Um excelente texto de Cátia Bruno sobre o actual
fenómeno migratório para o Reino Unido, desta vez,
com consequências tantas vezes trágicas. Um excelente comentário de Antes pelo contrário, que não
resisto a transcrever, como síntese analítica.
Antes pelo contrário: A culpa é das ONG que participam no tráfico, pois
são elas quem na realidade lhes assegura a travessia, indo buscá-los à Costa de
África. Nada
disso aconteceria se as águas territoriais da Líbia e desses países não
tivessem apenas poucas milhas de faixa litoral, pois basta-lhes afastar-se como
daqui ao Barreiro para estarem em águas internacionais onde operam impunemente
as "Organizações Não-Governamentais"!!! Por isso é que eles se
aventuram em embarcações precárias com as quais sabem muitíssimo bem que
dificilmente conseguiriam fazer a travessia - mas que são precisamente o
chamariz dos piores traficantes, que são aqueles que não fazem isso por
dinheiro, mas por razões ideológicas e políticas, pois o seu objectivo é
destruir a Europa e a Civilização Ocidental injectando populações que já
representam 10% da população em França e na Inglaterra, e que tendo uma taxa de
natalidade muito superior à nossa, daqui a 20 ou 30 anos serão maioritários e
irão impor-nos as suas crenças e religiões, fazendo a Europa recuar à
Idade Média!!! E as grandes culpadas, por detrás disto, são a Igreja Católica
que influencia a Merkel e os traficantes de "coitadinhos", mais a UE,
que está muito "escandalizada" com 2.000 migrantes vindos da
Bielorrússia, mas deixou entrar mais de 6 milhões desde 2015, e fecha os olhos
a Portugal, que já legalizou desde 2018 mais de 1 milhão de
imigrantes ilegais!!!
Desespero, traficantes e percepções. O
triângulo que atrai refugiados para o Reino Unido e os leva a morrer no Canal
da Mancha
Maior controlo nos terminais de carga
de Calais deu origem a novo método: atravessar o mar de barco. Traficantes
lucram com o sonho britânico dos que fogem. E Brexit pode estar a alimentar
fenómeno.
CÁTIA BRUNO: TEXTO
OBSERVADOR, 01 dez 2021
“Toda a gente diz ‘Reino Unido, Reino
Unido, Reino Unido.’” Alex é um
dos vários requerentes de asilo que se juntam nas praias de Calais, no norte de
França, de olhos postos no outro lado da margem. A apenas
30 quilómetros de distância, o país é uma miragem com que tantos sonham. Um sonho forte o suficiente que faz milhares
arriscarem a vida numa travessia de barco que muitas vezes acaba em tragédia
— como a que vitimou 27 pessoas na passada quarta-feira.
O
iraniano foi acompanhado por uma equipa de
reportagem da BBC ainda em setembro, mas a sua entrevista já
ilustrava o fenómeno que se viria a agudizar nos últimos dias. “Amanhã, Inglaterra”,
assegurava aos jornalistas, explicando que pagou 2.500 euros a um traficante. Não era a primeira vez que tentava fazer a travessia
— era a terceira. Das vezes anteriores, a ondulação forte fê-lo
regressar a nado para a costa francesa. Desta vez, o traficante garantiu-lhe
que o barco é mais resistente: por isso, vai voltar a tentar.
O
fenómeno não é novo, como relembra ao Observador Peter William Walsh, do Observatório para as Migrações
britânico: “Há anos
que se juntam migrantes em Calais, o pico foi com o estabelecimento do campo
conhecido como ‘A Selva’, entretanto desmantelado pelas autoridades francesas”, diz. “Quando chegam a Calais, estas pessoas
tentam entrar em contacto com os traficantes. Esses organizam as viagens e
depois comunicam com eles por telemóvel: ‘Estejam na praia x à hora tal. O
mar está calmo, vamos tentar fazer com que consigam atravessar. São dois mil
euros por pessoa’”.
▲ Sobreviventes
do naufrágio da passada quarta-feira, na chegada ao Reino Unido PA
IMAGES VIA GETTY IMAGES
A diferença é que, se antes a maioria
tentava a travessia escondendo-se dentro de camiões, agora arriscam fazer-se ao
mar em barcos precários. De acordo com dados da polícia fronteiriça britânica,
em 2018 menos de 500 pessoas chegaram ao país em embarcações
improvisadas. Este ano,
já foram mais de 25 mil. Fora as que
não conseguem chegar ao outro lado do Canal da Mancha, mas tentam: segundo as
autoridades francesas, este ano 50
mil foram impedidos. “Há
noites em que temos quase 50 barcos a desembarcarem ao mesmo tempo. Apanhamos
metade, mas não chega. Não é possível pôr um polícia em cada duna”,
lamentava-se Nicolas Laroye, polícia fronteiriço francês em Calais, ao Politico.
