Vamos esperar.
De Camões aos Descobrimentos ou as
saídas em falso…
E se a impreparação em português de
muitos alunos saídos do ensino secundário é cada vez mais notória, que dizer da
opção verificada em algumas universidades ao imporem o leccionamento em inglês…
DINIS DE ABREU
Jornalista
e colunista do Observador
OBSERVADOR, 03 jun. 2024, 00:1635
Há quem tema, e com razão, pelo gradual
apagamento dos símbolos nacionais, substituídos por soluções “modernaças” e
muito “inclusivas”, como se verificou no anterior governo socialista, que tomou
algumas iniciativas, nesse âmbito, com não pouca ligeireza para não escrever
leviandade.
O
episódio do novo logotipo desse governo, defendido com os habituais chavões, de
harmonia com os vários dogmas da paleta dos “activistas”, foi um deles,
implementado mais ou menos à sorrelfa para se tornar num facto consumado.
O dito logotipo, foi revertido – e bem –
pelo actual governo, cumprindo, de resto, uma promessa eleitoral, e logo
choveram as indignações dos “artífices” de esquerda, reprovando e lamentando a
prioridade de Luís Montenegro, que se limitou a honrar um compromisso.
Constou,
entretanto, que o controverso logotipo obtivera um prémio nacional de design, o
que diz bem da “pobreza franciscana” que vai por aí em matéria de criatividade.
O
prémio serviu logo de “arma de arremesso”, como se o facto de o logotipo ter
sido revertido fosse um crime de “lesa majestade”, praticado por um “rural”,
destituído da mais elementar percepção e sensibilidade artísticas. As esquerdas
no poder podem reverter tudo, enquanto à direita, em idênticas circunstâncias,
as reversões são intoleráveis.
Havia, porém, outro atentado na forja.
De facto, sabia-se há muito que neste ano se assinalava o quinto centenário do
nascimento de Luis Vaz de Camões, o nosso poeta maior, símbolo da literatura e
da língua portuguesa.
Pois bem. Apesar de criada a comissão consultiva, em 2021, e nomeada a
comissária, a professora catedrática de Coimbra, Rita Marnoto, o certo é que nada mais avançou, nem sequer lhe foi
atribuído qualquer orçamento, conforme reconheceu em entrevista, explicando que “são
questões que estão um pouco para além da comissária das celebrações”.
E só em finais de dezembro do ano
passado é que o ex-ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, se lembrou de publicar um despacho normativo, dando
forma ao Comissariado para as Comemorações do V Centenário do Nascimento de
Luís de Camões, com a incumbência de apresentar o “programa das festas” ao
governo, até ao passado dia 20 de maio, o que obviamente não aconteceu. Claro
que prazo se esgotou sem vestígios de programa.
Entretanto,
passou despercebida a data de 23 de janeiro, consensual entre estudiosos, como
sendo a do nascimento de Camões, em 1524. E foi
necessário o novo executivo dar corpo, há dias, à estrutura de missão para o
comissariado consultivo – que ficou a “marinar” durante dois anos, com a
comissária de mãos vazias -, para
elaborar, finalmente, o programa das comemorações, que deverão prolongar-se até
10 de Junho de 2025.
Por
incompetência, desleixo, ou ambas, o governo de António Costa primou pela
displicência em relação a uma efeméride relevante, comprometendo o calendário
das celebrações, que há muito deveria estar definido, com o envolvimento de
universidades e de outros organismos públicos, além de especialistas
camonianos.
A negligência sobrou agora para Luís Montenegro e Dalila Rodrigues, que
anunciaram a composição da Comissão para um trabalho em contrarrelógio.
Se em vez de celebrar Camões se tratasse do Rock in Rio, do Web
Summit ou de hastear bandeiras e iluminar fachadas de edifícios públicos, com
as cores LGBT, incluindo o Parlamento — para comemorar o dia internacional da
Luta contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia. seja lá o que isso for –, tudo
teria sido organizado a tempo e horas.
Camões mereceu do governo socialista o tratamento reservado às
insignificâncias sem urgência, aliás, em linha com os “tratos de polé” que
sofre a língua portuguesa nas escolas públicas, abrangendo até docentes, como
ficou demonstrado nas provas de avaliação a que os professores se submeteram
contrariados e cujos resultados foram desastrosos em não poucas situações. “Metade dos professores chumba a Português”,
noticiava o JN em Maio de 2015. Está tudo dito.
