Princípios na base das políticas intervencionistas
nas liberdades individuais. Uma boa análise de PATRÍCIA FERNANDES, com
comentários enriquecedores dos conceitos pró e contra.
Discurso sobre a servidão desejada
Os anos pandémicos já tinham dado o
cheirinho dos novos tempos: a disponibilidade fácil que as sociedades
demonstraram para aceitar a limitação das liberdades decididas com
justificações mal-amanhadas
PATRÍCIA FERNANDES Professora na Escola de Economia e
Gestão da Universidade do Minho e na Faculdade de Letras da Universidade do
Porto
OBSERVADOR, 22
mai. 2023, 00:1644
“Não tenho vícios, tenho só
liberdades.” Agustina
Bessa-Luís, Aforismos
1O princípio do dano
Um livro incontornável na história do
liberalismo político é o publicado por John Stuart Mill em 1859: Sobre a Liberdade.
O filósofo Richard Rorty considera que Mill faz nesta obra a última
revolução conceptual de que o pensamento social e político ocidental
necessitava: “A sugestão de J. S.
Mill de que os governos se dedicam a optimizar o equilíbrio entre deixar em paz
as vidas privadas das pessoas e evitar o sofrimento parece-me ser a última
palavra.” Quase dois séculos depois
de John Locke, Mill consolidou conceptualmente o liberalismo
político como o paradigma político moderno.
Em que se traduz este paradigma liberal? O liberalismo político surge como
resposta aos regimes absolutistas que marcaram a primeira modernidade e tem
como âmago a limitação do poder político. Só a limitação do poder político
garante liberdade individual e foi visando essa liberdade individual que os
autores liberais prescreveram a divisão de poderes, eleições regulares e uma
permanente fiscalização interna e externa, em mecanismos previstos
constitucionalmente. É a partir desta tradição que Mill se propõe
identificar “a natureza e os limites do
poder que pode ser legitimamente exercido pela sociedade sobre o indivíduo”
e oferecer um princípio filosófico para essa limitação:
“O
objetivo deste ensaio é asseverar um princípio muito simples, que se destina a
reger em absoluto a interação da sociedade com o indivíduo no que diz respeito
à coação e controlo, quer os meios usados sejam a força física, na forma de
punições legais, quer a coerção moral da opinião pública.” (itálico meu)
Esse princípio filosófico é o princípio
do dano e diz-nos que “o único fim em função do qual o poder pode ser correctamente
exercido sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada, contra a sua
vontade, é o de prevenir
dano a outros.”
De acordo com este princípio:
“Uma
pessoa não pode correctamente ser forçada a fazer ou a deixar de fazer algo
porque será melhor para ela que o faça, porque a fará feliz, ou porque, na
opinião de outros, seria sensato, ou até correcto. Estas são boas razões para a
criticar, para debater com ela, para a persuadir, ou para a exortar, mas não
para a forçar, ou para lhe causar algum mal caso ela aja de outro modo. Para
justificar tal coisa, é necessário que se preveja que a conduta de que se
deseja demovê-la causa um mal a outra pessoa.” (itálico meu)
Encontramos aqui o espírito emancipatório por excelência que dá forma ao paradigma liberal e que já
tinha sido estabelecido por Immanuel Kant no opúsculo Resposta à pergunta: Que é o
Iluminismo?(1784):
“lluminismo
é a saída do homem da sua menoridade de que ele próprio é culpado. A menoridade
é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem. (…)
Sapere aude! Tem a coragem de te servires do teu próprio entendimento! Eis a
palavra de ordem do Iluminismo.”
A consequência desta dimensão emancipatória
é a recusa kantiana do paternalismo,
em ensaio de 1793:
“Um
governo que se erigisse sobre o princípio da benevolência para com o povo à maneira
de um pai relativamente aos seus filhos, isto é, um governo paternal (imperium paternale), onde, por conseguinte, os súbditos, como crianças
menores que ainda não podem distinguir o que lhes é verdadeiramente útil ou
prejudicial, são obrigados a comportar-se apenas de modo passivo, a fim de
esperarem somente do juízo do chefe do Estado a maneira como devem ser felizes,
e apenas da sua bondade que ele também o queira – um tal
governo é o maior despotismo que pensar se pode (constituição, que suprime toda
a liberdade dos súbditos, os quais não têm, portanto, direito algum).”
