Diz-nos da esperança que nos resta, como
coisa última a desaparecer da tal caixa de que foram largados os males condenatórios
das vidas racionais. E a esperança pode servir de muito, nas naturezas
derrotistas, inconformistas em relação ao presente, refugiadas no passado
juvenil, implicando as alegrias da inconsciência e da descoberta, nos espaços iniciais
de uma aprendizagem gradualmente vivida na euforia do desconhecido e da
surpresa, revividos pela memória, no tal presente de incompreensão de uma
experiência tantas vezes dramática - a visão futura abrindo receios, mas por
vezes esperanças - duvidosas embora - ou mesmo vividas com fé, apoiadas, tantas
vezes, na devoção divina apaziguadora – o que é uma felicidade para os fiéis.
VIVER NO PASSADO
Até o futuro é preferível ao
presente. Quero deixar expressamente claro que não sou uma pessoa de futuro e
chego a ter algumas dificuldades com quem assim é. Mas até o futuro é
preferível ao presente.
TIAGO DE OLIVEIRA CAVACO Pastor
Baptista, colunista do Observador
OBSERVADOR, 29 set. 2024, 00:165
Quando a minha mulher me acusa
justamente de eu viver no passado, tento explicar-lhe que o presente é um lugar
desinteressante. Qual o interesse que a vida de agora tem? Desconheço-o. O
passado, por outro lado, é uma vida muito melhor em que recordamos coisas boas
ou más mas que, sobretudo, podem ser alteradas de acordo com a nossa vontade. Gosto
muito de viver no passado porque consigo mexer nele a meu favor como no
presente não consigo. Recordo momentos que aconteceram e traduzo-os de
acordo com as minhas conveniências de agora. O presente é um mono.
Até o futuro é preferível ao presente. Quero
deixar expressamente claro que não sou uma pessoa de futuro e chego a ter
algumas dificuldades com quem assim é. Mas até o futuro é preferível ao
presente. O futuro, como o passado, pode ser usado com muito mais imaginação
do que o presente. Com frequência projecto cenários futuros fantásticos,
que me tratam bem e favorecem. No futuro consigo o que no presente não há
maneira de acontecer. Tal como o passado, o futuro é um cenário moldável e dado
a liberdades que o presente, abrutalhado que é, faz questão de impedir.
As pessoas do aqui e agora tendem a
desinteressar-me. As pessoas reais tendem a desinteressar-me, reconheço. A
realidade, que acho que é o que chamamos ao que desobedece ao poder da imaginação,
tem falta de modos, falta de classe, falta de capacidade de progresso. Não sei como continuamos a tolerar a
realidade quando, vez após vez, ela demonstra total desinteresse em ser
sensível ao que agrada aos outros. Quem gosta do aqui e agora gosta também de
ignorar que a vida podia ser muito melhor do que é. Desconfio quando vejo
pessoas que não usam o livro de reclamações para se queixarem da existência.
O que isto significa não é qualquer
recomendação da murmuração. O segredo
contra o despotismo da realidade não é ser anti ela; é escolher as suas versões
alternativas que nos são dadas no passado e no futuro. Viver no passado não é
estar no presente a murmurar. Até viver no futuro, que já expliquei ser uma
coisa mais potencialmente irritante, não é estar no presente a murmurar. Se há
pelo menos três tipos de tempo diferentes, existentes no passado, no presente e
no futuro, por que tem de ser entregue ao segundo o monopólio de viver na
realidade?
Esta semana fui acusado de ser um escapista. Uma vez mais
acusaram-se de algo que sinto não precisar de me defender. Será o presente
um lugar do qual ninguém deve tentar escapar? Se assim for, parece-me tristemente parecido com uma prisão. Às
pessoas que vivem aqui e agora recomendo a terapia da imaginação. Talvez se viva igualmente bem noutro tempo e noutra
realidade, diferentes dos rigores do momento e do espaço que no imediato nos
dizem respeito. Só será
ficção científica não querer viver no aqui e no agora para quem tiver na
ciência da realidade a certeza da ausência da ficção.
CRÓNICA COMPORTAMENTO SOCIEDADE
COMENTÁRIOS:
Alexandre Barreira: Pois. O
tempo não pára. Não espera. E é....implacável....!!! Francisco
Almeida: Tiago de
Oliveira Cavaco hoje tocou-me fundo. Não nasci assim mas sou há muito
monárquico. Como disse o autor no passado encontro coisas boas e outras menos
boas. No futuro, posso sempre sonhar. Mas no maldito presente, tenho Marcelo.
Tim do A: Somos todos diferentes. E ainda bem que assim é. Prefiro
viver o presente e pensa sempre no futuro. bento guerra: Deveria ver se essa acusação da sua mulher, não
se refere a algo específico Cisca Impllit: Grande artigo. Gostei mesmo de o ter lido.
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