“É
uma constante da vida / Tão concreta e definida / Como outra coisa qualquer…” -
ainda que o mundo não pule nem avance, e muito pelo contrário, pareça
retroceder… Temos o nosso próprio exemplo comprovativo, de portugueses que
sabemos puxar os cordelinhos, não para fazer pular o mundo – isso foi chão que
deu uvas - mas para o proveito pessoal, o único mundo importante para os do
sonho nacional. Autrement…
umbiguistas se lhes pode chamar… Arranjistas também…
A força dos “deploráveis”
Serão as linhas vermelhas que alguns
pretendem aplicar racionais, democráticas, desejáveis, ou sequer eficazes e
respeitadoras da vontade do povo?
JAIME NOGUEIRA
PINTO Colunista do Observador
OBSERVADOR, 27 jan. 2024, 00:1844
A 9 de Setembro de 2016, no jantar de
recolha de fundos “LGBT por Hillary” em Nova Iorque, a candidata democrática à
presidência dos Estados Unidos punha
num mesmo saco, o dos “deploráveis”, a maioria dos apoiantes de Donald Trump. E,
encorajada pelos risos e aplausos da assistência, prosseguia, especificando o
conteúdo do dito “basket of deplorables”, carregado de “racistas, sexistas, homofóbicos, xenófobos e islamofóbicos”;
carregado, enfim, de desqualificados opositores políticos.
Só Deus sabe o que leva um eleitor, sobretudo um indeciso de última
hora, a votar nesta ou naquela candidatura numa situação de oposição radical,
mas a bravata de Hillary talvez lhe tenha custado a eleição. Caricaturar
os adversários políticos de forma maniqueísta e enfiar num mesmo saco milhões
de votantes, chamando-lhes deploráveis, tinha tudo para ter consequências
desagradáveis. E teve, porque, ao contrário do que imaginam algumas
pseudo-elites, o povo não é estúpido.
Com as transformações geopolíticas
que vieram com o fim da Guerra Fria, as classes populares e parte das classes
médias do Ocidente viram-se marginalizadas e penalizadas pelo “sistema”. Foi,
também, o preço da melhoria de vida nas periferias asiáticas, mas, o que é
certo, é que quem o pagou foi parte significativa dos cidadãos da América do
Norte e da Europa ocidental. Era, por isso, natural que a mudança do
panorama político do Ocidente viesse pela mão dos lesados, de “deploráveis”
como os operários das fábricas de automóveis de Detroit e das siderurgias de Pittsburgh
ou os trabalhadores comunistas franceses que, no início do século XXI, passavam
do PCF para o Front National.
Os velhos liberais da mão invisível ou os marxistas de uma luta de
classes determinadas pelo lugar na Produção não deviam ter estranhado o facto
de a decadência da indústria e a desindustrialização terem mudado as convicções
e o sentido de voto do povo. Mas estranharam. E estranham.
E alhearam-se. Até porque, entretanto, os valores de Deus, de Nação, de Família, de Justiça Social tinham já sido abandonados numa deriva – engolidos,
à direita, pelo globalismo agnóstico, mundialista ou federalista europeu; e, à
esquerda, pelas micro-causas, as micro-ofensas e as macro-inquisições
diacrónicas e sincrónicas de minorias urbanas de género e espécie, apostadas em
diluir no seu arco-íris planetário as lutas pela igualdade social, racial e
sexual do anterior paradigma.
Mas, aparentemente, havia vazios
deixados pelo fim de alguma prosperidade e estatuto, pelo declínio do
cristianismo social e pela falência do “sonho comunista” que nem mesmo o mais inclusivo e frondoso
dos arco-íris conseguia preencher. Assim, os “danados da terra” – que,
juntamente com as classes médias empobrecidas, reagiam a uma “modernização dos
costumes” imposta de cima, aos “novos direitos humanos” endossados pelos
milionários do World Economic Forum, à imigração descontrolada e à corrupção
que viam generalizar-se – passavam de
“vítimas da fome”, a defender e a mobilizar, a “deploráveis”, a desdenhar e a
cancelar.