Os regimes liberais são, então,
fundados nesta tradição de liberdade individual, que passa por uma escolha
autónoma do indivíduo sobre como viver a sua vida, com a salvaguarda de não
provocar dano a terceiros.
2A lei do tabaco
Quando me debruço sobre o princípio do
dano de Stuart Mill na sala de aula, a discussão torna-se sempre mais rica em
situações-limite ou de grande complexidade. É o que acontece no que diz
respeito ao uso do cinto de segurança
(trata-se de um paternalismo aceitável?), aborto (há ou não terceiros afectados?)
ou consumo de drogas (que envolve as duas questões anteriores). Mas é o
exemplo do tabaco a permitir um maior esclarecimento do princípio do dano.
De facto, a legislação sobre o tabaco
deve comportar três dimensões de reflexão, todas elas pensadas a partir do
enquadramento liberal que Mill consolidou: 1) em que medida deve a legislação proteger terceiros? 2) como deve
considerar a situação dos menores? 3) que previsão deve ser pensada para
adultos?
A primeira pergunta não tem oferecido
grandes dúvidas: considerando os dados fornecidos pela ciência, e que afirmam a
possibilidade de dano a fumadores-passivos, a legislação deve proteger
terceiros dos malefícios do tabaco (notemos, no entanto, que se trata de
proteger o dano, não o incómodo). Deste modo, parecem legítimas as medidas
que limitam o consumo de tabaco em espaços fechados (possibilitando que se
criem espaços para fumadores).
No que diz respeito aos menores, devemos
considerar que o princípio emancipatório liberal (de Kant e Mill) se aplica
apenas a indivíduos maiores: os menores
devem ser alvo de protecção por não terem ainda atingido condições de
emancipação cognitiva que lhes permitam tomar decisões conscientes e
informadas. Nessa medida, parece admissível que o Estado intervenha no sentido
de os proteger, nomeadamente impedindo a compra de tabaco ou mesmo o seu
consumo.
E no que diz respeito a adultos? De acordo com
o princípio do dano, o Estado pode
alertar, informar e tentar persuadir o consumo de tabaco por adultos – mas não
pode impedir as pessoas de fumar ou tomar a decisão de se tornarem fumadores.
Mill até admitiria uma cobrança de
impostos específica para este produto, mas não teria dúvidas de que uma
crescente limitação (legal e moral) do direito a fazermos o que queremos com o
nosso corpo assume a forma de um paternalismo inaceitável (recordemos que Mill
recusa a própria ideia de “coerção moral da opinião pública”).
Assim, de acordo com princípios
liberais, não cabe ao Estado determinar como devemos conduzir a nossa vida,
mesmo que “dois terços das causas de morte
nos fumadores [sejam] atribuíveis ao consumo do tabaco e, em média, um fumador
[viva] menos 10 anos do que um não fumador”. Oferecida essa
informação, uma sociedade não despótica garante ao cidadão o seu espaço de
liberdade e decisão.
Ora, é
este o lado problemático não só das alterações propostas à Lei do Tabaco em
Portugal, mas também da tendência que tem vigorado nas designadas democracias
liberais e que se traduzem no objetivo apresentado pelo governo: “diminuir os
estímulos ao consumo e contribuir para uma geração livre de tabaco [sic] até
2040.” Seremos livres de tabaco, mas não livres para ter
vícios: quão orwelliana é esta redefinição de liberdade?
E a linguagem usada dificilmente poderia
ter um espírito mais paternalista: os documentos do governo não referem
“menores”, mas “gerações mais jovens” (em que idade termina esta
categoria?) e o objectivo é criar
uma geração livre de tabaco…mesmo depois de essa geração atingir a
maioridade. Ou, nas palavras do Ministro da Saúde:
“Começaremos hoje a proteger os adultos de amanhã”. Meu caro senhor, em
sociedades de democracia liberal os adultos de amanhã não precisam de ser
protegidos. Agradecidos estamos pelo seu paternalismo, mas não o desejamos.
Ou será que desejamos?
