Em ponderação e desassombro, demonstrativos de agudeza
crítica e uma formação moral de dignidade e coragem pouco comuns. RUI RAMOS, o
seu autor.
I - Causas do derrotismo dos
povos ocidentais
Há no Ocidente uma inclinação para
acreditar que qualquer esforço militar ocidental está condenado ao fracasso, é
ilegítimo e se revelará inútil. É isso que vemos em relação à Ucrânia e a
Israel.
RUI RAMOS Colunista do Observador
OBSERVADOR, 31
mai. 2024, 00:2131
O presidente Zelensky anda
sempre agora com uma cara preocupada. Pelo menos nas fotos que vi da sua
passagem por Lisboa, nem mesmo os cochichos do nosso presidente lhe inspiraram
um sorriso. O ar sombrio de Zelensky tem razão de ser. Dois anos depois,
reacenderam-se por todo o Ocidente as dúvidas que em 2022, nas primeiras horas
da invasão russa, terão levado Joe Biden, esse especialista em retiradas catastróficas, a propor a fuga a
Zelensky.
Sim, há dificuldades e nem tudo corre
bem. Mas numa guerra, por maior que seja a vantagem, há sempre dificuldades e
nem tudo corre sempre bem. É por isso que a firmeza dos líderes, a
resiliência dos combatentes e a convicção das sociedades importam. Mas aqui
não é apenas de dificuldades que se trata. É
de outra coisa: uma inclinação para acreditar que qualquer esforço militar
ocidental está condenado ao fracasso, é ilegítimo e se revelará inútil. É isso
que vemos em relação à Ucrânia e a Israel.
Em que assenta esse derrotismo? Em
primeiro lugar, na ideia de que todas as guerras, seja qual for a sua origem
imediata, são culpa do Ocidente: Putin invadiu
a Ucrânia, mas provocado pela expansão da Nato. Depois, na convicção de que nenhuma
potência ocidental, por mais contida que seja, conseguirá fazer a guerra sem
infringir as leis de um humanitarismo que só a ela se aplicam: o Hamas tem o
direito de recorrer a “todos os meios necessários”, como se reclama nas
universidades, mas as baixas civis que resultam da defesa israelita
configuram logo um caso de “genocídio”. Eis porque todas as guerras
parecem, aos ocidentais, destinadas a ser outro Vietname: o Ocidente,
moralmente comprometido, acabará por desistir. É como se houvesse no Ocidente
uma tendência para compensar a assimetria militar, que lhe é favorável, com uma
assimetria moral, que joga a favor dos seus adversários, por mais hediondos que
sejam.
Não é preciso explicar porque é que este derrotismo convém aos
inimigos do Ocidente. Há que compreender, porém, porque é que as elites e os
públicos ocidentais lhe são tão susceptíveis. Para começar, temos de falar da sua pretensão de superioridade moral, que
facilmente se muda em auto-abjecção perante as necessidades da competição e
confronto no mundo. Para os ocidentais, a guerra refuta
qualquer causa. Mesmo quando têm de se defender, acham-se por isso culpados. Diz-se
que os fins justificam os meios, mas os ocidentais comportam-se por vezes como
se os meios tivessem de justificar os fins: quando os meios não são benignos,
tudo lhes parece ilegítimo.
Mas este moralismo tem uma causa: a
complacência. Os ocidentais predominaram no mundo
durante os séculos XIX e XX. Sobreviveram à Alemanha nazi e à Rússia comunista.
Mesmo quando perderam, como no Vietname, ganharam a prazo: Saigão está hoje
mais americanizada do que no tempo da intervenção americana. Em 1989, acreditaram
que tinham sido os vencedores de uma história que chegara ao fim. Nunca mais se
sentiram ameaçados existencialmente. Por isso, acham-se acima do que acontecer
na Ucrânia ou em Israel. Daí permitirem-se o luxo de tratar a derrota como uma
opção.
O derrotismo ocidental tem a
sua raiz, não no cepticismo, mas na ilusão. É o reflexo de um mundo que já não
existe. O Ocidente já não produz a maior
parte da riqueza mundial. A democracia e a economia de mercado já não
são o fim da história. Na Ucrânia
e em Israel, não está apenas em causa a existência de Estados que
potências locais se recusam a reconhecer. Está em causa a ordem mundial, que
ditaduras como a de Putin e do Ayatollah pretendem refazer à sua imagem. Não é
só Zelensky que deve estar preocupado.
UCRÂNIA
EUROPA
MUNDO OCIDENTE ISRAEL
MÉDIO ORIENTE
De 39
COMENTÁRIOS:
Carlos Chaves: Mais uma
excelente análise de Rui Ramos! Eu acrescentaria à ilusão como causa do
derrotismo a falta de instrução, ou melhor, a instrução errada que a esquerda
tem imposto nos nossos estabelecimentos de ensino, a todos os níveis! Grande
parte das nossas populações nem sequer tem ilusões, pura e simplesmente não
conseguem perceber o que se está a passar! O que a esquerda nos tem feito é
criminoso! Pobre Portugal: O Ocidente vive um pesadelo! O que o Hamas fez a 1200
israelitas em 7/10, se não fizesse corar de vergonha o mais repugnante
comandante nazi, estaria lá perto. No entanto, o ocidente agita a bandeira
desse tirânico povo. Já não me revejo neste Ocidente. Maria
Tubucci: Muito bem Sr.
