De que tanto se ouvia falar, quando tudo começou, em Abril de 74, não
era, talvez, bem esta, de que trata o Dr. Salles, a respeito da distribuição
das “massas” por aqui processada, do Estado para os contribuintes, e vice-versa,
dos contribuintes para o Estado, que parece, actualmente, ser generoso na
distribuição que faz das massas que de fora recebe, mas a exigência na absorção
das receitas próprias, desses contribuintes que gemem sob o peso dos impostos
sobre os seus rendimentos, mostra quanto isso não passa de ficção, condenatória
a uma cepa sempre torta e gemebunda. O Dr. Salles dá-nos lições de economia,
justificada por preceitos de moral que aqui se não aplicam e por isso o “dinheiro
foge” de cá, por “se sentir em perigo”. Trabalhássemos com competência, sem a
usual matreirice que redunda em desequilíbrios sociais permanentes, mas
houvesse também uma Justiça que punisse tanto desmando na fuga do dinheiro, e
um ensino que visasse uma formação moral e cívica séria e competente, e
saberíamos apreciar os preceitos de hombridade que o Dr. Salles bem se esforça
por ditar.
Quanto às demais teorias económicas, sinto que são demasiado elaboradas
para a minha capacidade abarcante, e prefiro lê-las e admirá-las, e deixar a
sua análise para comentadores mais em comunhão com essas. Retomo, em
pensamento, de preferência, a tal “transparência política” de que ouvia falar,
quando tudo começou, e eu ria intimamente do pretensiosismo retórico e oco das
competências palavrosas de então.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 26.11.22
ou
O TRIBUTO JUSTO
O serviço que o Estado presta ao
cidadão deve ser pago. Na ausência de serviço, o saque é imoral.
* * *
O dinheiro só foge de onde se sente
em perigo.
* * *
A primeira condição para a
tranquilidade do dinheiro é a liberdade de movimentação de capitais – só pomos
as nossas poupanças em lugar (país, banco) donde as possamos sacar em qualquer
momento e sem necessidade de justificações.
A
segunda tem a ver com a solidez do sistema bancário – a experiência
portuguesa dispensa explicações...
A
terceira é definida pela carga fiscal – justificativo da existência
profusa de paraísos fiscais.
A
quarta condição para a tranquilidade do dinheiro tem a ver com a
remuneração dos capitais- «guerra» Draghi-Lagarde.
* * *
A livre circulação de capitais
é um dado adquirido na UE e desde a adesão à CE. Trata-se, pois, de um
não-problema (a menos que os capitais queiram migrar para a Rússia, Cuba,
Coreia do Norte, Venezuela…).
Sobre a solidez da banca portuguesa,
estamos falados com o desaparecimento dos banqueiros lusos. Recuperando
o que há anos escrevi, o crédito
não é um direito universal e, pelo contrário, só deve ser concedido a quem o
merece. Este merecimento merece matematização mais apurada do
que os métodos que vêm sendo usados na análise do risco. Para já, eu próprio tenho sérias
dificuldades na matematização de dois factores que terão estado muito em voga, o «compadrio» e o «Gamanço». Estes,
sim, devem ser os factores que configuram as «grandes palmadas» que
destabilizaram a banca que foi de capitais portugueses. A menos que tudo o que
a comunicação social informa seja «fake»
…
Quanto à remuneração dos
capitais, remeto-me para o que já escrevi sobre a «guerra» Draghi-Lagarde cuja
simultaneidade com o problema da Ucrânia faz confundir muita gente: o que está
em causa é a remuneração dos credores que já estavam fartos dos juros
negativos.
4.Deixo
para 4 a condição 3 do incómodo do dinheiro, a carga fiscal, para fechar com
chave de chumbo. E se a comodidade dos capitais se mede na razão inversa da
carga fiscal, colhe perguntar não já para que servem os impostos, mas
sim da sua moralidade. Então,
grosseiramente, dividamos apenas os impostos directos e os indirectos
englobando as taxas nestes últimos e os emolumentos nos primeiros. Deste modo
(sempre grosseiramente, mas sem grosserias), reconheçamos que, cumprindo
ao Estado servir o cidadão, se faça pagar pelos serviços prestados. E assim fica moralmente justificada
toda a fiscalidade indirecta. No
que se refere aos directos, sobre os rendimentos singulares e colectivos, a
necessidade de financiamento das despesas públicas não justifica cabalmente a
moralidade desse tipo de tributação.
