Macio, suave, rosto sério de quem não quebra um prato.
Algodão que não engana, na perfeição da sua limpeza, na perfeição dos seus
espectáculos de uma compostura e beleza que raiam o milagre, na compostura
cínica de um discurso sereno de vencedor implacável. Assim, começara por nos mandar o
vírus, sorrateiramente, vírus lá iniciado, a disfarçar, na sua China domada,
mas depressa se livrou dele, desse vírus, que não descola do resto do mundo,
peganhento e eterno. Entretanto, a ameaça agora é outra e o seu espectáculo comemorativo
do centenário comunista chinês seria sinistramente impecável e ameaçador, de
tão geométrico e colorido. Ai de quem lhe queira cortar, pois, as voltas, para
o seu domínio universal!
Qui vivra verra...
Xi Jinping promete um partido e uma nação invencíveis
O líder chinês fez um discurso forte e
desafiador para assinalar o centenário do Partido Comunista. Projecção
internacional e modernização militar são para manterséria que não move .
PÚBLICO, 1 de
Julho de 2021
Foto: Xi Jinping discursou no centenário do PCC com um fato idêntico
aos que eram usados por Mao XINHUA/JU PENG / EPA
Foi em tom de desafio que Xi Jinping discursou
perante 70 mil pessoas em Pequim, durante o culminar dos festejos do centenário do
Partido Comunista Chinês (PCC) esta quinta-feira. Com a segurança de se saber o líder chinês mais
poderoso desde Mao Tsetung, Xi deixou avisos aos adversários do regime, prometeu
a reunificação com Taiwan e
proclamou a proeminência do partido e a sua irredutibilidade.
Com
Xi no poder desde 2013, nada é deixado ao acaso e os pormenores contam.
Vestido com o fato idêntico aos do “grande timoneiro”, Xi discursou durante
mais de uma hora de costas para os Portões da Paz Celestial, na Praça Tiananmen,
de novo o local escolhido para um acontecimento histórico da República Popular
da China.
Foi ali que Mao anunciou a vitória da guerrilha comunista
sobre os nacionalistas do Kuomintang, a 1 de Outubro de 1949; que Lin Biao proferiu o discurso que
lançou as bases da Revolução Cultural, a
18 de Agosto de 1966;
e onde os tanques do Exército de Libertação do Povo
avançaram sobre os estudantes a 4 de Junho de
1989. A
1 de Julho de 2021, Tiananmen foi o palco da renovada confiança chinesa sobre o
mundo.
O secretário-geral regressou aos
primórdios da fundação do PCC, em Xangai, há cem anos, para exultar o seu
trabalho na eliminação do “sistema de exploração feudal que persistiu durante
milhares de anos na China” e para anunciar que os objectivos de construir uma
“sociedade moderadamente próspera” e sem pobreza foram atingidos. “O povo chinês é bom não apenas a
destruir o mundo antigo, mas também a construir um novo mundo”, declarou Xi. “Apenas o socialismo pode
salvar a China, e apenas o socialismo com características chinesas pode
desenvolver a China”, afirmou.
Num
discurso cheio de avisos dirigidos a adversários nunca nomeados, Xi quis deixar
bem clara a posição hegemónica do PCC na
sociedade, política, economia e cultura da China, tão viva hoje como
antes. O
partido é “a espinha dorsal do país”, afirmou, pelo que “o êxito da China depende
do partido”.
Qualquer tentativa de retirar
poder ao PCC ou de virar os chineses contra o partido está destinada
a falhar, avisou Xi. “Os
mais de 1,4 mil milhões de chineses nunca irão permitir que um cenário desses
possa acontecer.”
“Muralha de aço”
O tom manteve-se na hora de olhar
para fora, onde cada vez mais se jogam as prioridades da liderança chinesa
no século XXI. Com Xi
Jinping, a China acelerou a projecção do seu poder a nível
internacional, com a expansão sem precedentes dos seus interesses económicos e
geopolíticos. Ao fazê-lo, o regime chinês passou também a coleccionar
adversários, que olham para a sua ascensão com apreensão.
