quinta-feira, 4 de maio de 2023

Somos dos tais


 Esperando Godot. Implacavelmente rodando. Tristemente ridículos.

Presidente 1, primeiro-ministro 0

O ministro, personalidade assanhada, gerador de polémica que evocou o SIS como se o SIS não fosse o SIS, continua ao leme de um dossier trágico. Porquê?

MARIA JOÃO AVILLEZ Jornalista, colunista do Observador

OBSERVADOR, 03 mai. 2023, 00:2296

1Não é demais repeti-lo mesmo que “o” assunto não seja esse: o dique levou um rombo. O SIS? Chamar o SIS por causa de um computador? Quem assim agiu desconhece absolutamente 1) o que é um país; 2) o sentido de Estado; 3) a segurança do Estado; 4) a responsabilidade de governar; 5) as obrigações de um ministro (e do seu gabinete).

O andar da carruagem socialista tinha já privado os portugueses de algumas das suas garantias: os diques da Educação, da Justiça, da Saúde, da Administração Pública, foram cedendo levados pela desordem das águas governativas. Aquilo que porém nos parecia de aço – a segurança tem de ser e nos parecer de aço – pode ter aberto uma fissura. Ficou registada.

2É evidente que a história se mantém mal contada (bastou atentar ontem na “encenação” do primeiro-ministro); que faltam peças para completar o desastroso puzzle, o colar de mentiras e omissões vai dar ainda muitas voltas, talvez nunca venhamos a saber tudo. Não importa, sabemos o suficiente: há uma luz vermelha em cima do SIS que em circunstância alguma poderia haver. E há suspeitas, fundamentadas, claro, sobre o real significado da tal “matéria classificada”É que até aqui havia um carrocel vertiginoso, antiético e antiestético, de casos e episódios, uns relevando da irresponsabilidade, outros do abuso de poder, outros da ostentação e da arrogância, outros da mera vulgaridade, outros da caricatura. E outros, claro, da tonteria presidencial. A mistura ia produzindo resultados deploráveis mas com uma passividade digna de estudo e uma indignação inoperante, fomo-nos habituando. E subitamente, há dias, pisou-se uma impisável linha vermelha. O que não é nada a mesma coisa do que tem ocorrido ultimamente. E o ministro que esteve no centro desta história turva, dono de personalidade assanhada, gerador de polémica, dotado de pouca credibilidade política e a quem ouvimos evocar o SIS como se o SIS não fosse o SIS, continua ao leme de um dossier trágico. Porquê? Porque a venda da TAP pode estar num ponto delicado e não convir mudar de rosto e de nome? Não. Dizer que estamos perante a oficialização de uma declaração de guerra ao PR, sendo verdade, fica aquém. A “consciência” de António Costa será a conveniente camuflagem da sua vontade de uma dissolução rápida do parlamento, por saber melhor que ninguém que já lhe sobra pouco tempo para puxar pelos galões, vitimizando-se ou glorificando-se? Talvez mas nunca o PR lhe oferecerá o bombom da vitimização numa bandeja. O Presidente esperará que a espiral negativa em que se encontra a governação teça as suas malhas e que um dia o governo caia ao chão e já não se levante. Mas eu insisto: há uma pergunta – a única que interessa – que ficou por responder: porque é que António Costa não demitiu João Galamba? Se lhe antepusermos o inédito caso do SIS – também ainda por responder – sabemos ao menos que vivemos um momento politico particular. Começou outra história.

3São muitas as perplexidades, incomensuráveis as estranhezas, incontáveis as razões de queixa do comportamento dos órgãos de soberania – dos três, o que, convenhamos, é pouco vulgar. Mas apesar delas e apesar de convivermos com a tal governação impreparada, inoperante, abusadora; apesar da misteriosíssima gestão política do país tão generosa no fornecimento de vergonha diária; apesar do irresponsável relevo que o PS – por razões meramente tácticas e não de pundonor democrático – confere à meia dúzia de gatos pingados rudimentares e boçais do Chega, qualquer dia levando-o ao colo ao altar da vitória; apesar de tudo isso que já era muito, subiu-se um lance na escala da vida politica nacional. Não se pode sair disto: porque é que João Galamba não foi demitido? (Que aconteceu? Quem tem medo de quem? Quem se quer vingar de quem?)

4Ontem, terça-feira, dia 2 de Maio de 2023, foi o primeiro dia do “depois” nas relações entre o PR e o PM. Anteontem vivia-se no “antes”: no fundo “eles” davam- se bem, conheciam-se há tanto tempo, riam das mesmas coisas, faziam coro a dizer mal do PSD, Costa sempre fez o que quis, Marcelo sempre o deixou fazer o que ele queria. Agora não, já passou. Passou de vez. A era agora chama-se “depois”. Com todas as consequências que daí virão: dissolução ou… (sim, sim) um dia a demissão do chefe do governo. Não há hipótese C. Na certeza porém de que detestando Marcelo confrontos como detesta, nesta nova era do “depois” quem está aliviado é Marcelo Rebelo de Sousa e a fazer contas de cabeça é António Costa. Quem diria?