Salvaguardando o princípio da inconsignação das receitas, reconheçamos que a
tributação do trabalho («ad valorem» em regime de taxas fixas) deve servir para
financiar o sistema de segurança social. Mas pergunto-me se as Despesas
Gerais do Estado não deveriam ser financiadas apenas por uma taxa única
aplicada a todos os contribuintes, individuais e colectivos: taxa única
destinada ao financiamento de Administração, Segurança, Saúde, Justiça. E
assim se moralizaria (cobrando um serviço prestado pela Estado a todos os
contribuintes) o absurdo moral desta componente da tributação directa. E o
papel redistributivo da riqueza? Excluindo a demagogia populista, a função
deve ser incluída na Segurança Social e, daí, ser financiada pela tributação
laboral. E que tudo o resto seja financiado pelos impostos indirectos.
* * * *
Terão os meus críticos muitas
razões relacionadas com o deficiente pragmatismo de financiamento do Estado
implícito nas minhas propostas.
Mas, pelo menos num aspecto,
não poderão atacar o que afirmo, o da imoralidade geral da tributação directa.
Mais: o cúmulo da imoralidade fiscal é o caracter progressivo das taxas
aplicado na escala crescente da matéria tributável.
E pronto, fico à espera da
excomunhão que me lancem os fiscalistas (sobretudo os da banda esquerda da
nossa Praça do Comércio).
Novembro de 2022
Henrique Salles da Fonseca
Tags: economia
COMENTÁRIO:
Anónimo
26.11.2022 15:42: Estou
hesitante em te lançar, Henrique, a excomunhão ou de te aplicar uma penitência
severa. Vejamos. Nada a dizer em relação à condição 1 nem à 3, esta já tratada
anteriormente. Quanto à 2, dificilmente encontro explicação para o que ocorreu na
Banca, após a sua reprivatização. Tínhamos uma Banca sem reparo de maior no
tempo do Estado Novo. Tivemo-la capaz de suportar as crises sucessivas após o
25 de abril e, uma vez reprivatizada, alguma, com dimensão significativa,
volatizar-se-ia se não tivesse sido o amparo público. E mais do que isso: antes
do 25 de abril, apenas 3 pequenos bancos estrangeiros operavam em Portugal e o
capital dos restantes era, na sua totalidade ou quase, nacional. Actualmente,
com excepção dos bancos públicos e de pouco mais, todo o restante capital é
estrangeiro e maioritariamente espanhol. Os interesses bancários espanhóis avançam em Portugal
paralelamente com a retirada de bancos com capitais de outras origens (Alemanha
e Reino Unido, por exemplo) e com a alienação de operações bancárias
portuguesas em Espanha. Vamos
definhando e abandonando a ordem externa. No que respeita à condição 4,
aprendemos, na década 60 (não sei se actualmente ainda será assim…) que a
equidade fiscal era tanto maior quanto mais a arrecadação fiscal se fizesse
através de impostos directos e que estes não fossem celulares (um imposto para
cada tipo de rendimento ou de património), como havia nesse tempo, mas sim que
o imposto englobasse os vários tipos de rendimento e/ou de património. Entendia-se
que os impostos indirectos, tal como a inflação, eram regressivos, pois
penalizavam proporcionalmente mais as pessoas com maior propensão para o
consumo, que eram as de menor rendimento. A questão de
fundo está (e estará) na magnitude dos impostos arrecadados versus
contrapartidas auferidas, directa ou indirectamente. O
famoso despesismo de uns Estados confrontado com a frugalidade de outros. A gama de serviços que um Estado presta
comparada com a contribuição fiscal do cidadão ou da empresa. Não creio que
algum Estado abdique da sua função redistributiva. Aqui o tema é essencialmente
a forma e a sua agressividade. Não me parece que aquela possa residir apenas na
tributação laboral, pois isso seria iníquo para quem tem só rendimento do
trabalho perante, por exemplo, quem tem igual nível de rendimento de origem
diferente. Isto foi o que aprendi, mas tudo evolui e temos de estar abertos a
novas conceções e ideias. Grande abraço. Carlos
Traguelho
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