Do texto anterior – China e Rússia, amigos do peito. E assim vamos
andando, observando, incautos ou assustados, textos destes ensinando…
«Mas,
se olharmos mais de perto, veremos que a China é uma sociedade tão
polarizada como qualquer democracia, até mesmo como os Estados Unidos. Polarizada
em torno dos rendimentos, polarizada em questões de género, absolutamente
polarizada em questões de nacionalidade étnica (pensemos nos Uyghurs, nos
tibetanos e nos mongóis do interior) e, diria eu, polarizada em torno de uma divisão
entre a classe criativa — que inclui empreendedores e intelectuais — e a classe
burocrática. Imaginemos
o que aconteceu no mundo destes criadores nos últimos 12 anos, desde que Xi
Jinping chegou ao poder: ficou muito mais pequeno, certo? O espaço para pensar
de forma criativa, para escrever o que se pensa, para fazer o que se quer em
termos de inovação…. Xi Jinping demonstrou não ter qualquer escrúpulo em
cortar as pernas a alguns dos empresários mais talentosos do seu país, como
Jack Ma, [dono da] Alibaba.
Porque o controlo do Estado é o mais
importante?
Sim.
E se olharmos para trás, para os anos de 2010, 2011, tínhamos uma situação em
que alguns destes empresários milionários tinham 20, 30 milhões de pessoas a
segui-los no Weibo [rede social mais popular da China]. E, nalguns aspectos,
constituíam um verdadeiro desafio à autoridade exclusiva do Partido Comunista
Chinês. Penso que isso também irritou Xi Jinping. Ele não quer…
Concorrência?
Qualquer tipo de concorrência, exactamente.
Por isso, penso que é importante olhar para o interior do país, na medida do
possível, e reconhecer as diferentes perspetivas, muito amplas e
díspares. E reconhecer que dezenas de milhões, se não centenas
de milhões de pessoas, estão descontentes com muitas das coisas que Xi Jinping
está a fazer. “Os EUA
têm de ser claros a fortalecer a capacidade de defesa e o poder de dissuasão de
Taiwan. Mas não podemos provocar”
Ao mesmo tempo, estamos a assistir ao aumento da repressão em
algumas áreas, das quais Hong Kong foi o maior exemplo. Acha que Taiwan vai por
esse caminho ou é um ninho de vespas demasiado complicado?
Hong Kong e Taiwan estavam em duas posições diferentes. Hong Kong estava formalmente sob o controlo da China
continental, mas tínhamos “um país, dois sistemas”. O que aconteceu ali é
trágico. Mas, se olharmos para 2014, Xi Jinping dizia já nessa altura que Hong
Kong teria de ser integrada, mais cedo ou mais tarde, porque via-a a afastar-se
da China continental de uma forma que considerava perturbadora. Portanto, já na
altura, ele dava sinais do seu descontentamento com a situação em Hong Kong. Obviamente que os protestos em massa e as
exigências de eleições diretas e de uma responsabilização clara dos líderes de
Hong Kong desencadearam a repressão vinda da China continental. Mas nunca iria
caminhar para o que o povo de Hong Kong desejava, para uma situação mais
democrática. Xi Jinping nunca iria permitir isso. Taiwan é diferente. Taiwan é democracia
avançada, com uma economia em pleno funcionamento. Nalguns aspectos, é mesmo um
excelente exemplo de uma democracia. Tem alternância de partidos, tem
transparência e responsabilização.
Mas
não há apetite por parte de Xi Jinping para mudar essa situação?
Há
apetite por parte de Xi Jinping, é óbvio. É um dos seus 14 pontos essenciais
para “o grande rejuvenescimento da nação chinesa”. Portanto, é mais um sinal que temos de levar a sério.
A questão é que acho que ele gostaria de o fazer pacificamente, sem ter de
tentar uma acção militar. Uma das coisas realmente interessante que ocorreram
nos últimos meses, com as eleições [de janeiro] em Taiwan, foi que houve uma
tentativa deliberada, por parte de Xi Jinping e do governo da China
continental, de dizer que o facto de o candidato vencedor, Lai Ching-te, ter
obtido menos de 50% dos votos [teve 40%] indicava uma vitória para a política
de reaproximação do continente. Porque
o candidato do DPP não era apoiado “pela maioria do povo de Taiwan”. Assim,
ao fazer isto, Xi Jinping dá a si próprio um pouco de espaço. Depois tivemos
a visita do antigo presidente de Taiwan, Ma Ying-jeou, ao continente. E, mais
uma vez, Xi Jinping fica com mais espaço para dizer que as coisas estão a
avançar na direcção certa. Isto apesar do facto de Taiwan estar
muito activamente a diversificar o seu comércio e diversificar os seus
investimentos, afastando-os da China continental. E, já agora, as sondagens em Taiwan mostram que
praticamente não há apoio à ideia de unificação com o continente. Portanto, se Xi Jinping conseguir arranjar
formas de ignorar estes factos concretos, penso que tirará partido disso
enquanto puder. Mas, em última análise, sim: ele quer, durante a sua liderança,
conseguir progressos claros e definitivos na unificação com Taiwan.
