segunda-feira, 16 de setembro de 2024

Amargura

 

Contínua. De prever.

O país de papelão

Este Portugal de impostos máximos, serviços mínimos e funcionários em crescendo mas que estão sempre em falta ficou escancarado em Vale de Judeus.

HELENA MATOS Colunista do Observador

OBSERVADOR, 15 set. 2024, 01:33108

O país de papelão. Para tudo temos mil procedimentos. Requisitos. Normas. Programas. Licenciamentos. Aprovações.

Um linguarejar estranho acompanha este país outrora de papelão e agora do balcão virtual: vive-se em constante dinamização, a implementar objectivos e na prossecução do programa Europa qualquer coisa, da Agenda de não sei quando, Portugal vinte e não sei quantos

Até que um facto diverso e inesperado rompe este cenário virtual de perfeição e progresso. O ser um facto diverso e inesperado é fundamental porque pouco a pouco fomo-nos habituando ao que pouco antes declarávamos inaceitável: as urgências hospitalares fechadas já são uma rotina, as escolas sem professores tornaram-se uma fatalidade.  Tudo, claro, sempre envolto na roupagem da informação on line, da digitalização, do reencaminhamento… (Ontem, um homem morreu numa estação de serviço no Algarve enquanto a sua família tentava contactar o INEM. Durante 45 minutos a chamada não foi foi atendida. Ou, como agora soe dizer-se, foi reencaminhada. O reencaminhamento não leva a lado algum mas mantém-nos na ilusão de um possível atendimento.)

Quando Fernando Ferreira, Fábio Loureiro, Shergili Farjiani, Rodolf Lohrmann e Mark Cameron Roscaleer saltaram os muros da prisão de Vale de Judeus deixaram-nos a olhar para uma prisão sem director e que tem há largo tempo o chefe dos guardas de baixa; onde as torres de vigia não foram substituídas e a cerca electrificada não pode ser ligada à corrente. Onde um único guarda controlava até à passada semana mais de 150 câmaras de videovigilância e ninguém achou relevante substituir a iluminação exterior que fora destruída, deixando cegas algumas dessas mesmas câmaras.

Há em tudo isto uma espécie de contínuo estado de falta que choca com o contínuo e desmesurado crescimento do Estado: em meados de 2023, o número de funcionários públicos atingiu os 745.707. No mesmo ano, 2023, a receita fiscal chegou aos 65,7 mil milhões de euros. Para onde vai o dinheiro dos nossos impostos? E o que fazem e onde estão os mais de 700 mil funcionários da máquina estatal? Faltam médicos. Professores. Oficiais de justiça. Enfermeiros. Juízes… E mesmo quando não faltam, como até pode ser o caso dos guardas prisionais, não estão onde é suposto. Ou nós, na nossa ingenuidade, acreditamos que é suposto estarem.

Este Portugal de impostos máximos, serviços mínimos e funcionários em crescendo mas que estão sempre em falta ficou escancarado em Vale de Judeus.

A parábola dos autoclismos

A fazer fé no portal que regista os contratos públicos, a maior despesa não corrente efectuada este ano na prisão de Vale de Judeus versou os fluxómetros, vulgo autoclismos. A saber, 123.953,60 euros para “Substituição dos Fluxómetros das Celas”. O que, se tivermos em conta o número de presos e de celas naquele estabelecimentos, nem é um valor excepcionalmente alto, pelo menos se o termo de comparação forem os 14.500 euros que, no ano da graça de 2022, o contribuinte português despendeu em “material variado e fluxometros anti vândalo, para reabilitar as únicas 3 celas especiais disciplinares, vandalizadas por um recluso” num estabelecimento prisional de Lisboa. Como é que “um recluso” destrói “as únicas 3 celas especiais disciplinares” duma prisão e respectivos fluxómetros é algo que escapa ao meu entendimento.

Mas voltemos às intervenções em Vale de Judeus. Em 2021 foi adjudicada a remodelação do quadro eléctrico daquela prisão. Uma obra no valor de 36 mil euros. Nessa data não se ponderou transformar a cerca eléctrica de objecto ornamental em cerca eléctrica propriamente dita? Primeiro dissemos que

ESTADO      POLÍTICA

COMENTÁRIOS (de 110)

 

