Um dia bonito, no seu significado de
regresso. Mas as guerras hoje, por lá, onde Jesus andou e ressuscitou, resultam
em ironia. Macabra, ajudando à descrença. Um suave texto de reflexão, pelo Sr. P. GONÇALO PORTOCARRERO DE ALMADA, a quem agradecemos, pelo
prazer colhido. À Internet também, pela revisão do conceito.
O Paradoxo da Páscoa
Nas ressurreições de Lázaro e dos
filhos de Jairo e da viúva de Naim não houve nenhuma dúvida quanto à identidade
do ressuscitado. Não assim com Jesus de Nazaré.
P. GONÇALO PORTOCARRERO DE ALMADA, Colunista
OBSERVADOR, 30
mar. 2024, 00:1714
São Paulo é categórico, ao afirmar que a
ressurreição de Jesus é o fundamento da fé cristã: “se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé (…). Se somente nesta vida esperamos em
Cristo, somos os mais miseráveis de todos os homens” (1Cor 15, 17.19).
Este acontecimento, embora atestado por inúmeras testemunhas, permanece
misterioso, porque os que melhor
conheciam Jesus não foram capazes de O identificar, quando O viram logo após a
sua ressurreição. Paradoxo da Páscoa: como podem ser garantes do
fundamento da fé cristã aqueles que, conhecendo-o tão bem, não O reconheceram
depois da sua ressurreição?!
Os Evangelhos referem três
ressurreições atribuídas a Cristo: a de Lázaro
(Jo 11-1-44), a da filha de Jairo (Mt 9, 18-26) e a do filho da viúva de Naim
(Lc 7, 11-17). Nestes três casos não houve nenhuma dúvida quanto
à identidade do ressuscitado, pois foi sempre óbvio que se tratava da mesma
pessoa. Não assim com Jesus de Nazaré.
São Marcos refere as diferentes
aparições de Cristo no dia da sua ressurreição: primeiro a Maria Madalena, depois aos discípulos
de Emaús e, “finalmente, aos próprios onze, quando estavam à mesa” (Mc 16, 14). Na segunda
aparição, Jesus de Nazaré “apareceu com um aspecto diferente”. Mas, não é pela
aparência que se conhecem as pessoas?! Se o aspecto era diferente, como podiam
saber que era a mesma pessoa?!
São Lucas diz que, quando as mulheres
foram ao sepulcro, “apareceram-lhes dois homens em trajes resplandecentes. Como
estivessem amedrontadas e voltassem o rosto para o chão, eles disseram-lhes: ‘Porque buscais o Vivente entre os mortos?
Não está aqui; ressuscitou!’” (Lc 24, 5-6). São
Mateus e São Marcos esclarecem que quem lhes apareceu foi um “anjo do Senhor”,
cujo “aspecto era como de um relâmpago; e a sua túnica branca como a neve” (Mt
28, 2-3; Mc 16, 5-8).
Em relação a esta aparição há, portanto,
discordâncias quanto à natureza e número: apareceram
dois homens, como disse Lucas; ou um anjo, como referiram Mateus e Marcos?!
Se um anjo é tido por dois homens, a
aparição de Cristo ressuscitado não pode ser também a de um anjo?! Neste caso,
não provaria a ressurreição do Nazareno, até porque aquele que é mentiroso e
pai da mentira (Jo 8, 44) pode disfarçar-se de anjo de luz (2Cor 11,14) e dar
assim a conhecer, como real, o que poderia nunca ter acontecido.