3Uma nova norma social
Os anos pandémicos já tinham
levantado o véu sobre o cheirinho dos novos tempos: a disponibilidade fácil que
as sociedades demonstraram para aceitar a limitação das suas liberdades,
decididas com justificações mal-amanhadas e pobremente fundamentadas, já nos
tinha feito convocar a nostalgia das sociedades fechadas. Parecemos, de
facto, cada vez mais predispostos a aceitar políticas paternalistas. E a lição
da pandemia, que o Ministro da Saúde convocou na conferência de imprensa, não
deve ser esquecida: em democracias
liberais devemos ouvir os especialistas e considerar a informação médica que
nos é disponibilizada, mas não podemos adoptar a palavra do médico como lei sob
pena de nos tornarmos uma ditadura sanitária – aí poderemos ter saúde, mas
não nos restará qualquer liberdade.
Por outro lado, o argumento económico
regularmente convocado nesta discussão coloca-nos numa perigosa rampa
escorregadia: sim, é verdade que os fumadores significam um impacto não
negligenciável nas despesas dos sistemas de saúde. Mas quem está realmente
disposto a jogar este tipo de jogo? Aquele fuma, esse consome álcool, outro
abusa de comida de plástico, tu usas demasiado sal, tu não fazes exercício
físico, tu não lavas as mãos, tu passas a noite sentado no sofá – tu, tu, tu…
Afinal, quem de nós vive uma vida pura? Como dizia sabiamente Manuel Serrão, diga-me
um!
Este
jogo de fiscalização dos vícios privados dos outros é ainda mais perigoso com o
admirável mundo novo tecnológico que nos vai cercando: já temos aplicações que
controlam os nossos dados biométricos, registam as nossas alterações físicas,
verificam as nossas actividades. Estaremos realmente interessados em jogar com
as hipóteses de uma vida totalmente higienizada? É que o perigo vai para lá da dimensão
sanitária, pois o paternalismo não tem limites: ontem foi a comida que te faz
mal, hoje é o tabaco que te faz mal, amanhã serão os livros que te fazem mal
(amanhã?). Enquanto vivemos rodeados de câmaras de vigilância, que estão a ser
instaladas em pequenas cidades do norte do país pelas próprias autoridades
municipais…
Vivemos tempos estranhos, em que
quase parece normal que o estado decida como devem viver as gerações futuras.
Restam-nos as lições dos clássicos, que nos permitem sempre compreender melhor
os nossos tempos. Vejamos como Stuart Mill fecha o seu argumento:
“um
Estado que inferiorize as suas pessoas, de modo a que sejam instrumentos mais
dóceis nas suas mãos, até com fins benéficos, descobrirá que com pessoas
pequenas nada de grande se poder[á] alguma vez alcançar.”
PS: O facto de estas propostas
assentarem em contradições evidentes e muitas delas parecerem resultado de insanidade (como a de proibição de fumar ao ar livre
no perímetro dos estabelecimentos de ensino superior: teremos
polícia nas universidades a fiscalizar o incumprimento? ou caberá aos
seguranças da Universidade perseguir pelos “campi” estudantes e professores
incumpridores?), ao ponto de alguns deputados do
Partido Socialista se terem manifestado contra a proposta que será agora
discutida na Assembleia da República, não deixa de levantar a
suspeita: estaremos perante a repetida estratégia de António Costa de
apresentar medidas polémicas com o objetivo de ocupar o espaço de discussão
pública e desviar a atenção do que verdadeiramente importa?
O título do texto é, naturalmente, inspirado em Etienne de La Boétie.