Cupid stunt: É facto, um país de faz de conta. Não apenas, mas muito devido à total incompetência e desleixo xuxalista que teve como expoente máximo depois do escroque 44) o escarro de gente que agora fugiu para a Europa... Um pais que insiste no xuxalismo anos a fio, não tem futuro e está condenado a ser cada vez mais pobre e rasca....               Manuel Martins: Concordo com a cronista.  Mais que um país de papel,  somos em muitas áreas um país virtual,  onde a realidade é muito diferente do que nos é mostrado nos sites,  nos PowerPoints, nos discursos.. O Estado voltou a ser o "monstro " incontrolável,  onde grassa a incompetência,  o desleixo,  as baixas médicas infinitas interrompidas por períodos de férias,  as licenças,  etc. Somos o país dos direitos, sem deveres...  Paulo Luis da Silva: Este é o país socialista. Anos de socialismo a degradar tudo. Será que os milhões de portugueses que têm votado nas esquerdas continuam a achar que é este o caminho? Tal é a meu ver a irracionalidade que me parece estarmos perante um caso grave de perturbações psicológicas crónicas em grande parte da população!                Alfaiate Tuga: Não é um país de papelão, é um país de  OTARIOS. Só um país de otários sustenta 750 mil sujeitos e sujeitas que têm um horário de trabalho (eufemismo), inferior ao normal, não são avaliados convenientemente e tem como princípio fazer o mínimo sacando o máximo ao erário, para cúmulo, não podem ser despedidos. Digam lá se não é preciso ser muito OTÁRIO para sustentar isto?  A função pública nas suas vastas valências não tem falta de gente ou dinheiro, tem falta de disciplina, porquê? Porque é impossível disciplinar alguém que faça muito ou pouco, seja competente ou incompetentemente não possa ser punido. Só um exemplo, há uns tempos em conversa com um responsável de serviço de uma câmara municipal ele contava- me, (…) Sabes ontem fui dar com fulano a dormir na carrinha, na segunda-feira mandei-o à instalação X resolver um problema, chegou no final do dia e disse que já estava quase, que no dia seguinte ficava resolvido, perguntei qual era o problema e contou-me uma história, no dia seguinte saiu para a instalação de manhã, liguei-lhe por volta da hora de almoço, disse-me que ia almoçar e de tarde montava tudo e no final do dia tinha a instalação a funcionar, ao início da tarde agarrei no carro e fui à instalação, quando cheguei o fulano estava a dormir na carrinha e tinha a instalação perfeitamente operacional e parada, acordei-o e perguntei, então é assim que resolves o problema, resposta, acabei por conseguir acabar antes, tive de desmontar isto e aquilo etc e tal mas já está tudo ok, fui averiguar e facilmente percebi que não desmontou nada, pois estava tudo cheio de pó sem o mínimo sinal de ter sido mexido (…) Perguntei à pessoa, não o podes sancionar? Resposta, Até posso tentar, mas vou arranjar problemas, perguntei, porquê? Porque depois eles viram-se todos contra mim e ainda fazem menos, depois quando as coisas não funcionam quem leva na cabeça sou eu. Já disseste ao presidente da câmara perguntei, resposta, já ele diz que sou eu que tenho de gerir o pessoal com as regras que existem…Isto é só um exemplo de muitos que conheço. Não é possível pôr a função pública a funcionar com uma lei que proíbe despedimentos, as chefes são reféns dos subordinados pois não se conseguem ver livres deles por muito parasitismo que pratiquem.  Agora a política, este governo supostamente de direita, nos poucos meses que leva em funções já conseguiu tornar os trabalhadores do privado mais otários ainda, pois distribuiu mais dinheiro pelos funcionários públicos mais ruidosos e grevistas em troca de nada . Vamos continuar a ser pessimamente servidos mas com uma diferença, vamos pagar mais.  O saudoso Medina Carreira falava no partido do estado, eu falo no partido do contribuinte, estou à espera que apareça, temos a IL, mas o liberalismo nos costumes causa-me alguma urticária, mas nas próximas lá terá que ser. Privatizem tudo até a justiça.  PS: A Lucília Gago veio explicar que as magistradas coitadas têm todas gravidez de risco, pois assim dá para passar a gravidez em casa. PS2. Quem deixou fugir os presos de Alcoentre foi o chefe das cadeias que estava em Lisboa, não form os guardas que estavam de serviço. Otários….               afonso moreira: A Troica já saiu daqui há muito tempo e as bancarrotas cíclicas, desde há 50 anos, parecem quase uma fatalidade! Há umas semanas, uma das múltiplas tvs, dava-nos a conhecer um estudo comparativo sobre a produtividade dos médicos em alguns dos serviços nacionais de saúde dos respectivos países. Retive que essa produtividade era cerca de um terço quando comparada com a alemã. Mas, o que é que isso importa comparado com uma conferência de imprensa de um treinador de futebol ou uma câmara de filmar fixada na traseira de um autocarro, durante horas, e que transporta jogadores de futebol? Os mestres do hipnotismo sabem o que fazem até à próxima Troica                Ludovicus: Somos um povo adverso à autoridade. Enquanto a Espanha teve o problema da ETA, tinha a maior percentagem de polícias por 100mil habitantes. Portugal ultrapassou. Cada vez que uma brigada de OPC tem que ir fazer uma busca a uma casa da Quinta da Fonte, em Loures, já viram a quantidade de PSP necessários para proteger a brigada? Quando há dias um guarda prisional explicava o regime da prisão de maior segurança do país, Monsanto, e dizia que os presos de maior perigosidade estão 22horas na cela, o jornalista da CNN escandalizado disse que violava DH. Eu queria saber se o argentino que fugiu e que veio de lá lhe tivesse feito a um filho o que fez na Argentina, onde raptou um jovem, pediu resgate, os pais pagaram e o miúdo nunca apareceu, o que pensava dos DH. Queremos eficácia e ao mesmo tempo tudo "fofinho". Verifiquem como é que é feito o recrutamento para guarda prisional. Quem concorre. E, como se sentirão 20 guardas a "guardar" 500 presos, alguns deste "calibre" que tinham (não sei se continuarão a ter) a manhã toda em liberdade no pátio. E, aquele Abrunhosa em vez de defender os "seus homens", chutou para baixo.                Rui Lima: Somos os recordistas em guardas prisionais várias cadeias tem mais que presos, tudo está errado mas o grande responsável desta fuga é a justiça com os seus tribunais sem visão sobre a realidade, ninguém tem coragem de contar toda a história pois teriam de pedir contas aos juízes Que decidem retirar criminosos violentos de cadeias de alta segurança.             Ana Luís da Silva: Estranhamente, depois de ler mais uma crónica excepcional de Helena Matos, apercebi-me de que a razão por que um recluso deu cabo de três celas num estabelecimento prisional e que deu azo à substituição dos fluxómetros é a mesma que levou o PS a dar cabo paulatinamente do funcionamento dos serviços do Estado ao longo dos anos da sua parasitagem: a total impunidade.  Quanto à engorda do Estado com funcionários completamente inúteis ao bom funcionamento da Administração Pública eu sei onde estão: nas listas de militantes ou de simpatizantes socialistas… os tais que, ainda que de baixa, febris ou com uma perna partida, se arrastarão até uma mesa de voto para votar caninamente no PS, o partido dos Parasitas Socialistas. O tal partido que tão bem os compreende, alimenta e, já agora, identifica.             Miguel Sousa: Faz finalmente a pergunta que se impõe - onde estão e o que produzem 800 mil funcionários com ordenados e regalias muito superiores aos do privado e onde se gasta a maioria dos impostos sacados?????                      Paulo Machado: Excelente artigo de opinião. (………………..)