RR. Os derrotistas são as elites esquerdistas, filhas dos privilegiados que
nunca trabalharam na vida, nunca conheceram o preço do esforço, tudo lhes foi
dado. Depois armam-se em seres superiores convencidos que podem impor aos
outros a sua alucinada ideia de progresso, cheia de humanismo oco de virtudes
imbecis. No ocidente esta casta infiltrou-se nas instituições e considera-se
acima de todos, aliás considera o povo um rebanho para eles pastorearem. Quando
os oiço falar em reparações do colonialismo, só me apetece gritar “Se tens a
consciência pesada paga do teu bolso, não devo nada a ninguém”. Ou quando os
oiço dizer: “Ai a Ucrânia fica-nos tão cara”, só me apetece gritar “É o preço
da paz, se queres a paz prepara-te para a guerra, também tenho de pagar a
segurança social de emigrantes que vieram do Cuu de Judas, e ainda ficam mais
caros”. A verdade é que o mal não dorme e o tempo é cíclico, o provérbio
oriental que diz “homens fortes criam tempos fáceis e tempos fáceis geram
homens fracos, mas homens fracos criam tempos difíceis e tempos difíceis geram
homens fortes” também é verdadeiro. O derrotismo tem de ser derrotado,
começando por correr com o esquerdismo na Europa a 9/6, reduzindo-o à sua
insignificância, só assim a Europa das nações poderá construir um futuro
melhor, preocupando-se em primeiro lugar com os seus, em vez de lutar pela paz
no mundo ou quiçá no universo e arredores………
II TEXTO
Um texto – já antigo - que me escapara, mas que me parece de uma
doutrina imprescindível, a contrariar o pedantismo provocatório dos desacatos contra
Israel e aparentemente pró palestinianos, que sucederam no Festival:
As lições da Eurovisão
No festival Eurovisão, vimos o abismo
que actualmente separa os protagonistas da vida pública, e aqueles a quem
poderemos chamar as “pessoas comuns”.
RUI RAMOS Colunista do
Observador
OBSERVADOR, 17
mai. 2024, 00:22106
Foi
um dos pequenos factos mais significativos dos últimos tempos, e teve a ver com
uma cantiga. No festival da Eurovisão, a concorrente de Israel
obteve uma das mais baixas pontuações dos júris oficiais, mas a segunda mais
alta votação do público. Em
muitos países, venceu mesmo a eleição popular. Foi o caso da Bélgica, apesar de
a televisão pública flamenga ter boicotado a sua transmissão. Foi também o caso
de Portugal, onde o júri não lhe atribuiu um único ponto, e o público lhe deu a
pontuação máxima. É improvável que se tenha tratado só de uma
questão de gosto. O que separou o público que votou pelo telefone e os júris
nomeados pelos organizadores não terá sido o apreço pela canção, mas a campanha
contra Israel: não sei se os júris cederam, mas de certeza que o público quis
resistir. Como em tantas votações dos últimos
anos, vimos mais uma vez o abismo que actualmente distancia os protagonistas da
vida pública, daqueles a quem poderemos chamar as “pessoas comuns”.
É possível ter diversas opiniões
sobre a guerra entre Israel e o Irão em Gaza. Os próprios israelitas as têm.
Mas como muita gente já percebeu, não é isso que está em causa na campanha
contra Israel: não é a estratégia militar israelita, nem as baixas civis
árabes, mas a existência de Israel. Ao exigir
um cessar-fogo imediato e sem condições (nem sequer a libertação dos reféns
israelitas), a campanha exige uma vitória do Irão e do seu braço em Gaza, a
seita terrorista Hamas. Ao descrever Israel como um “Estado colonial” e
“genocida”, a campanha reduz Israel a uma monstruosidade sem direito a existir.
É esse, aliás, o sentido da reivindicação de uma “Palestina do rio até ao mar”,
isto é, de uma terra sem a única democracia do Médio Oriente e sem os seus cerca
de sete milhões de cidadãos judeus. É isso que os manifestantes, uns
conscientemente e outros talvez inconscientemente, pedem nas universidades e na
arena da Eurovisão.
O wokismo, de que a campanha contra
Israel se tornou um dos rituais obrigatórios, não é só a extrema-esquerda. Mas
é fundamentalmente a extrema-esquerda. São
os activistas da extrema-esquerda que definem os temas e os métodos da “luta”.
Nada, por isso, é aqui novo: a campanha contra Israel recicla apenas o
anti-semitismo soviético, que encarava todos os judeus como “sionistas” e
Israel como um agente do “imperialismo americano”. Houve quem estranhasse ver os activistas do clima e
das “reparações coloniais” passarem a activistas contra Israel, a começar pela
inevitável Greta. Mas para estes activistas, os assuntos são
irrelevantes em si, e por isso substituíveis uns pelos outros. O objectivo não
é dar um Estado aos árabes da Palestina, nem diminuir o consumo de petróleo ou
devolver peças dos museus: é atacar o Ocidente “capitalista” e “liberal”, dê
por onde der.