TABACO SAÚDE LIBERDADES SOCIEDADE
COMENTÁRIOS:
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Alexandre Nicolau: Ui
Liberalismo como argumento para defender vícios... Dizia Thomas Green Hill: " pode-se não ser livre de uma forma
psicológica, e não meramente política, se se é sujeito a um impulso ou desejo
que não se consegue controlar. Tal
como um escravo não faz o que realmente deseja, mas cumpre a vontade do seu
dono, alguém que é, por exemplo, um alcoólico, está a ser dirigido por um
desejo de encontrar satisfação e realização, onde esta não pode ser,
ultimamente, encontrada" Se o pensamento liberal foi
importante no afirmar de liberdades essenciais e na deposição de antigos
sistemas verdadeiramente castradores e promotores de desigualdades gritantes,
as suas iterações actuais, com foco excessivo no indivíduo, como se fosse
possível existir apenas como tal, desprovido de qualquer cultura, sentimento de
pertença ou identidade, tem redundado num excesso de individualismo de que são
expoentes máximos a cultura narcisista das redes sociais, o capitalismo
selvagem e o globalismo. É
um luxo de primeiro mundo de que os nossos antepassados não dispunham -
coexistir e colaborar ou morrer. Um quase pensamento mágico de que existe algo como liberdade
absoluta e de que existe tal coisa como auto-realização sem um qualquer
contexto de relação com o outro, o que me surpreende ainda mais neste país até
há bem pouco de matriz Judaico-Cristã, assente em valores de cooperação,
entreajuda, compaixão. Mágico também, nas suas
declinações político económicas porque assenta numa ideia de possível
crescimento contínuo, sem qualquer consideração pelos limites ( e exaustão) de
recursos. Um exemplo concreto, que nos
está a bater à porta. Depois de anos (décadas) a
varrer para debaixo do tapete e a ignorar os avisos dos cientistas, as
alterações climáticas começam a bater-nos à porta, mais cedo até que o previsto
- o Sul da Europa está em situação de seca grave. Contudo, e como mostrava uma reportagem recente no Público, há um
total desacerto entre as culturas que os proprietários privados, os
agricultores, cultivam e os recursos hídricos de que dispomos. Dirão os liberais - o terreno é
meu, planto o que quiser. Mas
a água, até ver, é de todos, e não dá para tudo. Vamos ter de fazer escolhas, e, invariavelmente, vai ter de ser o
Governo a criar limites e normas, a limitar as liberdades individuais, em
benefício do colectivo. Se calhar não podemos ter seca e piscinas cheias,
campos de golfe a ser irrigados diariamente, plantio de frutas tropicais que
requerem enormes quantidades de água, pecuária intensiva na dimensão que temos. Dizia a Margaret Thatcher que o Socialismo se acaba
quando acaba o dinheiro dos outros. Diria que o Liberalismo (económico) se
acaba quando acaba o dinheiro do próprio ( e vi-o tantas vezes, fortunas
pessoais esfumarem-se em camas de Hospital, e quando não há mais um cêntimo...
que bom termos o SNS !) Toda esta conversa em torno dos gastos com
o Tabaco recorda-me os célebres jantares de Natal de empresa, em que no
primeiro ano se divide a conta por todos. Há umas Senhoras que não bebem, mas comem
sobremesa, um ou outro que pede um prato mais caro, mas no final todos estão
mais ou menos satisfeitos com a conta final. No segundo ano há um grupo que pede uma
garrafa de whisky para a mesa. No terceiro ano aperitivos, whisky e umas
cigarrilhas. No quarto ano os que bebem água e não fumam fartam-se
e deixam de ir ao jantar. Alexandre Nicolau Alexandre
Nicolau: Ainda sobre adições: Uma
experiência feita com ratinhos e cocaína e heroína. Investigadores puseram ratinhos em gaiolas
com um bebedouro com água simples, e outro bebedouro com água com cocaína ou
heroína. Os ratinhos quando descobriam o segundo bebedouro, bebiam
compulsivamente, até que acabavam por morrer de overdose. Esta experiência chegou a ser usada nos
anos 60 como parte de campanhas anti droga nos USA. Alguém mais tarde decidiu revisitar a
experiência e alterar as condições dos ratos. Em vez de os colocar em gaiolas vazias, só
com comida e os bebedouros, colocaram-nos em "parques" mais
espaçosos, com outros ratos, brinquedos, diversos tipos de comida, espaço para
se movimentarem à vontade. Os ratos provavam do segundo bebedouro, mas perdiam
interesse. De certa forma, também somos os ratos desta
experiência. A erosão das relações pessoais significativas, dos
laços culturais relevantes, as condições desumanas em que nos vemos cada vez
mais forçados a viver, explicam muito da epidemia das mais diversas adições
contemporâneas, das digitais, às químicas.
