Que não foi desaire, bem pelo contrário.
PARTIDO CHEGA:
Culpas em
Tânger desobrigam mudança estratégica
Tânger é bode expiatório para resultado nas Europeias. Chega não sente pressão para repensar estratégia
Com resultado que ficou aquém das
expectativas, Chega procura justificações para uma diferença tão grande
relativamente às legislativas. Abstenção é um dos motivos, mas até aí Tânger
pode ter culpas.
OBSERVADOR, 13
jun. 2024, 22:0723
O Chega provou o sabor da derrota e
André Ventura assumiu-se como o “único responsável”, mas no partido apontam-se culpas a António Tânger Corrêa e considera-se que foi o cabeça de lista que levou
muitas pessoas a optarem pela abstenção. Agora, o partido procura levantar a
cabeça, com dúvidas sobre se o resultado pode vir ou não a alterar a postura a
nível nacional — sendo que, para já, só ajudou a firmar distâncias para o PSD,
através do anúncio do chumbo do Governo de Miguel Albuquerque.
Há algo que é assumido por todos os
dirigentes ouvidos pelo Observador: ninguém
acreditou que fosse possível o Chega recuar de forma tão abrupta relativamente
às eleições legislativas. Acreditava-se que as europeias poderiam não chamar
tanta gente às urnas, sabia-se
que Tânger não é Ventura, mas no Chega considerava-se que havia um eleitorado
mais fiel que sairia de casa para ir votar no partido, independentemente do
candidato. Mais do que isso, assumia-se a possibilidade de uma
queda, ainda que não para os valores em causa — o Chega teve 18,07% nas legislativas
e conseguiu apenas 9,76% nestas europeias.
A noite eleitoral foi de altos e baixos,
entre os resultados das projecções e os números que iam chegando das mesas
eleitorais. No núcleo duro do Chega
sempre se acreditou que o partido não iria perder a posição de terceira força
política — e essa realidade foi um dos poucos motivos de festejo no
final do dia —, mas a clareza de que
as projecções eram mais próximas dos resultados finais do que se chegou a
acreditar foi um balde de água fria para um partido que nunca tinha sentido na
pele o peso de uma derrota. Ou uma “vitória que não foi assim tão grande”, como chegou a dizer André Ventura
nessa mesma noite.
No rescaldo de um resultado que o
próprio Tânger Corrêa
descreveu como não tendo sido “um dia bom”, o Chega procura razões para que as
pessoas não tenham ido votar, três
meses após conseguir eleger 50 deputados para a Assembleia da República.
É na abstenção que os dirigentes do
Chega ouvidos pelo Observador encontram a resposta mais óbvia: “O que levou os
nossos votos foi o sumidouro da abstenção” ou “as pessoas não foram votar”.
A justificação mais óbvia está no candidato e é
distribuída por diversas premissas. Em primeiro lugar, acredita-se
no núcleo duro, os eleitores que encontraram no Chega a casa para o protesto
não viram em Tânger Corrêa esse
perfil. Dos debates
aos argumentos em campanha, o cabeça de lista do partido foi mantendo uma
postura de embaixador, de quem prefere não entrar em confronto, de quem entende
que é melhor ficar calado do que promover a discussão, e considera-se que isso
pode ter jogado contra Tânger Corrêa.
Nos debates, recorda um dirigente ao
Observador, o candidato do Chega chegou a ser alvo de acusações por vários adversários
e preferiu não responder. “O nosso eleitorado sentiu isso e não gosta de ser
atacado e que não se defenda o Chega. O poder de encaixe, vindo da formação profissional, não serve
o eleitorado, que gosta de resposta e contra-ataque”, explica ao Observador.
A verdade é que esse eleitorado que
tem alimentado o Chega está habituado a um André Ventura assertivo, pronto para
o confronto verbal e que defende o partido e as convicções até ao fim.
E remata-se: “O voto de
protesto não se revia no candidato porque não é um candidato de protesto.”
Mas há mais: Tânger Corrêa não é propriamente a pessoa mais
popular dentro do partido. Há uma proximidade com o núcleo duro, mas é um dos
membros da direção que tem uma relação mais distante com as estruturas. E esta é outra
das justificações para que a noite eleitoral não tenha corrido de feição.