São Lucas refere, com muito pormenor, a
aparição de Jesus aos dois de Emaús. Como discípulos que eram, deviam
conhecer bem o Mestre. No terceiro dia depois da morte de Cristo na cruz,
decidiram regressar à sua terra. Foi
então que se “aproximou deles o próprio Jesus, e se pôs com eles a caminho; os
seus olhos, porém, estavam impedidos de O reconhecer” (Lc 24, 15-16). Esta sua incapacidade para reconhecerem o seu Mestre é muito
suspeita, não apenas porque eram seus alunos, mas também porque foi dele que
falaram demoradamente: “começando por Moisés e seguindo por todos os profetas,
[Jesus] explicou-lhes, em todas as Escrituras, tudo o que lhe dizia respeito”
(Lc 24, 27). Ou seja, estão com Ele, a falar dele, e não O reconhecem?! É caso
para perguntar: seria mesmo Jesus de Nazaré?! Só ao fim do dia, quando fazem
uma paragem, para tomar uma refeição, é que, ao partir Jesus o pão, “os seus
olhos abriram-se e reconheceram-no; mas Ele desapareceu da sua presença” (Lc
24, 31).
É paradoxal este testemunho dos
discípulos de Emaús: como acreditar em quem, sendo discípulo do Mestre, está
com Ele, horas a fio, e não O reconhece?! Se se afirma a sua inicial cegueira,
quanto à identidade do estranho transeunte, como aceitar que, depois, vejam a
Jesus de Nazaré?! Se não era crível o seu primeiro testemunho, quando não reconheceram
o Mestre, porque há-de sê-lo o segundo, quando identificam o seu companheiro de
viagem?! Não seria mais razoável crer que era verdadeiro o seu primeiro
testemunho, que era também o mais natural, e que o que viram, ao lusco-fusco,
quando caiu a noite e estavam já cansados do caminho, foi uma alucinação?! Se
assim tivesse sido, ficaria também explicado o súbito desaparecimento posterior
de Cristo.
Quando
Jesus apareceu, no dia da sua ressurreição, aos apóstolos, estes, “dominados
pelo espanto e cheios de temor, julgavam ver um espírito” (Lc 24, 37). Ora, uma
tal perturbação não aconteceu nas outras ressurreições, em que ninguém duvidou
de que se tratava da mesma pessoa, em corpo e alma. Se Lázaro e os filhos
de Jairo e da viúva de Naim, depois de ressuscitados, não foram confundidos com
nenhum espírito, foi o corpo de Cristo ressuscitado que apareceu aos
apóstolos?! Porque a dúvida era pertinente, o suposto ressuscitado disse aos
espantados e atemorizados discípulos: “‘Vede as minhas mãos e pés:
sou eu mesmo. Tocai-me e olhai que um espírito não tem carne, nem ossos, como
verificais que eu tenho’. Dizendo
isto, mostrou-lhes as mãos e os pés.” (Lc 24, 39-40). Como nem assim ficaram convencidos de que
era Ele mesmo, “perguntou-lhes: ‘Tendes aí alguma coisa que se coma?’ Deram-lhe
um bocado de peixe assado; e tomando-o, comeu diante deles” (Lc 24, 41-43).
Não consta que nenhum espírito coma,
mas também não é natural que um verdadeiro corpo apareça e desapareça. Com efeito, misteriosas são as suas
aparições e desaparições. Depois de os de Emaús O terem reconhecido, “ele
desapareceu” (Lc 24, 31). Mais tarde, quando estes discípulos
contavam aos apóstolos o que lhes tinha acontecido, “Jesus apresentou-se no meio deles” (Lc 24, 36). Não aparece
naturalmente, mas surge, instantaneamente, num sítio onde antes não estava. É o
que também diz São João: “Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana,
estando fechadas as portas do lugar onde os discípulos se encontravam, com medo
das autoridades judaicas, veio Jesus, pôs-se no meio deles” (Jo 20,
19).
