Reivindicações,
aparentemente, sem razão de ser. O costume? Não havia necessidade…
Moedas
compra crise com oposição e compromete Governo
Moedas
sugeriu uma mudança estrutural nas funções da Polícia Municipal, mas Governo,
Rui Moreira e oposição levantaram reservas. Entretanto, esclarecimentos do
autarca apontam noutro sentido.
MIGUEL SANTOS
CARRAPATOSO: Texto
OBSERVADOR, 25
set. 2024, 22:4711
O objectivo era anunciar uma “grande mudança de filosofia” na
política de segurança de Lisboa. No entanto, transformou-se rapidamente num caso
bicudo, com Carlos Moedas no centro do furacão e Governo, Rui Moreira e
oposição autárquica metidos ao barulho. Tudo
somado, a “ordem” que Moedas disse ter dado há um ano para que a Polícia
Municipal detivesse suspeitos pode não ter sido afinal uma ordem e também pode
não ter surtido qualquer efeito. Ao mesmo tempo, a intenção de Moedas
seria, afinal, muito menos abrangente do que se supunha — e, mesmo assim, há
quem entenda que a lei já a prevê. No meio de tudo isto, a ministra Margarida Blasco, que torceu o nariz à ideia de Moedas,
arrisca-se a ter de ir ao Parlamento de urgência explicar o que se passa.
A polémica começou na segunda-feira. Em
declarações à SIC Notícias, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa afirmou
que tinha dado “ordem” ao comandante
da Polícia Municipal para fazer detenções e que “essas detenções já estão a
acontecer”. Mesmo sublinhando que existem “questões jurídicas” a tratar
com o Ministério da Administração Interna, o
autarca defendia a posição da Câmara: “Tem sido uma grande mudança na filosofia de
actuar na cidade.” Um dia depois, na terça-feira, Carlos Moedas
acrescentaria um novo dado: essa
orientação tinha sido dada há um ano ao comandante da Polícia
Municipal.
O Observador procurou perceber o porquê
de a tal “ordem” a que Moedas se referiu ter sido dada “há um ano” e só agora a
autarquia estar a pedir uma “clarificação jurídica” ao Governo. O motivo estará relacionado com o próprio
calendário político: António Costa demitiu-se em novembro de 2023, as eleições
legislativas foram em março deste ano e a ministra está em funções há
relativamente pouco tempo. Esta sequência de eventos terá tornado difícil dar a
pretendida celeridade à clarificação da lei, ainda que Moedas tenha
admitido já ter levado a questão a José Luís Carneiro, na altura em que o
socialista tutelava as polícias.
Ainda assim, segundo apurou o Observador
junto de fontes da Polícia Municipal, nada de substancial mudou na
atuação daquela polícia ao longo deste último ano — e há mesmo quem questione o
facto de Moedas ter dado ou não uma “ordem”. Isto porque continua a ser
entendimento da Polícia Municipal que os agentes estão impedidos de fazer uma
detenção porque não está nas suas competências — o que podem fazer, sim, é “entregar
sob detenção” às autoridades competentes (previsivelmente, à PSP ou à GNR)
alguém que seja apanhado a cometer um crime.
A
diferença nos termos aqui é relevante. Exemplo prático: quando um agente da
Polícia Municipal intercepta alguém a cometer um crime pode deter essa
pessoa, mas tem de pedir a intervenção da PSP. Porque, de
acordo com a interpretação que é feita da lei, esse agente está impedido de colocar a pessoa num carro da
própria Polícia Municipal e de a transportar até a uma esquadra da PSP. É por
isso que se diz que a Polícia Municipal está autorizada a “entregar sob
detenção” e não a fazer uma “detenção”.