O centenário do PCC chega numa
altura em que a China é fortemente criticada pelos abusos de direitos humanos
cometidos em Xinjiang, em Hong Kong e no Tibete, mas também pelo envolvimento
em disputas territoriais com a maioria dos seus vizinhos, desde a Índia até às
Filipinas. É também
uma época em que a rivalidade com os EUA pela hegemonia geopolítica
parece entrar num caminho sem retorno.
A relação com os outros países é um
tema sensível na China e com enorme lastro histórico. Aos seus compatriotas, Xi
prometeu que a época de humilhação para os chineses acabou definitivamente. “Nunca intimidámos, oprimimos ou subjugámos povos
de outros países, e nunca o iremos fazer. Na mesma medida, nunca iremos
permitir que nos intimidem, oprimam ou subjugam”, declarou, para logo
acrescentar aquela que é a frase de maior efeito no seu discurso: “Quem
quer que o tente fazer irá entrar em rota de colisão com a muralha de aço
construída por 1,4 mil milhões de pessoas.”
A segurança de Xi advém do crescente poderio militar chinês e, por isso,
reservou um elogio para o Exército de Libertação do Povo – que responde
directamente ao PCC – por ter alcançado “feitos indeléveis” e deverá manter a
sua missão de proteger a soberania chinesa e os interesses do país não só na
região, mas “mais além”. Com Xi,
as forças armadas chinesas atingiram níveis inéditos de modernização em todas
as áreas, uma tendência que é para manter, prometeu o chefe de Estado.
Sem
surpresa, Xi reafirmou o objectivo de alcançar a “reunificação”
com Taiwan, considerada
pelo regime de Pequim como uma região separatista, que definiu como “uma missão
histórica inabalável”. “Todos os
filhos e filhas da China, incluindo os compatriotas dos dois lados do Estreito
de Taiwan, devem trabalhar em conjunto e seguir em frente em solidariedade,
esmagando de forma resoluta quaisquer conspirações de ‘independência em
Taiwan’”, disse Xi
Jinping.
Não
é a primeira vez que o Presidente chinês assume sem rodeios a intenção de
avançar com a reunificação de Taiwan, a ilha para onde fugiram em
1949 os nacionalistas derrotados da Guerra Civil e onde desde então se
consolidou um regime democrático, apoiado e garantido militarmente pelos EUA. A existência de Taiwan depende de um frágil
equilíbrio diplomático e, para muitos analistas, trata-se
do ponto sensível através do qual a rivalidade latente entre Pequim e
Washington pode precipitar-se.
As autoridades taiwanesas criticaram o discurso de Xi e prometeram
defender a “soberania” e a democracia na ilha. Apesar de reconhecer a
capacidade do PCC, por ter alcançado “um certo desenvolvimento económico” na
China, o Conselho de Assuntos Continentais de Taiwan afirmou que o país é uma
ditadura que oprime os direitos e liberdades do seu povo.
O
discurso de Xi foi o culminar de uma celebração que se estendeu a toda a China
nos últimos dias, que pretende deixar rapidamente para trás o capítulo aberto
pela pandemia originada em Wuhan, no final de 2019. Em Pequim, os céus
encheram-se com helicópteros militares e caças de várias classes, deixando os
habituais rastos de cor vermelha. Foram disparadas cem salvas de 56 canhões,
que representavam os 56 grupos étnicos da China, explica o Guardian.
Cartazes e material promocional de
vermelho garrido foram exibidos em autocarros, estações ferroviárias e
aeroportos em todo o país e, nas cidades, as grandes acções comemorativas foram
provas da capacidade organizativa dos ramos locais do PCC e dos seus 95 milhões
de militantes.
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