segunda-feira, 4 de março de 2024

Vivemos em democracia


Cujo lema são os direitos de igualdade, liberdade, fraternidade, comuns à humanidade, daí o escape das referências pessoais, os pretendentes aos cargos políticos querendo dar um ar de fraternidade universal nas referências pessoais que os tornam semelhantes aos mais, para efeitos de contabilidade votante. Mas a referência a Mário Soares, de grande efeito valorativo no texto de Miguel Pinheiro, não apaga, em mim, o sentimento do ridículo, em tempos passados, aquando de um debate político ente Soares e Felipe González, cujo discurso político foi muito mais desenvolto e consciente dos problemas mundiais do que o do nosso apagado ministro - para além da imagem inesquecível deste, montado numa tartaruga gigante, nas bastas viagens que lhe proporcionou o cargo por  que lutou nos seus heroísmos de pacotilha. Não, também não acredito na superioridade do tal Soares.

Soares e Sá Carneiro? Não me façam rir

Nesta campanha eleitoral, os líderes partidários, que gostam de invocar os grandes políticos do passado, trocaram o jornalismo pelo entretenimento. Querem que seja tudo muito fofinho.

MIGUEL PINHEIRO Director executivo do Observador

OBSERVADOR, 02 mar. 2024, 00:2234

Pedro Nuno Santos revela, com comovente embaraço, que trata a mulher por “baby”. Luís Montenegro lembra, com incontrolável saudade, que “brincava muito na rua, mas sem excessiva traquinice”. André Ventura confessa, com desarmante nostalgia, que está “um pouco arrependido de não ter vivido num determinado momento certas coisas” porque “talvez tivesse feito mais amigos”. É tudo muito fofinho, não é?

Nestas eleições, a forma de fazer campanha em Portugal mudou de forma irremediável. Não é que estejamos perante uma genial originalidade: em democracias maduras e robustas, há muito tempo que os candidatos usam parte do tempo de campanha para conversarem sobre a sua vida privada com apresentadores de programas televisivos da manhã ou da tarde e com humoristas, influenciadores ou youtubers. Barack Obama fez isso. David Cameron fez isso. Pedro Sánchez fez isso.

Tem todo o sentido. Dar o voto a alguém é um acto de confiança política, como é evidente. Mas é também um acto de confiança pessoal, como não podia deixar de ser. Por isso, Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro e André Ventura querem mostrar, recorrendo aos meios que forem indispensáveis, que merecem ser os fiéis depositários dessa confiança dos eleitores, especialmente se eles forem recalcitrantes ou indecisos. Em tempos, os assessores de comunicação dos líderes partidários preocupavam-se com a resposta à pergunta “Comprava um carro em segunda mão a este político?”. Agora, estamos longe das preocupações locomotoras — a avó, a mulher, os filhos e o papagaio de estimação são o combustível para perseguir o voto de quem não se quer ocupar com centenas de páginas de programas eleitorais.

Insisto: está tudo certo, é mesmo assim. Convém, no entanto, deixar dois alertas, enquanto é tempo. O primeiro é que, ao exporem sem qualquer filtro a vida privada, usando-a para cumprir os seus objectivos políticos mais terrenos, os líderes partidários transformam a sua família, o seu passado e as suas decisões mais íntimas num terreno legítimo de escrutínio jornalístico. A imprensa irá, naturalmente, procurar incoerências, exageros e mentiras porque convém que os eleitores não sejam enganados por fantasias criadas para ganhar votos.

O segundo alerta é este: quando a política é a sério, uma conversa simpática não substitui uma entrevista incómoda. Mas, nesta campanha, Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro e André Ventura trocaram o jornalismo pelo entretenimento. O Observador, por exemplo, passou várias semanas a tentar marcar entrevistas de escassos 45 minutos com os líderes do PS, do PSD e do Chega. Todos recusaram, invocando motivos frívolos, irrelevantes ou dissimulados. Eles sabem bem que não seriam, seguramente, conversas sobre o amor, sobre a nostalgia ou sobre a amizade — seriam sobre propostas, sobre contradições e sobre a adequação das suas promessas à realidade. Mas, isso, Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro e André Ventura não querem. De forma pusilânime, preferem controlar a mensagem e evitar surpresas. Ao longo desta campanha, em momentos diferentes, cada um destes candidatos já invocou os nomes de Mário Soares e de Francisco Sá Carneiro, tentando assim, esforçadamente, comparar-se com os grandes políticos do nosso passado colectivo. Como já deu para perceber, não fazem ideia do que estão a falar.

