sexta-feira, 19 de maio de 2023

Verdades


Que a integridade – e a inteligência – sustentam.

Autores e herdeiros

A lei prevê uma punição para quem alterar ou rasurar o que alguém assinou. Não, não se trata de “revisionismo literário”, mas de falsificação. Um livro é um documento assinado.

 

18 mai. 2023, 00:1628

Quando o PSD apresentou uma recomendação à Câmara de Lisboa para proteger do “revisionismo literário” as bibliotecas municipais, declarou que esta prática de alterar os livros era comparável à censura própria dos regimes totalitários. O documento invocava o nazismo e o fascismo, já que em matéria de horror e prepotência são estes os regimes mais presentes na memória desta parte ocidental da Europa. Vou completar esta memória, contra a cartilha da esquerda ainda hoje recitada pelos próceres do Estado e da alegada “cultura” a benefício da Pátria desejadamente analfabeta. Lembro os regimes comunistas. Neles a censura sempre foi política oficial.

Lembro a União Soviética, onde Aleksandr Solzhenitsyn foi preso pela primeira vez ainda antes de terminar a segunda guerra mundial, por lhe terem interceptado uma crítica a Stalin numa carta a um amigo. A correspondência não era sagrada na União Soviética. Onze anos antes do “Arquipélago de Gulag”, em Novembro de 1962, Solzhenitsyn publicou “Um dia na vida de Ivan Denisovich”, sobre a vida dele num “campo especial” para prisioneiros políticos. A publicação foi autorizada por Khrushchev por lhe servir a ideia de circunscrever ao período de Stalin todos os horrores. De resto, uma fraude que Solzhenitsyn nunca aceitou e que, aos olhos da União Soviética, constituiu o seu maior crime político: para ele não existia “estalinismo”; existia comunismo. Todo ele igualmente infernal. Por este crime de opinião, Solzhenitsyn viveu perseguido, torturado, condenado até ser expulso, em 1974. Primeiro o NKVD, depois o KGB. Puseram-lhe escutas em casa, ouviram-lhe as conversas com os amigos, com os filhos, com a mulher. Não voltou a ter um minuto de privacidade. Hoje é fácil fazer uma biografia de Aleksandr Solzhenitsyn; toda a vida dele está gravada e transcrita, guardada nos arquivos do KGB.

Lembro Cuba, onde Reinaldo Arenas, escritor, poeta, e homossexual, foi comunista até deixar de ser.Antes que anoiteça”, a autobiografia publicada em 1992, serviu de base ao filme com o mesmo nome, de 2000, com Javier Bardem no papel de Arenas. Dizia que em Cuba não era proibido ser homossexual; o que não se podia era ser homossexual e, ao mesmo tempo, opositor do regime. A liberdade sexual estava limitada pela opinião política. Os apoiantes do regime eram livres de viver livremente a sua sexualidade; aos outros era servida a perseguição.

A própria expressão “revisionismo literário” é inadequada. Desde logo porque o revisionismo é, muitas vezes, não só legítimo como necessário. Por exemplo, aplicado à história. Sucede sempre que uma versão dos acontecimentos, aceite por largo período de tempo, é substituída por outra, em resultado do trabalho de um historiador que, olhando para outros dados, ou fazendo deles uma interpretação diferente, estabelece um novo conhecimento genericamente reconhecido. Sucedeu com a Revolução Francesa e o livro “Citizens: A Chronicle of the French Revolution”, de Simon Schama, publicado em 1989. E sucedeu em Portugal, com “O poder e o povo”, de Vasco Pulido Valente, publicado pela primeira vez em 1976, que destruiu a ortodoxia marxista em vigor e mostrou que a I República tinha sido “uma ditadura terrorista”, e um regime assente numa “cultura política que perseguia sem escrúpulos (e, às vezes, matava) uma extensa e indeterminada multidão de suspeitos”. A I República, a quem o PS insiste em prestar homenagem oficial, atingiu limites em número de presos políticos dos quais nenhum outro regime do Portugal moderno, incluindo o Estado Novo, algum dia se aproximou.

Mas um livro é uma obra de arte, e uma obra de arte é um documento. Não passa (ou ainda não passou) pelas cabeças destes polícias da nova moralidade alterar os quadros de Caravaggio, ou de Rubens, ou de Velázquez. Mas andam por aí alterando o que os autores escreveram. A lei prevê uma punição para quem alterar ou rasurar o que alguém assinou. Não, não se trata de “revisionismo literário”, mas de falsificação. Um livro é um documento assinado.

Convém relembrar histórias horríveis e olhar para as coisas como elas são, sobretudo aqui, em Portugal, desgraçado país cujo atraso também se expressa pela natureza do seu espectro político. É que felizmente não existe, com representação parlamentar, na Assembleia da República ou, para voltar ao início deste texto, na Assembleia Municipal de Lisboa, nenhum partido que se reconheça a si próprio como herdeiro do nazismo ou do fascismo. Mas há vários herdeiros do comunismo. E o PS, herdeiro estridente da I República, votou contra a recomendação do PSD. É importante e oportuno perceber exactamente o que eles representam.

