O de HELENA GARRIDO, para complementar o anterior, de MARIA JOÃO AVILLEZ,
com uma análise do caso TAP, da nossa arruaça polida, que levaria a uma falsa
demissão de Galamba, gloriosamente boicotada por António Costa, em exibicionismo provocatório contra Marcelo e, e… À
suivre.
Um excerto de um texto de António Barreto, que recebi no Gmail, enviado pelo Luís, que pode servir de comentário a
este status de guerrilha insalubre e de insignificância grosseira de prestações
da nossa política de mulherio. Ou, mais rigorosamente, de compadrio:
«O
actual regime pode e deve aprender muitas coisas acerca da década larga de
1960-1974. Uma óbvia está na escolha da elite governante. Não há comparação
possível entre a envergadura intelectual e académica das principais figuras de
Salazar, com as fornadas de aparelhistas fabricadas nos ISCTEs e no Largo do
Rato, sem qualquer obra ou currículo visíveis. Neste aspecto fundamental,
regressámos ao ambiente da Primeira República». António Barreto, Público PT As
proezas económicas e sociais
A TAP ou a falta de Governo
O que se passou no gabinete do ministro das
Infraestruturas é grave e, mais uma vez, revelador de uma forma de governar. Mas tem a gravidade para justificar a
demissão do Governo ou mesmo do ministro?
HELENA GARRIDO,
Colunista
OBSERVADOR, 02 mai. 2023, 00:2446
O caso que TAP que agora envolve o
ministro das Infraestruturas João Galamba pode sistematizar-se em três
temas: as agressões à equipa do gabinete
por parte do adjunto; os documentos com as notas da reunião que envolve um
deputado do PS e a ex-presidente executiva da TAP e, finalmente, a decisão de
fazer esse mesmo encontro. Além disto há aquilo que se revela agora
como especialmente grave: o envolvimento dos serviços de
informação, o SIS. O gabinete
do primeiro ministro, na sua primeira
reacção ao caso, na noite de segunda-feira, garante que “as
autoridades agiram em conformidade no âmbito das suas competências legais”.
Mas todos estes acontecimentos antecipam
que o caso tem condições para continuar a agravar-se por via dos testemunhos
dos envolvidos na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP, nomeadamente quando
o adjunto exonerado, e depois o próprio ministro, forem ouvidos. O quadro político está num ponto tal que,
da direita à esquerda, e passando até pelo próprio PS, pede-se no mínimo uma
remodelação que envolva a substituição do próprio ministro das Infraestruturas.
No limite podemos ter eleições antecipadas, por extraordinário que possa
parecer. A acumulação de casos, mais do que o caso em si, parecem ser a
principal justificação para essas posições.
Se
olharmos para o conteúdo do que se passou, os acontecimentos são graves, com
responsabilidades do ministro, mas é sempre possível encontrar, em cada um
deles, atenuantes para João Galamba. Mas neste momento, em que ainda nem
tudo está esclarecido, pode ter sido a reacção impulsiva e precipitada e, no limite,
até amadora e autocrática a esses acontecimentos que merece a maior preocupação
e condenação política.
No meio de tanto ruído vale a pena
perceber do que estamos a falar. Não
se deve desdramatizar, até porque este caso é mais um de vários exemplos do
estado de descoordenação do Governo, da atitude pouco profissional com que
trata os assuntos de Estado e as suas tentações para a autocracia, para o uso
do aparelho do Estado para servir os seus interesses de sobrevivência no poder,
e não o país.
Comecemos pelas agressões. Nessa noite foram agredidas duas pessoas
das cinco pessoas que estavam no gabinete do ministro das Infraestruturas,
quando tentavam evitar que o adjunto, exonerado pelo telefone por João Galamba,
levasse o computador, que costumava ser seu, para casa. Uma das
assessoras do ministro teve de ir ao hospital e foi submetida a exames. Sobre
tudo isto o gabinete do ministro garante que tem provas. Há detalhes
adicionais, revelando bem a confusão que se estava a viver, com a polícia – que
não se sabe bem se foi chamada por uma das cinco pessoas do gabinete ou pelo
ex-adjunto – a deixar sair Frederico Pinheiro com o computador.
O computador é depois
resgatado, não sendo ainda claro quem o fez, se a Polícia Judiciária, se o SIS,
o que é importante para perceber se os serviços de informação extravasaram as
suas competências. Levando em conta os esclarecimentos do
primeiro-ministro, a garantir que tudo foi feito no quadro da lei, podemos
admitir que a questão foi esclarecida. O
gabinete de João Galamba parece ter-se limitado a informar o SIS que tinha sido
roubado um computador com informação classificada e fê-lo por sugestão do
gabinete do primeiro-ministro. E António Costa diz agora explicitamente que fez
bem.
