sábado, 20 de maio de 2023

Donde se depreende


Que o comentário de Adriano Miranda Lima ao texto anterior de HSF sobre a “condição paisana” (in “Com vodka ou sem ela”) vem a matar como corolário deste 2º texto de continuação sobre o tema, com a falta de ética “regulamentar” destes tempos nossos, talvez já consequência de uma cada vez maior ausência de princípios – sejam eles éticos ou regulamentares – que a não obrigatoriedade do Serviço Militar torna cada vez mais precários, o que se revela afrontosamente na imbecilidade fulanizada de ministros e acompanhantes publicitários com que as televisões massacram tenebrosamente os ouvintes de tão hedionda aventura jornaleira desses ministros de pocilga. 

(O comentário deAdriano Miranda Lima a este segundo  texto confirma e acentua o primeiro)

DA CONDIÇÃO PAISANA - 2

HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO, 19.05.23

A Ética paisana é intelectual; a Ética militar é regulamentar.

* * *

A Ética tem a ver com os factos e deriva da Moral que tem a ver com os princípios; historicamente, cada Moral tem origem na respectiva religião e esta, por sua vez, invoca a(s) respectiva(s) Divindade(s) para distinguir o Bem e o Mal. O pragmatismo militar reduziu toda a exegese dos Livros Sagrados a um único texto dogmático a que por cá chamamos «Regulamento de Disciplina Militar».

* * *

Da condição militar fazem essencial e nomeadamente parte três elementos, a saber: a disciplina, o aprumo e a honra. Da condição paisana não é essencial a pertença de qualquer um destes elementos pois andam por aí muitos indisciplinados, despenteados e snobes (sine nobilitatis).

E a questão era a de saber que enquadramento dar aos paisanos «despenteados que se queriam militarizar. Assim se inventou essa classe dos mercenários, os combatentes «sine nobilitatis».

CONCLUSÃO: Nem todos merecem a honra militar.

(continua)

Maio de 2023

Henrique Salles da Fonseca

Henrique Salles da Fonseca

Tags: sociologia

COMENTÁRIO:

Adriano Miranda Lima  19.05.2023  23:12

Permita-me, Dr. Salles da Fonseca, que eleja Fontes Pereira de Melo, militar que foi um dos maiores estadistas de Portugal, como a síntese da extrapolação que este seu texto sugere: a ética paisana (intelectual) será sempre incompleta, para não dizer coxa, se não beber alguma coisa da ética militar. Mais até do que a disciplina e o aprumo, o sentido da honra é absolutamente essencial à ética paisana. É um valor estruturante e catalisador de tudo o que predispõe ao serviço público, desde logo, o sentido do dever e a dedicação à causa pública, tendo como único móbil a satisfação pessoal pelo dever cumprido.
Olha-se para a qualidade genérica dos nossos políticos e servidores públicos, e é impossível não reconhecer em muitos casos importantes carências relativamente àqueles princípios. Assim se explica a prática da corrupção e do nepotismo entre detentores de cargos públicos constantemente ventilada na comunicação social. Mas será errado pensar que é fenómeno dos últimos anos ou décadas. Não há muito tempo, li que no regime de Salazar era corrente e vulgar o compadrio e o nepotismo, e se calhar também o eram casos de corrupção. Ora, Fontes Pereira de Melo fez história como parlamentar e como estadista, antes de, enquanto jovem oficial, ter tido também comportamento honroso no campo da honra (guerra civil). Os seus competentes governos cairam mais de uma vez, mas tão depressa voltavam a ser reeditados, porque havia a percepção entre os seus pares e opositores de que ele era difícil de substituir. Nos debates parlamentares, em que não raro o ambiente do confronto se degradava, ele não era tratado como mais um deles. Ninguém o ousava tratar por tu.

Direi que Fontes Pereira de Melo personificava a junção e a articulação perfeitas da "ética paisana e da ética militar".
Tanta falta que disso temos, mormente nos tempos que correm, em que o debate político se transformou num verdadeiro chiqueiro.


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