Shame!
O texto de um homem justo, inteligente e corajoso: JOSÉ ANTÓNIO RODRIGUES DO CARMO Coronel
"Comando". O meu
deslumbramento e a minha gratidão. Por cá… a subserviência de sempre. Um bravo
aos comentadores.
O dilema de Israel e
o "finca-pé"
Tendo em conta que é a sua
sobrevivência que está em jogo, deve Israel render-se às exigências do Hamas
ou, pelo contrário, responder de forma a que os seus inimigos vacilem e se
contenham?
JOSÉ ANTÓNIO
RODRIGUES DO CARMO Coronel "Comando"
OBSERVADOR, 06
set. 2024, 00:565
Há dias, na CNN Portugal, Tiago André Lopes, acabava a sua análise da situação
israelita com uma sinuosa
indirecta ao governo israelita, que estaria a “fazer um finca-pé nas
questões securitárias em vez de nas questões humanitárias”.
Nesta matéria, tal como na questão
ucraniana, Tiago AL, não consegue
esconder o seu óbvio enviesamento antiocidental.
Aparentemente, para Tiago AL é estranhíssimo que um líder de um país democrático,
invadido por um grupo terrorista, atacado a partir do Irão, do Líbano, do
Iémen, da Síria, da Judeia, da Samaria e do Iraque, com numerosos cidadãos
sequestrados, dos quais seis acabam de ser executados a sangue frio, esteja
mais preocupado com as “questões securitárias” dos seus cidadãos, do que com as
“questões humanitárias” dos cidadãos do inimigo.
Presumivelmente, Tiago AL, à frente de um governo de um país nesta
situação, colocaria todo o seu empenho e engenho a tratar das questões
humanitárias do inimigo, deixando para segundo plano a segurança dos seus
cidadãos.
Não estaria muito tempo à frente desse
governo, porque nas democracias quem é eleito é suposto servir o povo que o
elege, e não os outros povos.
Todavia, uma vez que Israel, indo muito para além do que as leis da
guerra preconizam, até garante condições para a vacinação das crianças de Gaza,
permite e facilita a entrada de alimentação, fármacos, água, electricidade,
etc., que deveria fazer mais, para mostrar preocupação com as “questões
humanitárias”?
Talvez
Tiago AL inovasse nesta matéria, a partir da sua confortável poltrona mas, no
mundo real, não se conhece nenhum país que, atacado de uma forma que viola
completamente o jus ad bellum e o jus in bello, se preocupe mais
com a população do atacante do que os próprios dirigentes dessas pessoas, os
quais, como é sabido à exaustão, mesmo por quem não quer saber, as usam
despudoradamente como escudos humanos e até se vangloriam do brilhantismo dessa
estratégia, como fez o próprio Sinwar.
Lamentavelmente, Tiago AL e toda uma
considerável constelação (a maioria) de comentadores, jornalistas e
“especialistas” vários da CNN Portugal, que martelam ostensivamente as notícias
e as opiniões para que Israel seja visto como o mau da fita
(omitindo factos, repetindo acriticamente as perspectivas, léxico e números do
Hamas, acrescentando adjectivos tremendos às acções israelitas, apagando o
terrorismo palestiniano nas narrativas, etc.), têm a vantagem de estarem longe da realidade da
guerra e não terem de enfrentar os dilemas que se colocam a Israel.
Para eles, Israel tem de “aceitar o cessar-fogo”, seja ele qual for,
e o culpado por não haver cessar-fogo é “o Netanyahu” e a “extrema-direita”. É
assim de simples, porque tudo é simples para quem pouco compreende.
Não são só os comentadores.
Qatar,
Egipto, a Administração Biden/Kamala, Guterres, a Europa, etc., estão também
embalados nessa narrativa que o Hamas e o Irão aplaudem fervorosamente e procuram
promover.
Guterres porque a sua especialidade,
para além dos pântanos, é fazer “alertas” e sinalizar virtude para o auditório.
A Administração Biden/Kamala, porque
a proximidade das eleições implica alinhar a virtude com as novas
tendências woke e antissemitas que grassam em largas faixas do seu
eleitorado, mesmo ao custo de alienar o seu maior aliado na região e os
interesses americanos e ocidentais a longo prazo.