Alexandre Nicolau: Alexandre Nicolau: Podem ler a análise dessa experiência aqui : https://www.psychiatrictimes.com/view/what-does-rat-park-teach-us-about-addiction mas há imensas referências na internet. pedro dragone: Stuart Mill está certíssimo, a
autora é que parece fazer interpretações abusivas das suas palavras: - as
câmaras de vigilância nas cidades não estão lá para controlar a vida das
pessoas; estão lá para as proteger contra o banditismo e o crime na rua. É uma
obrigação do Estado fazê-lo e não é paternalismo nenhum. - em TODAS as
pandemias houve restrições e isso é assim porque sem elas os danos sociais
seriam incomportáveis e a pandemia incontrolável. É a ciência médica que o diz,
mas bastam 2 dedos de testa para perceber porquê. - é um artifício separar
incómodo de dano: por norma, se houver incómodo haverá dano. Em todo o caso, as
pessoas têm todo o direito de não serem incomodadas pelos actos de terceiros
(fumo, ruído etc) Sempre baseado na
ciência, o Estado tem a obrigação de alertar os cidadãos para os malefícios de
determinadas práticas e opções de vida. Porém, não deve impor qualquer tipo de
restrição que impeça de as seguir. Finalmente: acha mesmo que as pessoas
desejam a servidão? Que "filosófica" confusão vai nessa cabeça! Nelson
Soares >pedro dragone: Os
fundamentalistas muçulmanos incomodam-se com o facto das mulheres não usarem
véu ou burka ou nikhab ou qualquer coisa que lhes cubra o cabelo o e/ou a face.
Os fundamentalistas católicos incomodam-se com o facto de o aborto ser legal.
Os pais podem sentir-se incomodados com certas opções de vida dos filhos... Não
duvido que exista quem sofra psicologicamente com isso e se reflicta
fisicamente. Não podemos confundir dano físico causado directamente por terceiros
- e neste caso até posso incluir ruído que impeça o sono, com incómodo que nos
afecte psicologicamente - que é causado por nós próprios. Qualquer restrição à
liberdade deve ser proporcional ao dano que pretenda proibir. O que não
acontece neste caso. Proibir o fumo em espaços abertos evitará muito poucos
danos em não fumadores. Tal como restringir os locais de venda do tabaco. Antonio
Araujo > pedro dragone: Pelo seu comentário, presumo que não utiliza automóvel (ruídoso,
emissor de partículas nefastas, etc,) pois afecta os outros, nem electricidade
(a sua produção e transporte, mesmo as ditas limpas) também têm efeitos
maleficos, nem plásticos e por aí adiante. Em tempos idos não havia
câmaras (eram muito caras e pouco práticas) mas havia os PIDES para nos
proteger dos bandidos de rua. Aliás o estado Novo existia para nos proteger. O
tabaco, esse sim é que é maléfico e incomoda os outros. Não vejo confusão na
cabeça da articulista, mas vejo
muita insipidez na sua cabeça. Nota: não sou fumador. pedro
dragone > Nelson Soares: Não generalize; refiro-me ao incómodo físico como o provocado
pelo fumo e pelo ruído. Só isso. Também não concordo com a proibição em espaços
abertos nem com a restrição dos locais de venda (e não disse que concordava!).
É uma estupidez que ataca a liberdade individual e não protege ninguém Alexandre Nicolau > Nelson Soares: As medidas parece-me são para
proteger populações vulneráveis , quer pela sua idade e possibilidade de serem
influenciados (escolas) quer pelo seu estado de saúde (Hospitais). As restantes
medidas destinam-se a reduzir o consumo compulsivo. Sabemos que quanto mais acessível algo
está, mais é consumido (daí os chocolates e gomas perto das caixas de
supermercado) e o inverso também é verdade. Em atomic habits conta-se como uma empresa
conseguiu aumentar a ingestão de água pelos seus funcionários, e diminuir o
consumo de refrigerantes, apenas colocando mais pontos e fontes de água
facilmente acessíveis e deslocando as máquinas de vending para locais mais
distantes ( sem discursos moralizadores, só mesmo a lei da preguiça). Há um
País ditatorial neste planeta em que as bebidas alcoólicas só podem ser
vendidas em lojas estatais, com horários rígidos e apenas a maiores de 20 anos.