Claro que o que se passou é grave e, pelo
menos em parte, podia ter sido evitado. O
adjunto agora exonerado acompanhava o dossier TAP desde o tempo de Pedro Nuno
Santos, com quem trabalhava desde os Assuntos Parlamentares. Na
sucessão, o novo ministro resolveu mantê-lo exactamente porque acompanhava o
dossier da TAP. O que levou João Galamba a exonerá-lo foi, pelo que tem dito o
ministro, a forma como actuou na preparação dos documentos a enviar à Comissão
Parlamentar da TAP. O ministro pode ter toda a razão do mundo, mas manda o bom
senso que não se demita uma pessoa – como não se despede – pelo telefone. Com
isso não se apercebeu da reacção nem, obviamente, a conseguiu controlar.
Depois há obviamente toda a reacção
atabalhoada que se pode compreender pelo estado de nervosismo das pessoas
envolvidas, duas delas agredidas. Mas não parece ter existido bom senso fora
daquela sala, com orientações de ligar para aqui e para ali, envolvendo até os
serviços de informação. Não houve
ninguém com serenidade para actuar sem agravar ainda mais a situação.
O segundo tema é, para simplificar, os documentos. O ministro afirma que sempre teve
intenção de entregar todos os documentos, nomeadamente os que dizem respeito à
reunião com a ex-presidente da TAP, à CPI. O agora ex-adjunto acusa o ministro
de não o querer fazer. Facto: até ver, os documentos foram entregues e
o ministro argumenta ainda que pediu a prorrogação da data para que se pudesse
fazer chegar à CPI as notas que o seu ex-adjunto disse que afinal tinha.
Podemos sempre acreditar mais numa parte do que na outra, mas o facto é que, até
que se provem que existem outros documentos, o ministro das Infratestruturas
entregou as notas dessa famosa reunião que estavam na posse do adjunto que
exonerou. Não podemos avaliar o ministro por declarações de intenções realizadas
por um adjunto exonerado.
Finalmente as reuniões com a
presidente da TAP. Já se sabia que
tinha sido João Galamba a dizer à presidente da TAP que existia um encontro com
o Grupo Parlamentar do PS que tinha manifestado também vontade de reunir com ela.
O que não se sabia é que João Galamba também tinha dito, nesse dia, que era bom
que a presidente da TAP fosse a essa reunião. Este pode não ser o caso mais
apelativo, mas para o bom funcionamento do regime é o mais problemático, para
dizer o mínimo. Os deputados, incluindo os que pertencem ao partido que
governa, devem escrutinar o Governo, coisa que obviamente não fazem se andarem
a combinar perguntas e respostas. Sim, a TAP está sob um plano de
reestruturação que o Governo tem de acompanhar de perto, até pelo dinheiro dos
contribuintes que já lá injectou. Mas bastaria, no respeito pelo papel do
Parlamento, o Governo artilhar-se com a TAP sem envolver os deputados.
Toda esta trapalhada é inacreditável e lamentável, não apenas em si,
mas pela acumulação de casos em que se tem envolvido um Governo, com pouco mais
de um ano em funções, com uma maioria absoluta, dinheiro como nunca houve para
investir e uma economia pujante. Tem sido repetido até à exaustão que o
primeiro-ministro tem de escolher melhor a sua equipa. Agora temos de alertar
igualmente que os ministros devem escolher melhor os membros do seu gabinete
para que não fiquemos todos a alimentar cada vez mais a suspeita de que a
governação é tratada com leviandade e amadorismo.
O Governo, e especialmente o
primeiro-ministro, vai ter de parar um bocadinho para refletir. O que se tem
passado é demasiado grave. Quando pensamos que pior é impossível, há mais um
caso a mostrar que sim, é possível. Depois de agressões dentro de um gabinete,
um acontecimento nunca visto, é possível esperar ainda pior? Parece que sim, especialmente se o primeiro-ministro não
agarrar a governação.
Como sublinhou António Costa Pinto na RTP, o facto de o Presidente
não se ter, desta vez, precipitado a comentar o assunto é um dos sinais mais
fortes da gravidade do tema. Pode não ter sido ainda a gota de água que fez
transbordar o copo de Marcelo Rebelo de Sousa, mas estamos cada vez a
aproximar-nos mais. A economia não é tudo, é preciso também a
política, disse no dia 1 de Maio. Já recordou também o que tinha dito quando António
Costa escolheu apenas substituir Pedro Nuno Santos em vez
de fazer uma remodelação. Nós aprendemos que a maioria absoluta não garante
tudo. E a partir de determinada altura o Presidente vai começar a preocupar-se
seriamente com aquilo que a História dirá sobre si. E António Costa perderá uma
oportunidade única de levar o país a dar um salto no seu desenvolvimento.
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