Como é que acha que a administração Biden tem lidado com o assunto? Houve
muita discussão sobre as afirmações do Presidente Biden de que os EUA apoiarão
Taiwan “aconteça o que acontecer”. Há quem tenha achado a afirmação demasiado
arriscada.
Os EUA têm tido uma política de ambiguidade
estratégica, que penso que a maioria das pessoas diria que tem servido bem
tanto aos EUA como a Taiwan. Ou seja, nunca dizemos em público, de forma clara,
o que faríamos [em caso de ataque a Taiwan]. Mas o Presidente Biden veio a
público dizer, pelo menos três vezes, que os Estados Unidos iriam em auxílio de
Taiwan. Penso que a política norte-americana, tal como está neste momento, é a
de basicamente fazer o máximo possível para aumentar a resiliência de Taiwan e
ajudar Taiwan a ter poder de dissuasão. E isso
significa vender armamento a Taiwan e significa contactar aliados e parceiros,
como o Japão, a Austrália, a Coreia do Sul e a Europa, para que invistam não só
na economia de Taiwan (que é muito bem sucedida e tem trocas comerciais com
muitos países), mas também na segurança de Taiwan e mostrem que levam isso a
sério. Porque isto
aumentará a parada para a China, que reformula o seu cálculo quanto a levar a
cabo alguma acção militar contra Taiwan. Enquanto tentamos garantir que o povo
de Taiwan está preparado para se defender.
▲ A ex-presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, visitou
Taiwan ainda durante o seu mandato GETTY IMAGES
Esta
tem sido a estratégia da administração Biden, que me parece correcta. Mas
também temos de ter cuidado. Olhe
a visita da presidente [da Câmara dos
Representantes] Nancy Pelosi a Taiwan, por exemplo… Entendo-a, é a pessoa no Congresso que mais fez pela
defesa dos direitos humanos e tem uma fatia considerável de eleitores com
origens taiwanesas no distrito que a elegeu. Percebo a vontade dela em ir.
Mas não podia ir quando já se tivesse reformado? Os EUA têm de ser claros em
fortalecer a capacidade de defesa e o poder de dissuasão de Taiwan. Mas não
podemos provocar. Não devemos fazer este tipo de acções diplomáticas, em que
agitamos uma bandeira de maneiras que podem provocar Pequim. Não vale a pena.
O
que espera da próxima administração norte-americana?
Quer dizer da
próxima administração Biden? [risos]
Tem a certeza que será uma administração Biden?
Aquilo
de que estou certa é que tenho esperança e estou a trabalhar para isso. Agora,
acho que o que me quer perguntar é o que acontecerá com outro governo Trump,
certo?
Sim, porque se for uma vitória de Biden, o rumo provavelmente será o
que já está em vigor.
Sim, o rumo mantém-se o mesmo. Acho
que se tivermos uma segunda administração Trump, muito dependerá das pessoas à
volta dele. Uma das coisas que muitas vezes não é reconhecida no mundo, com
excepção de um grupo muito pequeno nos EUA e talvez na Ásia, é que na verdade
havia um grupo de funcionários, como o secretário Mattis (ex-secretário da
Defesa), o secretário Tillerson e até o secretário Pompeo (ex-secretários de
Estado) e a equipa Conselho de Segurança Nacional, que realmente tentaram
continuar uma política externa americana muito mais tradicional. Eles tentaram,
especialmente com os nossos aliados asiáticos. Durante a
administração Trump, por exemplo, foi
reforçado o “Quad” — o relacionamento com a Austrália, o Japão e a Índia na
verdade foi fortalecido durante esse período. As relações com a Europa,
obviamente, não correram muito bem e essa relação foi claramente prejudicada
pela administração Trump. Acho que dependerá de quem estiver a apoiar o
Presidente. Talvez com um grupo semelhante tenhamos políticas que não serão tão
dramaticamente horríveis quanto aquelas que o Presidente Trump por si só
seguiria.