 

Sem medo de responder

 

Eu até que fui dos da “miuçalha branca” que também participou no apoio aos “assaltantes” do Rádio Clube de Moçambique, nesses dias 8 e 9 de Setembro de 1974 – Eu e o meu marido e o Artur, (que por sinal aparece na segunda página de um livro – “AQUI MOÇAMBIQUE LIVRE” – de Ricardo de Saavedra – datado de Joanesburgo, Agosto de 1975 – que me foi oferecido por um amigo, pela Páscoa de 1976 – de que resultou a surpresa da descoberta do meu pequeno Artur, de quatro anos, logo na segunda página após o Prefácio, encostado a um Volkswagen - a foto de um velho mais abaixo sob a bandeira, escondendo provavelmente as lágrimas da sua vergonha patriótica ou da sua impotência prevista. Dia maravilhoso esse em que, carregados nós com os restos da festa de anos da Paula para distribuir pelos militares portugueses “assaltantes” do Rádio Clube, uma colega que descia com o marido e os filhos pequenos no seu carro, erguida em pé, ao ver-me, gritou: “Berta, também lhe devemos isto a si”, frase que nunca esqueci, não por conta de um ego vaidoso mas apenas consciente da sua participação literária “reaccionária", o meu último livro – “Pedras de Sal” tendo saído recentemente – onde questões, como as expostas por HELENA MATOS, no texto infra, haviam sido focadas, com ironia, naturalmente. Esse livro, enviei-o ao Dr. Almeida Santos, em carta adequada, que mereceu uma troca de correspondência delicada e virtuosa entre ambos, que reproduzo no final, saltando os 54 dos 138 Comentários ao texto dos COMENTADORES de HELENA MATOS, por me parecer importante como documento de um dos participantes da odisseia, desses “miuçalhos” lusitanos - (da expressão de Helena Matos) - reproduzida na obra “CRAVOS ROXOS”, que contém “PEDRAS DE SAL em 2ª edição.

O medo de perguntar

Meio século depois, os acontecimentos de 7 de Setembro de 1974 em Moçambique continuam a colocar a mesma questão: até quando o activismo vai impor o medo de perguntar?

HELENA MATOS Colunista do Observador

OBSERVADOR, set. 2024, 01:16137

Milhares de pessoas terão sido assassinadas a tiro, catana, queimadas vivas… Talvez tenham sido três mil. Talvez mais. Talvez menos. Dificilmente, sairemos do domínio das estimativas porque nunca houve a preocupação de saber o seu número ou as circunstâncias da sua morte. Eram brancas, negras, asiáticas, mestiças. Em Portugal, nos jornais, nas rádios e na televisão nunca houve dúvidas: tratou-se de uma “aventura colonial da última hora” por parte da “miuçalha branca” que ensombrou o “momento de júbilo”.

Comecemos pelo “momento de júbilo”? Estamos em Setembro de 1974. Os portugueses são informados de que “O Estado português, tendo reconhecido o direito do povo de Moçambique à independência, aceita por acordo com a Frente de Libertação de Moçambique a transferência progressiva de poderes que detém sobre o território nos termos a seguir enunciados.

Ou seja, o que em Moçambique temiam, quer as minorias branca e oriental, quer os simpatizantes e dirigentes negros de vários partidos e movimentos nacionalistas, estava consumado: os moçambicanos, a quem menos de três meses antes Almeida Santos, ministro da Coordenação Interterritorial garantira um referendo para decidirem o futuro daquele território, iriam passar a viver numa república popular dirigida pela Frelimo. Como o ministro dos Negócios Estrangeiros, Mário Soares, declarara a 6 de Setembro ao chegar a Lusaka para firmar os acordos com a Frelimo: “a delegação portuguesa estava na Zâmbia para entregar o poder à Frelimo.” De facto era isso que estava a acontecer. É portanto este “o momento de júbilo”. E é aqui que começa a “última aventura colonial” protagonizada pela “miuçalha branca”.

A 7 de Setembro, o Rádio Club de Lourenço Marques é ocupado e passa a designar-se Rádio Moçambique Livre. Os ocupantes declaram-se contra o que definem como entrega de Moçambique à Frelimo. Entre os ocupantes do Rádio Club  estão também líderes nacionalistas negros como Joana Simeão, Paulo Gumane e Uria Simango. Apelam à intervenção de Spínola, com quem alguns, na qualidade de membros da FICO (Frente Integracionista de Continuidade Ocidental), se tinham encontrado tempos antes no Buçaco. Aí, garantem, o Presidente da República ter-lhes-ia dito “Façam vocês qualquer coisa que mostre a vontade da Província, para eu vos apoiar.” Eles fizeram “qualquer coisa”. Mas em Setembro de 1974, com o Acordo de Lusaka já firmado, com Spínola cada vez mais fragilizado e obcecado com o futuro de Angola, era tarde demais para que o apoio do ainda presidente da República se pudesse fazer sentir. Os revoltos resistem até 10 de Setembro. Entretanto a violência explodira: violações, gente decepada, queimados vivos, linchados e vários desaparecidos. Os acontecimentos do 7 de Setembro de 1974, a violência que os acompanhou e a vaga de repressão que lhe sucedeu marcam um antes e um depois: até ao final de Agosto de 1974, tinham deixado Moçambique 5 mil portugueses. Mas só nas últimas semanas de Setembro e primeiros dias de Outubro saem de Moçambique oito mil portugueses para a África do Sul. Em Lisboa começam a cair pedidos de transferência para a “metrópole” de professores, carteiros, funcionários dos caminhos-de-ferro, da aeronáutica, dos bancos. Em Dezembro, segundo revela Vítor Crespo, Alto-Comissário de Moçambique, em Lourenço Marques sobrava apenas um ginecologista e já nenhum ortopedista.

Simultaneamente a repressão cresce no território administrado por Portugal. O Alto-Comissário Vítor Crespo institui que questionar a representatividade da Frelimo é um crime contra a descolonização e um sinal de racismo. Militares e agentes de segurança portugueses desempenham um papel activo na detenção, interrogatório e entrega à Frelimo daqueles que se lhe opõem, nomeadamente de dissidentes da Frelimo e nacionalistas negros que participaram na revolta do 7 de Setembro. Por grotesca ironia a revolta em que os jornais só viam brancos não só teve a participação de dirigentes negros como estes pagaram com a vida o seu protagonismo nestes acontecimentos: Joana Simeão, Paulo Gumane e Uria Simango, além doutros dissidentes da Frelimo, seriam internados em campos de reeducação daquele movimento e queimados vivos mais tarde.. (No caso de Uria Simango a sua própria mulher, Celina, foi também morta.)