LISBOA   PAÍS   COMUNISMO   POLÍTICA   CULTURA

COMENTÁRIOS
vitor Manuel
:
Tudo de bom e que continue na luta durante muitos e muitos anos no combate às forças negras destruidoras desta Sagrada Pátria, para a corajosa Margarida Bentes Penedo.              João Floriano: Excelente aviso para quem ainda não percebeu naquilo que o PS se está a tornar ou então sempre foi um partido comunista envergonhado que agora perdeu o pudor de se declarar, de sair do armário, assim como está a perder o pudor em muitas outras situações.            Maria Paula Silva > João Floriano: Não acho que sempre tenha sido. Há uma grande diferença entre os ideais e a prática do PS original e este. Acho que o PS de AC o é. Porque, e sempre o disse, o Costa não é socialista, he is the mole :)            João Floriano > Maria Paula Silva: Boa tarde cara Maria Paula Pelo menos desde 2015 que António Costa anda de braço dado com o PCP. Certamente já reparou na notícia: grupo de Bilderberg em Lisboa. Alguns portugueses no grupo, os do costume, penso eu. Vou ver o depoimento de João Galamba. Vamos ver se não promete uns murros a alguém que o «aperte». Até já!              Maria Paula Silva > João Floriano: Ainda não vi a notícia do grupo B mas vou ver. Ok, depois conte-me como foi a galambada!!!!               João Floriano > Maria Paula Silva: Estou quase a dormir. Está muito chato.                Maria Paula Silva > João Floriano: ahahah foi o que me aconteceu ontem ao ouvir a Eugénia.... não há pachorra, amanhã sai 1 notícia com a síntese :          Carminda Damiao: Excelente artigo.               Ana Silva: Excelente! A chamar a atenção para um dos maiores perigos actuais para a liberdade: o controlo do pensamento e da História pela manipulação da linguagem.            Maria Paula Silva > Ana Silva: e a falta de respeito pelo autor da "obra mutilada"! Hás De Cá Vir O "grupo de buda" ou o "grupo de Paris", Afonso Costa, Bernardino e outros despojos físicos da I Republica morreram, em Paris, nos inicios dos anos 40 de tédio e inanição. Todavia, o pai Soares homem da I Republica e herói da laicidade via seminário de Cernache, passou a herança laica e o pior que a república tinha ao filho Mário, juntando este depois o socialismo, quando passeava pela social democracia do norte da Europa, barrando o caminho ao PSD e, ao mesmo tempo fazendo a colecta de umas "kroas" para o precisado e recém nascido PS, ficando assim um partido socialista republicano e laico. Ora, este partido que nos tem governado maioritariamente depois do 25 de Abril, de resto muito bem representado pelo que se passou ontem na CPI e, só Deus sabe o que se passará logo à tarde, é o espelho consanguíneo dos caceteiros da I Republica. Ah, vou reler o livro do VPV "o poder e o povo" para refrescar a memória.           Joaquim Lopes: Júlio de Melo Fogaça, fidalgo do Cadaval, (esquecem as origens de Lenine ou de Engels), Fogaça foi denunciado pelo grupo de Cunhal do PCP à PIDE por ter craveira intelectual muito superior ao cego estalinista Cunhal e decerto por outros motivos que o ódio da figura de Cunhal e seguidores não toleravam, era assim dos arquivos da PIDE roubados e enviados para a URSS. Apagado da história do PCP, o partido de paredes de vidro e de telhados também de vidro, todos escaqueirados, pela sua contínua tentativa de tomada de poder com a ajuda da frente popular, do PS e do BE e Livre, o que hoje é impossível, tentaram em 1975, com a ajuda dos militares de carreira que destruíram as Forças Armadas e a economia com as nacionalizações do PCP de Cunhal e Mário Soares que também por lá passou, mas envergonhou-se ou então não lhe era conveniente, como se viu. De facto, adulterar livros com direitos de autor é crime e as editoras deveriam ser castigadas e julgadas, desacreditadas por quem ainda compra livros, os do acordo ortográfico e estes das novas narrativas, das minorias, muito micro, mas muito activas e impositivas, tipo pequenos grupos de ditadores a quererem impor os seus hábitos ou costumes, deveriam ser respeitados apenas.

