Um descritivo como sempre gerido com
nobre intelectualidade que a ninguém perdoa os truques da nossa pequenez
temerosa e assaloiada, quando não pedante, ou falsamente decente, de que os da
AD, por ser a mais responsável neste momento, definem bem o que reputo de
preguiça ou cobardia, que não vão salvar a nação que tanto precisa de salvação
e de gente capaz para isso. Um agradecimento do coração a AG, que os
descreve a todos, com saber - sem picardia, contudo, que só merecemos
palmatoadas.
A direita do Chega arrisca ser a que sobra
De acordo com Sua Sumidade, os
resultados foram claros: ganhou a esquerda, já que teve mais votos e mandatos
que o centro-direita e a extrema-direita separados.
ALBERTO GONÇALVES Colunista
do Observador
OBSERVADOR, 16 mar. 2024, 00:2010
O dr. Tavares é uma inteligência. Um
dia caiu-lhe uma maçã na cabeça e no interior desta germinou a tese dos três
blocos. Quer dizer, o dr. Tavares apenas lhe deu o nome, se tanto. O resto
ficou a cargo dos “media”, que por insondáveis motivos acham graça ao
personagem e resolveram atribuir-lhe a autoria de um truque obviamente
inventado, ou no mínimo popularizado, há anos pelo dr. Costa e adoptado pela
esquerda em peso e pela parte da “direita” que se julga virtuosa.
O truque – perdão, a tese –, é o
seguinte. Existe a extrema-direita, que é o Chega, o centro-direita, composto por PSD e IL, e
a esquerda, que agrupa a rapaziada remanescente. A
esquerda, que mistura o PS com os “franchises” locais de Putin, Lula, Maduro e
do Hamas, é o único conjunto de forças verdadeiramente democráticas e pode
fazer o que lhe apetecer, incluindo, se necessário, acordos escritos com os
canibais do Haiti. O centro-direita não pode fazer nada, excepto sonhar
com a consideração de uma esquerda que lhe dedica sistemático asco. E a extrema-direita não entra nas contas.
Quem entra destravado pelas contas é o
dr. Tavares, a explicar aos leigos os resultados eleitorais que os leigos,
coitados, pensavam ter influenciado e percebido. De acordo com Sua Sumidade, os
resultados foram claros: ganhou a
esquerda, já que teve mais votos e mandatos que o centro-direita e a
extrema-direita separados. A separação é fundamental a todo o
edifício teórico, dado ser preciso que os primeiros dois blocos não se juntem
para que o terceiro seja justamente consagrado vencedor. Alguns leigos, casmurros, talvez
perguntem porque é que a esquerda, ainda que venere “Che” Guevara e conviva com
ex-Stasi, nunca é “extrema” e nunca se sujeita às restrições morais que impõe à
direita. Ora essa: porque o dr. Costa, o dr. Tavares e a
esquerda em peso assim o decretaram, e a “direita”, ou a parte “virtuosa” da
“direita”, aceitou toda contente o decreto.
Um estrangeiro, um ermita ou qualquer
indivíduo pouco
familiarizado com o estado a que desceu a política caseira lê o acima descrito
e imagina tratar-se de brincadeira. Não, senhor. Por incrível que pareça, o dr.
Tavares é real. A conversa dos três blocos anda por aí. E há gente à “direita” que admite, e
aplaude, tudo. Ou seja, no passado Domingo, a esquerda foi arrasada nas urnas
de maneira quase inédita e, apesar das recusas dos chefes de PS e do BE em
aderir ao delírio, o dr. Tavares continua a tentar convencer-nos do contrário.
E o extraordinário é que o ouvem Detesto analogias
futebolísticas, mas é como se a equipa goleada quisesse levar a taça sob o argumento
de que o adversário não podia ter jogadores com nomes começados por “C” – e os
painéis da especialidade debatessem a pertinência do tema dias a fio. Vendo
bem, é pior que isso..
Surrealismo de lado, os partidos não
socialistas, ou menos socialistas que o PS, conseguiram a 10 de Março uma vasta
maioria parlamentar. É uma oportunidade rara, que, sujeitos às respectivas
consequências, aproveitam ou desperdiçam. Ao
invés do que finge a brigada das “linhas vermelhas”, o problema do “não é não”
jamais passou pela mera, e parcialmente inevitável, rejeição do Chega, e sim
pelo fervor com que a rejeição do Chega desviou o PSD (e a IL) da rejeição do
socialismo. Na mesma linha (de cor facultativa), a
alternativa ao “não é não” não implica puxar o Chega para o governo, com as
pastas da Administração Interna, da Defesa e da Justiça. Não faltam tons
intermédios na gestão das coisas, possíveis através de negociações, cedências,
expectativas, dependências, medos, bluffs e chantagens, afinal a matéria da
política. O que não é possível, ou não devia ser, é permitir que
escrúpulos postiços devolvam em breve o poder ao PS e seu actual séquito de
leninistas. Os leninistas não têm escrúpulos.
E receio que certa direita não tenha
juízo. Após se constatar o sensacional fiasco da “cerca sanitária”, dois ou
três dos iniciais adeptos da estratégia reconheceram o erro, uns tantos
continuam calados e muitos, à semelhança dos sábios que vão contra um poste até
que o poste se queixe, insistem em demonstrar a sua razão. A demonstração é que não é fabulosa:
consiste em exibir provas de que os dirigentes do Chega, os deputados do Chega
e os votantes do Chega são, cito, “grunhos”, presume-se que por comparação com
os vultos intelectuais que votaram no dr. Tavares, na dra. Mariana e no dr.
Pedro Nuno, eles próprios monumentos à sofisticação. E em
simultâneo fala-se de “princípios”, os exactos princípios que impelem a brigada
das “linhas vermelhas” a preferir o radicalismo da esquerda mais selvagem a
sequer acolher uns palpites de uma “extrema-direita” cujo maior desvario são as
exalações “sociais” e estatistas.
Pendurado na fragilidade do tipo de
governo que ameaça escolher liderar, o dr. Montenegro vai distribuir brindes
pelo povo, na esperança de que os brindes comprem a aprovação da esquerda. Não
compram. Com jeito, garantem o enterro da direita. Menos a direita do Chega,
que arrisca ser a que sobra.
COMENTÁRIOS (de 10)
José Paulo Castro: A teoria do Dr. Tavares é tão
simples como as seguintes regras: 1) "Os mandatos do Chega na assembleia são anulados, não
contam para nada. " 2) "Na sub-assembleia da República assim
constituída, com apenas 182 deputados, a esquerda terá maioria e o PSD e a IL
ficam na oposição." Ah, o democrata! E democrata representativo... do tipo
que evolui de "cada cidadão, um voto" para "por cada cidadão, eu
voto".
Maria Paula Silva: A direita do Chega arrisca-se a
ser a única que sobra e que vai crescer. Podem agradecer a todos os outros. E
quanto às analogias futebolísticas que também detesto, até porque metade
delas nem as percebo porque o que detesto mesmo é o futebol, parece-me
que nos últimos anos a política exercida se parece cada vez mais com o
futebol. E é tudo muito medíocre, desde os jogadores aos jogos
escabrosos. Entretanto, o piroso do psd ou ad (ou seja lá o que
isso for) com vergonha de não ser de esquerda vai descambar até estar
completamente fundido ou aglutinado pelo ps. O Chega agradece. É para lá que vão todos os descontentes e os que
se sentirem traídos. Montenegro está a arranjar um karma desgraçado.
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