O wokismo propõe-se, nos salões
burgueses, simplesmente como uma nova “boa educação”, ou até como uma espécie
de terapia para os ricos e instruídos purgarem o pecado dos seus “privilégios”.
Mas esta receita de “boa consciência” vai servindo sobretudo para viabilizar a
manipulação esquerdista de instituições e empresas. Quem tem estatuto no espaço
público não parece capaz de lhe resistir. O activismo esquerdista conseguiu,
através do movimento woke, impor os seus critérios às autoridades e às
celebridades do Ocidente. Essa é uma das lições da Eurovisão. A outra lição é
esta: fora desses círculos de cobardia e oportunismo, a história é diferente. A
gente anónima, usando os mecanismos democráticos, provou que nem todos se
deixam intimidar pelo “bullying” da extrema-esquerda. Portanto, viva a
democracia e bem-haja o povo.
FESTIVAL EUROVISÃO DA CANÇÃO MÚSICA CULTURA
De 106 COMENTÁRIOS
JP Miranda: Já não vejo o Eurovisao há
muitos anos, não vi este certamente e não pretendo ver futuros e muito menos
alguma vez peguei no telefone para "votar" uma música. Este ano tive
que o fazer, à semelhança presumo de muitos de nós. Foi uma pequena vitória por
assim dizer, mas disse muito, diz muito, do que uma GRANDE maioria de nós pensa
e acha desta deriva wokista que lentamente vai devorando a nossa sociedade,
livre e tolerante, que tanto a tantos custou implementar. Algo de bom saiu
deste triste e lamentável episódio da nossa História Ocidental. Afinal ficamos
a saber que não somos todos cordeiros, ou zombies, ou simplesmente idiotas
ignorantes ou esquerdistas sectários. Haja Esperança. Foi certamente um pequeno
gesto, como indivíduos, mas um grande gesto duma Sociedade Livre a preservar. Eduardo Cunha: Excelente artigo. diz tudo em
poucas palavras. Parabéns. Madalena
Magalhães Colaço: Em França, a esquerda de
Melanchon veio recentemente dizer que a purga conhecida por Vel d'hiv não
existiu. Na madrugada de 16 de julho de 1942, milhares de judeus foram
surpreendidos em casa e levados para o velódromo de Inverno de Paris, onde
depois seguiram para os campos de concentração. Hoje a esquerda quer negar o
que aconteceu nessa terrível madrugada e aliam-se aos imigrantes que odeiam a
França e desprezam os seus valores, para aterrorizarem os judeus. Nunca pensei
que no século XXI, os judeus em França pudessem estar a viver novamente sob uma
ameaça de morte, ao ponto de mudarem os filhos das escolas, retirarem os seus
nomes das caixas de correio e de viverem em pânico. Paulo Silva: Por falar em existência, ironia
do destino, a verdade é que Israel em muito deve a sua existência a Estaline e
à ex-URSS, mas a esquerdice militante tem uma memória curta e muito selectiva,
(o kibutz é o protótipo ideal do kolkhoz sua cópia grosseira). Somente
quando os soviéticos começaram a ver na Liga Árabe um potencial aliado com peso
na região, é que os EUA começaram a ficar com o papel de aliado principal de
Tel Aviv. É a partir deste momento que a esquerda militante começa a empunhar a
bandeira da Palestina de keffiyeh ao
pescoço... numa cruzada contra os states
e o Ocidente ‘capitalista’ e ‘liberal-conservador’. Caro RR, se se regozija pela
‘gente anónima’, as ‘pessoas comuns’ - o grosso da sociedade civil – que não se
deixou levar pela propaganda anti-semita anti-sionista, a actuação dos júris
oficiais e o boicote de algumas estações não podem deixar ninguém
particularmente descansado. Aqui há uns anos isto não sucederia. Uma plêiade de
organizações de fachada afectas à causa ligadas a partidos de esquerda estaria
nas ruas a berrar e a empunhar cartazes, como agora, mas as principais
instituições do mundo Ocidental teriam outra postura. Podemos achar que tudo se
joga no balanço entre as elites e o grosso da sociedade civil… mas também pode
acabar numa espécie de revolução vinda de cima. A esquerda infiltrou-se e tomou
de assalto as instituições educativas e os meios de difusão de informação e
opinião – Universidades, escolas e comunicação social - e assim se foi permitindo à
difusão de um novo código moral e a uma série de enviesamentos vertidos na
psique das sociedades civil e política, ao longo de décadas. Se o fluxo não desagua
directamente nas massas, vai sempre passar pelas elites, os centros de poder e
ong’s influentes. Foi ao que assistimos em Malmo. Os judeus são um povo
inteligente com uma grande resiliência que lhes permite defenderem-se dos
ataques militares e retóricos dos seus inimigos, mas o mundo está a mudar e
está perigoso……………….
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