Da História Pátria. Um texto com gente
do passado, próximo, paralelo, Lavoisier presente sempre… Texto curioso, de Luis Soares de
Oliveira, sobre Afonso Costa
e as suas razões e condições de governação…
5 d ·
livro D.O:
fascículo 7
FUGA PARA A
FRENTE
Afonso Costa teria outros motivos da beligerância que
adoptou. A
sua situação política caminhava apressadamente para o desastre. Arrebanhara as
milícias populares e os marginalizados do regime anterior e enchera as
repartições com adeptos, sem cuidar de indagar da competência e das razões de
cada um e agora estava cercado de incompetentes gananciosos que apenas pensavam
no espólio a que podiam deitar mão. Os antigos arruaceiros eram agora bombistas
protegidos pela lei, e tal condição em nada alterou os seus propósitos. Costa
enganara-se: julgava que os terroristas defenderiam a causa dos pobres mas
afinal e - como notou Freud -, "o terrorista não defende causas nem
doutrinas; o que o move sempre é a prática de actos ilegais"
O poder político de Afonso Costa dependia em larga medida do
equilíbrio entre duas influências predominantes no quadro republicano: - a Maçonaria,
por uma lado, e a Carbonária por outro. Tal equilíbrio saiu fortemente descompensado no
"14 de Maio". Não
só a Formiga-Carbonária tomou ascendente, como
surgiram novas organizações terroristas com outros patrocínios, incluindo o da
Igreja. O próprio Afonso já se
vinha a queixar disso nas Câmaras como mostram alguns respingos dos suas
intervenções nas Câmaras em 1913. adiante transcritos: "os sindicalistas revolucionários, que
empregam a dinamite como revelação dos seus próprios maus instintos, e que não
querem trabalhar …" (sessão 17-VI-); "ontem em Vila Real foi
arremessada um bomba contra um quartel; em Pardelhas, arrancaram os fios do
telégrafo por uma extensão de mais de 50 Kms. São os patrões que promovem a
escassez para levarem os operários à revolta" (sessão 06.V).
"perguntaram-me se, como chefe do governo, estava decidido a abrir as
associações operárias e dei a seguinte resposta. «O
que está fechado é conhecido por Casa Sindical que está inteiramente fora da
lei. Eles não querem a greve; querem é sabotage que faz descarrilar os caminhos
de ferro e que queima as searas»." (sessão
de 2.VI.). E tinha razão, os terroristas só reconhecem uma
verdade - o ódio.
«««»»»
Afonso Costa
tinha ainda outro motivo para desejar a Guerra. A luta faria o Exército
claudicar. Ele próprio afirmou: "os oficiais vão a
laço, se preciso for, e os soldados não têm escolha". O soturno
Norton de Matos, agora ministro da Guerra, encarregar-se-ia disso. Este teve o cuidado de confiar
os comandos exclusivamente a militares maçons. Deixava cá os que não lhe eram
fiéis. Engrossava pois as forças contrárias. Seria ou não proposital o critério
adoptado, mas a verdade é que, como resultado da entrada na guerra, muito
aumentou o número dos que se sentiam no direito de provocar a desordem. Correspondentemente, o poder de
Afonso ressentiu-se: assustar os burgueses era com
ele, mas disciplinar a escumalha bombista exigia audácia que lhe faltava. A fraqueza do poder tornou-se
visível mediante acumulação de distúrbios sangrentos, escândalos espetaculares,
no fratricídio e na desordem. Pensavam os políticos aflitos que uma situação de
guerra e a ameaça externa seria factor de coesão nacional e estabilidade
política. Afonso Costa passou então a
ver mérito na cruzada de João Chagas a favor da entrada de Portugal na Guerra
Mundial. Via
que os rebeldes que agora o incomodavam passariam à condição de soldados
puníveis com pena de morte em caso de deserção.