Mais recentemente, a somar ao
distanciamento socialista em matéria de celebrações camonianas, foi apresentada pela INCM uma bizarra
moeda comemorativa, que ficou disponível no catálogo de numismática e que só
poderá ser vista como uma prova de mau gosto, ou, mesmo, como uma memória
caricatural do autor dos Lusíadas.
No prospecto de lançamento, a Casa da
Moeda enfatiza “o rosto de Camões e o escudo das quinas no reverso, com realces
coloridos na versão prata”. Aliás, é no mesmo reverso da moeda que se
assinala “a efígie estilizada do poeta
cego, com uma coroa de louros e uma gola típica do século XVI”. Mas o tratamento
conceptual da efígie, ou melhor, a sua interpretação, não abonam a inspiração
do autor.
Estranhamente, a moeda comemorativa tem passado no olvido dos media,
e assim continuaria, talvez, se não fossem as redes sociais e o Polígrafo a
ocuparem-se criticamente do tema. Mas o mal estava feito. E Camões não o merecia.
Enquanto
a língua portuguesa e o grande poeta andam aos baldões nos acasos da Cultura e
dos programas escolares, sofrendo as mais variadas vicissitudes, a homenagem
devida ao quinto centenário do seu nascimento não teve melhor sorte.
No caso das escolas, recorde-se que a revisão curricular que,
a certa altura, deixou de fora “Os Lusíadas”, no 10º e 11º ano, chegou
a merecer a crítica afiada do saudoso Vasco Graça Moura, ao escrever que “o medo que
os programas do ensino secundário revelam perante ‘Os Lusíadas’ traduz
um deplorável complexo da esquerda retrógrada que tem vergonha do passado de
Portugal”, enquanto
acusava a revisão curricular de estar“viciada por uma abusiva componente
ideológica”.
Esses complexos não desapareceram. Longe
disso. E se a impreparação em português de muitos alunos
saídos do ensino secundário é cada vez mais notória, que dizer da opção verificada
em algumas universidades, públicas e privadas, ao imporem o leccionamento em
inglês…
A
pretexto de que as universidades portuguesas são mais procuradas por alunos
estrangeiros, sem domínio do nosso idioma, multiplicaram-se os cursos dados
exclusivamente em inglês, uma possidonice que marginaliza o português.
Se
o plano para as comemorações do V Centenário de Camões adormeceu nas gavetas da
burocracia socialista, arriscando agora o improviso, a dois passos das
celebrações do Dia de Portugal, que dizer do silêncio sepulcral que recaiu
sobre o futuro Museu das Descobertas (ou da Descoberta, ou dos Descobrimentos)
que constava nas prioridades do programa eleitoral de Fernando Medina,
anunciado em 2017, ao candidatar-se ao Município de Lisboa?
O projecto nunca saiu do papel, perante a oposição assanhada movida
pelos sectores mais à esquerda, incluindo académicos “bem-pensantes” e uma
Associação de Afrodescendentes, que não tardaram em manifestar-se contrariando
o desígnio camarário. E Medina encolheu-se e recuou.
Em
junho de 2018 já o autarca eleito confessava que “nasceu uma polémica que se
desenvolveu e eu não a vou alimentar.” Foi fiel à promessa. A tal ponto, que
não voltou a mexer no projecto até deixar o Município.
Nem
nesse nem noutro anterior, datado de maio de 2015, que mereceu, inclusive, uma
luzida cerimónia nos Paços do Concelho, para a assinatura de um “protocolo de
formalização de interesse” na construção de um núcleo museológico, dedicado aos
Descobrimentos, tendo ainda a particularidade, à época, de prever a instalação
de uma nau precisamente na Ribeira das Naus.
O protocolo assinado com a Marinha, a Faculdade de Ciências Sociais
e Humanas da Universidade Nova e a Associação de Turismo de Lisboa não passou
disso.
O projecto “encalhou” ainda antes de
sair da doca, embora Medina o tenha defendido como “algo que há muito fazia
falta no país e na cidade”, já que “no
nosso país não temos muitas histórias para contar ao mundo, mas temos uma
história única para contar”. Um ano depois, os zelotas do património e
da cultura acharam que o
projecto apresentava “uma intrusividade excessiva”. E chumbaram-no. Até
hoje.
Se tínhamos – e é verdade que temos – uma
história única, esta continua por contar. Ao contrário das ciclovias a esmo,
que desfiguraram a circulação em Lisboa — agravando os constrangimentos no
trânsito citadino -, o polo museológico ficou “no tinteiro”, abandonado à sua
sorte.
