Julgo que revela, sobretudo, amor
pátrio. O contrário da outra. A tal do “coração”- a nossa, sempre presente.
A aliança entre Macron e Le Pen
Em França há o que o vocabulário
político português chamaria uma geringonça de direita. E a doutrina das nossas esquerdas
é de que um governo é legítimo desde que tenha uma maioria parlamentar.
JOÃO MARQUES DE ALMEIDA Colunista do
Observador
OBSERVADOR, 12 set. 2024, 00:2041
Em Junho, na segunda volta das eleições
legislativas, o partido de Macron fez alianças em vários círculos eleitorais
com candidatos socialistas e dos Verdes, para evitar a vitória do partido de Le
Pen. Apesar do Rassemblement National ser o partido com mais deputados, Macron conseguiu os seus
objectivos. Mas o preço foi elevado: a frente de esquerda
ganhou as eleições. A
complicação para Macron não são, como vimos, os socialistas e os Verdes. O
grande problema é a França Insubmissa, o maior partido da coligação das
esquerdas. Macron não poderia aceitar um governo apoiado pela França Insubmissa
porque iria tentar mudar as suas reformas principais: no mercado laboral e na
idade da reforma.
Pelo meio, comportou-se como um
Presidente autoritário com pouco respeito pelos resultados eleitorais. Eu considero que um governo apoiado pela
França Insubmissa seria um desastre para a França. É um
partido anti-democrático, contra a União Europeia e a NATO, apoiante de Putin e
do Hamas e aliado do radicalismo islâmico francês. Mas a verdade é que muitos franceses
votaram nesse partido e faz parte da coligação vencedora das eleições. Macron deveria ter nomeada PM a candidata
da frente de esquerda e depois logo se veria o que aconteceria no Parlamento.
Não compete ao PR substituir os deputados. É o grande problema das linhas
vermelhas: enfraquece a democracia. Muitos nas esquerdas apoiaram as linhas
vermelhas contra a direita de Le Pen, mas agora discordam das linhas vermelhas
contra a França Insubmissa. Em nome da democracia, sou contra ambas.
Macron tentou que o Partido
Socialista se separasse da França Insubmissa e dos comunistas e apoiasse
um governo juntamente com a sua coligação centrista e liberal e com os
Republicanos. Seria a versão central de um bloco central ou de uma grande
coligação. Não conseguiu porque os socialistas continuaram aliados às esquerdas.
Macron virou-se assim para o seu plano
B, para uma coligação do centro liberal e das direitas. Mas, para
o fazer, foi obrigado a destruir as
outras linhas vermelhas que tinha levantado em Junho, contra o partido de Le
Pen. A fragmentação da política francesa não aguenta duas
linhas vermelhas simultâneas. Há linhas vermelhas contra a extrema-esquerda ou
contra a direita radical populista. Macron escolheu aliar-se a Le Pen. Só assim foi possível nomear como PM
Michel Barnier dos Republicanos. Sem Le Pen, não havia maioria parlamentar. A
frente de esquerda vai apresentar uma moção de censura contra o governo de
Barnier, a qual será rejeitada por uma maioria que vai da coligação centrista e
liberal de Macron aos Republicanos e ao partido de Le Pen.
Para agradar aos respectivos
eleitorados, Macron e Le Pen não assumem a aliança que fizeram e não haverá
membros do Rassemblement National no governo. Mas a
aliança existe e é ela que assegura o governo de Barnier. O tempo dirá quais são os termos do
entendimento. Mas desconfio que Le Pen aceitará as reformas de Macron, as
políticas de Barnier para diminuir o défice, e o apoio à Ucrânia e, em troca, o
novo governo terá uma política muito mais forte e agressiva contra a imigração
ilegal e na segurança interna, sobretudo contra os grupos radicais islâmicos.
Noutras matérias continuará a haver desacordos, sobretudo em políticas
climáticas, de transição energética e de comércio externo.
Neste momento, em França, há o que o
vocabulário político português poderia chamar uma geringonça
de direita. A doutrina das esquerdas portuguesas é de que um
governo é legítimo desde que tenha uma maioria parlamentar. Em princípio, será
esse o caso com o governo de Barnier.