Uma coisa interessante que ouvi de um ex-funcionário do governo
Trump foi “O que o Presidente Trump respeita são líderes fortes”.
- Não necessariamente apenas ditadores,
apesar dos enamoramentos com Putin, Xi Jinping e Kim Jong-un. O primeiro-ministro [japonês Shinzo]
Abe era alguém com quem o Presidente Trump acreditava que podia trabalhar, porque sentia que o primeiro-ministro era
capaz de avançar com as coisas no seu próprio país. A Europa foi um desafio
maior, porque temos a União Europeia e depois temos os líderes [dos países] e
ele sentia que se falasse com um líder europeu, na verdade ele não conseguiria
avançar com nada. Portanto, penso que uma
coisa a ter em mente é que a Europa
pode apresentar uma frente unida forte e forçar o Presidente Trump a lidar com
isso neste contexto. É o meu
conselho.
Emmanuel Macron “não parece ter plena noção
do desafio que a China representa”
É
também interessante como, se houver uma segunda administração Trump, ela terá
lugar num ambiente global muito diferente. Olhando especificamente para a
relação da Europa com a China: vimos agora a visita de Xi Jinping, em que ele
se encontrou com [Ursula] von der Leyen. Ela foi um tanto crítica em algumas
questões, especialmente na questão dos carros eléctricos…
Sim,
ela é óptima!
A Europa parece ser muito mais dura com a China agora. Mas, ao mesmo
tempo, Xi Jinping visitou a Sérvia, a Hungria, e reuniu-se com o Presidente
Macron — que é um grande defensor daquilo a que ele chama “autonomia
estratégica”. Como acha que a relação entre a Europa e a China está a evoluir?
Acho
que não há ninguém em Washington que não tenha noção de que a Europa tem
autonomia estratégica. Penso que a
maioria de nós que estivemos no governo — eu servi durante dois anos como
conselheira sénior do secretário do Comércio para a China, até Outubro passado
— não tem qualquer dúvida de que a Europa é um ator independente. Por
isso, às vezes é intrigante para nós porque é que o Presidente Macron
continua a sentir a necessidade de dizer “temos autonomia estratégica, temos
autonomia estratégica”, quando nós acreditamos plenamente que a Europa tem
autonomia estratégica. Aquilo que esperamos é que os nossos valores e as nossas
normas e as nossas prioridades políticas estejam alinhadas no geral, em virtude
do facto de sermos democracias e geralmente termos uma visão alinhada do
sistema internacional. Não sentimos nenhuma ameaça por parte do Presidente
Macron quando ele fala em autonomia estratégica. Acho que o que nos incomoda é
quando ele parece ignorar a questão de Taiwan ou de alguma forma a rebaixa. Ou quando não parece ter plena noção do desafio que a
China representa. Acho que aí temos uma dificuldade.
"Talvez seja apenas uma questão de
como [Macron] expressa as suas preocupações ou de quando é que o faz, mas faz
parecer que há um ligeiro desalinhamento da perspectiva americana."
Mas Macron não estará apenas a tentar não provocar a China? E ao
mesmo tempo acreditar na importância de defender Taiwan?
Sim,
é inteiramente possível. Nós próprios, nos Estados Unidos, restabelecemos
vários grupos de trabalho com os chineses. Estamos a tentar gerir a
concorrência e não queremos, de todo, que a relação avance para um conflito
cinético.
A propósito disso, diz uma coisa muito interessante no seu livro:
não devemos comparar esta situação com a Guerra Fria, porque existem acordos em vigor entre EUA e China em questões
importantes como macroeconomia e alterações climáticas. Portanto, a relação
não está quebrada?
Não,
não está. E não é como se a China tivesse uma ideologia que está a impor a
outros países. Está sim a exportar elementos de autoritarismo para países que o
desejam, o que é um desafio por si só. Nem me faça falar sobre o apoio da China
à Rússia… Mas sobre a
Europa, quero explicar este ponto. Olhemos para um país como a Alemanha,
onde há uma ministra dos Negócios Estrangeiros forte, que diz “Reconhecemos
muito claramente os desafios que a China nos coloca e estamos a reagir”.