Mas a imprensa portuguesa em 1974 não tem dúvidas: no 7 de Setembro está-se perante uma “revolta dos colonos brancos”, uma “aventura colonial da última hora” protagonizada por “rebeldes brancos”, “miuçalha branca”, “grupúsculos”, “reaccionários”, “ultra reaccionários”, “racistas”, “colonialistas” … que ensombraram o “momento de júbilo” representado pela assinatura do Acordo de Lusaka.

Meio século depois o que surpreende não é que o 7 de Setembro de 74 em Moçambique tenha sido relatado assim mas sim a certeza de que hoje voltaria ser relatado assim. Porque, tal como aconteceu a propósito do 7 de Setembro de 74, não se trata tanto da imposição duma visão dos factos e do seu silenciamento mas sobretudo do poder de instituir o medo de perguntarDo medo de ser rotulado. Do medo de passar para o lado dos controversos, que é meio caminho andado para passar a conservador e de conservador a reaccionário e de reaccionário a outra coisa qualquer já sem retorno social possível.

Meio século depois, quantos crimes foram necessários para chamar ditador a Maduro? Ou o que vai ser necessário para que deixe de ser visto como um risco denunciar a ideologia de género nas escolas? E por quanto tempo mais vamos ter de esperar para que se perca o medo de desmontar as efabulações sobre a escravatura como pecado do homem ocidental e branco que se tornaram uma espécie de mantra obrigatório?…

O 7 de Setembro de 1974 em Moçambique tem muito de perturbante. Mas o facto de sabermos tão pouco sobre o que ali aconteceu nessa data também.

MOÇAMBIQUE      ÁFRICA      MUNDO

*****

 

Troca de missivas:

(TEXTOS de «LUSOS /74» (III LIVRO de “CRAVOS ROXOS”, «MAIS PEDRAS DE SAL»):

1-      «UMA CARTA EM PAPEL COR DE ROSA»

«Dr. Almeida Santos: Envio-lhe o meu último produto literário* (*Envio de PEDRAS DE SAL”). Espero que o aprecie, tanto mais que me dirijo a alguém capaz de idênticos produtos. A única diferença consiste em que ao Dr. Almeida Santos são propícios outros recursos copiosos, além dos literários.

Eu tinha também, embora de modo algum copioso, o de mestra de meninos, nestas terras que o sr. Dr. tanto ajudou a colonizar, conquanto nelas se não eternizasse propriamente como velho colono.

Sei que o Sr. Dr. tem instigado os seus amigos no sentido de irem cavar para outros lados. Neste momento em que, graças a uma fina-flor pseudo portuguesa de amantes da variedade governativa e demográfica, me consideram estrangeira nestas terras que aprendi na escola a julgar portuguesas, necessitava do apoio de alguém que soubesse atentar nas pessoas válidas para cavarem para outros lados, sem o espectro do desconforto pecuniário.

O sr. D., como pessoa provadamente atenta aos aspectos pecuniários, poderá ser esse alguém e eu a pessoa válida.

Mando-lhe essa prova e a informação de que os meus cinco filhos necessitam de que o continue a ser por alguns anos mais.

Sugiro, pois, que me apoie, através de um prémio literário mais chorudo e pontual do que a tença dada ao Camões. Que bem me posso comparar ao Camões. Ele cantou as glórias do povo português no seu renascimento. Eu canto as mesmas no seu falecimento.

Gostaria de sair daqui, para estudar aí novos tipos da comédia humana que me proponho analisar. Os entraves pecuniários, resultantes de um colonialismo digerido à pressa, levam-me a recorrer a si, que o digeriu sem dúvida mais espectacularmente sob todos os pontos de vista.

Com a agonia na alma, em previsão da do corpo, que o sr. Dr. ajudou a perpetrar, sem contemplações para com os seus irmãos de cor, embora, indiscutivelmente, de raça muito diversa.

                                                                                                                       Berta Brás

P.S. – O papel cor-de-rosa justifica-se, creio, pela escassez do branco, nestas terras perfeitamente colonizadas por algumas minorias esmagadoras.

Ag. 74

 

2-     A RESPOSTA DO SR. MINISTRO

Ministério da Coordenação Interterritorial

Gabinete do Ministro

Berta

Ainda sem ter tido tempo para ler o seu livro – é esta uma das fatalidades da minha nova condição – eis-me a agradecer-lhe o ter-mo oferecido. Folheei-o num lampejo e pareceu-me amargo. Ou só amargurado?

Não creia que é fácil esta tarefa que o destino me reservou de ajudar a liquidar um império. Uma espécie de anti Infante. Porquê eu?

Pelo contrário, tenho aconselhado as pessoas a conservarem-se em Moçambique. Acredito em que poderão continuar a viver aí, apesar de tudo mais agradavelmente do que na Metrópole.

Não obstante, diga concretamente em que medida posso ir ao encontro das suas preocupações e desejos.

Em breve o futuro de Moçambique estará definido “tant bien que mal”. Espero que não de todo mal, dado o ponto de partida.

Creia-me

                Amigo ao dispor

                                         ALMEIDA SANTOS

3-     RESPOSTA AO SR: MINISTRO

Sr. Ministro Almeida Santos:

Confesso-me honradíssima pela inédita dita que me coube de trocar correspondência amável com um dos mais representativos representantes da nação portuguesa. Porquê eu?

Lamento que as fatalidades da sua nova condição lhe não permitam mais que uns lampejos de folheamento das minhas Pedras, o que conduz fatalmente a interpretações erróneas. Não me parece amarga a mim a minha obra – quando muito salgada – e amargurada não vejo em quê. Mas talvez o sinta assim a sensibilidade do sr. Ministro, apurada nos trâmites alegremente vertiginosos da actual política, incompatíveis com o equilíbrio e a sensatez prazenteira que transparecem no meu sal luso.

A observação do sr. Ministro das dificuldades surgidas na liquidação do Império espantou-me. Ouvi falar em 50 milhões, mas foi com certeza alguém mais optimista, ciente das vantagens deles para a formação de novas minorias capitalistas ou no fortalecimento das anteriores. Na minha opinião, muito pessoal, confesso, a liquidação foi grátis, dada a urgência posta na empresa. Não posso, pois, deixar de o felicitar, bem como ao seu queridíssimo amigo, Dr. Mário Soares, pelo “record” da proeza.