Como sempre acontece em épocas de
mudança radical e desorientação geral, perante o aparecimento de novas forças,
as forças instaladas qualificavam como ressentidos ou enganados os que,
descontentes com as alternativas disponíveis, migravam para novos movimentos
políticos.
De
resto, como o vazio ideológico acaba por ser preenchido, o aparecimento à
esquerda e à direita de novos partidos e novos líderes não era de surpreender. À
direita, onde apareceram com força, a par de algum ateísmo pós-moderno e
populismo simplista comum ao das esquerdas mas de polo oposto, surgia um resgate e uma renovação de valores
identitários e vitais; valores espirituais e temporais, éticos e políticos que
tinham estado durante séculos em vigor na Europa, no Ocidente, e surgido
noutros pontos do globo.
Para os combater e combater tudo isto, o sistema instalado – que à esquerda, ao centro e até ao centro
direita não é já o sistema tradicional, mas uma versão esvaziada e contaminada
pela retórica e pelo bullying ideológico das esquerdas mais extremas
– parece disposto a tudo. E cego às suas próprias derivas totalitárias e à
disrupção que encerra a “legislação avançada” que levianamente encoraja ou
permite, propõe-se empenhar as armas poderosas que tem na
cultura, no ensino e na comunidade mediática numa cruzada contra uma
“extrema-direita” que equipara aos totalitarismos fascistas e nazis ou aos
autoritarismos ditatoriais do passado.
Ora
uma das coisas que caracteriza estas novas direitas – populistas, populares,
nacionais-conservadoras ou o que se lhes quiser chamar – é precisamente o facto
de serem democráticas no acesso ao poder e no seu exercício, conquistando e
mantendo o poder democraticamente e cedendo o lugar quando o perdem eleitoralmente
– com mais ou menos ruído, mas cedendo.
Nestas circunstâncias, serão as linhas vermelhas que alguns
pretendem aplicar-lhes, racionais, democráticas, desejáveis, ou sequer eficazes
e respeitadoras da vontade do povo?
A SEXTA COLUNA HISTÓRIA CULTURA ELEIÇÕES POLÍTICA
COMENTÁRIOS (de 44):
Maria Soares: Brilhante! Rui Lima: JNP rezo por si para que viva muitos anos para que todos
nós possamos continuar a ler as suas crónicas, o senhor consegue nestas
4 linhas dizer tudo o que está a acontecer. Estes
novos valores da esquerda woke serão mais mortais para o Ocidente
que todas as guerras da Ucrânia a Gaza … “ Assim, os “danados da
terra” – que, juntamente com as classes médias empobrecidas, reagiam a uma
“modernização dos costumes” imposta de cima, aos “novos direitos humanos”
endossados pelos milionários do World Economic Forum, à imigração descontrolada
e à corrupção que viam generalizar-se – passavam de “vítimas da fome”, a
defender e a mobilizar, a “deploráveis”, a desdenhar e a cancelar.” Manuel
Lourenço: Tão óbvio que até dói. E a estupidez do “centro direita” tuga corrupta é
tão estúpida que até confrange.