De
prioridade em prioridade abortadas, a nau e o museu dos Descobrimentos ficaram
a “nadar em seco”, e nem Medina nem Carlos Moedas voltaram ao assunto.
Enquanto o novo aeroporto de Lisboa “envelhece”
há meio século nos bastidores de interesses cruzados – com mais uma polémica a
desenhar-se no horizonte, devido aos lençóis aquíferos subterrâneos e ao estudo
de impacte ambiental que farão “correr muita tinta” –, não admira que o Museu, vocacionado para celebrar a
nossa Epopeia Marítima, fique congelado “sine die”, em nome dos complexos e das
penitências em actos de contrição, reparações, devoluções, e outras
autoflagelações para diminuir grandezas passadas.
Somos um País onde vicejam
minorias soberanas, que sabem impor a sua vontade e doutrina, com a
cumplicidade dos media. E se vamos
celebrar Camões com atraso, não se espere que o Museu das Descobertas tão cedo
vingue, comparado, como já foi, pela miopia e pelo radicalismo vigentes, à
Exposição do Mundo Português, de 1940, organizada em Belém, e considerada «a
mostra estética e ideológica do Estado Novo».
Mais
afortunado foi o Museu da Resistência, recém-inaugurado na Fortaleza de Peniche, de onde se
evadiu Álvaro Cunhal, e onde um ex-presidente do Município, António José
Correia, autarca independente eleito pelo PCP, preconizara a instalação de um
hotel, no âmbito do programa “Revive”…
Embora Correia tenha assumido que “desde
que foi eleito, em 2005, se bate por esse projecto”, o PCP não esteve pelos ajustes, “bateu o pé”, desautorizou o
seu autarca, e conseguiu que a fortaleza fosse retirada do programa, e
requalificada na Assembleia da República para preservação da memória histórica
enquanto ex-prisão política da ditadura. E assim ficou. Sem hotel.
Com as Descobertas a “coisa fia mais
fino”. Quando a democracia for capaz de ultrapassar embaraços e tiver a coragem
de consagrar a História em museu, alheando-se de “velhos do Restelo” e de “activistas” sempre
indignados, terá cumprido um passo fundamental para libertar a cidade e o País
de modas e agravos de ocasião.
Os
500 anos de Camões seriam uma boa oportunidade. O primeiro passo está dado, ao
baptizar o futuro aeroporto de Lisboa com o nome de Luís de Camões, em sua
homenagem. Um “golpe de asa”…
HISTÓRIA CULTURA INSTITUTO CAMÕES PAÍS
COMENTÁRIOS (de 35)
Jose Ferreira > Maria Cordes: Elementar... minha cara Cordson. Numa Europa desarmada
e sem defesa, os recentes tempos com a luta a Leste, em breve a equipar
americano da indústria bélica, tudo nas mãos USA,
posta
de parte a personalidade do general PR Charles De Gaulle, o da Europa do
Atlântico aos Urais, a França independente e fora da OTAN. Com o monstro da 5
de Outubro, da Educação faz de conta, PM's PS e ou PSD sem tempo para
pensar... Não estranhemos de todo: Destinados a falar inglês, como
falaram aqui em tempos recuados os indígenas da Ibéria: o latim de Roma. Maria
Cordes: A minoria
aleivosa, que em grande gritaria tem conseguido impor, alterações substanciais
aos programas escolares, especialmente na Língua e História de Portugal, mas
não só, na qualidade e nível do ensino, nas passagens administrativas, na
formação de professores, que seriam chumbados num ditado de meia dúzia de
linhas, na imposição de teorias de género e Lgbt, com a cumplicidade da
comunicação social e a apatia da maioria silenciosa, que tarda em acordar,
enredada na luta pela sobrevivência, num pais em que são esbulhados e abusados
pelo Estado. O Costismo permitiu tudo isto, será feita a História da tentativa
de destruição da identidade duma nação, estratégia delineada em silêncio e
apresentada como facto consumado. Só percebemos, aquando da vergonhosa
manipulação dos símbolos, agora premiada pela mesma gente. O pais estremeceu.
