“dos espertos regatinhos que
fugiam, rindo com os seixos, dentre as patas da égua e do burro” dos tempos
do Jacinto e do Zé Fernandes, porquanto a água de hoje é mais à
base de químicos purificadores, já não merecendo o provérbio do título acima.
Mas o discurso de Vasco
Pulido Valente é assim, de provérbio ido – claro, directo, risonho
por desprezo, severo por ânsia correctiva, clarividente, percuciente,
sintético, na sua viagem pela Terra, que é a de todos nós, graças aos veleiros
de outrora e às aeronaves de agora, os últimos dos quais - e os primeiros também,
por já na sucata - a nossa Greta despreza, contaminada pelos zunzuns
politiqueiros, sem reparar nos contrassensos dessas passeatas que faz, ao
abrigo dos tais zunzuns...
CRÓNICA
Diário
A menina Greta veio agora à vela de Nova Iorque. E como tinha de fazer
escala em Lisboa, provocou, naturalmente, uma crise de nervos nacional.
VASCO PULIDO VALENTE
PÚBLICO, 7 de Dezembro de
2019
A menina Greta veio agora à vela de Nova Iorque,
para não sujar o planeta e para convencer os milhões de pessoas que todos os
dias atravessam o Atlântico que esse é o método mais prático e seguro de
viajar. A propósito, o destino da menina Greta é Madrid.
E como tinha de fazer escala em Lisboa, provocou, naturalmente, uma
crise de nervos nacional. O senhor Presidente da República explicou em
pormenor por que razão
não tencionava recebê-la com muitas selfies e um
discurso no Cais de Alcântara. O senhor presidente da Câmara de Lisboa já prometeu
oratória e beijinhos. O senhor ministro do Ambiente teve um espasmo
de alegria e virtude. E não há quem os agarre.
1 de Dezembro: O 1.º de Dezembro é uma data curiosa. Começou por
ser o emblema da casa de Bragança: um emblema dinástico e não um emblema
nacional. Foi também, depois, o
hino do constitucionalismo monárquico, escrito por D. Pedro IV num acesso de
lirismo imperial. Durante
a República tornou-se numa festa da resistência monárquica. Hoje em dia, não se sabe porquê, o Estado
democrático resolveu juntar-lhe o hino da Patuleia, que 35 bandas tocaram
misteriosamente nos Restauradores.
Claro que Marcelo não se meteu nesta trapalhada: ajuizadamente entrou mudo e saiu calado
nas cerimónias oficiais. Deixou a idiotia retórica a Siza Vieira e Fernando Medina.
2 de Dezembro: A NATO perdeu todo o sentido, desde que
Trump foi eleito para a presidência dos Estados Unidos e declarou que o seu
principal interesse estava no Pacífico. E
está: a Rússia ainda tem uma máquina de guerra capaz de intimidar
qualquer um, mas tem uma economia frágil, atrasada e muito pequena – por esse
lado, não inquieta ninguém. Quando caiu o muro de Berlim, caíram também os
argumentos que justificavam uma aliança da América com a Europa. Para a América, essa aliança era só uma despesa;
para a Europa acabou por ser a condição da sua prosperidade. Durante o império soviético a Europa viveu tranquila
sob o guarda-chuva americano e hoje nem sequer gasta 2% do PIB em sua defesa.
Não admira que Trump ande por aí a fazer desacatos. Os problemas que ele tem com a Ucrânia são outros.
E não passa pela cabeça de Putin arrasar o mundo pelo prazer de mandar na
Bulgária ou na Letónia; nem sequer pelo prazer de mandar num bocado da Ucrânia. A arrogância da América e da Rússia face à
Europa assenta nesta verdade primária: a Europa é uma personagem
gratuitamente acrescentada ao quadro.
4 de Dezembro: Os candidatos à “liderança” do PSD insultaram-se
entusiasticamente mostrando a mediocridade de todos eles – o
que se previa. O que
não se previa é que, discutindo o partido com um ar sabedor, nenhum deles se
tivesse referido à Igreja Católica Apostólica Romana. É como se ela nunca tivesse
existido, nunca se tivesse importado com as peripécias do casamento de Sá
Carneiro e não fosse, nos primeiros anos do regime, uma força decisiva em
qualquer eleição.
Colunista
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