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COMENTÁRIOS

Américo Silva: Navalny foi enterrado, se todos os abonados da CIA em Moscovo tivessem ido ao funeral haveria muito mais gente; a propósito, Durão Barroso entrou na campanha para nos lembrar as virtudes de invadir o Iraque, fugir, e ganhar umas massas na goldman sachs; segundo os comentadores Montenegro penetra nos reformados, já Passos Coelho tinha penetrado, não sei se gostarão de ser penetrados, quem sabe?        Paulo Almeida:  Esta crónica parece mais um desabafo de frustração por ninguém querer brincar comigo. Se a rádio Observador tem tanta audiência, porque será que os políticos recusaram vir à entrevista do observador mas foram à CMTV, à CNN, à Radio Renascença e a outros canais digitais não generalistas? Se poderiam ter audiência para falar porque não foram? Os outros canais também fazem perguntas difíceis. Neste ponto o Observador está certo e todos os outros estão errados? É o contrário. Não pensar sequer que o modelo de entrevistas passado tenha influência, ou que seja da forma das entrevistas no caso no congresso do Chega, ou das peças constantes enviesadas, ou de medidas de programa politico alteradas propositadamente e poderia continuar. É uma ingenuidade ou teimosia. A realidade é que eles foram a outros locais e não ao Observador. A realidade é que as razões para recusarem não foram ditas nem são aceites, como se alguém que convida tivesse o direito de ditar a agenda do outro ou ser juiz da veracidade das razões evocadas. A realidade é que com tanta audiência e mesmo assim não quiseram, seria um motivo para uma análise da forma de actuar do Observador, mas isso nem sequer está em cima da mesa. Acham que nós fazemos perguntas a sério e os outros não. Acham que devem vir e submeterem-se a interrogatórios como foi o último sob escuta de 2022 pelo menos o do Ventura que foi vergonhoso. Acham que sabem melhor quem são os políticos antigos do que os próprios políticos. Se fosse um trolha a dizer que um jornalista não sabe se é jornalista, que fariam? O problema é achar-se que a comunicação social é o 4º poder e lhes cabe a defesa da democracia ou da sua moralidade segundo seus princípios. Não é, cabe informar de forma isenta, e respeitar a vontade do convidado, sem birras. E o Observador ainda não chegou aí, infelizmente. Podem arriscar-se a ficarem isolados, pois é muito fácil perceber-se a razão ao verem os "interrogatórios" que fazem. Não são entrevistas, não tentam explicar para os ouvintes. Só esperam conseguir encontrar uma trica e apanhar uma incoerência. Veja-se o sob escuta de 2022 de Ventura e percebe-se isso tudo. Só têm o que merecem. Crónica fraquinha, nem sempre corre bem, mesmo assim vale pelo esforço!  Fernando Cascais O Miguel Pinheiro nasceu em 74 e era muito jovem para ter percebido Sá Carneiro e Mário Soares nos seus tempos.  Deve haver um termo na psicologia que identifica a percepção exacerbada do heroísmo que temos das figuras históricas do passado. Eu, até muito tarde acreditava num Afonso Henriques com uma força hercúlea que girava no ar a sua espada de 20 kg quando corria a cavalo ou a pé atrás dos mouros.  O Miguel Pinheiro e a história recente de Portugal memorizaram Carneiro e Soares como Afonsos Henriques contemporâneos. Obviamente que tiveram os seus méritos, mas, eram homens como estes de agora. As circunstâncias dos tempos fazem os heróis. Zelensky é um bom exemplo. Cavaco Silva quando nos deixar será também recordado como um dos maiores do seu tempo, maior que Sá Carneiro ou Mário Soares. Passos Coelho se lhe tivesse calhado a ele a infelicidade que calhou à mulher, hoje seria também recordado com a mesma importância de Sá Carneiro ou Mário Soares. Os tempos que vivemos não são nada fáceis. Ao contrário de Soares, os socialistas agora juntam-se aos comunistas. O PSD ganhou concorrência no seu espaço político. Existem muitos mais partidos e o espectro político para o posicionamento dos partidos políticos deve ser elaborado de forma mais complexa, talvez por quadrantes formados por sistema de coordenadas com eixos, um para a ideologia económica e outro para os valores morais. A política é mais complexa. Tendemos a não gostar do que temos e a exigir mais e melhor, mas, é o que temos, foram os que se chegaram à frente, são os representantes atuais do povo português. Se calhar gostávamos mais de suecos, alemães ou noruegueses, mas, como vivemos em Portugal e somos portugueses, os nossos políticos são o nosso reflexo. Portanto, caro Miguel Pinheiro, não entre nessa de desvalorizar o produto português e dizer, como dizem os Velhos do Restelo, que antigamente é que era. Estes hoje serão os Sá Carneiros e os Mários Soares do futuro.                           