Portanto, mesmo quando o chanceler vai à China e leva uma delegação
empresarial, entendemos que os [nossos] valores estão alinhados. Acho é que
se não virmos essas outras vozes a surgirem num país como a França, se não
ouvirmos o suficiente sobre os aspectos negativos das acções da China a nível
global, aí sim ficaremos preocupados.
Os EUA não confiam em Macron?
Não
sei se é uma questão de não confiar, acho é que ele tem a sua própria maneira
de gerir as coisas. Acho que gostaríamos apenas que a França nos
tranquilizasse, dando-nos certezas sobre a sua posição. Quer dizer, o
facto de ele ter ido à China e levado uma delegação de grandes empresas, ter
feito uma grande viagem comemorativa e não ter sido muito crítico numa série de
temas… E depois voltar e dizer: “Ó meu Deus, estamos prestes a ser inundados
com carros eléctricos chineses!”. Foi um pouco estranho. Foi um pouco estranho.
Talvez seja apenas uma questão de como ele expressa as suas preocupações ou de
quando o faz, mas faz parecer que há um ligeiro desalinhamento da perspetiva
americana.
A Nova Rota da
Seda e a presença chinesa no resto do mundo, que já tiveram melhores dias
Diz que outros países estão a importar o sistema chinês. Como é que
outras regiões do mundo para lá do Ocidente estão a reagir a este plano da
China para alterar a ordem mundial?
A China é atractiva nalguns aspectos, mas também causou
danos a si própria e a outros. Olhemos
para a Nova Rota da Seda, por exemplo. Começou de forma muito positiva, mas a
maneira como a China a foi aplicando, ao enviar os seus próprios trabalhadores,
levando países a contraírem tanta dívida junto da China que não conseguem
pagá-la, levantando considerações ambientais… Se olharmos para os países onde a Nova Rota da Seda esteve
mais activa, especialmente em África, na Ásia Central e em alguns países da
América Latina, encontramos protestos em todos os países contra os projectos
da Nova Rota da Seda.
Ou seja, não é tão
popular quanto pensamos que é aqui no Ocidente?
Correcto. E também vimos isso aqui, penso que
Portugal também é um exemplo disso, tal como a Grécia. A Itália, por exemplo,
saiu da Nova Rota da Seda.
Mas houve grandes investimentos feitos pela China nestes países,
quando estes não estavam em boa forma financeira…
Mas
agora o nível de investimento chinês diminuiu e o entusiasmo de muitos
países também. Repare, há muito entusiasmo em muitos países de África,
no Indo-Pacífico, na América Latina, por uma reaproximação aos Estados Unidos,
à Europa, à principais economias da Ásia. Todos eles querem outros países lá,
não querem ser dominados pela presença chinesa. Isso não quer dizer que não
apreciem o que a China fez, mas não querem ser dominados. Também
acho que alguns países estão mais dispostos e interessados porque já possuem
sistemas autoritários e, para eles, a China dá-lhes diferentes tipos de apoio. Não se
trata apenas de investimento em grandes projectos, mas também de sistemas de
vigilância de tecnologia chinesa. Vimos vários casos em África, onde líderes
acolheram favoravelmente a capacidade de aprender com a China como controlar a
dissidência social, como monitorizar a Internet…. Para estes países a China é
uma presença muito bem-vinda. E há uma série de economias de médio porte,
algumas das quais nos BRICS ou que querem aderir aos BRICS, que consideram que
já é tempo de o dólar deixar de dominar. “Por que não podemos usar a nossa
própria moeda?”
O Presidente brasileiro, Lula da Silva, disse isso mesmo
recentemente: “Por que fazemos comércio com o dólar?”
Exacto.
E há pressão da China nesse sentido. [O modelo chinês] não é necessariamente
aquilo que outros países desejem, mas muitos gostam deste impulso para a
desdolarização da economia global. E a China encontrou aqui uma forma de fazer
avançar os seus próprios interesses, ao mesmo tempo que apela a um conjunto
muito mais vasto de países.
Ou seja, essa
aproximação não acontece tanto por estes países serem pró-China, é mais por que
desejam afastar-se dos Estados Unidos?
Diria que é porque desejam ser menos
dependentes dos Estados Unidos.
A
aliança China-Rússia.
“Há
um alinhamento no apoio ao autoritarismo. Mas também por estarem isolados entre
as maiores economias do mundo”
Como acha que a Rússia se encaixa nesta equação?
Penso que a decisão da China
de apoiar a Rússia na invasão da Ucrânia causou-lhe enormes danos,
especialmente na Europa. Primeiro
tivemos Xinjiang [região onde a China é acusada de estar a levar a campo
violações de direitos humanos em massa contra a minoria Uyghu], quando a China
impôs sanções a uma série de intervenientes europeus, tanto instituições como
indivíduos, que levaram ao colapso do acordo comercial UE-China, depois de
muitos anos de negociação. Esse foi o primeiro rombo na relação. Depois
temos as questões relacionadas com operações de influência chinesa, espionagem,
etc. Durante a Covid, outra coisa problemática foi a forma como a China se
comportou, com a sua diplomacia de “lobo guerreiro”, que alienou muitos países. Mas o apoio da China à Rússia revelou
ser uma enorme preocupação para a Europa. Porque [a guerra] é ali nas suas
fronteiras e muitos países europeus sentem uma ameaça directa por parte da
Rússia. O facto de nos últimos anos a China
não ter feito nada para responder a essas preocupações, ao mesmo tempo que
aumentou a relação comercial com a Rússia… Sabemos
muito bem que está a fornecer à Rússia componentes, carrinhas, drones...
Pode não estar a fornecer equipamento militar per se, mas vende
muitas das matérias secundárias que apoiam a guerra.
"Se olharmos para as dez maiores
economias mundiais, a China é a única que não é uma democracia. Se expandirmos
para as 20 maiores, só temos a China e a Rússia. Portanto, é um relacionamento
forjado a partir de um alinhamento político." O que ajuda Russa a contornar as sanções?
Certo.
Nós, os Estados Unidos avisámos e
avisámos novamente os chineses de que vamos sancionar as empresas deles que
estiverem a vender à Rússia material alvo de sanções. Ou seja, se nós vendermos
à China e a China vender esse material à Rússia, vamos impor sanções a essas
empresas. Os chineses
protestaram e disseram que o acordo não é esse: “O acordo é apenas de que
não usamos esse material para as nossas próprias Forças Armadas”. Mas nós
dissemos que vamos fazê-lo e ameaçámos também sanções a alguns pequenos bancos chineses
que temos quase a certeza que estarão a apoiar directamente a Rússia. Portanto, penso que a questão do apoio da China à
Rússia causou muitos danos à sua reputação na Europa, que já tinha sido
prejudicada por uma série de considerações anteriores.
Mas quais acha que são as motivações da China para ser um aliado tão
poderoso da Rússia? A Rússia precisa da China neste momento, está bastante
dependente. Mas o que ganha Xi Jinping com isto?
Desde
o início do mandato de Xi Jinping que ele fala sobre Putin como sendo um dos
seus amigos mais próximos no sistema internacional. Acho que existe uma relação
pessoal real entre os dois líderes. Em parte, isso decorre do medo [partilhado]
de uma “Revolução Colorida” [levantamentos populares pró-ocidentais como o da
Maidan, na Ucrânia], de um alinhamento no apoio ao autoritarismo. Mas também por estarem isolados entre as maiores
economias do mundo. Se olharmos para as dez maiores economias mundiais, a
China é a única que não é uma democracia. Se expandirmos para as 20 maiores, só
temos a China e a Rússia. Portanto, é um relacionamento forjado a partir de um
alinhamento político em muitas questões, que vem de antes. Basta olhar para a
China e para a Rússia nas Nações Unidas e vemos como muitas vezes votaram
juntos e trabalharam em conjunto em questões relacionadas com direitos humanos,
regulação da Internet e questões de soberania. Há uma longa história de apoio mútuo, que
melhorou devido à relação pessoal entre Xi Jinping e Putin.
▲ A China tem apoiado a Rússia desde o início da invasão de larga escala
à Ucrânia SPUTNIK/AFP VIA GETTY IMAGES
Dito
isto… Uma vez mais, se olharmos para dentro da China, para o que os académicos
têm escrito, até mesmo para as opiniões populares na internet — e não para as
sondagens oficiais —, há muito
descontentamento com a decisão de Xi Jinping de apoiar a Rússia. Não é uma decisão inteiramente apoiada
pelas camadas intelectuais, diplomáticas ou até mesmo populares. Neste momento,
isso não está a ter qualquer impacto. Mas pelo menos recorda-nos que Xi Jinping
não fala em nome de 1,4 mil milhões de pessoas. E que as coisas podem mudar se
ele não estiver no poder.
CHINA MUNDO RÚSSIA ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA AMÉRICA
Nenhum comentário:
Postar um comentário