Apesar
de o partido ter feito arruadas em praticamente todos os distritos do país, há
quem note que não houve mobilização por parte das distritais e concelhias, não
só durante a campanha eleitoral — o que não permitiu presenças avultadas em
várias acções —, mas também na noite eleitoral, onde foi sentida a ausência de
vários presidentes de distritais e elementos do partido que raramente falham. “Houve falta
de mobilização e isso mostra alguma coisa”, conta um outro dirigente, que
entende que as pessoas não se demonstraram tão disponíveis como noutras
ocasiões — até porque, ao contrário de umas legislativas, a probabilidade de
eleição de dirigentes distritais é mais reduzida. E isso pesou, na visão
interna, no facto de as pessoas terem ficado em casa tendo em conta que “as estruturas não conseguiram chamar
eleitorado”.
Além disso, “no Chega não se estupidifica” o eleitorado e há certezas de que as pessoas “sabiam que
o candidato às eleições não era Ventura” — pelo que se normaliza que
Tânger tenha responsabilidades. Mais, enaltece-se também uma “campanha pejorativa” feita contra Tânger Corrêa, com atribuição de
culpas à comunicação social e aos programas de entretenimento que, argumentam
vários membros do núcleo duro, criaram uma imagem falsa e que ligou Tânger a
teorias da conspiração.
Medidos os pulsos após uma noite
difícil, o resumo faz-se atribuindo culpas a Tânger Corrêa: “Claro
que temos de retirar responsabilidades ao candidato, André Ventura chamou a si
a responsabilidade, mas essa responsabilidade tem de ser do cabeça de lista, a responsabilidade
é da má performance do candidato”, realça um dirigente do Chega ao
Observador.
Em frente a câmaras e de microfones
ligados, dirigentes do Chega como Rita
Matias ou Pedro Santos Frazão vão assumindo, tal como Ventura fez na noite
eleitoral, que o partido ficou aquém das expectativas. Na
CNN, o deputado e vice-presidente do partido assumiu que o Chega teve uma
derrota e justificou-o com o facto de ter ido “para estas eleições com aquilo
que a IL nunca poderá ambicionar, que é vencer as eleições”. Sublinhou que desde 10 de março o Chega
“passou a ser um dos três grandes partidos”, que “a partir daí tudo o que não
seja uma vitória pode ser um resultado menos saboroso” e reconheceu que “alguma
coisa não correu bem”, remetendo para uma análise interna necessária.
Já
Rita Matias disse, no
programa Comissão de Inquérito do Observador, que os eleitores do Chega podem
ter “engrossado estes 61% de abstencionistas”. “Sabemos
que nas últimas eleições aquele um milhão de eleitores teria vindo dessa franja
e sabemos que as eleições europeias não motivam tanto a participação e sabemos
também que, com espírito crítico, tem de nos levar a reflectir sobre porque é que quando chega ao momento das
europeias os portugueses não se sentem tão motivados a participar”,
referiu. Porém, ao contrário do colega de direcção e de bancada, considera que
“o Chega não tem derrota
nenhuma” e argumentou: “Diz-se
que o Chega perdeu quase metade dos seus eleitores, mas a verdade é que foram
as primeiras eleições europeias em que participámos (…) e “passámos de zero
para dois eurodeputados”.
Um futuro incerto, com ou sem travões
Mais do que certezas, da noite eleitoral fica a dúvida sobre se
estes resultados podem ou não alterar a postura do Chega relativamente à
política nacional, desde logo pelo receio de vir a ser castigado nas urnas e de
perder a robusta bancada que tem desde 10 de março. André
Ventura chegou a recusar logo na noite eleitoral que este tenha sido um cartão
vermelho por todas as vezes em que preferiu alinhar ao lado do PS para aprovar
medidas, deixando o PSD sem capacidade para avançar com as medidas — e que o
Chega foi argumentando tratar-se de uma “coligação com o povo” e não uma
coligação negativa com socialistas.
