Por
aqui, não há perigo, que temos cravos vermelhos em barda para o traçado das
tais linhas, sempre acarinhadas, apesar dos ameaços. Mas o que se quereria era
mais bom senso. Eu creio no novo governo, embora descreia do anterior, que usa
as linhas mesmo contra os que parecem interessados numa reconstrução efectiva,
sem demagogia e em democracia com a tal transparência de que se falava dantes. Quanto
ao nosso Le Pen, julgo
que lhe falta o gabarito daquela, demasiado excitado para merecer tanta linha
vermelha assim. Lá pela França é que as consequências da mesma democracia de
braços abertos são mais arrasadoras, o que leva a população francesa a não
aderir tão eficazmente às linhas vermelhas contra a direita radical.
O fracasso das linhas
vermelhas em França
Macron percebeu o óbvio: a estratégia
das linhas vermelhas fracassou e só pode ser salva pelo eleitorado francês. Por
isso, devolveu a palavra aos eleitores.
JOÃO MARQUES DE ALMEIDA Colunista do Observador
OBSERVADOR13 jun. 2024, 00:173
Se recuarmos ao início deste século, a estratégia
das linhas vermelhas contra a direita populista ou radical começou em
França. Vale a pena recordar. Sob pressão das esquerdas, o líder das direitas moderadas, Jacques Chirac, impôs as linhas vermelhas à
Frente Nacional, ainda liderada por Jean
Marie Le Pen. Isso valeu quase 80% dos votos nas presidenciais de 2002, com
os socialistas a votarem em Chirac unidos na famosa frente republicana. Os
líderes seguintes dos Republicanos, como Sarkozy,
continuaram a política das linhas
vermelhas. A
estratégia da frente republicana foi seguida por todos nas eleições
presidenciais e nas eleições legislativas, com os republicanos
e os socialistas a apoiarem-se mutuamente nos círculos eleitorais onde um
candidato da Frente Nacional fosse à segunda volta.
A estratégia parecia funcionar até 2017.
A estratégia das linhas vermelhas começou a fracassar quando a Frente Nacional ultrapassou os Republicanos como o maior partido entre as
direitas. Em 2017, Marine Le Pen foi à segunda volta das eleições
presidenciais contra Macron,
tal como em 2022.
A partir do momento em que a Frente Nacional ultrapassou os Republicanos iniciou
igualmente um processo de moderação. Atacou muitas das políticas mais radicais de Jean Marie Le Pen,
deixou de ser contra a União Europeia e contra o euro, e mudou de nome para
Coligação nacional. Nas últimas
eleições legislativas, igualmente em 2022, também ultrapassou os Republicanos no parlamento francês.
Agora
nas últimas eleições europeias, a Coligação nacional tornou-se no partido
mais votado em França, o que levou
Macron a dissolver a Assembleia Nacional e a marcar eleições parlamentares
antecipadas. Macron percebeu o óbvio: a
estratégia das linhas vermelhas fracassou e só pode ser salva pelo eleitorado
francês. Por
isso, devolveu a palavra aos eleitores. Os franceses vão agora decidir se estão
preparados para eleger a Coligação Nacional de Marine Le Pen para o governo ou
não.
Macron, obviamente, arriscou. Mas, por vezes, na política, é
necessário arriscar. Não há alternativa. Há agora dois cenários. O primeiro será a vitória do
partido de Macron. Isso significaria que uma grande maioria dos eleitores
franceses pretende manter a Coligação Nacional fora do poder. É o cenário menos provável. O segundo
cenário será a vitória da Coligação Nacional. Será muito difícil ganhar com maioria
absoluta, mas muito possivelmente ganhará
com maioria relativa. Estou convencido que nesse caso, Macron
reconhecerá o fim da estratégia das linhas vermelhas e convidará o partido de
Le Pen para formar governo.
Mas estou convencido de que
Macron impedirá o seu partido de se juntar a todos os outros para derrubar o
governo minoritário da Coligação Nacional. Com o fim das linhas vermelhas, só
resta integrar a direita populista e radical no sistema político e permitir que
governe para ser avaliada pelo eleitorado pelo que faz e não apenas pelo que
promete. E a tarefa de um governo do partido de Le Pen será tudo
menos fácil: será um governo minoritário, fraco e dependente de Macron.
Macron prefere um governo minoritário da
Coligação Nacional a uma aliança entre todos contra Le Pen, a tal frente
republicana. Isso
abriria as portas do Eliseu a Marine Le Pen em 2027. Macron prefere governar
com a Coligação nacional do que deixar Marine Le Pen no seu lugar de Presidente
de França.
Macron escolheu, se for necessário, dar responsabilidades políticas
à direita populista antes de a deixar ser a força política dominante em França. A direita
em Portugal, especialmente aquela que continua a defender as linhas vermelhas
em relação ao Chega, deve olhar com muita atenção para França. E tentar, desta
vez, aprender alguma coisa, já que não aprendeu nada com Meloni em Itália.
PS: Mesmo
sem ganhar, as eleições europeias correram bem ao governo e a Montenegro. A questão
decisiva era a seguinte: depois das
eleições europeias as hipóteses de eleições no início do próximo ano aumentaram
ou diminuíram? Diminuíram, por isso foram boas para o governo. Tem hoje mais hipóteses
de governar durante três anos do que tinha antes de domingo passado.
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COMENTÁRIOS
Joao Cadete: A defender outra vez governar com
patetas... Maria Cantista: Em Portugal, as linhas vermelhas cairão quando cair o TRAIDOR da
Direita: André Ventura! Arranjem outro líder e logo se vê 😂 Fernando Cascais: Caro
João Almeida, é melhor esperar sentado. Portugal é um país relativamente
pequeno que só tem 10 milhões de habitantes. Se votarem 5 milhões já é muito
bom. Nas últimas legislativas o PS e a AD tiveram 1,8 milhões de votos cada um.
O Chega arrebatou quase 1,2 milhões de votos. Votaram desta vez cerca de 6,5
milhões de eleitores.
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