Mas ao andar sempre armados em vítimas, só serve para ter efeito contrário, foi como a vergonha da projecção na fachada AR da bandeira de várias cores, decerto decisão de ASS que já poucos engana.             Joaquim Almeida > Joaquim Lopes: ASS a cuidar do seu rebanho eleitoral... Ofereçam-lhe um exemplar da Constituição ( "todos os cidadãos são iguais perante a lei, sem distinção de..., de..., de orientação sexual, etc.") para ele revelar o citado preceito constitucional a uma cambada de imbe..is hemicirculares.              Sérgio: Muitíssimo bom! Obrigado.                Lourenço de Almeida: As minhas desculpas. Escrevi o comentário anterior assim que li o primeiro período do texto. Quando me dispus a continuar a lê-lo, vi que o comunismo é referido logo em seguida. Parabéns pelo artigo.                  Lourenço de Almeida: Não sei porque é que se associa a censura a Nazismo e Fascismo e não a Marxismo, Socialismo e Comunismo quando o Fascismo acabou em 1944 (na versão portuguesa que de Fascismo tem pouco, em 1974), o Nazismo em 1945 e o comunismo, continua a existir em várias partes do mundo e mesmo na Europa Ocidental, continuou a fazer-se ouvir até hoje, quase 80 anos depois do fim do Nazismo e Fascismo (dois derivados directos ou variantes do socialismo) e 50 anos depois do fim do Estado Novo.              bento guerra: Ficaria melhor com exemplos concretos. Trata-se de querer "orientar" o pensamento. Estão por todo o lado e neste jornal, há no mínimo, uma dúzia  de leitores a fazê-lo. Tiques herdados                João Serra: Um clássico: Margarida Bentes Penedo a escrever verdades incómodas para o regime sociopata dos que se governam com o povo. Muito bem. Parabéns               Rosa Silvestre: Modificar o que alguém escreveu é um crime. Será que também aceitariam a modificação ou corte de documentos orais? Imaginem uma entrevista de há 50 anos cheia de pip-pips sobre palavras censuradas...         Alexandre Barreira: Pois. Cara Margarida. Acha bem o "Lobo Mau". Comer a "avózinha"....?!             C Barria: Parece-me também que esta história de andarem a alterar obras é falsificação, falta de honestidade para com as gerações futuras e acharem que as pessoas não têm capacidade de discernimento e que andam a comer gelados com a testa. paternalismo que me parece inaceitável. Woke uma treta.            Pobre Portugal: É por o PSD ter medo de dizer que o comunismo é igual ao nazismo, que não chega ao poder. Quem é que confia em pessoas que sabemos estar a mentir? O PS tem essa qualidade (a única!) que falta ao PSD: é honesto. Mostra o que é e assume-se amigo do comunismo. O problema, para o PSD, é que a honestidade cativa.                   Carlos Dias: O sistema político mais necessário a uma sociedade como a nossa é o liberal mais absoluto Só deve haver leis que protejam os direitos fundamentais A vida A propriedade privada A dignidade de ser português O resto não deve ser um direito mas sim uma responsabilidade de cada um A saúde A educação A habitação Quem não puder por si assumir as suas responsabilidades individuais por incapacidade física ou mental não deve ser excluído e deve sim ser ajudado por quem pode e deve ajudar por dever de honra Por dever de honra e não de solidariedade É um dever maior que qualquer sistema de segurança social imposto                   Carlos Dias: O marxismo foi experimentado em Portugal durante o breve período do PREC e apesar da curta duração provocou danos económicos e sociais que perduram até hoje A antítese do fascismo português foi uma desgraça pior ainda que o próprio estado novo Menos direitos humanos Menos economia Menos justiça Menos liberdade Só foi melhor no tempo que durou É impossível mudar de um regime autoritário para outro também autoritário e ideológico e esperar que possa correr bem Um projecto falhado não pode ser substituído por outro igual de sinal contrário O resultado não é algébrico É o mesmo ou ainda muito pior                    Carlos Dias: Existe uma benevolência endógena para com os declarados e orgulhosos herdeiros do comunismo É sobretudo fruto de desconhecimento histórico e também de décadas de propaganda que enaltecem o partido comunista português como o maior defensor da liberdade em oposição ao regime autoritário do estado novo É um paradoxo português que nunca foi verdadeiramente posto em causa e até foi inclusive alimentado por uma classe política com medo de afrontar a percepção de uma sociedade pouco esclarecida e pouco receptiva a mudar de opinião      Maria Paula Silva: Excelente! Adorei :) Hoje em dia não é preciso porem escutas, pois já todos temos as vidas escutadas através dos  devices  que usamos. Para além disso, até colaboramos voluntariamente através das redes sociais. :) Este artigo é importantíssimo e é bom que várias vozes se levantem, como fez recentemente Tom Hanks Esta onde wokista (até o nome é feio) pode ter vários objectivos mas representa apenas  muita mediocridade e ignorância. Qualquer pessoa com dois  dedos de testa  se recusaria a colaborar com esta idiotice. Obrigada, MBP. Joaquim Almeida > Maria Paula Silva: Mas o que essa gente busca é exactamente o obscurantismo. Por ex., o Min. Educação chama "integração de saberes" à sua "educação para a cidadania", a qual não passa de uma evidente charlatanice ideológica, anti-objectiva e anti-científica  - obscurantista, portanto.                Maria Paula Silva > Joaquim Almeida: Sem dúvida

 

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