Uma
vaga que para os especialistas como Walsh ilustram uma realidade clara: por muito controlo que se aplique, não há como parar
esta tendência. “Há sempre
pessoas dispostas a tentar. Isto
revela a magnitude do desafio”,
afirma. “É algo muito semelhante ao que vimos na fronteira entre os EUA e o
México: erguem-se muros e gastam-se milhares de dólares, mas no final
continua a chegar sempre gente que vai continuar a tentar.”
Um “jogo de xadrez” com os traficantes nas dunas do
norte de França
O
principal motivo pelo qual
aumentaram exponencialmente as tentativas de travessia por mar é apenas um: os
maiores controlos impostos na travessia por terra, desde que o Reino Unido
aceitou pagar mais ao governo francês para apertar a malha. “Houve um
aumento substancial na vigilância e policiamento dos terminais de carga e isso
tornou muito mais difícil para alguém esconder-se num camião. Drones,
cercas, etc. Isso fez aumentar esta rota dos barcos”, explica Walsh.
▲ Nos
terminais de Calais, o controlo sobre os camiões de transporte tornou-se mais
apertado GETTY IMAGES
E não são as únicas estratégias. O uso de equipas cinotécnicas (guardas e cães) e de
detectores de dióxido de carbono são outros dos mecanismos que ajudam a
descobrir se há gente escondida na carga dos camiões. Mas essa eficácia ajudou
a criar aquilo que o comandante da polícia francesa Frantz Tavart chama de
“círculo vicioso”: “Se desviarmos os traficantes da rota mais prática, eles
estendem as suas operações”, disse à BBC. “É como um jogo de xadrez
em que os traficantes fazem sempre a primeira jogada”.
As autoridades francesas têm colocado
a tónica sobre as redes de tráfico. Foi esse o principal foco da discussão que
reuniu os ministros do Interior de França, Alemanha, Holanda e Bélgica no
passado domingo, em Calais. “O
principal objetivo do encontro é a luta
contra os traficantes que tiram
proveito das nossas fronteiras e dos nossos países”, avisou o responsável francês Gerald Darmanin. A
porta-voz da Autoridade Marítima francesa, Véronique Magnin, fala em redes mais profissionais,
com ligações por todo o continente europeu. O barco
que naufragou na passada semana, por exemplo, tinha ligações à Alemanha, de
acordo com os investigadores. “Os
traficantes têm um papel crítico, sim”, resume Peter Walsh. “São fundamentais
porque facilitam as travessias do Canal. E há elementos que sugerem que estão
mais sofisticados.”
▲ O policiamento nas dunas
de Calais por parte da polícia francesa evitou o embarque de 50 mil pessoas GETTY
IMAGES
“Mas esse é apenas um dos elementos”, diz o
investigador, antes de apontar baterias à própria arquitetura da política de
asilo internacional. “Para se pedir asilo num país, é preciso estar lá
fisicamente. As pessoas não podem pedir vistos para ir para o Reino Unido a fim
de pedir asilo lá. Portanto, viajam de forma ilegal, de avião com documentos
falsos, por exemplo, ou dentro de um camião. E sim, de barco também.”
As “ligações” e “percepções” que
tornam o Reino Unido o destino de sonho
O
governo britânico tem argumentado que não tem de receber estas pessoas, porque
considera que elas podem pedir asilo em França, por ser um país seguro — embora
nada na lei internacional obrigue a que seja pedido asilo no primeiro país
“seguro” a que um requerente de asilo chega. O desejo da grande maioria parece ser o de chegar ao
Reino Unido, arriscando a vida numa travessia perigosa. O que levanta uma
questão simples: porquê?
Heaven
Crawley tentou
responder a essa questão. No terreno, em Calais, esta professora da
Universidade de Coventry especializada em migrações fez parte de uma equipa que
realizou inquéritos a 500 requerentes de asilo para tentar perceber as suas
motivações.
“Nuns casos é a língua, o facto
de eles terem familiaridade com o inglês é um grande fator. Mas a grande
maioria é o facto de terem amigos ou família a viver no Reino Unido,
que eles sentem que os podem ajudar a integrarem-se melhor no sistema britânico”,
afirma Crawley. “Todos os que entrevistámos sentiam que tinham
mais hipóteses de conseguir uma vida melhor no Reino Unido, em parte por também
sentirem que é um país mais orientado para os direitos humanos. Muito disto
assenta em ligações e percepções.” Heaven
Crawley, professora da Universidade de Coventry
A
professora acrescenta que muitos dos entrevistados não só vêm de países onde são
perseguidos, como esperam meses em Calais em condições terríveis. Tudo isso contribui para um plano mental de tentar
alcançar o objetivo idealizado: “O facto de sentirem que perderam tudo
leva-os a querer ir apenas para o sítio onde acham que têm mais hipóteses.”