Carlos Chaves: Muito obrigado Jaime Nogueira Pinto, estou sempre a
aprender consigo! Transpondo para o caso português é ignóbil o papel da
comunicação social na transformação do nosso panorama político! Ignora tudo o
que acabou de escrever, e claramente põe-se de um dos lados, esse sim que luta
para se manter no poder! Vai ser apenas uma questão de tempo para engolirem
tudo o que de errado têm andado a fazer(-nos)! Jorge
Carvalho > Carlos
Ferreira: Está a referir-se às INVENTONAS
pós eleitorais pós Trump e Bolsonaro montadas pela esquerda já no poder e pela
sua Guarda Pretoriana da comunicação social que só beneficiaram na encenação os
pseudo atacados e no Brasil permitiu ao Lula fazer uma purga a todas as
instituições que não se vergam à sua cleptocracia? Não sejemos Anjinhos. Não
sei se tem idade para ter assistido à nossa INVENTONA do 28 de Setembro seguida
pelo seu justificativo 11 de Março que pôs o PCP no governo através de Vasco
Gonçalves como 1.º ministro. Só papalvos podem papar com estas encenações
históricas. observador
censurado: Excelente
texto que descreve com mestria a realidade actual dos E.U.A e da Europa
Ocidental. Quando sairam os resultados das últimas eleições nos E.U.A., nem
queria acreditar no que estava a ver (sou ignorante nestas questões): Donald Trump ganhou nos Estados
pobres dos E.U.A.; Joe Biden ganhou nos
Estados ricos dos E.U.A. A bota não batia com a perdigota: Donald Trump, o
representante dos pobres, a apanhar pancada da "esquerda" portuguesa?
O mundo terá virado do avesso?
Maria Soares: Brilhante! bento guerra: Entre nós, também o Montenegro marcou as suas
"linhas vermelhas": votos no Chega não contam e só governará se
ganhar as eleições. Parece que já andam a negociar o "patim" para ele
e próximos Rosa
Silvestre: Gostei especialmente deste período:
"à esquerda, pelas micro-causas, as micro-ofensas e as macro-inquisições
diacrónicas e sincrónicas de minorias urbanas de género e espécie, apostadas em
diluir no seu arco-íris planetário as lutas pela igualdade social, racial e
sexual do anterior paradigma." Rui Lima >
Américo
Silva: Acerta no seu comentário em cheio, não os deixam educar
de várias maneiras, logo programa escolar nivelando tudo por baixo
para acolher 20 nacionalidades diferentes na mesma turma , perseguido as
escolas quem bem funcionam , pela teoria do género , pela violência nas escolas
, professores esgotados batidos e mortos em escola desta Europa ….pelo domínio
de uma cultura que só lê um livro que decora . Domingas
Coutinho: As linhas vermelhas definem quem as traça e dão-lhe um
certo carisma mas na prática não são uma boa política. Lá diz o povo “nunca
digas nunca”. Américo
Silva: Os deploráveis são os deserdados do capitalismo, não influenciam os
governos, residem nas periferias incómodas, não podem pescar em águas poluídas,
não podem explorar a terra, suportam as indústrias poluentes, aguentam a
imigração, não têm acesso ao trabalho, não os deixam educar os filhos, não têm
acesso à informação contraditória, nem à justiça, não estão confortáveis e
querem mudança. Nokogiri
> Carlos
Ferreira: A falta de informação ou a censura dos media "main stream", cada
vez mais em vias de falência, provocam esse tipo de imagem sobre o que passou
no Brasil e Bolsonaro e nos USA de Trump, não perceber o que fez o STE e o STF
no Brasil contra Bolsonaro e favor de Lula ou do PT, ou o uso da justiça nos
USA contra Trump, tanto pelo grupo Biden/Obama/Clinton do grupo dos democratas
e as pseudo elites de Washington, mais um grupo de senadores republicanos,
levam á situação de guerra civil de baixa intensidade e da invasão criminosa
permitida por esta administração com um pseudo presidente Biden, uma pessoa sem
condições mentais para o ser, sendo controlado por Obama e Clinton e os seus
gangs. Maria
Nunes: Excelente. Obrigada JNP. Nuno Alves: Resumo muito claro. Obrigado vitor Manuel: Depois de saborear este
magnífico texto o que poderei dizer, além de um grande obrigado?! Rosa
Silvestre > Domingas
Coutinho: Uma das grandes mais-valias dos partidos de direita é precisamente obrigar
a olhar para as necessidades e anseios dos esquecidos dos governos de esquerda
e centro-esquerda há décadas no poder. A.l. Sameiro: Excelente e actual!!!
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