quinta-feira, 10 de novembro de 2022

«De sorte que Alexandro em vós se veja, sem à dita de Aquiles ter enveja.»


São os dois versos finais d’ OS LUSÍADAS, de apelo ao combate épico em Marrocos, que Camões se dispõe a exaltar em nova epopeia, o rei servindo de exemplo ao próprio Alexandre Magno, sem necessidade de este invejar Aquiles, já que, superior a esse, é o próprio Sebastião, segundo esses versos épicos, naturalmente, pura exaltação hiperbólica de mais um deserdado valioso, em busca das sopas pátrias, ingratamente e mesquinhamente - (invejosamente também) - arredias, como já lembrou Almada Negreiros, a respeito d’ “a pátria onde Camões morreu de fome e onde todos enchem a barriga de Camões!”

Mas é de ruindade real que se trata, no caso putiniano, superior, isso sim, a tantos mais monstros reais que habitaram o mundo, até mesmo superiores em perfídia desumana a esses heróis da criatividade artística, tirando as figuras e ambientes sinistros desses “1984” e C.ia, que nos afundam a mente.

Invejoso, Putin? Raivoso, apenas. Como pode julgar seus, países de outras línguas e costumes?... Dá vómitos.

Quanto aos que o admiram e sua doutrina abjecta, julgo que mais do que invejosos lhes chamaria “deslumbrados”. Deslumbrados do poder, digo embora sem grande convicção, tantas razões haverá…

DE CAMÕES E DE MARX

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA              A BEM DA NAÇÃO, 09.11.22

Inveja é, tendo ou não tendo, querer que o próximo não tenha -   e desse pecado tanto se serve por grosso como a retalho: por grosso, a inveja nacional; a retalho, a inveja individual. Como dose intermédia, sirva-se a inveja partidária.

* * *

É no «panegírico lusitano» que o Épico nos enrola nas malhas da mitologia clássica concluindo que os deuses olímpicos derramaram sobre nós toda a sua inveja.

E aí está a «inveja» como a última palavra d’ «Os Lusíadas», tal qual como presente envenenado legado para a nossa eternidade…

Da inveja por grosso refiro a da Rússia desde sempre, a da Alemanha desde Bismarck até Hitler se sumir, a de Castela desde que entrou na História; da inveja a retalho refiro com especial ênfase a que se estende a sul de Pas de Calais até ao Mediterrânio e, já com sotaque camoniano mas sem a sua pujança épica, a nossa, a invejinha lusitana, miudinha como os arrozinhos, as sopinhas e outras miudezas que tais…;da dose intermédia não posso citar um Partido em especial porque todos são invejosos mas uns há que o são por doutrina e outros apenas por estratégia. Cuidemos, pois, da inveja doutrinária e deixemos a outra no campo das coisas desprezíveis.

A inveja doutrinária é a que resulta da condição miserável a que os «servos da gleba industrial» no séc. XIX a que foram conduzidos. Miséria essa sobre que Marx construiu uma doutrina «salvadora» que acabou por levar à escravidão hordas de miseráveis que acreditaram em Lenine. E agora, passado mais de um século sobre a revolução russa e demostrada a substância falaciosa da receita marxista e da prática leninista, ainda há quem siga essa cartilha como se ela fosse a chave das portas celestiais. Contudo, é hoje sabido que é a das portas infernais.

Então, como se explica que, depois de tanta evidência de ruína, ainda haja gente inteligente a seguir esses ideais? Porque essa é a teorização do sentimento mais íntimo de quem «não pode ver uma camisa lavada a um pobre» e isto é a essência da inveja.

Eis como a instituição da inveja como fundamento de conceito político levou ao Inferno parte substancial da Humanidade.

Na hora em que Jerónimo de Sousa sai da liderança do PCP, não quero deixar de assinalar que a «débacle» do seu Partido não aconteceu apesar da sua óbvia simpatia pessoal, mas apenas porque o mundo já percebeu que essa não é a Via da Salvação.

E quem diz Marx e Lenine diz também todos os intérpretes dessa pauta da inveja.

Então, sonho por sonho, mais vale sonharmos com Camões e louvarmos «os barões assinalados» que, esses sim, deram novos mundo ao mundo.

Até porque esta é uma boa hora para, sem invejas nem complexos de superioridade, praticarmos a amizade entre todos os que já fizeram Portugal em qualquer parte do mundo.

Novembro de 2022           Henrique Salles da Fonseca

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COMENTÁRIOS

 Antonio Fonseca  09.11.2022  15:19: ... praticarmos a amizade entre todos os que já fizeram Portugal em qualquer parte do mundo", são os meus votos também, para mais 450 anos pelo menos. Muito obrigado.

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 Anónimo  09.11.2022  15:26: Sabes, Henrique, os deuses abandonaram o Monte Olimpo e residem agora por aí, principalmente em Bruxelas, Berlim e Frankfurt, e vejo mais por essas bandas Baco do que Júpiter, Vénus ou Marte (na tua linguagem, diria que vejo mais os frugais do que os perdulários a decidirem). É lindo o apelo contido no último parágrafo do teu post, mas começo a recear (e por natureza sou optimista) que se estejam a aprofundar as clivagens na Sociedade do burgo, que comece a lavrar algum sentimento de revolta, não tanto por razões inerentes à inveja ou à cobiça, mas sim mais por razões referentes às privações que começam a abranger muitos (cujas causas salto por cima) e estes vêem em seu redor, ou acima deles, privilégios injustificados ou até indiciariamente ilícitos, seja sob a forma de corrupção, seja de incompetência, seja de conflito de interesses, pelo menos no plano ético, seja na estafada figura de “jobs for boys”. Espero que os deuses, a Democracia e o Estado de Direito nos acudam a tempo, para que a nossa viagem chegue a bom porto, com os fundos vindos daquelas paragens, bem atempada e transparentemente aplicados, com a inflação controlada, com o PIB a crescer e sem que ninguém tenha de perguntar, em algum momento, “É uma revolta?” e um qualquer Duque Liancourt tenha de responder: “Não, é uma revolução.” Abraço. Carlos Traguelho

 antónio pinho cardão  09.11.2022  17:10: Caro Henrique, também o marxismo puro e duro de Lenine, Estaline e outros seguidores, verificado o seu falhanço, está a evoluir para uma doutrina porventura ainda mais perigosa devido a uma fácil aceitação dos seus pressupostos, o "marxismo cultural", com grande difusão nos meios académicos norte-americanos e na Europa, que confunde e mistura política ambiental, movimentos estudantis, pacifistas, política identitária, feminismo, movimento LGBT, procurando reescrever a história e criando novas prioridades políticas avessas ao desenvolvimento da economia e criação de insatisfação colectiva. Pior do que tudo isto, é que os evangelizadores vão criando um ambiente que leva a banir quem não pense da mesma maneira, o que já vem sendo nítido na comunicação social. O movimento é larvar, mas por vezes os menos preparados escorregam, como agora aconteceu com a Greta, a santa da nova religião ambiental, que referiu expressamente que a luta pelo ambiente é a luta contra o capitalismo.

Henrique Salles da Fonseca  09.11.2022  22:06: M/ Caro, Na mouche! Já dizia Ludwig Feuerbach que "(...) no fundo, os portugueses são invejosos e mesquinhos." Estávamos, então, por meados do séc. XIX, logo após as lutas liberais, creio. Escreveu-o não por ouvir, mas de experiência feita. Tinha passado uns tempos connosco. E apesar de se passear pelos salões da nobreza lusitana que lhe deu hospitalidade e o estragou com mimos, topou-nos à légua. Abraço APM

 

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