Para concordar com as observações dos nossos governantes – entre os quais o Ministro Almeida Santos – da possibilidade de permanência aqui, necessitaria de exemplos fortes, como o do Sr. Ministro, que preferiu, todavia, estranhamente, a permanência metropolitana, juntamente com a família e as matérias indispensáveis para o amenizar das dificuldades surgidas.

Concretamente, Sr. Ministro, já que a minha sugestão do prémio literário o não seduziu, o que acho naturalíssimo, creia-me, não se me dava de possuir um prédio de trinta andares de rendimento numa das alegres avenidas da nossa Lisboa. Posso, em todo o caso, fazer um abatimentozinho de andares, à semelhança do abatimento feito – a crermos no boato dos 50 milhões – a quando da venda de Moçambique aos nossos irmãos pretos.

Pela parte que me toca, não espero nenhum futuro promissor nesta terra, e justamente pelo afastamento dela de um dos seus mais representativos representantes. – o Ministro Almeida Santos. Prefiro o retorno à pátria do Infante e do Anti, e felizmente poderei sempre contar com a protecção do último, que tão amavelmente se afirma ao meu dispor, no que lhe fico profundamente reconhecida.  

                                                                                                                                                                Berta Brás

PS- A mudança de direcção para perto de V. Ex.ª – Parede (1) - justifica-se, não tenho dúvidas em crê-lo, pelos mesmos motivos, conquanto menos favorecidos pela sorte, que fizeram mudar a V. Exª.

Já no fecho desta missiva, um rebate perturbou a minha consciência escrupulosa. Receando o excesso de altura do meu prédio com trinta andares com abatimento numa terra sujeita a tantos tremores como é a nossa Lisboa, outra alternativa se pôs ao meu espírito iluminado presentemente de alternativas e interrogações sem resposta: A de poder fazer corresponder os 3000 contos da minha conta bancária de cá, a 3000 contos (também com possibilidade de abatimento) daí, o que suponho não vai contrariar nenhuma dentre as numerosas especialidades do Ministro Almeida Santos.

                                                                                                                                                              Set. 74

 

(1)     – Escrita de Lourenço Marques, a carta foi enviada já de Portugal.

domingo, 15 de setembro de 2024

Um texto


De Jaime Nogueira Pinto (e outros de comentadores) defendendo pontos de vista cordatos relativamente aos candidatos que disputam a presidência americana, decididamente, Trump aparentando ser um justo, na sua infantilidade perversa, ante a aleivosia traiçoeira de Kamala.

A América dividida e que nos divide

Apesar de tudo, não parece que o debate tenha tido grande efeito sobre o eleitorado, mantendo-se os candidatos muito próximos, quer na totalidade da massa eleitoral, quer nos Estados decisivos.

JAIME NOGUEIRA PINTO, Colunista do OBSERVADOR

OBSERVADOR, 14 set. 2024, 00:1855

Num tempo de pessimismo em relação à política e aos políticos, os eleitores têm vindo a confirmar experimentalmente a famosa frase do realista cínico Talleyrand, de que a escolha em política é sempre “uma escolha entre dois inconvenientes”.

Por estes tempos, este parece ser o paradigma da luta política no mundo euroamericano. O facto de, no resto do mundo, poder o inconveniente ser ainda maior e nem sequer haver escolha não tem servido de grande consolo para quem, por aqui, se vê perante o esvaziamento racional e ideológico e a simplificação “emocional” dos “inconvenientes políticos” em jogo, representados por estridentes personagens de wrestling, como que vindas de mundos inconciliáveis.

Tentemos, com alguma calma, guardar o senso comum. Mesmo estando em claques opostas, em oposição radical, mesmo tornando-nos inimigos no sentido schmittiano do termo, tentemos pensar que nem tudo é o que parece, que há causas e consequências reais em jogo e que há pessoas boas ao serviço de causas más e pessoas más ao serviço de causas boas. Até na América.

A dupla prodigiosa

As eleições americanas afectam-nos e vão afectar-nos a todos. Sobretudo num mundo perigoso, com dois conflitos quentes na Europa Oriental e no Médio-Oriente, uma dezena de potências nucleares, uma ordem internacional em falência e em processo de substituição por ordem multipolar em caótica ascensão e uma comunicação social mais empenhada em narrativas ideológicas úteis para os seus objectivos do que na descrição e na análise objectiva dos factos. Um mundo perigoso onde a tecnologia permite a grupos não estatais organizados causar efeitos desproporcionais para a sua capacidade e onde há todo um novo patamar de propaganda, com mundos virtuais paralelos, antagónicos, cruzados.

É neste quadro que nos Estados Unidos se vão travar as mais que decisivas eleições de 5 de Novembro de 2024. Inicialmente eram para ser disputados pelo actual presidente, Joe Biden, e o ex-presidente, Donald Trump, mas depois da pobre prestação de Biden no debate com Trump, o Partido Democrático, mostrando disciplina e obediência a cúpulas nem sempre visíveis, procedeu ao defenestramento do Presidente (que até aí defendera como habilíssimo e preparadíssimo, contra “insinuações reaccionárias” de eventuais deficiências de memória e raciocínio do re-candidato). Fê-lo expeditamente, ultrapassando regras de democracia interna e substituindo-o por uma vice-presidente até aí quase simbólica, usada em 2020 para equilibrar o centrista moderado Biden com a ala mais à esquerda do partido.

Assim, do dia para a noite, a figurante de conveniência foi convertida por uma poderosa máquina de propaganda numa nova e excepcional criatura, capaz de governar a América.

Curiosamente, o que vimos, foi a preocupação de esvaziar e moderar a imagem da candidata, de a desradicalizar, de lhe retirar a carga de esquerda, de a livrar das ideias e dos actos do passado a fim de a tornar aceitável para independentes e moderados, enfim, para as classes médias. O mesmo para o seu co-equiper na vice-presidência, o governador do Minesota, Tim Walz, outro radical da legislação anti-Vida e do wokismo transgénero, que passou a ser aquilo que até já parecia – um cordato chefe de família com quem se toma uma cerveja à tarde, na doçura de uma cidade pequena do Minesota, desfrutando da american way of life.