Peter
Walsh, que também
participou em vários inquéritos do género, acrescenta um outro ponto: o tratamento duro por parte das autoridades francesas
faz com que muitos ganhem particular aversão a França e a alimentar a ideia de
que o Reino Unido é um país “mais amigável”. O investigador destaca, porém, um ponto: o sistema de asilo em França é na verdade, em termos
monetários, “mais liberal do que o britânico”. “Em
França os requerentes de asilo recebem mais dinheiro, têm alojamento em
melhores condições e podem trabalhar ao fim de 6 meses — no Reino Unido têm de
esperar um ano”. O The Times fez as contas: no Reino
Unido, um requerente de asilo recebe cerca de 46€ por semana do Estado; em
França, recebe mais de 50€.
Londres e Paris apontam dedos em público
— e provavelmente negoceiam em privado
Enquanto um desejo de vida melhor no
Reino Unido alimenta estas travessias do Canal que matam, os políticos
britânicos e franceses dividem-se no passa-culpas. Os últimos dias foram de tensão aguda entre
Londres e Paris, com a crise migratória a somar-se às anteriores das pescas
(relacionada com o Brexit) e da assinatura
do AUKUS (o acordo de segurança entre Austrália, Reino Unido e EUA, que
desagradou a França por ter sido deixada de fora).
▲ Emmanuel Macron com alguns
dos polícias que trabalham em Calais
O
pico ocorreu na sexta-feira, quando o primeiro-ministro Boris Johnson
tweetou uma carta para o Presidente francês, Emmanuel Macron,
em que pedia mais colaboração a França e a possibilidade de assinar um acordo
bilateral — algo que
os franceses têm rejeitado, alegando que os britânicos têm de negociar com a
União Europeia como um tudo. “Não são métodos sérios”, queixou-se
Macron, referindo-se à publicação do tweet em vez do uso de um canal mais
recatado. Ao mesmo tempo, França retirou o convite para o encontro com os
ministros do Interior de domingo à ocupante da pasta britânica, Priti Patel.
A ministra britânica tem feito um
discurso duro contra a imigração e argumenta
que 70% dos que atravessam o Canal da Mancha são migrantes económicos e não
requerentes de asilo — um valor desmentido pelo Conselho para os Refugiados britânico,
que estima que 98% dos que chegam de barco pedem asilo no país. Já o seu
homólogo francês, Darmanin, tem-se
focado no combate aos traficantes e acusa os britânicos de não estarem a
cumprir a sua parte.
▲ Boris Johnson e a
ministra do Interior britânica, Priti Patel GETTY
IMAGES
“A solução para isto seria a de criar
canais seguros e regulados para as pessoas pedirem asilo ao Reino Unido a
partir de França”, afirma Crawley, invocando uma das soluções propostas pela
grande maioria das ONG que estão no terreno em Calais. “Mas isto não é popular. E
estes políticos passaram os últimos anos a promover sentimentos anti-migrantes,
é claro que agora se disserem algo diferente perdem votos.”
Toda
esta crise ocorre em momentos politicamente delicados quer para Macron, quer
para Johnson: o primeiro
tem eleições presidenciais para o ano, com os candidatos da extrema-direita
Marine Le Pen e Éric Zemmour a fazerem-lhe sombra; o segundo enfrenta o pior
momento em termos de popularidade desde que é primeiro-ministro e tem Nigel
Farage, o antigo líder do UKIP, a deixar promessas veladas de que pode
regressar à política.
É por isso que Peter Walsh acredita que estamos perante uma situação em que os
líderes dos dois países fazem barulho em público, mas continuam certamente a
negociar em privado. “É uma retórica intensa, mas atrás da cortina a
cooperação continua”, avisa. “Nenhum dos países tem interesse em que isto
continue.”
“O Brexit pode estar a alimentar isto”
Os
especialistas ouvidos pelo Observador consideram, porém, que o governo
britânico está numa situação mais delicada do que o francês nesta matéria. Tudo
por causa de dois elementos: Brexit e Acordo de Dublin.
Vamos
por partes. A UE tem em vigor o Acordo de Dublin, partilhado pelos seus
Estados-membros, que prevê que cada requerente de asilo seja obrigado a fazê-lo
no primeiro país da UE por onde entrou — o que significa que pode ser deportado
para aí se pedir asilo num outro país europeu. Ora, com a saída do Reino Unido
da UE, o país deixa de estar abrangido por este acordo e passa apenas a
responder perante a lei.