Em Lisboa,
multiplicavam-se as prisões de oposicionistas. O parlamentarismo estava em
baixa: nas eleições de Junho de 1915 dos cerca de 400 000 a quem era reconhecido
direito de voto apenas 282 387 compareceram nas urnas. ( ). O novo governo só ficou
completo em 29 de Novembro seguinte. Afonso Costa e os partidários da
participação de Portugal na I Guerra Mundial ficaram então aparentemente
senhores absolutos da cena - do parlamento, das autarquias, da marinha e da rua
onde do minava a "formiga" agora armada. A propaganda republicana proclamava que só Afonso
Costa estava em condições de governar porque era o único que tinha apoiantes
"que se mexiam". O problema estava na qualidade
dos colaboradores. Teixeira de Queirós, primeiro indigitado para a pasta dos Estrangeiros, estranhou tal ideia
pois não falava línguas - "o meu francês é pior do que o de um beduíno" - e,
"no estado em que se encontra a
minha uretra, sou forçado a ir com frequência à casa de banho, onde demoro pelo
menos uma hora e donde saio com raiva a tudo e a todos os que me cercam" .
Não se considerava pois em condições para assumir as negociações com a
Inglaterra relativas à entrada de Portugal na Guerra. Posteriormente, foi
substituído por Augusto Soares, um janota de
Lisboa, pessoa de hábitos refinados.
«««»»»
Caberia a uma
inesperada descarga eléctrica fornecer explicação científica para o estranho
procedimento de Afonso Costa. A explicação embora científica tem cunho
emocional. Corria o mês de Julho de 1915. Afonso Costa, indigitado para
substituir João Chagas na chefia do Governo, viajava num eléctrico da Carris,
na Avenida 24 de Julho, onde foi surpreendido pelo estrondo de uma descarga
provocada por curto-circuito no trólei do carro. Assustado, saltou pela janela
e aterrou de cabeça no passeio empedrado o que forçou à sua hospitalização
imediata. O povo celebrou o acontecimento recorrendo à revista de teatro:
O caso não era porém para
gracejos. O salto repentino pela janela de um eléctrico em movimento diz mais
sobre Afonso Costa do que tudo o resto que dele se conhece. O lente
revolucionário de Coimbra entendia que toda a gente lhe queria mal, o que se
ajusta á conclusão do psicólogos sobre percalços emocionais . Guardava dentro de si medos
infinitos. Os
psicólogos dizem que este receio perpétuo é sintoma concludente de transtorno
comportamental sociopático. Diz o relatório da OMS publicado na
Internet, que o sobressalto exagerado por motivos banais é sintoma de trauma
infantil. O trauma de infância, segundo Freud, marca para todo a vida. Em
relação á comunidade, Afonso Costa sentir-se-ia sempre receoso. Lá está ele
isolado na foto dos Lentes de Coimbra. E não é o marginal criativo em busca de
reconhecimento; pelo contrário, será para sempre o cobardemente destrutivo
que procura defender-se. O medo é mau
conselheiro. Já Séneca dizia que o fraco defende-se com a crueldade.
O estrondo
produzido pela curto-circuito eléctrico veio pois fornecer uma explicação do
conteúdo científico ao estranho comportamento do mais notável estadista
português do seu tempo.
«««»»»
Como se notou acima, o poder
interno fraco ou decadente é o mais inclinado a recorrer à guerra externa para
recuperar a segurança interna. Já Danton berrara na Constituinte, com
toda força dos seus pulmões, que "a Pátria estava em perigo".
Tais gritos porém não o impediram de
subir à guilhotina. Do mesmo modo, Chagas e Costa viram na I Guerra Mundial deflagrada em Agosto de
1914 excelente oportunidade para recuperarem o poder prodigamente esbanjado.
Com a queda do governo de José de Castro, em Novembro de 1915, Afonso Costa
viu-se obrigado a assumir, ainda que a contragosto, a posição de primeiro
ministro e formou um governo exclusivamente com gente do seu Partido. A "união sagrada" desfizera-se;
as coligações eram cousa do passado; agora só poderia contar com os seus
parasitas ou seja os formigas violentos. Estava cada vez mais isolado. Triste
conclusão para quem admitiu que a guerra e a ameaça externa seriam factores de
coesão nacional e estabilidade política que tanta falta fazia ao país"«««»»»
Mas ainda o esperaria outra contrariedade resultante
da entrada de Portugal na Guerra e este tribuno. Desde
que daqui saiu, fugido a Sidónio, em finais de 1918, nunca mais votou a
discursar. (continua)
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