É
o evangelista João quem refere que Maria Madalena, estando junto ao túmulo,
“contemplou dois anjos vestidos de branco, sentados onde tinha estado o corpo
de Jesus, um à cabeceira e outro aos pés. Perguntaram-lhe: ‘Mulher, porque
choras?’ E ela respondeu: ‘Porque levaram o meu Senhor e não sei onde o
puseram.’ Dito isto, voltou-se para trás e viu Jesus, de pé, mas não se dava
conta de que era ele. E Jesus disse-lhe: ‘Mulher, porque choras? A quem
procuras?’ Ela, pensando que era o encarregado do horto, disse-lhe: ‘Senhor, se
foste tu que o tiraste, diz-me onde o puseste, que eu vou buscá-lo.’ Disse-lhe
Jesus: ‘Maria!’ Ela, aproximando-se, exclamou em hebraico: ‘Rabbuni!’ – que
quer dizer: ‘Mestre!’” (Jo 20, 12-18).
Mais uma vez alguém, que conhecia muito
bem Jesus e que o tratava com a distância e reverência devida pela criatura ao
Criador e pela discípula ao mestre, não O reconhece, apesar de estar a falar
com Ele e dele!! Mais uma razão para duvidar de que fosse mesmo Jesus, embora ela estivesse certa de que assim
era e, por isso, de seguida, foi “e anunciou aos discípulos: ‘Vi o Senhor!’”
(Jo 20, 18).
É
sabido que Tomé estava ausente, quando Jesus apareceu aos demais apóstolos, no
dia da sua ressurreição. Não tendo acreditado no unânime testemunho deles,
disse: “Se eu não vir o sinal dos pregos nas suas mãos e não meter o meu dedo
nesse sinal dos pregos e a minha mão no seu peito, não acredito” (Jo 20, 25).
Não obstante a impertinência da sua reivindicação, Jesus apareceu uma semana
depois e “disse a Tomé: ‘Olha as minhas mãos: chega cá o teu dedo! Estende a
tua mão e põe-na no meu peito. E não sejas incrédulo, mas fiel’. Tomé
respondeu-lhe: ‘Meu Senhor e meu Deus!’” (Jo 20, 27-28). Como é possível
que Jesus pudesse mostrar as suas chagas a Tomé e as não tivessem visto os
discípulos de Emaús?! Quer isto dizer que Cristo ressuscitado tem várias
aparências, nem sempre coincidentes?!
É o que também se deduz de um outro
episódio, quando, “ao romper do dia,
Jesus apresentou-se na margem, mas os discípulos não sabiam que era Ele” (Jo
21, 4). Disse-lhes que deitassem as redes para o lado direito
da barca e, graças à pesca milagrosa, reconheceram-no. Pela sua aparência e voz
não O tinham identificado, apesar de ser a terceira vez que aparecia aos
apóstolos, e a quarta a Pedro!
Não restam dúvidas de que Cristo ressuscitou, como todos os
apóstolos e mártires testemunharam e confirmaram, não apenas com a sua palavra,
mas também com a sua vida. Mas, por que razão os evangelistas não ocultaram
esta manifesta dificuldade de os seus mais próximos amigos O reconhecerem,
depois de ressuscitado?! Não seria
mais fácil crer na ressurreição de Jesus se o seu reconhecimento, por aqueles
que melhor O conheciam, tivesse sido imediato?!
Esta aparente contradição é o paradoxo da Páscoa, que tem fácil
explicação: enquanto Lázaro e os filhos de Jairo e da viúva de Naim apenas
regressaram à vida mortal que antes tinham, tendo todos eles voltado a morrer,
Jesus de Nazaré ressuscitou para uma nova vida na glória. Os evangelistas atestam a realidade da
sua ressurreição, bem como a certeza da sua identidade e realidade corpórea,
sublinhando a sua misteriosa transcendência, que a razão humana não pode compreender.
Por isso, embora a ressurreição de Cristo seja uma evidência, é
também um mistério, a que só se pode aceder pela fé. Se a ressurreição fosse apenas voltar à
vida anterior, mais do que graça seria, como as cíclicas reencarnações em que
acreditam algumas religiões orientais, uma maldição e uma desgraça.