Ainda na noite eleitoral, questionado
sobre se os resultados podem causar algum impacto, assegurou que não: “O Chega mantém a sua firmeza de posições,
vamos manter a mesma linha que temos tido até agora porque foi essa que nos
levou aos resultados de vitória e não nos deixamos afectar por um resultado que
não foi uma vitória assim tão grande.” A alguns meses desse que pode
ser um documento fundamental para a vida do Governo, dirigentes ouvidos pelo
Observador consideram que dificilmente
a postura do Chega irá alterar-se — sendo que também nunca se comprometeu com
chumbar ou aprovar.
De resto, confrontados com a possibilidade de a pressão vir de
dentro pela quantidade de lugares que pode estar em causa (no caso
de haver uma queda também nas legislativas), os dirigentes acreditam que não será um argumento válido para
encostar Ventura à parede. Certos de que o presidente do partido “não
vai pensar nisso na hora da decisão”, até
se acredita que pode haver pressão, mas não que o líder do Chega seja “permeável”
a isso.
De mais a mais, o Chega mostrou exactamente
o movimento oposto quando, um dia após as eleições europeias, Miguel Castro
anunciou que o partido vai votar contra o programa do Governo Regional do PSD
por considerar que “Miguel Albuquerque
não tem condições políticas, nem éticas, para liderar o governo da Região
Autónoma da Madeira” por ser “arguido num processo judicial que o implica em
redes tentaculares de influência e jogos de interesses que não podem existir na
governação, nem, muito menos, serem premiadas com o silêncio ou com a
complacência parlamentar”.
André
Ventura veio confirmar, no dia seguinte, que deu indicações para que o
Chega/Madeira votasse contra o programa do Governo de Albuquerque, deixando
claro que o partido “procurou, por
todas as vias, sensibilizar o PSD e o CDS para a necessidade de substituir
Miguel Albuquerque” por não ter “condições éticas, políticas e pessoas para
continuar à frente do governo regional” — “Era impossível o Chega suportar este Governo”, rematou.
Desta forma, André Ventura não só
tenta mostrar que o Chega não está fragilizado ao ponto de se colocar ao lado
do PSD na Madeira, como deixa o flanco aberto para mostrar que pode bem manter
uma postura de distância dos sociais-democratas que procurou ir sublinhando
depois da nega de Montenegro e do “não é não” que o deixou a falar sozinho e a
sonhar com uma solução à direita.
Com
a primeira grande desilusão em cinco anos, o Chega tem cacos para apanhar, vai
para Bruxelas com apenas dois eurodeputados quando ambicionava muito mais, mas
quer acreditar que esse foi um epifenómeno apenas digno de europeias. Sem
grandes certezas, ninguém se atreve a adivinhar o futuro, nem sequer umas
eleições que não estão no horizonte, mas Ventura é dos poucos a dizer
que é possível legislativas para “breve”. Resta saber se este era um bom timing
para experiências arriscadas.
PARTIDO CHEGA POLÍTICA ELEIÇÕES
EUROPEIAS ELEIÇÕES
COMENTÁRIOS (de 23)
bento guerra: O embaixador Tanger era o único que
percebia alguma coisa de politica internacional, mas não era candidato para a
palhaçada eleitoral, que a Comunicação montou. Tirar conclusões sobre o
potencial do Chega, a partir destas eleições, é só conversa de quem quer atacar
o "conceito Chega", como é o caso desta jornaleira, já muito
conhecida Paulo
J Silva: Muitas contas e conjecturas se vão fazendo
sobre o resultado das eleições europeias. O Chega sempre no centro das
atenções, incontornável! A Europa está a entrar numa fase de viragem à direita
e Portugal (sempre com algum atraso) não vai ser excepção. Os tempos que correm
não são favoráveis à esquerda. As próximas eleições legislativas (antes do fim
desta legislatura decerto) vão acentuar a viragem à direita. Inevitável! Veremos
se as direitas serão capazes de dar ao país um outro caminho. João
Silvestre > Jorge Pereira: Deixe a droga Pertinaz >
Manuel Filipe Correia de Araújo: Só cumbersa Tânger sabe mais a dormir que
todos os restantes acordados Certo é que revelou que não tem paciência para as
fantochadas do circo mediático e político O resultado teve contornos totalmente
explicáveis pela abstenção Os resultados do chega nas legislativas explicam-se
pela mobilização de eleitorado que normalmente não vota Nada mais…
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