Mas o mal está feito, um povo embrutecido, que olha em volta e não sabe se está
no Mali ou no Bangladesh, outra arma poderosa, utilizada na tal estratégia,
entradas sem lei , intrusivas e abusivas, a que o poder político terá que pôr
rapidamente cobro. A cereja em cima do bolo, é a incompetência dos governantes
nomeados por Costa, que permitiu a implosão do país. Resta saber o que foi
feito ao dinheiro enviado por Bruxelas .Nem a tecnologia que serve de
identificação de quem entra no país, compraram. João
Floriano: Mudou o
governo mas a esquerda continua a pôr e dispor. Assim não saimos da cepa torta. O Ministério da Educação é um triste exemplo de
que o governo da AD não quer e não se considera com forças suficientes para
combater o wokismo galopante, à rédea solta que anda a envenenar a
vida académica. Esquece-se propositadamente a comemoração de Camões, mas
andaram meses a preparar as comemorações do 25 de Abril, sem se perceber para
onde foi tanto dinheiro já que não se viu nada de especial em relação a anos
anteriores. Quando se votou numa mudança a 10 de março, mudança essa que não
foi atendida por Montenegro que insiste num governo frágil, sem apoios,
dissemos que para além da economia também queriamos mudar as mentalidades.
Diariamente continuamos a ser confrontados com as linhas vermelhas da esquerda
e da extrema esquerda. Não há coragem política para varrer todo o lixo intelectual
que a esquerda foi acumulando ao longo de todos estes anos. Verdadeiros
hoarders de pechibeque ideológico e como a maior parte dos hoarders guardam o
lixo como se fosse uma preciosidade. José B
Dias: A efígie de
Camões na moeda comemorativa foi garantidamente desenhada pela paroquiana
espanhola que "recuperou" uma pintura da sua igreja há uns anos atrás
... o estilo é inconfundível e novo prémio estará por certo já garantido! Maria
Nunes: Não comemorar
condignamente o nosso grande Camões, mostra bem até que ponto esta gente é pequenina,
ignorante e estúpida. Maria
Augusta Martins: A ideia do
presidente da câmara de Peniche era de seguir e de dar apoio. Criava-se um hotel com o pessoal fardado de GNR à
antiga (com farda de cotim, quépi e plainitos, façanhudos e bigodudos), não á
moda paisana como agora andam ataviados que mais parecem funcionários e
funcionárias de companhia de limpeza ao domicílio. O local era explêndido o
pessoal atraíria as turistas do norte da Europa e até as nacionais, mortinhas
por saber como era a autoridade á antiga com cassetete e chinfalho sempre
"prontos", Daria muito mais movimento à vila e a economia crescia de
forma nunca sonhada, Mas afinal os governantes que promoveram e pagaram o museu
dito da resistência, vão observar que os visitantes serão poucos ou nenhuns porque
o que lá vai lá vai e o tempo não volta para trás. Coxinho > Maria Nunes: 1/2 dúzia de palavras que resumem uma realidade
portuguesa que envergonha quem tem vergonha. António Soares: A cara da referida moeda, está ao nível do logotipo
escolhido pelo kosta Kamov.
António Alberto Barbosa Pinho: O excelente Grande Jornalista Dinis Abreu sempre
presente em temas essenciais da nossa sociedade. Que não lhe doa a pena. JOHN
MARTINS: Hoje DdA, mais
voltado para a história, designadamente, os 500 anos do nascimento de LUIS DE
CAMÕES, e com comemorações garantidas por este novo governo do Pº Mº Luis
Montenegro, o que é de saudar; mas de facto e merecidamente a letras de ouro, o
novo aeroporto, surpreendentemente, foi decretado, em Conselho de Ministros,
atribuir-lhe o nome de Luís de Camões. Ainda há mentes douradas...desde que
algumas sumidades sejam os últimos a saber, não vão estragar o projecto!.. Carlos Chaves: Dinis de Abreu que nunca se acabe a tinta no tinteiro
da sua “pena”! Porque será que a esquerda mais imunda encontrou tão boa e
duradoura guarida aqui neste rectângulo do sul da Europa? Qual a origem da
cegueira deste povo que não vislumbra sequer, que é votando reiteradamente no socialismo/comunismo,
que o mantém, pobre, atrasado, inculto e infeliz? Que vergonha incutirem neste
povo ter vergonha da grandiosa história que nós temos. Apesar de tudo não perco
a esperança de ainda ver este povo a escolher um destino diferente!
Coxinho: Já é tempo de aprendermos esta verdade INCONTESTÁVEL: Em
última instância, o socialismo destrói e mata. Senão... não tem lugar. Por isso
tem de matar uma maioria para alimentar a minoria que manda. S N: Mais uma excelente e muito pertinente crónica política
publicada neste jornal
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