As bebidas pagam impostos consoante o seu teor alcoólico (vodka por exemplo
para 40% de imposto). Falo da Suécia. A Noruega, outra ditadura, tem um sistema
semelhante e supermercados, por exemplo, só podem vender bebidas até 4,7% de
álcool, e estão proibidos de o fazer depois das oito da noite durante a semana,
depois das seis da tarde ao sábado, e durante todo o Domingo. Tabaco
e jogo são igualmente altamente regulados. Contudo, nos rankings de desenvolvimento
económico, de desenvolvimento social e, sobretudo, de felicidade, estão nos
lugares cimeiros, de todo o mundo. Alfredo Vieira: Excelente
artigo, na perspectiva filosófica dos direitos individuais e dos limites da
interferência nos mesmos. Para aqueles que se preocupam com o
"custo económico de certos grupos sociais", além de neste caso
(fumadores) o tiro sair-lhes provavelmente pela culatra (pois provavelmente
"custam menos" que não-fumadores, globalmente), não tarda em terem à
perna outros grupos que se diferenciam por uma "maior despesa"
(gordos diabéticos, sedentários, "trans-people" mais as suas
cirurgias e tratamentos, velhos em geral -porque não?-, e por aí fora...). Para
aqueles que acham que o Estado deve legislar "incómodos" que não põem
em causa a saúde de terceiros (como o tabagismo em espaços abertos, por
exemplo), confundindo-os propositadamente com incómodos que põem em causa a
saúde de terceiros (ruído-falta de condições adequadas de sono, lixo e seu
risco sanitário, etc...), este artigo (e seu título) é mesmo sobre vós.... Paulo
Silva > Alfredo Vieira:
O caro Alfredo Vieira
vai desculpar, mas o seu discurso começa com uma extensa manobra de
whataboutismo sem grande nexo, e acaba em manifesto tom de sobranceria. Os
problemas de saúde pública, (no fundo qualquer tipo de problema), resolvem-se
não apenas com tratamentos depois do mal feito, mas também com medidas
profiláticas, e o Estado já promove limitações aos hábitos de consumo de
substâncias extensa e amplamente difundidas pela sociedade há séculos, como o
sal ou o açúcar. E depois, vai-se proibir a velhice?!… O Estado não deve zelar
apenas pela saúde, mas pelo bem-estar de todos. Se o caro admite que o ruído é
um incómodo a evitar, porque não o mau cheiro de um ar viciado?… A autora dá um
bom exemplo representativo de tudo o que o caro não aprova, o uso obrigatório
do cinto de segurança. Acabe-se com ele para os condutores solitários cheios de
si… nota: hoje em dia os mais activos e ruidosos
defensores da liberdade enchem a boca com ela, enquanto cerceiam a Liberdade
dos jogadores do Toulouse que se recusaram a participar na campanha
pró-LGBTQIA+ decretada pela Federação Francesa de Futebol no penúltimo fim de
semana. Alfredo Vieira
> Paulo Silva: Não leu bem. O ruído que perturba o sono das pessoas
nas suas casas afecta a sua saúde, daí justificarem-se períodos de silêncio que
permitam o descanso. O "mau cheiro" é apenas isso: um mau cheiro.
Incomoda? A não ser que ele o esteja a incomodar na sua propriedade privada,
muda de sítio, frequenta outro, ou aguenta. Sal e açúcar? Ainda podemos, felizmente,
fazer o nosso pão, temperar as nossas comidas e fazer doces com as quantidades
que quisermos. Se calhar por pouco tempo, mas ainda podemos. Cinto?
Claro que não devia ser obrigatório! As pessoas que se entendessem com quem de
direito: as suas seguradoras, e que assumissem as suas responsabilidades e
riscos! "Promover" e "limitar"
(coercivamente, como se subentende), são duas coisas diferentes que confunde,
não sei se propositadamente. Deve ser novilíngua. "Convidar a não
fazer", proibindo. "Estimular bons comportamentos", obrigando. E
agora: "promover limitações" a "hábitos que incomodam",
misturando "promoção" (no sentido de "informação",
"educação", "persuasão") com "limitação" (que,
como é bom de se ver, não carece de qualquer"promoção" do que quer
que seja). Não existe tal coisa como o direito a não
ser "incomodado". Ou a não ser "ofendido". Quanto
ao último parágrafo: fale por si. Estou convencido que viveria melhor sem
depender de um Estado "promotor de limitações". Menos
"tutelado". Mais senhor de si próprio, sem risco de dependência de
paternalismos variados mais ou menos indiscriminados. Essa
dependência subserviente de tantos assusta-me infinitamente mais que a
independência responsável. Mas acho que tem tudo a ver com o grau de infantilização
a que cada qual está disposto a sujeitar-se, e ao grau de desconfiança do
próximo com que deixamos que nos assustem.
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