De acordo com decreto-Lei n.º 13/2017, de 26 de
janeiro, que regula o regime especial das polícias municipais de Lisboa e do
Porto, esta força policial tem competência para proceder à "detenção e
entrega imediata, a autoridade judiciária ou a entidade policial, de suspeitos
de crime punível com pena de prisão, em caso de flagrante delito, nos termos da
lei processual penal"
“O Presidente
da Câmara não dá ordens para deter”
Ora,
se as declarações iniciais de Carlos Moedas pareciam ter um alcance muito mais
abrangente, as de hoje, quarta-feira, são mais limitativas. Inicialmente — e
foi essa a interpretação da oposição na Câmara, mas também de figuras
como Rui Moreira, presidente da Câmara do Porto. Moedas estaria a
defender, por exemplo, que a Polícia Municipal, que tem, segundo a lei, uma
vocação essencialmente administrativa, pudesse passar a dar sequência a um
determinado processo, ir buscar suspeitos a casa ou a conduzir uma
investigação criminal. A ideia do autarca é esta: se é certo que os agentes da Polícia Municipal de Lisboa (tal como
os do Porto) são ‘recrutados’ na PSP, então não há motivo para que não possam
fazer o mesmo que um agente da PSP faz quando identifica a prática de um crime
— deter e conduzir à esquadra para identificação. “A PSP e a Polícia Municipal
têm de trabalhar lado a lado, até porque ambos são PSP. Eu digo isso há dois
anos”, sublinhou esta terça-feira.
“Sou muito a favor do Estado moderno — que tem
o monopólio do uso da força, quer na defesa das fronteiras quer na segurança
interna. E isso não pode ser distribuído através de 308 municípios, não faz
sentido nenhum. Nem que houvesse regionalização estaria de acordo em que se
descentralizasse essa competência. Porque senão estamos a avançar para o modelo
americano dos xerifes. Ou vamos ter um exército privado também”, reagiu Rui
Moreira, em declarações ao Diário de Notícias.
Esta quarta-feira, Carlos Moedas, na já
referida reunião da Câmara, disse uma coisa diferente: “Ninguém percebe, e todos devíamos lutar
para mudar a lei, que um polícia municipal apanhe alguém que está a roubar na
rua e que tenha de ficar à espera de um PSP [Polícia Segurança
Pública] para poder levar essa pessoa para a esquadra“, explicou. Esta primeira
ideia está em linha com o que se passa no terreno, como confirmou o Observador
juntos de agentes da Polícia Municipal.
No entanto, na mesma intervenção, Moedas
acrescentou outro argumento: “Se um
Polícia Municipal vir alguém a roubar na rua, que [o] detenha — claro que dei
essa ordem. É a minha função como presidente da Câmara”. Esta afirmação
levanta dois problemas: em primeiro
lugar, a lei já autoriza um agente da Polícia Municipal a deter,
identificar e revistar alguém que seja apanhado a cometer um crime — os agentes
não estão obrigados a ficar a assistir passivamente a um crime em
curso.
Em
segundo lugar, são os próprios agentes a questionar o facto de Moedas ter dado
uma “ordem” para actuar nessas circunstâncias — até porque já o fazem. “O
Presidente da Câmara não dá ordens para deter. Quem dá ordens é a
lei. Os polícias, os órgãos de polícia criminal, as polícias municipais, seja
quem for, quando faz as detenções, faz porque deteta um crime em flagrante
delito. Porque é assim que a lei o obriga“, afirmou Pedro Oliveira, do Sindicato dos Polícias
Municipais, em declarações à Rádio Renascença.
Esta quarta-feira, em reunião de Câmara, tendo
sempre como pano de fundo o aumento da insegurança em Lisboa, Moedas voltou a
dizer que era incompreensível que a Polícia Municipal "não pudesse actuar
num caso de um assalto". Esta
afirmação não está inteiramente correcta: um agente da Polícia Municipal que
assista a um assalto tem competência e obrigação de actuar.
Lei já prevê e obriga Polícia Municipal a actuar em
flagrante delito
A afirmação de Pedro Oliveira tem
sustentação legal. De acordo com decreto-Lei n.º 13/2017, de 26 de janeiro, que
regula o regime especial das polícias municipais de Lisboa e do Porto, esta força policial tem competência para
proceder à “detenção e entrega imediata, a autoridade judiciária ou a
entidade policial, de suspeitos de crime punível com pena de prisão, em caso
de flagrante delito, nos termos da lei processual penal”.
Portanto,
para todos os efeitos, a Polícia Municipal tem competência e obrigação
legal de entregar sob detenção qualquer suspeito apanhado em flagrante
delito às autoridades competentes (daí a expressão “entrega imediata” inscrita
na lei). Qualquer agente que extravase essas funções pode incorrer num crime
de sequestro, abuso de poder e detenção ilegal, e toda a operação pode ser
considerada nula pelo Ministério Público.
De resto, foi essa a reacção do
Ministério da Administração Interna (MAI) ao pedido público de Carlos Moedas.
Numa nota enviada a vários órgãos de comunicação social, o gabinete de Margarida
Blasco informou que as questões levantadas pelo autarca “estão previstas na
lei aplicável”. Apesar de tudo,
acrescentava fonte oficial do MAI, a “matéria está a ser analisada do ponto de
vista técnico-jurídico”. O Bloco de Esquerda já veio exigir uma audição
parlamentar com carácter de urgência da ministra da Administra
Interna.
Ou seja, genericamente, tanto o Governo,
como Rui Moreira (a Polícia Municipal tem regimes especiais para as cidades do
Porto e de Lisboa, daí a reacção do portuense ser tão relevante) e a oposição
autárquica a Carlos Moedas (o PS acusou o social-democrata de desconhecer a
lei, tal como o BE e o PCP) entendem que a lei-quadro da Polícia Municipal é
suficientemente clara e não deve ser alterada. Aliás, há quem argumente que uma eventual alteração do regulamento
municipal seria suficiente para dissipar qualquer dúvida que pudesse
existir.
De acordo com este regulamento, aprovado
em 2018, a Polícia Municipal tem como competência, entre outras coisas, “cooperar na manutenção da tranquilidade
pública e na protecção da comunidade local, exercendo funções
de segurança pública, na vigilância de espaços públicos ou abertos ao
público”. Também se diz que “os
casos omissos e as dúvidas suscitadas na aplicação do presente regulamento
serão resolvidas pelo Presidente da Câmara, mediante parecer fundamentado do
Comandante da Polícia Municipal”.
Atendendo a isto, entre a oposição a
Carlos Moedas na Câmara de Lisboa, há quem defenda que uma alteração ao
regulamento — que teria de ser necessariamente aprovada com votos de uma
maioria que o autarca não tem — seria suficiente para sanar qualquer
dúvida que pudesse subsistir. Ao Observador, fonte do executivo de Moedas
defende que não, que uma simples alteração ao regulamento não deverá ser
suficiente quando existe uma lei que
não é suficientemente clara.
Depois, e este argumento também é
utilizado, uma vez que a Polícia
Municipal tem sempre de pedir a intervenção da PSP no local, existe, no fundo,
uma duplicação de recursos. Se,
como pretende o autarca, a Polícia Municipal pudesse fazer uma detenção no
sentido mais literal do termo, a PSP seria dispensada de se deslocar ao local e
de transportar o suspeito até a uma esquadra.
Este argumento tem sido rebatido publicamente
pelos sindicatos da PSP ou, por exemplo, por Rui Moreira: a Polícia Municipal
foi criada, essencialmente, para libertar a PSP do trabalho
administrativo e de fiscalização; não para se subsistir à PSP em matéria
criminal.
Existe também um plano político. Há
muito que Carlos Moedas vem defendendo um reforço da segurança em Lisboa,
criticando a falta de agentes da PSP e da Polícia Municipal. Segundo apurou o Observador, o presidente
da Câmara Municipal entende que, perante a insuficiente presença de
agentes da PSP na rua, a Polícia Municipal deve ser mais proactiva, ter
mais visibilidade na cidade e actuar sempre que esteja em causa a segurança dos
cidadãos.
Esta quarta-feira, na mesma reunião da
Câmara, tendo sempre como pano de fundo o aumento
da insegurança em Lisboa, Moedas voltou a dizer que era incompreensível que a
Polícia Municipal “não pudesse actuar num caso de um assalto”. Mais
uma vez, esta afirmação não está inteiramente correcta: um agente da
Polícia Municipal que assista a um assalto tem competência e obrigação de actuar.
Apesar das dúvidas, e até ao momento, o autarca não esclareceu que tipo de
clarificação jurídica pretende junto do Governo.
