Salazar, a quem o
distanciamento ideológico não impediu a honestidade do apreço por aqueles que o
ajudaram na sua subida cultural, e quem sabe se de carácter. Uma história
sintética e, afinal, bem espirituosa, ao modo de um escritor de hoje, descendente
– “transviado”? – de familiares mentores de opinião pública. Expressivamente
gracioso mas, sobretudo, homem de pensamento livre - como, de resto, o foram os
seus antecessores - mas rumando no seu próprio lenho…
Henrique Salles da Fonseca
03.12.21
José
Tomás da Fonseca (16 de
Março de 1877-12 de Fevereiro de 1968) quase 91 anos
José
Lopes de Oliveira (25 de
Dezembro de 1881-3 de Agosto de 1971)
António
de Oliveira Salazar (28 de
Abril de 1889-27 de Julho de 1970)
Tomás da Fonseca tinha mais 12 anos
que Salazar.
Quando Salazar, aos 11 anos, foi para
o Seminário de Viseu, Tomás da Fonseca tinha 23 anos; quando Salazar, com 19
anos, terminou o Seminário, Tomás da Fonseca tinha 31 anos.
Lopes
de Oliveira tinha mais 8 anos que Salazar.
Quando Salazar, com 19 anos, ingressou
na Universidade de Coimbra, Lopes de Oliveira tinha 27 anos e quando Salazar
atingiu a maioridade (então, aos 21 anos), Lopes de Oliveira tinha 29 anos.
* *
*
Posta
esta relatividade etária em evidência, resulta a plausibilidade da história que
se conta na família segundo a qual Tomás da Fonseca foi encarregado
de educação de Salazar durante o período em que este esteve no Seminário de
Viseu e que Lopes de Oliveira desempenhou função equivalente nos dois primeiros
anos em que Salazar esteve em Coimbra enquanto menor de idade.
À
minha frente, os «educadores» nunca se gabaram da função e a única
informação que recordo o meu avô me ter dado foi algo como «o rapaz
era bom aluno e nunca lhe deu preocupações naquele período. As preocupações
vieram mais tarde…». A Lopes
de Oliveira nunca ouvi qualquer referência à dita função e concluo que em ambos
os casos se tratou do
cumprimento de um formalismo legal de tutela de um menor a pedido da respectiva
família.
Tutores
e tutelado seguiram ideais muito diferentes e que os puseram em campos opostos
até ao fim das vidas de quem se foi finando.
Logo
que Salazar chegou ao poder, decidiu moderar os ímpetos voluntariosos dos
idealistas republicanos e mandou
Tomás da Fonseca fazer um «estágio» no Aljube e enviou Lopes de Oliveira num
cruzeiro até ao Tarrafal onde o ex-tutor permaneceu um ano. A sucessão de «estágios» não se fez rogada mas
nenhum dos «estagiários» foi alguma vez molestado fisicamente. A Tomás
da Fonseca couberam 12 «estágios, tantos quantos os livros que ia publicando.
Creio que a Lopes de Oliveira apenas coube o «cruzeiro» inicial.
Foi
o meu pai que me contou que, certa vez, alguém
da roda de Salazar arengou coisas tremendas sobre Lopes de Oliveira ao que se seguiu o seguinte diálogo (ou parecido):
Salazar – Mas
o Senhor conhece o Dr. Lopes de Oliveira?
Salazarista - Não,
Senhor Presidente, não o conheço pessoalmente.
Salazar – Pois
eu conheço-o e deve ser a pessoa mais inteligente que alguma vez conheci.
Fim
de conversa.
Alguém ouviu e contou ao meu pai,
sobrinho do visado, o «Tio Lopes» como era conhecido em família.
Como facilmente se compreende, não há
fotografia conjunta dos três personagens desta história.
Lisboa,
Dezembro de 2021
Henrique
Salles da Fonseca
Nenhum comentário:
Postar um comentário