O Qatar, porque joga em dois
tabuleiros, e é um generoso patrocinador do Hamas e da Irmandade Muçulmana.
O Egipto, que mostrou não ser fiável
ao fazer vista grossa perante as escavações do Hamas, e até colaborou com o
intenso contrabando de armas e todo o tipo de bens para o movimento jihadista
de Gaza.
A Europa – cuja hostilidade crescente
a Israel e aos judeus a leva a financiar galhardamente diversos grupos
anti-israelitas e outros ligados ao terrorismo, sob a capa diáfana de “ajuda
humanitária” – remete-nos para uma das finais declarações aparentemente
alucinadas de Adolfo Hitler: “Passarão os
séculos, mas nas ruínas das nossas cidades e monumentos, renovar-se-á o ódio
contra aqueles que são os verdadeiros responsáveis por isto: o judaísmo
internacional!”.
Só
se enganou no prazo. Não foram precisos séculos, alguns anos bastaram.
Em
suma, toda esta gente repete ipsis verbis, conscientemente ou não, as
posições do movimento terrorista e do seu titereiro iraniano, e verbaliza como
solução exactamente o que estes pretendem: a rendição incondicional de
Israel às exigências do Hamas.
Tendo em conta que é a sua
sobrevivência que está em jogo, deve Israel fazê-lo ou, pelo contrário,
responder de forma a que os seus inimigos vacilem e se contenham?
Qualquer das opções tem consequências, trata-se de uma daquelas decisões onde a
escolha não é entre o mal e o bem, mas entre dois males.
O Hamas é uma
organização terrorista movida pelo ódio, pelo islamismo jihadista, pelo
dinheiro do Qatar, pela simpatia acéfala da esquerda ocidental e pelas armas do
Irão. Procura
obviamente quebrar a vontade dos cidadãos israelitas e forçá-los à submissão,
acreditando que ao infligir dor e medo pode extrair infindáveis concessões. O
seu objectivo final é claro, abertamente declarado e coincidente com o do Irão: a
destruição da “Entidade sionista”, e a expulsão ou submissão dos judeus!
Voltemos ao passado para aprendermos
algo.
Há 13 anos, com aplauso e aclamação,
Israel trocou o soldado Gilad Shalit, preso pelo Hamas, por mais de 1000
jihadistas palestinianos.
Um preço alto, mas que o Estado
de Israel entendeu poder pagar.
Contudo o preço foi muito maior do
que esse.
Um desses jihadistas libertados
chamava-se Yahya Sinwar e é
ainda o líder do Hamas. Os milhares
de israelitas e palestinianos que entretanto morreram nas batalhas e nos actos
de terror, são uma consequência directa dessa troca.
Tal
como o facto de o Hamas ter feito mais de 200 reféns, porque os seus líderes
perceberam a eficácia de tal acto e a extraordinária remuneração que conlevava.
O passado ensina uma lição inescapável: ceder ao terror, é garantir
que ele funciona e o maior incentivo para que volte a acontecer.
Ser inflexível com o terror, é a
maneira certa de Israel tornar caríssimo e inútil o sequestro e morticínio de
israelitas.
Isto não tem a ver só com Israel.
A única forma de os
terroristas em todo o mundo entenderem que as democracias não se curvam perante
o terror é fazendo-os pagar um preço altíssimo por qualquer tentativa. Chama-se
a este processo elementar dissuasão!
Neste momento, perante as reacções de
certos líderes ocidentais e de uma parte da população israelita, que aceita
qualquer acordo que o Hamas queira impor, e sendo aconselhado e apoiado pelo
Qatar, Irão, Rússia, Turquia e China, o Hamas sente que pode assassinar reféns
e continuar a controlar a maior parte de Gaza sem consequências de maior.
Recentemente, o ex-líder
Khaled Mashaal fez um discurso em Istambul, abertamente, na capital de um país
membro da OTAN, anunciando os atentados suicidas como a nova táctica do Hamas.
No Ocidente, a execução dos seis reféns,
motivou umas breves e protocolares palavras de condenação, logo complementadas
com pungentes pedidos de cessar-fogo que colocam o ónus, não no movimento
terrorista, mas em Israel, o que é música para os ouvidos dos aiatolas e dos
líderes jihadistas.