Pelos maus da fita

Este é um lado da equação. Do outro lado está Donald Trump. Trump tem um passado liberal-chique, de tycoon do imobiliário, de anfitrião de reality shows e de mulherengo do show business. Quando, em 2016, encabeçando os descontentes do “sistema” e promovendo uma agenda conservadora, bateu os candidatos da direita republicana nas primárias e foi eleito, a surpresa foi geral. Apesar do seu estilo excitado e por vezes brutal, apesar da febre de nomeações e demissões de colaboradores, Trump não “acabou com a democraciae dirigiu uma Administração conservadora e realista sem novas guerras e com um sucesso apreciável na reconciliação do Médio Oriente. Internamente, a economia correu bem. No final foi leviano no modo como destratou a Covid-19 e os seus efeitos e isso pode ter-lhe custado a reeleição.

Independentemente das razões, foi também pouco feliz no modo como lidou com o ataque ao Congresso, em Janeiro de 2021, por alguns dos seus partidários, um gesto de populismo desastrado que rendeu munições sem fim aos seus inimigos.

Apesar de tudo isto e do histrionismo excêntrico e aparentemente caótico do candidato a Presidente, se eu fosse norte-americano, votaria na dupla Trump-Vance. Em Trump, como mal menor, em Vance por identificação com os seus valores de nacionalismo conservador e popular. Porque o que está em jogo não é a personalidade mais ou menos coerente, mais ou menos simpática, mais ou menos capaz de enumerar em público bons e sãos princípios de cada um dos candidatos, mas a política e as políticas que querem e vão prosseguir e as suas consequências.

Desde logo, com Trump e apesar de Trump, uma política internacional realistae não ideológica, como a dos neocons que, da Administração George W. Bush, liderados pelo Vice Dick Cheney, até às administrações democráticas, do Iraque à Líbia e ao Afeganistão, foram levando o caos ao Médio Oriente e a humilhação ao Ocidente. E uma política que conduza, efectiva e rapidamente, a Europa e o Médio Oriente à paz. E o virar de página sobre uns Estados Unidos reféns de agendas radicais, a exportarem como valores da América e do Ocidente as bandeiras do wokismo e fazendo depender programas de ajuda da adopção de um alucinado catálogo de fatais experimentalismos.

É com espanto que vejo amigos e conhecidos, muitos deles católicos, que, por detestarem Trump, se declaram agora simpatizantes de uma dupla de abortistas radicais até ao nono mês (o “sofrimento psicossocial”, que passou a integrar a lista dos critérios elegíveis para a “inviabilidade do feto”, também justifica aborto até aos nove meses), e com vontade de estender a prática, por lei, a toda a América. O facto de considerarem Trump “mentiroso” ou “grunho” não me parece razão suficiente para “endossarem” uma Kamala algures entre o saco de vento e a caixa de Pandora.

Já quanto a J.D. Vance, o segundo de Trump, poucas vezes um político americano terá tido um pensamento tão coerente, estruturado e sofisticado.

O debate

Dito isto, o debate correu mal a Trump. Kamala Harris seguiu um guião bem ensaiado: grandes, bons e generosos princípios, a união de todos independentemente da cor da pele, um qualquer virar de página (sobre a própria Administração?), uma espécie de sermão da montanha secularizado, entremeado de modo tranquilo com provocações ao adversário e mentiras descaradas, como a sua história do fim da guerra no Afeganistão, logo contraditada – não evidentemente, ali, pelos pivots – mas pelo general Keith Kellogg, que participou nas negociações.

Trump pôs de lado o sentido de humor e pose presidencial e foi-se deixando levar pelas estudadas provocações da adversária. E foi sendo excessivo, o que lhe é habitual, mas o que, desta vez, lhe foi prejudicial. Por exemplo, sabendo-se que Harris e Waltz são pelo aborto incondicional e sem prazo, para quê acrescentar um ponto, e falar em assassínio de recém-nascidos? Sendo a imigração ilegal um flagelo na América, para os que chegam e para os que estão, e tendo Kamala Harrris demonstrado a sua incompetência em controlá-la, para quê trazer a história dos imigrantes que devoram os animais de estimação dos “bons americanos”? Para quê voltar à fraude eleitoral? Porquê não condenar claramente a invasão do Capitólio, mesmo insistindo na bondade do próprio discurso, e continuar a atribuí-la exclusivamente à (real) recusa de Nancy Pelosi de reforçar a segurança? Porquê não recordar mais oportuna e factualmente a actuação da candidata democrata quando do violento “assalto às instituições” por militantes do Black Lives Matter?

De qualquer forma, não parece que o debate tenha tido grande efeito sobre o eleitorado, mantendo-se os candidatos muito próximos, quer na totalidade da massa eleitoral, quer nos Estados decisivos.

Uma certeza e uma dúvida

Quanto à parcialidade da comunicação, não devem nem podem restar dúvidas. A narrativa mediática dos grandes meios e da chamada “informação de referência” – do New York Times ao Economist, do Le Monde ao El País e aos nossos correspondentes e comentadoresnão se dá sequer ao trabalho de simular isenção. Porque afinal, no ringue de combate, alguém tem de encarnar o Mal; e Trump, a besta loira, o diabo em pessoa, fá-lo na perfeição.

Na vida real, só fica uma dúvida: ou o Diabo, que costuma ser subtil e insidioso, está a perder qualidades e as coisas passaram a ser o que parecem, ou também anda a serpentear por outras bandas, sob a aparência de Bem.

