domingo, 15 de dezembro de 2019

É caso para dizer


Gato escondido com o rabo de fora. Um discurso viciado, naturalmente, este feito de dados  informativos de um governo coxo, que martela e atamanca, longe da realidade,  bem mais tenebrosa, do que a que aquele pretende garantir, com as exportações em regressão, como essa do calçado e dos tecidos, que o meu parco saber fixou, mais as dos ameaços frequentes. Salles da Fonseca explica, na forma desempoeirada que lhe permitem os seus Estudos de Economia...

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO,  14.12.19
«Si j’avais un marteau» - assim cantava Claude François nos idos de já não sei quando do século passado. Mas o Dr. Centeno tem-no e martela que se farta nestes prolegómenos do Orçamento do Estado para 2020 que se prepara para convencer o Parlamento a dar à luz.
Foi logo aos primeiros alvores da «temporada orçamental» que gostei de saber que o Governo – pela boca do Ministro das Finanças - anunciava o objectivo de um saldo positivo de 0,12% mas, passada a primeira impressão, logo me perguntei até que ponto estava a ir com a minha candura. Estava a ser wishful thinking, a sonhar acordado.
Esquecia-me de que a esquerda – génese do Governo e de quem o apoia – pensa mais na distribuição da riqueza do que na sua produção, donde resulta que o equilíbrio das contas públicas se deve fazer sobretudo à custa da receita e nunca pela via da redução da despesa.
Estava-me a esquecer de que a suborçamentação da despesa é uma manobra incompatível com a verdade do azeite e, na conjuntura política, incompatível com o apoio parlamentar de que o Governo carece para ver o «seu» Orçamento passar.
Estava-me a esquecer de que os membros do Governo usam a boca para apregoarem políticas de esquerda mas que, confrontados com as realidades, lhes fogem as cabeças para a direita, ou seja, para a austeridade que dizem ser maligna mas que sabem ser imprescindível.
Estava-me a esquecer de que o Governo não tem base política para introduzir as correcções estruturais – que nega mas que sabe necessárias - no SNS nem acabar com a persistente sovietização da educação.
Por tudo isto e por mais alguns pontos em cujo esquecimento eu esteja a persistir, não vejo que o tal superávite de 0,12% se consiga alcançar do modo que eu gostaria, pela redução da despesa e pela redução da carga fiscal. A menos que os Partidos da não esquerda se decidissem por um posicionamento que, negociando a reversão das políticas que estão na calha, fosse efectiva alternativa ao cenário que se perspectiva.
Mas não. Estou mesmo a ser wishful thinking porque ao Ministro das Finanças não resta alternativa, terá que continuar à martelada no naipe da percussão desta orquestra desafinada entre políticas de esquerda e práticas de direita a que eufemisticamente o Dr. Costa chama «travões» e nós, os outros, chamamos cativações ou marteladas.
Dezembro de 2019





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