Caso notável e particularmente
escandaloso, tanto quanto sei, e peço desculpa se estiver errado, em Portugal,
nem o Primeiro-Ministro, nem o Presidente da República, nem o Ministro dos
Negócios Estrangeiros se pronunciaram sobre o assassinato dos reféns em
cativeiro, ao contrário de Sanchez, de Macron, mesmo de Borrell, dos governos
de Grécia e Irlanda, e de toda a Europa….
Israel vive a hora do falcão,
a hora das decisões, um daqueles momentos da história dos povos em que as
escolhas podem determinar a sobrevivência ou o desaparecimento. Actualmente executa em Gaza operações de baixa
intensidade, com as unidades posicionadas nos corredores de Netzarim e
Filadélfia. O resto de Gaza é do Hamas, que já perdeu mais de 20 000 homens,
mas está intacto em várias zonas e tem presença noutras, não sendo contestado
internamente por qualquer outra força.
A
Judeia e a Samaria são agora um foco importante da acção do Exército, com o
objectivo de desarticular a infraestrutura terrorista que estava há anos a ser
construída sob os auspícios do Irão, seguindo o modelo de Gaza e do Líbano.
No Norte, continua o standoff com
o Hezbollah, que terá de ser resolvido brevemente, ou a bem ou com uma operação
militar de grande envergadura que pode envolver vários actores. E terá de ser
resolvido porque, na presente situação, Israel não tem soberania total sobre o
seu território, já que uma área importante está à mercê dos mísseis do
Hezbollah, e deserta de dezenas de milhares de habitantes.
Voltando
a Gaza, o Hamas exige que Israel saia dos corredores e da zona tampão de 1 km
de profundidade, a partir da fronteira com Israel, em troca da libertação de
alguns reféns.
Se Israel aceitar um cessar-fogo
nestas condições, o Hamas retomará rapidamente o controlo da fronteira e da
população, o dinheiro do Qatar e dos países ocidentais voltará a fluir para
Gaza, os túneis serão reconstruídos, os mísseis e explosivos entrarão novamente
e, daqui a algum tempo, tudo se repetirá, ainda com mais intensidade e
morticínio.
O ponto moral em questão é: Israel tem o direito de sobreviver como
Estado e impedir futuras tomadas de reféns, ao custo de arriscar a vida dos
reféns actualmente detidos.
Esta é uma escolha que,
emocionalmente, ninguém gostaria de fazer, porque libertar os reféns de hoje
com um resgate exorbitante, encorajará os sequestradores a repetir e amplificar
a estratégia, sequestrando ainda mais reféns. Pode um líder político
fazer esta escolha?
Em teoria, Israel poderia coreografar uma retirada, lograr a
libertação de todos os reféns e, logo após, retomar os seus objectivos
estratégicos.
Mas para isso necessitaria de um
pretexto, já que num mundo com regras pacta
sunt servanda, e Israel não tem nada a ganhar se destruir o capital de
confiança que torna possíveis as relações amigáveis entre Estados.
É por todas estas razões que aquilo
que Tiago André Lopes adjectiva desdenhosamente de “finca-pé” de Netanyahu, é
tão só o exercício da mais elementar racionalidade que, infelizmente, vai
escasseando em algumas lideranças ocidentais, porventura porque tardam a
perceber, apesar de a guerra lhes estar ruidosamente a bater às portas, que o
mundo real não é um pacífico condomínio kantiano, mas um perigoso universo
hobbesiano, onde o homem continua a ser o lobo do homem.
ISRAEL MÉDIO
ORIENTE MUNDO TERRORISMO
COMENTÁRIOS(de 5):
Manuel Abreu: Bravo.
Haja uma voz lúcida sobre esta matéria
Rui Sampaio Nunes: Excelente artigo. Estou 100% de acordo.
A visão simplista, populista e demagoga que varre
o Ocidente tem de acabar. É com artigos destes que explicam a realidade dos
factos que se pode contribuir para isso. Pela minha parte já compartilhei o artigo no FaceBook e no WhatsApp.
Muitos parabéns ao articulista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário