Refiro-me ao título da crónica de Nuno Crato, que coloca a Educação numa encruzilhada, mas que, afinal, também contribui
para ela – a encruzilhada – ao escrever segundo o AO90 que,
mais do que nunca, acentua o carácter artificial de um pobre país sem educação
e sem rumo que sirva. Com a Regionalização, então, será um “ver se te avias” de
fantochada educativa, cada uma das regiões impondo as suas normas pedagógicas, certamente, de
acordo com o bestunto dos seus mandantes. Mas prefiro ler os comentários, de
sentenças segundo as cabeças de cada um. Uma boa distracção.
OPINIÃO
A Educação numa encruzilhada?
Os resultados do PISA mostram-nos um copo meio vazio ou meio cheio,
conforme as perspetivas. Mas o que realmente importa é saber se o vamos
continuar a encher ou se o começamos a esvaziar.
NUNO CRATO
PÚBLICO, 10 de Dezembro de
2019
“Pode dizer-me, por
favor, o caminho que devo tomar?”
“Depende de para onde quer ir,” disse o Gato.
“Isso não me importa,” disse Alice.
“Então não interessa o caminho,” disse o Gato.
Lewis Carroll, Alice no País das Maravilhas
“Depende de para onde quer ir,” disse o Gato.
“Isso não me importa,” disse Alice.
“Então não interessa o caminho,” disse o Gato.
Lewis Carroll, Alice no País das Maravilhas
Quem no princípio do nosso século participava nos debates sobre
educação, ou quem começava a segui-los, lembra-se de reacções contraditórias
por parte dos actores da altura. Foi entre 1996 e 1998 que foram divulgados e
debatidos os resultados do primeiro estudo TIMSS (Trends in International
Mathematics and Science Study), realizado em 1995; e foi em 2001 que
surgiram os resultados
do primeiro PISA (Program for International Student Assessment),
de 2000.
Os que preconizavam um ensino mais rigoroso salientavam, com toda a
razão, a lástima que era, nas avaliações TIMSS, estarmos no fim da tabela, com
apenas dois países pior colocados do que nós a Matemática, e, no PISA, apenas
com quatro países pior colocados do que nós a Matemática, cinco a Literacia e
três a Ciências.
Muitos dos que estavam envolvidos política ou administrativamente na
direcção do sistema educativo, nomeadamente vários responsáveis políticos,
muitos professores de departamentos de educação, consultores e conselheiros
nacionais de educação tinham a posição oposta: desvalorizavam os resultados,
diziam que os estudos internacionais padeciam de uma forma “redutora de ver a
educação” e que não somos “nem piores nem melhores do que outras regiões” (ver
citações no meu O ‘Eduquês’ em Discurso Directo, Gradiva, 2006,
pp. 21-27).
Felizmente, o país não negou a evidência e pôs mãos à
obra para inverter os resultados. Durante mais de uma década, sobretudo a
partir de 2002, o país fez um esforço consciente para dar atenção aos
resultados, sobretudo a Português e a Matemática, e para os melhorar, elevando
os conhecimentos e a 2004formação dos alunos.
Em 2004 foram instituídos exames no final do ano
terminal da escolaridade obrigatória da altura (9.º ano) a Português e
Matemática, realizados em 2006. Foram criados programas de acção especiais para
essas duas disciplinas. Em 2007 foi criado um sistema de avaliação externa, de
melhoria e creditação dos manuais escolares. Em 2010 deram-se os primeiros
passos para estabelecer Metas, com o objetivo de clarificar os tópicos mais
importantes de cada disciplina, e em 2012 foram estabelecidas Metas
Curriculares, mais rigorosas e sequenciais, referências claras para o ensino e
a avaliação, e foram aperfeiçoados alguns programas. Na altura, iniciaram-se as Provas Finais,
primeiro no 6.º e depois no 4.º ano de escolaridade. Ou seja, durante mais
de uma década, pelo menos cinco ministros, de diferentes partidos e
orientações, prosseguiram uma actividade continuada de maior atenção aos
resultados, de maior rigor nos programas e na avaliação, de aperfeiçoamento dos
materiais de estudo.
Chegámos a 2015 e tivemos avaliações nos programas
TIMSS e PISA que nos revelaram os melhores resultados de sempre.
Não só em Matemática do 4.º ano superámos a então mítica Finlândia, deixando 36
países abaixo da tabela, como os jovens de 15 anos ultrapassaram pela primeira
vez a média da OCDE, despertando as atenções da comunidade internacional para o
nosso país.
Tudo isto aconteceu após os anos duros de 2011 a 2015,
durante os quais, além das dificuldades financeiras e sociais que vivemos, o
sistema educativo teve objcetivos curriculares mais exigentes e teve de se
alargar. A uma maior exigência curricular somaram-se outras responsabilidades.
A escolaridade obrigatória estendeu-se do 9.º para o 12.º ano, e foi
introduzido o Inglês obrigatório – que não o era na altura em nenhum ano de
escolaridade –, logo a partir do 3.º ano e durante sete anos de escolaridade
consecutivos. Não há dúvidas de que o nosso país, os nossos professores, alunos
e famílias conseguiram um avanço notável.
Após algumas hesitações, a educação no nosso país mudou o
seu caminho. Depois de serem
abolidas as Provas Finais de 4.º e 6.º ano, interrompeu-se a
avaliação e creditação de manuais e começou uma nova fase, em que o foco da flexibilidade
curricular foi alterado. Na realidade, essa flexibilidade, e também a
25% dos tempos e matérias, já tinha sido estabelecida em 2014, mas
na altura com avaliações finais e com a obrigatoriedade de cumprir as metas
para as matérias estruturantes. Agora a flexibilidade curricular foi outra. Já
não se trata de as escolas seguirem as suas opções para melhor ensinar as
matérias fundamentais, trata-se de abandonar os objetivos cognitivos claros, de
abandonar a sua avaliação e permitir que os programas sejam adaptados e
reduzidos pelas escolas, conforme as características dos seus alunos e as
opiniões dos seus professores.
Quando não se traçam e conhecem objcetivos cognitivos e não se avalia o
seu alcance pelos alunos, não importa o caminho. Mas os resultados não serão
famosos. Foi o que se passou com a Finlândia a partir de 2003-2006:
flexibilidade curricular, menosprezo pelos currículos e pela estrutura das
disciplinas, predomínio do ensino por projectos, menor avaliação, mais
felicidade… Os efeitos estão à vista. O país que, graças a uma atenção muito
grande aos avanços no conhecimento dos alunos, tinha obtido excelentes
resultados, passou de país modelo a país em decadência educativa acelerada.
Não será um bom caminho.
É curioso que a
flexibilidade, o menosprezo pela avaliação externa e o desinteresse pela
exigência dos manuais escolares seja apresentado como forma de reduzir as
desigualdades educativas. Não:
é exatamente o contrário. Portugal foi citado no relatório oficial do PISA 2015
como sendo um dos raros (2) países/regiões que conseguiram simultaneamente
melhorar os resultados globais e reduzir o número de alunos considerados “low
performers” (vol. 1, p. 266).
Infelizmente, as percentagens de alunos com extremas
dificuldades, que de 2012 para 2015 tinham melhorado em todos os três domínios
do PISA, agravaram-se de 2015 para 2018. Os alunos
com extremas insuficiências passaram de 17,4% para 20,2% em Ciências, de 23,8%
para 23,3%, em Matemática, o que é uma ligeira melhoria, e de 17,2% para 19,6%
em Literacia. São números extremamente preocupantes. Há ainda muito a fazer
para melhorar a educação no nosso país, sobretudo dos alunos mais desfavorecidos.
Por isso é tão importante a atenção à leitura, logo no princípio da
escolaridade. Como é logo de seguida importante a atenção à matemática, às
ciências, à história, à geografia, às artes, à literatura, ao conhecimento.
Se o ano de 2015 obteve os melhores resultados de sempre, o
ano de 2018 revelou uma estagnação, acompanhada do aumento das desigualdades. A
nossa encruzilhada é clara para todos os que defendem a importância do conhecimento
e da formação exigente dos jovens. Vamos seguir o caminho da Finlândia e
iniciar uma trajetória descendente ou vamos rumar para o futuro? Para quem sabe
onde quer chegar, o caminho importa.
Professor Catedrático de Matemática e Estatística na Universidade de
Lisboa
COMENTÁRIOS:
Rafael Nunes: Onde fica a Finlândia... Alguém que me
diga em História de educação o que acontece quando uma escola como a existência
da escola da Ponte fez por Portugal... Poderão explicar para que servem os
exames se porventura...as cábulas também existem... Nunca entendi o que é
melhor um ser humano feliz ou um humano que complexo mas sem orientação. São
números apresentados... Agora digam me lá se um jovem com o 12º ano feito com
média a 20 valores que vem do secundário, o que é que ele faz
profissionalmente... O ensino profissional tem uma mais valia a 100% aqui. Para
que serve a retenção ou chumbo se na época deste senhor e em toda essa década
agravou... A criança é porventura escutada...pois só os é que falam... Uma educação
para o séc XXI Sem palhaços do século XX...seria uma bomba...
mzeabranches, 10.12.2019: Foi com Nuno Crato, então Ministro
da Educação, que o linguística, democrática e politicamente indefensável Acordo
Ortográfico de 1990 foi imposto no ensino, num governo do PSD e do CDS, que se
empenhou em aplicar a Resolução do Conselho de Ministros de José Sócrates
n.º8/2011. E isto sem discussão, sem debate, submissamente, como se a língua
que estrutura, suporta e veicula todo o conhecimento fosse algo de
insignificante e desprezível! E continua a escrever com o AO90! Tinha lido, em tempos, o seu livro sobre
o "eduquês", e vi a minha esperança defraudada, ao confirmar-se o já
habitual: não adianta ter ideias, concepções, projectos - uma vez no poder,
esquece-se tudo e segue-se a 'cartilha' imposta politicamente no momento!...
FzD, 10.12.2019: Infelizmente tudo indica que já não
estamos na encruzilhada e a inversão está em marcha cada vez mais acelerada.
ALRB,
10.12.2019 A
julgar pela frequência de reformas no ensino parece-me que o ensino está numa
encruzilhada (eufemismo de baralhada) desde há muito, muito tempo. E não me
parece que possamos sair dela já que o anterior governo do Costa quis
introduzir a novidade de se fazerem reformas a meio do ano lectivo.
viana, 10.12.2019 16:27
Só a mentir e a enganar o pacóvio é que o Crato se safa. Pro
aqui se vê o "rigor", a "coerência", a
"honestidade" intelectual dum professor catedrático de matemática.
Porque é preciso ter lata para puxar os galões relativamente os resultados do
PISA em 2015, quando as suas "reformas" pouco impacto tinham tido no
percurso escolar dos alunos avaliados então, e associar os resultados do PISA
em 2019 às alterações feitas pelo anterior governo, quando os alunos avaliados
agora fizeram a maior parte do seu percurso escolar sob o efeito das suas
"reformas". Não tem um pingo de vergonha. Também não menciona que,
entre 2007 e 2019, o governo finlandês esteve quase sempre sob domínio de
partidos de Direita, que entre outras "reformas", cortaram 1.5 mil
milhões de euros no orçamento da Educação.
João Martins. 10.12.2019: Pingo de vergonha não tens tu. Em três
anos, o percurso de um aluno é muito alterável. como não deves saber, até num
ano lectivo se consegue que um aluno passe de sofrível para excelente. E já
agora, o Crato elogia os governos ps anteriores, pelo menos no tema do artigo:
"durante mais de uma década..." Aprende a ler e reconhece a
evidência: O PS desde 2015 tem vindo a estragar o trabalho feito nesta matéria
pelos governos anteriores (desde Guterres inclusivé....). Quem não tem
honestidade intelectual és tu, pá!
FzD,
10.12.2019: Comentário miserável e que só pode ter
sido escrito por alguém extremamente ignorante e mal educado.
viana, 10.12.2019: João Martins, o Crato "gostou
tanto" do que os governos anteriores fizerem que fartou-se de os criticar
antes de chegar ao governo (e foi isso que Passos o lá colocou). E depois de
chegar ao governo implementou a maior alteração de procedimentos em décadas.
Portanto, só um ingénuo é que não percebe que esse "elogio" a
governos anteriores é apenas uma manobra de retórica para parecer
"politicamente neutro". Há patos que gostam de cair em ratoeiras...
Passar um aluno de sofrivel para excelente num ano lectivo só se for numa
"boa" escola privada! Mais um papagaio que não sabe pensar pela sua
propria cabeça. Leia o artigo "Políticas de Nuno Crato em exame no PISA
2018" publicado neste jornal *antes* dos resultados serem conhecidos.
Informe-se antes de comentar.
DCM, 10.12.2019: Neste momento e sobre este assunto ,
durante o debate parlamentar que está a dar em directo, A. Costa já respondeu à
arranhadela sensata de R. Rio explicando qual o caminho que a Alice deve seguir
.
DNG, 10.12.2019: Super Crato ainda opina...
Coletivo Criatura, 10.12.2019: E conseguiu dizer isto tudo sem citar a
frase infeliz do ministro que o culpava dos resultados deste ano! Parabéns!
mário borges, 10.12.2019: Barbaridades como: “um maior nº de alunos
por turma cria melhores condições de aprendizagem!” "Acho que o dr. Passos
é um herói nacional." Ou ter feito 7, repito 7 alterações curriculares
durante 4 anos de desgovernação!!! As mesmas que nos 10 anos anteriores. Cursos
vocacionais no ensino básico! Introdução de exames na 4ª classe! Ai que
saudades das cratinices do cRato...
Raquel Azulay, 10.12.2019: O Gato é um bicho sensato. V Exa bem
tentou pôr ordem na educação. Que diferença abismal. Uma vergonha. Um país sem
norte-
Manuel AR, 10.12.2019: Um regresso ao passado romântico do ensino clássico com
Nuno Crato. Fã do ensino e não da aprendizagem, fã do "magister
dixit", fã da absorção de matérias pelos alunos sem espírito crítico. Nuno
Crato do ensino da matemática generaliza o seu ideário de professor a todas as
unidades curriculares. Hoje o ensino já não é o quer era antes, como o de entra
porco e saem chouriços. Meninos de bata branca entram na escola e, no final
saem todos em fila e os exames ditavam quem deveria ir para o talho ou para a
vida social.
Sima Qian, 10.12.2019: O seu comentário é vago, cheio de preconceitos e de um
bipolarismo redutor. Não há ensino separado de aprendizagem. Você não explica
como é o ensino de hoje e que ele tem de bom.
Raquel Azulay, 10.12.2019: Manuel > tretas. falam do caso finlandês sem o
perceber. na Finlandia, a educação a sério começa na creche. em Portugal é
outra história, completamente diferente. eu adoro esta do "espirito
crítico"...como é que se pode desenvolver o espirito critico sem a
possibilidade de avaliar se o aluno compreendeu o que leu, ou seja, sem avaliar
de forma rigorosa???
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