Não despiciendas, a respeito de
Donald Trump.
Eleições americanas – um
balanço quase final
A dita “derrota republicana” talvez
não tenha existido. Em termos de doutrina e valores a agenda
nacional-conservadora não foi posta em causa. O que estará em causa é a
personalidade e estilo de Trump.
JAIME NOGUEIRA
PINTO Colunista do Observador
OBSERVADOR, 19 nov
2022, 00:1810
Defendo-me de teorias da conspiração,
mas não restam dúvidas de que, quer na eleição de Joe Biden contra Donald
Trump, em Novembro de 2020, quer em vários duelos destas intercalares, a
maioria dos votos não presenciais têm ido parar aos democratas; e chegado nos
últimos dias ou horas da contagem para reverter o resultado.
Desta
vez, nas votações para o Congresso – para o Senado e para os Representantes –
aconteceu o mesmo em várias circunscrições eleitorais, onde os candidatos
republicanos iam à frente, e depois se viram derrotados com a chegada de votos
pelo correio electrónico e com votos deixados nas drop-boxes no
último dia. Uma situação ambígua que já levou a que uma dúzia de Estados da
União pusessem limites a esta prática.
Por tudo isto, foi com alívio que vi,
na noite de Quarta-Feira, 16 de Novembro, confirmados os 218 lugares dos
Republicanos na Câmara dos Representantes. Ficava,
assim, garantida a maioria conservadora na Câmara Baixa, assembleia que, além
de funções e poderes em matéria financeira, é o lugar para iniciativas como o
processo de impeachment e as comissões de inquérito às actividades da
Administração.
Segundo
declarações de dirigentes como o representante Kevin McCarthy (leader da minoria republicana que deverá agora
passar a leader da maioria, ou Speaker, lugar que foi
de Nancy Pelosi) com maioria
na Câmara, os republicanos podem controlar as Finanças públicas e abrir
inquéritos sobre algumas situações vergonhosas ou equívocas, como a
retirada ou a fuga humilhante de Kabul e o controle das fronteiras com o
México; e, possivelmente, investigar os negócios de Hunter Biden na Ucrânia e
na China, no tempo em que Biden era Vice-Presidente de Obama.
Embora
um impeachment (para o qual são precisos 2/3 do Senado) nunca vá por
diante – como o não foram os de Clinton e de Trump – é de
esperar alguma guerrilha deste tipo, até para compensar a que os Democratas
fizeram a Donald Trump. O
ressentimento é feio nas relações pessoais, mas, na guerra e na política,
chama-se direito de represália e
foi até regulado pelo costume na Idade Média.
Com
um Presidente que troca o Cambodja pela Colômbia, mas, sobretudo, com uma inflação
em grande alta, o crime em cidades como Nova Iorque e na Califórnia também em
alta e 75% dos eleitores convencidos de que o país vai na direcção errada, os
republicanos podem ter ficado longe da vitória esperada, mas não tiveram uma
derrota, como o coro obrigatório dos múltiplos especialistas e comentadores tem
vindo a repetir.
Contas certas
Apesar do desajuste entre as
expectativas e os resultados, na votação popular, até 11 de Novembro, os
Republicanos tinham um pouco mais de 53.400.000 e os Democratas cerca de
49.360.000. Os Democratas já têm garantida a liderança no Senado e perderam os Representantes.
Há 24 governadores democratas e 25 republicanos.
É um fracasso relativo este dos
republicanos, mas está longe de significar uma vitória dos democratas. Yuval Levin, do American Entreprise Institute,
no New York Times de 17 de Novembro, vem pôr limites à leitura
triunfalista das eleições intercalares feita pela maioria dos comentadores e
pelo próprio Presidente Biden; leitura que menospreza vários factores
importantes:
Os candidatos republicanos
tiveram mais votos nacionalmente do que os Democratas. E se “os eleitores” (soma aritmética de milhões de
vontades que, por milagre democrático-eleitoral, parece transubstanciar-se numa
vontade geral à Rousseau) quiseram penalizar alguns candidatos “trumpistas”, também
quiseram rejeitar a agenda radical para a qual Biden e o Partido Democrata
foram arrastados.
Os candidatos conservadores com uma doutrina e uma agenda firmes nos
valores religiosos e patrióticos e no combate à endoutrinação Woke obtiveram
vitórias esmagadoras, de 60% – 40%, como o
governador da Flórida, Ron DeSantis. Assim, em termos de conteúdo, de
doutrina, de valores, a agenda nacional-conservadora não está em causa. O
que pode estar em causa é a personalidade e o estilo de Trump.