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COMENTÁRIOS (de 55)

Miguel Seabra: Trump é desbocado e por vezes parece uma criança grande. Em geral, é genuíno para o bem e para o mal. Kamala é falsa da ponta dos cabelos às unhas dos pés. É um lobo a dizer que é vegetariano e eu também me admiro como é possível que pessoas inteligentes de centro e de direita engulam entusiasticamente este lixo….          Ana Luís da Silva: Quem seja conservador e defensor dos direitos humanos só pode ter a mesma opinião de Jaime Nogueira Pinto. Quanto a mim a pedra de toque das eleições nos EUA tem duas metades. A primeira é que Trump tem provas dadas de ser um bom Presidente. A segunda é que alguém que defenda o aborto até ao nono mês de gestação ou é um monstro ou um facínora. Ainda assim Kamala dá a sensação de ser uma boneca articulada completamente oca, desprovida de humanidade palpável, um mecanismo com sistema de vida sofisticado que se enche com o discurso que no momento político der mais jeito debitar         José B Dias: Subscrevo na íntegra.               Paulo Luis da Silva: Mais um excelente artigo!  Vivemos de facto tempos perigosos que tornam imprevisível a realidade com que nos havemos de confrontar, não daqui a cem anos, mas até ao final desta década. Sobre a eleição dos EUA, o que me pergunto é: caso a Kamala vença as eleições, quem vai estar de facto a governar os EUA na sombra            José B Dias > klaus muller: A Springfield, Ohio, resident on his way to work called 911 to report spotting four Haitian migrants snatching geese near a city park just two weeks ago, according to a newly revealed recording. The call to a Clark County Sheriff’s Office dispatcher, obtained by the Federalist, appears to support a viral claim about some members of the migrant community eating animals in city parks.           Manuel Rocha: Trump foi um presidente que não teve guerras e arquitectou os Acordos de Abraão. Isso é mau para a Europa?  Já com os presidentes democratas (Obama Biden) as guerras começam ou não acabam (Ucrânia Médio Oriente, Síria) isso é bom para a Europa?  Na economia a Europa só tem de deixar de regulamentar tudo e um par de botas, para ser mais inovadora, competitiva e rica               Glorioso SLB: Se fosse americano, certamente votaria Trump. Como europeu, prefiro Kamala. Como pai, prefiro Trump. Portanto, voto no boçal Trump.          João Floriano: Eu também votaria em Trump se  o pudesse fazer. Por muito que o tentem apresentar como um americano bonacheirão, Walz apoia uma política tenebrosa no caso do aborto, teve actuação duvidosa nas manifestações que se seguiram à morte de Floyd e ao Defund the Police e apoia as transições de género sem critérios válidos (o sofrimento psicossocial não vale) a não ser o oportunismo político. Quanto  a Kamala o cronista identificou perfeitamente os problemas da sua vice presidência e não devem ser nada abonatórios para  a candidata, já que a estratégia seguida é «despir» Kamala das antigas roupagens e «vesti-la de novo». Sem qualquer admiração, o debate não provocou alterações significativas e apesar de se reconhecer que Trump não esteve na sua melhor forma, democratas e republicanos continuam empatados. Isto significa que as trincheiras já foram cavadas, os lados escolhidos e que restará poucos indecisos. Talvez um resultado de uma campanha longa e cansativa mesmo para os eleitores. Apreciei o termo de «sofrimento psicosocial» para apoiar o aborto até final da gravidez, o que configura um caso de assassinato digam o que disserem. O argumento tem passado despercebido por cá  o que é estranho. Será que foi usado na reunião da JS quando propuseram o aumento do tempo limite para a realização do aborto? será que Alexandra Leitão o utilizou para justificar o apoio que o PS dá aos seus jotinhas? Pode ter-nos passado despercebido. Quanto à última questão do artigo, tenho  a certeza que o MAL serpenteia por aí travestido como BEM e enganando muito boa gente. O BEM por sua vez transformou-se numa espécie de remédio amargo que não se quer tomar, apesar de poder curar muitos dos danos causados pelo wokismo: o que arde, cura!             Maria Tubucci: Excelente Dr. JNP. Mas tu tens cérebro ou emprenhas pelos ouvidos? Digo muitas vezes quando pessoal conhecido diz apoiar a KH. Ah e tal, o DT quer acabar com a democracia. Até 27 Junho a KH dizia à grande comunicação social que estava tudo com Biden. Um mês depois os democratas empurram Biden da corrida à presidência dizendo que tinha dificuldades cognitivas, instalam KH na corrida à presidência, sem ter ido a votos nas primárias nem sido escrutinada, herdando os delegados do Biden bem como as contas bancárias da sua campanha. Isto é democracia? Desde então a “indústria” das celebridades, a “indústria” política democrata, a “indústria” dos actores, a “indústria” dos cantores, a “indústria” da imprensa escrita e TVs promoveram a maior limpeza de imagemde  que há memória, impingindo KH como o melhor deste munto e arredores para a presidência dos USA. No fundo todos sabem que KH é fraquíssima e incapaz de motivar alguém a ir votar nela, logo puseram-se todos em campo para irem caçar votos para a KH. Em termos de expressão corporal vê-se que DT é mais real e humano, irrita-se, diz o que pensa e gosta da América. Enquanto KH é totalmente postiça, muda de sotaque conforme o estado onde está; é troca-tintas em 2020 era contra o fracking e contra a construção do muro, agora é a favor; não gosta dos americanos, promove o extermínio de bebés e a mutilação genital de adolescentes confusos. Ao longo dos últimos 4 anos como vice-presidente KH mostrou que nada fez para melhorar a vida dos norte-americanos. Para além da sua administração ter tornado o mundo mais perigoso e instável. Acho que KH é tipo robot, programado para dizer e fazer o que o dono manda, será uma desgraça para o mundo se ganhar..             Jorge Tavares: Com franqueza, caro Nogueira Pinto, acha mesmo que Trump se limitou a ser "pouco feliz no modo como lidou com o ataque ao Congresso, em Janeiro de 2021, por alguns dos seus partidários"? A sério?!              Fernando ce: Votaria em Trump nos EUA, apesar de Trump. Trump tem uma política de direita de na economia, nos costumes , nos valores da sociedade. Kamala, um política socialista na economia, woke nos costumes e , mais do que uma politica duz que quer “avançar e não voltar atrás” fazendo -me lembrar um qualquer PREC com uma fixação de preços, e meras promessas de um mundo melhor, entremeado com gargalhadas e um desconhecimento confrangedor de política internacional.                  José Neto: A crónica de JNP tem todo o mérito e rigor do costume e ainda, para mim, um brinde extra: lendo a crónica e também os comentários dos leitores, fiquei a saber que há por aí mais pessoas a pensar como eu. Cheguei a pensar que era o único! Ufa...            Nuno Borges > Maria Tubucci: Putin prefere uma fraca Kamala na Casa Branca. Com Trump nem se teria atrevido a invadir a Europa.