F. Mendes: De acordo. O nível miserável dos debates, e da campanha eleitoral, ajuda a explicar por que motivo parece haver, ainda, tantos indecisos. Perante tanto ruído, sobrelevado por promessas estapafúrdias, haverá muita gente a pensar: eles são todos iguais!                     João Floriano: Miguel Pinheiro já pensou nos motivos que levam o Ventura a declinar os convites para entrevistas no Observador? Nunca foi tratado com cortesia ou imparcialidade. Eu também não punha lá os pés.            Joaquim Rodrigues: Sempre que Luís Montenegro invoque o nome de Sá Carneiro, isso é bom. Do que o País precisa é de um líder do Partido Social-Democrata que afirme, como Sá Carneiro afirmou, sem hesitações, como suas Prioridades Políticas, a “Libertação da Sociedade Civil”, a “Livre Iniciativa Privada”, o “Mercado e a Concorrência”, a “Liberalização da Economia”, a “Descentralização Política do Estado” e o “Desmame da Oligarquia da mama do OE”, das “Negociatas de Estado” e das “Rendas Monopolistas outorgadas pelo Estado”. Se isso acontecer, então teremos um “Líder e um Partido” capazes de mobilizar o eleitorado do PSD, o eleitorado democrata do PS, traído pelo Costa ao aliar-se à extrema esquerda e os actuais abstencionistas desiludidos com o “Sistema”. Quando isso acontecer teremos um “Líder e um Partido “com a força necessária para fazer as “Grandes Reformas” de que o País necessita e que o Sá Carneiro se preparava para fazer quando foi assassinado. A “Oligarquia” tem-se servido, umas vezes do PS, outras vezes do PSD e do CDS, conforme a conjuntura e conforme os lacaios na liderança dos partidos que, em cada momento, melhor controla e mais garantias lhe dão quanto aos privilégios montados à volta do Estado e do Orçamento de Estado que o nosso Regime “Estatista” e “Centralista” permite e facilita. A “Oligarquia” adorou o Sócrates que, nas suas negociatas, juntou ex-cunhalistas como o Mário Lino e ex- salazaristas, como o Ricardo Salgado. A “Oligarquia”, tal como não confiava em Passos Coelho, também não confiava em Rui Rio. Ansiava era pela oportunidade de poder correr com ele da liderança do PSD.  Mas só o queria fazer quando tivesse garantias de que conseguia pôr, no lugar de Rui Rio, um “lacaio” da sua confiança que “…pudesse pôr a funcionar…”, e de que não ia para lá alguém em quem não confiasse e que não controlasse. Enquanto isso não acontecesse preferia o Costa que caiu por indecente  má figura. Quando Rui Rio estava quase no ponto para servir de trampolim à “oligarquia” para a colocação de um lacaio seu à frente do PSD, eis se não quando, apareceu Luís Montenegro, que veio estragar todo o “arranjinho”. Temos esperança que o Luís Montenegro venha a ser o líder capaz de honrar a memória de Sá Carneiro e de fazer as grandes reformas de que o País necessita.                       João Queiroz e Lima: Honestamente, para perder tempo a falar de coligações pós e pré eleitorais ou do que fazem se perderem as eleições, mais vale falar de quem eles são.  Debates que pareciam entrevistas ou discussões com os moderadores, bem como entrevistas sem perguntas estruturantes e sem qualquer tempo para desenvolver ideias, serve para esclarecer quem? As pessoas preferem ser esclarecidas pelos candidatos e não pelos jornais, mas os jornais querem ensinar-nos a olhar para as coisas à sua maneira, fazendo de nós parvos. As formas alternativas de chegar ao eleitorado estão aí, nas redes sociais, e é pena que no Observador se façam os mesmos erros que são feitos noutros lados.     Manuel Martins: Devido ao hiato de tempo desde a decisão de convocar eleições, estamos em campanha eleitoral há 3 meses. Existe,  em minha opinião,  um enfoque exagerado da comunicação social na política,  com exploração dos casos e casinhos do que ocorre diariamenteQuando não há casos,  supõem que possam existir,  discutem cenários,  exploram deslizes dos protagonistas políticos ou alheios. Quase todos os intervenientes mentem, deturpam, numa narrativa  para enganar tolos. E mais me convenço que uma fragilidade da democracia é o facto de o voto,  para muitos cidadãos,  não ter valor, ou ser dado levianamente: alguns exemplos dados pela comunicação social nas interacções dos políticos com os cidadãos, mostram que o seu voto é dado por um interesse mesquinho ou com base em informação errada.  É triste...

 

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