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MONTENEGRO
COMENTÁRIOS (de 11)
Tem Dias: Como alguém
diz, a questão é simples: "a entrega imediata" significa que tem de
entregar no local a um PSP ou pode entregar directamente numa esquadra? Se a
PSP não tem meios e demora a chegar ao local, entrega imediata pode passar pela
Polícia Municipal levar uma pessoa presa em flagrante delito a uma esquadra.
Tudo isto é fogo de vista serve para atacar Moedas em Lisboa que a oposição
está a ver que vai sair reforçado Nuno
Silva: Todo este
problema, porque.... não há polícias (PSP) que cheguem. E não há por várias
razões: a carreira não é atractiva e os polícias não podem agir, porque são
logo sujeitos a processos disciplinares. Não possuem autoridade. Quem vai para
a Polícia Municipal, poderia ter logo concorrido à PSP, não o fez porquê? Menos
responsabilidade e menos risco. Já agora, querem colocar a PM a exercer funções
de polícia criminal (não é possível, porque a lei que regulamenta o sector, não
permite), e depois o carcanhol? O pilim? Também vão receber mais? Um político
(Carlos Moedas) que de bota cardada, quer pisotear a lei que regula as
polícias. Ainda- por cima, depois de toda a gente ter visto a forma como a
polícia foi tratada nas negociações do subsídio de risco. Pouco € e uma grande
parte vai-se na retenção dos impostos. O Costa quis dar guito à PJ, porque deve
ter alguns amigos naquela corporação. Se não tem para pagar decentemente, ia
agora ter para pagar mais aos PM? Contratem é mais polícias e de preferência
com melhores ordenados e mais autoridade pública. E não esta bandalheira onde o
PR vai tirar fotos com os bandidos e se esquece da polícia. Só estão a colher
aquilo que plantaram. É tudo uma questão de "sensações"!! Manuel
Gonçalves: No fundo a
questão é simples: a Polícia Municipal deve ou não levar o detido à esquadra? A
lei pode ter a redacção que tiver, eventualmente devendo ser alterada, mas
parece um absurdo que a PM não o possa fazer - os cidadãos não andam com
paciência para Rodriguinhos face à criminalidade. N A: Mal explicado. São polícias, mas só passam multas? É
isso? Querem segurança ou não. Tchiii Mário Costa: Só não entendo é o porquê de chamarem de Polícia a um
conjunto de pessoas que não têm essa função Para mim, polícia é polícia, não é
segurança da Câmara... E têm arma distribuída ou não? Eu até compreendo a
necessidade do Moedas em disciplinar o pagode indisciplinado Eu há dias até
sonhei que ele tinha ido à noite para os copos com o Ventura, e o Venenoso o
picou... Moedas, afasta-te dessas companhias... João Pedro Valente:
Este Moedas gosta de encher o peito de
ar e armar-se em forte. Depois choca de frente com a realidade e esvazia-se
logo. Não me esqueço da ciclovia da Almirante Reis que ele em campanha disse que ia retirar. Ainda lá está. Não volta a
ter o meu voto. Paulo
Nunes: Belo molho de
brócolos na cabeça do Presidente. Confirma-se
o que eu dizia no início desta conversa: ou há várias polícias para as mesmas
funções e há que as fundir rapidamente, ou têm funções distintas e não há nada
que ter funções de polícia, a não ser que seja a detenção normal, que até por
civil pode ser feita. Houve algum júbilo pela vitória de Moedas, que
libertou a cidade de anos de morte lenta, mas está a desiludir em toda a
linha... unknown
unknown: Há aqui mais
qualquer coisa não explicada! Não creio que o Moedas levante a questão sem
haver um qualquer objectivo a atingir! Joaquim Rodrigues: Mais um "ingrediente" para acrescentar à
"grande caldeirada" em que se transformaram as "Forças de
Segurança" em Portugal que, como em quase tudo o resto, quando comparado
com os restantes Países da UE, são exemplos de má organização
político-administrativa e de má Governação. O Sr. Moedas,
em vez de tomar iniciativas de relevo na Governação de Lisboa, que contribuam
para o prestígio do PSD, para se mostrar (e não aparecer nos Jornais e
Televisões, apenas e só, quando é levado, de mão dada, pelo Marcelo), toma iniciativas
que só contribuem para arranjar problemas ao PSD e à sua Direcção Política. É
absolutamente lamentável
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