segunda-feira, 25 de março de 2024

Mal se percebe

 

Tal assunto do vestir. A menos que seja num contexto ideológico, a respeito do simbolismo do vestuário… ou da falta dele, neste último caso, do tipo “Diz o roto ao nu”, em que nos condenamos uns aos outros, sem vermos o nosso próprio argueiro. Não, não entendemos o significado do texto, a roupa, desde sempre, servindo naturalmente para cobrir, tapar, proteger ou mesmo enfeitar, as ocasiões especiais merecendo trajes especiais, determinados empregos exigindo o vestuário próprio, talvez não tanto para valorizar, mas para distinguir, por vezes atemorizando. Mas o vestuário que nos é imposto ou que escolhemos, com maior ou menor aplicação, e dentro das nossas possibilidades económicas, serve, naturalmente, para distinguir ocasiões, de festividade ou outras, e não me parece que seja motivo de chufa ou ironia, a menos que os rasgões que hoje merecem as calças – não sei se já passaram para os blusões os tais rasgões – não só da juventude mas de adultos compinchas, ou desejosos de permanecer em adolescência exibicionista de desrespeito ou, pelo contrário, de pedante e falsamente amistoso paralelismo económico-social com os desvalidos da penúria real – a menos que esses rasgões, repito, merecessem comentário sobre a roupa e o seu papel social. Mas o texto foi sobre o Cristo bíblico, servindo para revelar que o povo que o cobriu usou a sua pobre roupa para servir de tapete ao burro que transportou Jesus. E eis o comentário da simpatia humana pelos pobrezinhos – neste caso, com censura implícita ao Salvador do Mundo que protagonizou o episódio: a roupa do povo a servir de tapete.

Não, não percebemos o objectivo do texto sobre a roupagem usada segundo as ocasiões – em momento próprio ou alheio. É claro que a roupa, com ou sem simbolismo, é necessária ao Homem sempre, que tem a pele demasiado fina, para se poder resguardar apenas com essa – o que lhe dá vantagens, inteligente como é, para criar roupas e se vestir com mais ou menos arte, e de acordo com as suas posses materiais.

Não, não percebemos a finalidade do texto. E muito menos a referência ao episódio bíblico revelador do amor do povo por aquele Menino, inocente ainda, e pobrezinho também.

O povo que se veste e que se despe

Hoje não estamos muito habituados à ideia de que a roupa que vestimos pode servir para dar valor a outra pessoa que não nós, que a vestimos.

TIAGO DE OLIVEIRA CAVACO Pastor Baptista, colunista do Observador

OBSERVADOR, 24 mar. 2024, 00:185

Fascina na entrada triunfal de Jesus em Jerusalém o papel da roupa. Ainda hoje, quando se prevê um grande ajuntamento, não são poucos os que se preparam para ele através do que vestem. Calhou-me passar pela miudagem que no ano passado ia para o concerto do Harry Stiles em Algés e espantei-me com o modo como se vestia. Grandes eventos puxam pelo que vestimos.

Há um paralelo precioso com o que acontece com a roupa daqueles que em Jerusalém acolheram Jesus. O texto bíblico diz-nos que duas coisas se fazem com roupa naquele episódio: em primeiro lugar, pôs-se roupa no jumentinho para que Jesus montasse nele e, em segundo, as pessoas estendiam a roupa pelo caminho para que agora o jumentinho, transportando Jesus, a pisasse. Imaginem uma coisa assim: a roupa do povo a servir de tapete.

Hoje não estamos muito habituados à ideia de que a roupa que vestimos pode servir para dar valor a outra pessoa que não nós, que a vestimos. Claro que há uma ou outra ocasião em podemos ter de nos vestir mais formalmente, não tanto porque gostamos mas porque a ocasião exige. Mas as ocasiões que exigem da nossa roupa estão, julgo, a tornar-se cada vez menos.

A verdade é que nos vestimos sempre em conformidade com o que valorizamos. Vestimo-nos e despimo-nos, vale a pena acrescentar. O que usamos na pele é, de um modo ou de outro, o que nos enche o coração. Visto-me para o artista que vou ver em concerto, visto-me para o artista que muitas vezes serei eu próprio, e por aí em diante. Mas vestir nunca é apenas vestir.

Reconheço que tenho esse hábito óbvio de escolher a roupa pensando em mim, nos triunfos que eu próprio gostava de alcançar. Nessa medida, todos vivemos a tentar coreografar as nossas próprias entradas triunfais. Mas também reconheço que, num dia em que se recorda Jerusalém invadida por Jesus, não me traz grande descanso essa tentativa constante de reinar sobre as circunstâncias. Vestir-me para acolher quem é muito melhor do que eu é uma moda muito, mas muito preferível. E que dá paz.

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COMENTÁRIOS

ily Lx: Santo Domingo de Ramos!               João Floriano: Os estudantes costumam estender as capas para figuras ilustres passarem por cima e aposto que jumentos muito maiores do que o jumentinho  do Dia de Ramos já pisaram as capas negras.                   Alexandre Barreira: Pois. Mesmo a propósito. Há dias....nas finanças de Setúbal. Reparei num tipo....de fato e gravata. E chinelos de "meter-o-dedo". Fiquei a pensar: Ora bem....vestir em conformidade com a ocasião..Tem o seu "peso" simbólico e "tributário"....!!!                   Maria Augusta Martins: Estou a ver o comentador e o povo de quem fala a botar uma albarda no lombo.

E burro bem albardado vale sempre mais umas "cr'oas", E pastor, com safões e pelicos, então nem se fala!             bento guerra: Povo "stripteaser"

 

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