À imagem e semelhança de Cristo
ressuscitado, todos os homens estão destinados à glória, que consiste na
participação da plenitude do amor que Deus é, e a que se acede, segundo a
esperança cristã, pela profissão da fé e a prática da caridade. Santa Páscoa!
COMENTÁRIOS (de 14)
Nuno Alves: Que nesta
Páscoa os que apenas reconhecem um Jesus humano, possam reconhecer um Jesus
divino. Que os nossos olhos se abram para a porta desconcertante, da
ressurreição aberta para nós. Santa Páscoa. Ana Luís da Silva > bento guerra Tem razão quando diz que é estranho para nós seres
humanos que Deus se apresente como Cristo sofredor, pregado numa cruz. Para o
entender é necessário começar a entrar na pedagogia da Salvação. Para nós,
seria mais “compreensível” que Deus se apresentasse Todo-poderoso. A
dinâmica da liberdade que permite ao ser humano salvar-se ou não, exige que
Deus não se imponha pelo lado do poder, mas pelo lado do amor, da conversão do
coração (entendido como o centro da pessoa: a sua vontade, a sua
inteligência, a sua alma). Por outro lado, Deus que se entrega para nos salvar,
só pode ser entendido se reconhecermos que precisamos de ser salvos. Tal
implica um caminho pessoal que nem todos estamos dispostos a trilhar. Opções.. Ana Luís da Silva: Excelente texto! Muito
obrigada ao padre Portocarrero de Almada por esta meditação tão consoladora
para o tempo de silêncio e reflexão de sábado santo. Bem-haja e votos de Santa
Páscoa. Lily
Lx: Santa Páscoa!
NOTAS:
TEXTO DA INTERNET: Significado
de Páscoa Cristã
A Páscoa Cristã
é uma das festividades mais importantes para o cristianismo, pois representa a ressurreição de Jesus
Cristo, o filho de Deus.
A data é comemorada anualmente no primeiro domingo
após a primeira lua cheia que ocorre no início da primavera (no Hemisfério
Norte) e do outono (no Hemisfério Sul). A data é sempre entre os dias 22 de
março e 25 de abril.
Dentro do
cristianismo, diferentes religiões e denominações celebram a Páscoa de maneira
diferente. Por exemplo, os protestantes celebram de maneira diferente que os
católicos. Enquanto os católicos são encorajados a não comer carne na Quaresma,
para os protestantes não existe essa restrição. Além disso, os protestantes não
costumam celebrar todos os dias da Semana Santa como os católicos, dando mais
importância à Sexta Feira Santa e Domingo de Páscoa.
Durante os 40 dias que precedem a Semana Santa e a
Páscoa - período conhecido como Quaresma - os católicos dedicam-se à penitência
para lembrar os 40 dias passados por Jesus no deserto e os sofrimentos que ele
suportou na cruz.
A Semana
Santa começa com o Domingo de Ramos, que lembra a entrada de Jesus em
Jerusalém, ocasião em que as pessoas cobriam a estrada com folhas da palmeira,
para comemorar a sua chegada.
A Sexta Feira Santa é o dia em que os cristãos
celebram a morte de Jesus na cruz. E por fim, com a chegada do Domingo de
Páscoa, os cristãos celebram a Ressurreição de Cristo e a sua primeira aparição
entre os seus discípulos.
A Páscoa já
era comemorada antes do surgimento do Cristianismo. Tratava-se da comemoração do povo judeu por terem sido libertados da
escravidão no Egipto, que durou aproximadamente 400 anos.
Segundo a Bíblia, supostamente Jesus teria participado
de várias celebrações pascais. Quando tinha doze anos de idade foi levado pela
primeira vez pelos seus pais, José e Maria, para comemorar a Páscoa, conforme
narram algumas das histórias do Novo Testamento da Bíblia.
A mais famosa participação relatada na bíblia foi a "Última Ceia", onde
Jesus e os seus discípulos fizeram a "comunhão do corpo e do sangue",
simbolizados pelo pão e pelo vinho.
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