▲ A grande
maioria dos que se juntam em campos improvisados em Calais sonham em ir para o
Reino Unido GETTY IMAGES
“Os
britânicos estão a dizer aos franceses ‘têm de os receber de volta’, mas não há
nada que obrigue França a isso, como acontecia antes. Suspeito até que os
traficantes estejam a dizer isso mesmo às pessoas”, aponta Crawley. No terreno,
a ideia já circula: “Por causa do Brexit assim que chegar ao Reino Unido
estarei finalmente a salvo. Já não há Dublin, nem registo de impressões
digitais”, dizia um jovem sudanês ao The Guardian em
Calais, há duas semanas.
Peter Walsh, investigador do
Observatório para as Migrações britânico
“Uma coisa é a realidade, outra a perceção”,
aponta Peter Walsh. “A realidade é que já não estamos na UE, logo não
há Acordo de Dublin no Reino Unido. Para isso mudar, seria necessário
fazer um acordo bilateral com França ou com a UE como um todo. E a
realidade também é que, quando fazíamos parte da UE, o Reino Unido já era um
país que recebia mais requerentes de asilo do que aqueles que deportava através
de Dublin. Mas a percepção das pessoas não é essa.”
Os dados comprovam o que diz o investigador do
Observatório para as Migrações: entre 2016 e 2020, o Reino Unido recebeu 194
mil pedidos de asilo, dos quais transferiu para outros países, através de
Dublin, apenas 1.250. Portanto, este não é um factor que altere completamente
a situação no terreno, ao contrário do que diz o governo britânico. Aquilo que
altera, aparentemente, é a percepção de que com o fim de Dublin, será mais
fácil a estes requerentes permanecer no país. “O Reino Unido não está a assumir o facto de que o
Brexit pode estar a alimentar isto, porque uma das ideias por trás do
Brexit era precisamente a de controlar as fronteiras”, resume Heaven
Crawley.
Um velho problema conhecido da Europa
Falamos
em requerentes de asilo porque os dados são esmagadores. O Conselho para os
Refugiados britânico não só garante que a maioria o faz, como afirma que 91% vem de apenas dez países marcados pela guerra e
por perseguições políticas, étnicas e religiosas: Irão, Iraque, Sudão, Síria, Vietname, Eritreia,
Afeganistão, Kuwait, Iémen e Etiópia. “Isto
significa que a maioria dos que atravessam o Canal são reconhecidos como
pessoas que precisam de protecção internacional quando fazem o seu pedido
de asilo”, escreve o organismo.
Heaven
Crawley acrescenta
outro dado: no Reino Unido, 60% de todos os pedidos de asilo são
concedidos — e isto inclui pessoas que chegam por outras vias que não os barcos
que atravessam o Canal da Mancha. “A maioria deles vem de países onde há provas
claras de violações de direitos humanos”, diz a professora. “São pessoas que
não têm nada a perder. E quando não se tem nada a perder, faz-se tudo.”
Propostas
como a do governo britânico de deter os que chegarem se vierem de países
considerados “seguros”, como França, são para os especialistas ineficazes: “Para
isso era preciso eles estarem a par dessas mudanças na lei e decidirem não vir
e não há nada que indique que isso vá acontecer. Não se pode fazer as pessoas
mudarem o seu comportamento com detenções se elas nem souberem que podem ser
detidas”, aponta Peter Walsh.
▲ Alguns dos
que sobreviveram ao naufrágio no Canal da Mancha da semana passada PA
IMAGES VIA GETTY IMAGES
Quaisquer soluções para os problemas
de refugiados e migrações só funcionam a uma escala mais global, segundo o
investigador. A prová-lo
está o facto de que, apesar do aumento exponencial de travessias de barco pelo
Canal da Mancha, o Reino Unido
ainda está muito longe de receber o mesmo número de pedidos de asilo que outros países europeus recebem: em 2020, os britânicos receberam 29 mil pedidos,
muito abaixo dos 81 mil registados em França, 86 mil em Espanha e 100 mil na
Alemanha. “Devemos pôr isto em contexto e nós britânicos temos de entender
que esta vaga não é assim tão grande”, afirma o investigador.
O
número de mortes no Canal, provocadas pelos naufrágios, fizeram manchetes pela
nova localização, mas estão longe de ser uma novidade na Europa. “Muita gente
morreu na Europa este ano e ninguém liga, seguimos todos em frente com a nossa
vida”, destaca Heaven
Crawley. Ao todo,
segundo a Organização Internacional para as Migrações, este ano já 1.300 migrantes morreram afogados no
Mediterrâneo. “Quando não
há possibilidade de viajar de forma legal, é isto que estas pessoas vão
continuar a fazer. Seja a pé, de autocarro ou num barco. Vão continuar a
tentar.”
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