JOÃO GALAMBA    PS    POLÍTICA    ANTÓNIO COSTA    PRESIDENTE MARCELO    PRESIDENTE DA REPÚBLICA

COMENTÁRIOS (de 97):

Alberico Lopes: Maria João: há pouco esqueci-me de dizer: não gostei do que escreveu sobre o Chega! Mesmo não indo à pala com o Ventura nem com o Chega no seu ideário, acho que não se pode chamar tão depreciativamente mais de 400 mil votantes. Para isso já temos o malhador da direita, essa inconcebível criatura que, infelizmente, é o actual presidente da AR!              Alberico Lopes: D.Maria João: concordando com quase tudo o que escreve e dado que a Maria João tece as mesmas dúvidas que eu sinto acerca desta encenação, só queria perguntar-lhe se, com a sua perspicácia e experiência, consegue mesmo vislumbrar os motivos desta encenação que tão mal nos foi vendida em horário nobre e com tanta solenidade pelo 1º. ministro mais analfabeto que algum dia Portugal teve! E já agora: se não concorda comigo quando me rio do dr. Marcelo por ter andado tanto tempo com o sr. Costa ao colinho e agora este lhe ter correspondido com esta garotice! Bem feito!                Joaquim Rodrigues: Como seria possível o Costa e o Galamba não se entenderem? Em momentos diferentes, dizia Vasco Pulido Valente: (sobre o Galamba): "O sr. Galamba não tem boas maneiras ou educação: ninguém iria jantar com ele ou o convidaria para casa. Como a sua insignificância é absoluta, era bom que se impedisse o indivíduo de maçar as pessoas." (sobre o Costa): "Desde a I República que não aparecia um cacique da envergadura do dr. Costa, pronto a meter o país no fundo por vaidade pessoal ou conveniências partidárias". O mais grave é que o Galamba prepara-se para lançar um concurso da Linha Ferroviária Lisboa-Porto, a que ele chama TGV, para fazer uma aberração de Projecto, onde vão gastar muitos biliões, à custa dos contribuintes, que é contra os interesses dos cidadãos, da economia portuguesa e de Portugal e que a Comissão Europeia já declarou que não financiaria, por contrariar o Plano da Rede Ferroviária Transeuropeia aprovado por todos os Países da União incluindo Portugal. Está tudo a ser feito pela "calada" enquanto vão entretendo os indígenas com estes "faits divers". Nem 4 anos depois .... Não concordo com muito. Costa manda e Marcelo submete-se. Porquê? Que Costa quer eleições? Não tenho nada certeza disso, Costa quer é ir para a UE e vai esperar por esse tempo, quanto ao Chega, a Mariazinha já vai vivendo no passado sem se aperceber que vieram para ficar.            F. Mendes: Fica deste artigo a referência de MJA, à "tonteria presidencial". Até que enfim, mais vale tarde do que nunca, mesmo sendo evidente que Marcelo nunca jogou com o baralho todo certo. E também escreve que Costa e Marcelo se divertiram a dizer mal do PSD, repetindo não ser alternativa. Depois, queixa-se dos "boçais" do CHEGA; que crescem graças ao PS e ao encolhimento do PSD, começado por Rio e Marcelo, e acelerado pelo Ventura, Santos Silva, Marcelo e Costa. Agora estamos assim: Marcelo atou-se a ele mesmo, porque o PSD continua a recuperar devagarinho de quase 5 anos de desaparecimento, e, a haver eleições, teremos um grande berbicacho. Continuem a escrever alguns, que o Marcelo é muito inteligente. Quando oiço tal, quase me sinto um Einstein!              Antonio Bentes: Eu continuo a achar que foi António Costa que deu ordens para que se envolvesse o SIS. Se como dizem o SIS reporta diretamente ao primeiro-ministro, então só a este é que o SIS obedece. Quem é que pode acreditar que o SIS tenha atendido a um pedido da Chefe de Gabinete do Galamba. E por acaso o número de telefone do SIS está na lista de telefones úteis de todos os gabinetes e ministérios? Obviamente que não. Costa está metido nisto até aos cabelos como também em todo o dossier da TAP.             júlio correia: Estimada MJA: No meio desta caldeirada toda os deputados do Chega é que são boçais e rudimentares? Exemplo acabado de como uma frase inquina toda uma crónica, pelo menos para mim.

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