COMENTÁRIOS (de 41)
Ana Luís da Silva: Parece que Macron despertou
para a realidade, leia-se a parvoíce das linhas vermelhas, ou é simplesmente um
oportunista? Claro, é simplesmente um oportunista. Eventualmente, aqui neste
lugar da Europa à beira-mar plantado, a idiotice do “não é não” irá cair com a
ficha, porque a realidade tarde ou cedo se impõe ou, pelo contrário, Montenegro
continuará a caminhar paulatinamente em direção ao cadafalso nas eleições
legislativas (antecipadas pela sua política arrogante em relação ao CHEGA)? É que se perder eleições não
perderá apenas eleitores desiludidos, perderá o aparelho (sempre calculista) do
partido que acabou de amansar em eleições internas e (o que é pior para todos) perderá
a oportunidade de inverter em Portugal a tenebrosa deriva socialista. João Floriano: As geringonças só funcionam,
são aceitáveis e legítimas, se forem de esquerda como aconteceu com o grande
teórico António Costa. Se as geringonças forem de direita, já são atentados á
liberdade, à democracia. Veja-se o caso português em que o obediente e submisso
Montenegro está impedido de se entender com o CHEGA. Tim do A: Pode ser que a França ainda se
salve com a aliança à direita. Mas acho que já vai tarde. O liberalismo de
Macron e a União Europeia já destruíram a França. A França, actualmente
em pré guerra civil, para sobreviver, teria de sair rapidamente da UE que a
destruiu economicamente e socialmente, combater o wokismo e implementar um
governo de salvação nacional.
Rui Lima: Devemos começar por assinalar
que com a mesma percentagem de votos os trabalhistas ingleses têm uma vitória
retumbante e o partido de Marie le Pen tem uma derrota, o que não deixa de ser
curioso. O grande problema são os Socialistas alinhados com o extremismo
e com os extremista Jean-Luc Mélenchon que aposta tudo no voto tribal. O
maior problema: todos os números da economia francesa são aterradores, está
protegida pelo Euro até quando? O actual presidente tinha prometido uma política de
“produção “ mas acabou a incentivar a procura numa economia com défice interno
e externo brutal , mas numa França que é uma manta de retalhos com
as suas diversas etnias é impossível aplicar um plano de rigor sem risco
de uma guerra civil. Para a reforma passar para os 64 anos foi o
fim de mundo. Fernando
Cascais: Excelente análise. O primeiro artigo que leio sobre a geringonça de direita
em França. Quanto à esquerda, estes gostam muito daquela máxima: Faz aquilo que eu
digo e não aquilo que eu faço. João Floriano > unknown
unknown: Eles têm La France Insoumise e nós a AD submissa. Tomazz Man: As linhas vermelhas duram até
que o risco de perder impõe a realidade... GateKeeper: Le petit napoleone não tinha
outra saída possível para sobreviver até as próximas "presidenciais".
Meteu-se num beco sem saída ao estabelecer linhas "vermelhas" pré-2a
volta à direita. "Ao fazê-lo "arregimentou" os xuxús e toda a
esquerdalha que estavam preparadinhos para o apear. A realidade nua & crua
de um País em franca decadência económico-social & política tem
"destas coisas". Claro que MlePen preferiu esperar e fez muito bem.
Todas e todos os "pintassilgos" esquerdalhó-liberalecos-woke que aqui
apostam arrogando-se [quais aves canoras] de grandes "defensores da
demo-crácia tuga actual -a do centrão ps+os2d- teriam que espumar
"ódio" vs o Chega!. Já se esperavam tais disparates, pois a força do
"hábito da genuflexão " ao centrão é superior aos seus neurónios. Que
continuem a mostrar a sua ignorância. Temos tempo. Jorge Espinha: Uma correcção. A doutrina de
esquerda (e dos seus companheiros da jogatana de cartas) é: o governo é
legítimo se for de esquerda.
Nuno Abreu: Uma muita boa análise da situação politica francesa! Jorge Barbosa: Excelente artigo......como é
habitual.
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