CHAGAS

 

Um herói português, “anjinho” de fraca visão e fraco orgulho pátrio. Por Luis Soares de Oliveira.

6 d  · 

Livro "Caos & Ordem" de Luis Soares de Oliveira

Fascículo XI

A guerra do Chagas

João Chagas - o mais fiel aliado de Afonso Costa - era de opinião que a fonte da racionalidade era Paris e advogava a tese de que o liberalismo português só poderia vingar se tornasse Paris - e não mais Londres - o centro de dependência externa. Como tal, via na guerra europeia que deflagrou em 1914 a oportunidade de consolidar esta nova dependência, ou seja, exactamente o contrário do que recomendava D. Carlos de Bragança que via Westminster como o único centro de poder externo capaz de nos entender e de nos ajudar. Chagas apregoava para quem o queria ouvir que esta seria última de todas as guerras! "As grandes potências europeias haviam entrado em guerra para resolverem finalmente todos os conflitos de interesses entre elas e nunca mais se ouviria neste planeta o troar dos canhões". Considerava por tanto indispensável obter um lugar à mesa dos vencedores que iriam decidir a Paz para todo o sempre e julgava que o conseguira ajudando o esforço de guerra da França.

João Chagas, "brasileiro de torna viagem," não estava porém suficientemente familiarizado com as subtilezas da política europeia. O polémico jornalista via ideologias e boas intenções onde só havia interesses e disputas da hegemonia. Ainda não se dera conta que o único interesse dos franceses em relação a Portugal consistia em subtraí-nos à órbita britânica. Paris - ao contrário de Londres - não tinha qualquer interesse particular na nossa independência. E assim tinha sido desde Napoleão e Talleyrand.

Ao tempo em que era plenipotenciário em Paris, Chagas assumiu a responsabilidade desta política suicida. Anotou no seu Diário de 1914: "a política que eles não sabem fazer em Lisboa, faço-a eu aqui". Confirmava-se: presunção e água benta cada qual toma a que quer.

E presumidamente agiu. Ele, foi, efectivamente o campeão da entrada de Portugal na guerra europeia. À data em que isso aconteceu, João Chagas comentou no seu diário: “a guerra matou a monarquia”. Não terá sido assim. A República vivia da indiferença do povo - produto da sua falta de cultura cívica -, em relação ao fenómeno político, mas esta indiferença estava longe de expressar os sentimentos profundos da nação. Salvo raras excepções, o português, tradicionalmente virado para o Atlântico e para o além-mar, não compreendia nem aceitava que o obrigassem a combater “a guerra dos outros, em casa dos outros". Agora, ao ser mobilizado, o povo deu-se conta que a República era um ente estranho que lhe entrara pela casa dentro.

João Chagas usou e abusou do argumento de que se não participássemos na luta europeia, as nossas colónias correriam sério risco. Ora quem tinha dado mostras de cobiçar as nossas colónias tinha sido a Alemanha Imperial. Nos primórdios do século, os liberais britânicos de Edward Grey tinham-se mostrado sensíveis a tal cobiça. Porém, o facto de os alemães terem invadido a Bélgica tinha acabado de vez com a validade de todo e qualquer entendimento anglo-alemão, inclusive aquele de 1913, relativo a colónias africanas, conforme o próprio ministro Grey declarou ao nosso embaixador Teixeira Gomes. O que Chagas desconhecia totalmente eram as intenções dos americanos. Esses não queriam as nossas colónias; queriam sim acabar com o colonialismo protecionista europeu por toda a parte. Perante isto, tanto fazia a Portugal participar ou não participar na Guerra.

Mas Chagas era teimoso. Foi ele quem, em 1914, mostrou aos franceses que Portugal dispunha de excelente artilharia Krupp adquirida dez anos antes pelo rei D. Carlos ao seu primo Hohenzollern. Canhões era o que os parisienses - na altura ameaçados de cerco - mais precisavam. O governo francês solicitou imediatamente a Londres que favorecesse a entrada de Portugal na Guerra. O ardil porém não resultou. O que nos salvou então - e nos deu dois anos de paz - foi a oposição inglesa à entrada de Portugal na Guerra. Eles, melhor do que ninguém, sabiam, que Portugal não tinha meios de defesa satisfatórios e que se tornaria presa fácil dos alemães. Mais, Londres receava que a entrada de Portugal na guerra como aliado da Inglaterra, pudesse induzir o rei de Espanha a alinhar no campo contrário. Lá se ia Gibraltar. O interesse de Afonso de Espanha em acabar com a República portuguesa já se havia manifestado - e eloquentemente - durante o 14 de Maio de 1915. Afonso de Espanha cedera então, mas não desistira. Ao lidarem com Afonso de cá, os britânicos sabiam muito bem o que pensava o Afonso espanhol.

O Foreign Office tentou ainda obter a cedência da artilharia desguarnecida, solução que encontrou forte resistência por parte de Norton de Matos, novo Ministro da Guerra português. A negociação arrastou-se.

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Chagas pagou muito caro a sua ousadia. Designado chefe do Governo em 1916, ficou impedido de assumir pois, no comboio em que vinha para Lisboa, foi agredido a tiro por um tal João de Freitas, deputado unionista - o partido anti guerra - e "homem de bem", segundo Raul Brandão - que lhe vazou um olho. Foi o fim da carreira política da de Chagas. Nunca chegou a Lisboa. Munido de olho de vidro, decidiu voltar para França, "onde ou me fazem embaixador ou fico exilado." E esperou até 1920 para tomar assento na Conferência da Paz, em Paris, onde juntamente com Afonso Costa, sofreria a humilhação de ver a Espanha (que não combateu na Guerra) e o Brasil escolhidos para membros permanentes do Conselho da Sociedade das Nações, enquanto Portugal, que combateu nas Flandres e em África, foi excluído. Ficou finalmente a saber a importância que o Quai d'Orsay atribuía a Portugal. E os delegados portugueses sentiram-se de tal modo vexados que nunca apresentaram ao Congresso da República o relatório sobre os trabalhos da Conferencia de Paz.

Chagas remeteu-se então à condição de cidadão abastado. Instalou-se no Avenida Palace, em Lisboa, onde viria a morrer, a 28 de Maio de 1925, vítima de aortite sifilítica.

(Continua)