Um trumpismo sem Trump?
Aqui
entramos no olho do furacão; e Ann Coulter – autora de uma dúzia de best-sellers políticos
e polémicos, com títulos explosivos como Slander: Liberal Lies About the
American Right, Godless: The Church of Liberalism ou Adios, America: The
Left’s Plan to Turn Our Country into a Third World Hellhole – pode
guiar-nos.
Coulter é, há três décadas, uma
espécie de consciência viva da direita americana pensante e militante: em 2016, apoiou Trump mas em Setembro de 2017 entrou
em guerra com o Presidente e passou a declarar-se “a former Trump”. Em 2020,
afirmou que “A Agenda Trump, sem Trump, seria muito mais fácil de aceitar”,
defendendo, portanto, um “trumpismo sem Trump”.
Coulter
voltou agora ao ataque na Takimag. Não deixando de reconhecer a
importância de Trump e o seu papel decisivo na transformação do Partido
Republicano num partido popular e resistente (só Trump poderia ter derrotado
Hilary Clinton em 2016), o antigo Presidente tornou-se “tóxico”.
Com
menor ou maior veemência, também outros porta-vozes da consciência
nacional-conservadora, como Rod Dreher, do American Conservative, e
Victor Davis Hanson, vieram recentemente criticar Trump, a propósito das
eleições. E mesmo em jornais institucionais de direita, como o Wall
Street Journal, e em cadeias de televisão como a FoxNews as
críticas a Trump intensificam-se e o apoio a DeSantis cresce.
Esta
tendência parece comunicar-se aos eleitores: segundo as últimas sondagens
do Economist / YouGov Poll, antes das eleições de 8 de Novembro,
60% dos Republicanos queriam Trump como candidato em 2024 e apenas 23%
escolhiam DeSantis. Agora, são 46% os que escolhem DeSantis contra os 39% que
continuam a favorecer Trump.
A principal crítica ao ex-Presidente
– e a mais significativa, juntamente com o seu controverso envolvimento no
“ataque ao Congresso” de 6 de Janeiro de 2021 – é a sua insistência na nulidade
das eleições de Novembro de 2020. Embora as suspeitas de fraude sejam
partilhadas por um grande número de americanos, o facto é que ninguém acha
agora razoável ou possível a anulação da eleição e a remoção de Biden da
presidência.
Trump e os seus devotos mais
incondicionais, ao transformarem a fraude eleitoral num dogma, comprometeram o
apoio de muitos eleitores. Muitos ou poucos, de qualquer forma, os suficientes
para que os republicanos perdessem, por pouco, lugares no Senado que
normalmente não perderiam – na Pensilvânia, no Nevada, no Arizona.
Os
eleitores conservadores têm princípios mas também têm, epidermicamente, sentido
da realidade. E, apesar de tudo, é bom que assim seja. O respeito pela
realidade e pela “força das coisas” sempre foi um valor conservador.
ELEIÇÕES
EUA ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA AMÉRICA MUNDO
COMENTÁRIOS (De 11):
Paulo Cardoso > Riaz Carmali: Este
seu comentário faz-me crer que não entendeu o artigo de JNP ou que tem alguma
questão a resolver com este. Entendo, que neste artigo, JNP “aplaude” a actual
tendência de, no partido republicano, pretenderem outro candidato que não
Trump. Neste e noutros artigos, JNP faz questão de realçar que Trump não é o
diabo pintado pelas forças progressistas americanas e internacionais - que
foi fundamental para evitar que as mesmas se tenham mantido nos comandos dos
EUA, aquando das eleições que venceu e que foi determinante para o partido
republicano ter adquirido o nível de intenções que hoje tem - mas, ainda assim,
« JNP tem deixado claro não concordar com traços da personalidade de Trump. Joaquim Almeida: Em matéria de fraude eleitoral,
vale a política do facto consumado. Os Estados de maioria democrata dão-se bem
com a trafulhice do voto não-presencial e não afinam as regras do escrutínio. Maria Emília Ranhada
Santos: Trump não serve para a elite do
poder porque ele quer os EUA livres e os globalistas não! Assim sendo quem tem
o dinheiro e tudo comprado, até a totalidade da comunicação social, por isso
mentem com quantos dentes têm na boca, é só ver o Brasil! Conseguiram roubar os
votos ao Bolsonaro, mesmo com as multidões a encher as ruas! É o mesmo que dizer:
Calma que a ditadura já está imposta! Francisco Miguel Colaço: Então os escândalos dos votos
aparecidos à décima-terceira hora, todos nos democrápulas, desapareceram?
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