quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Olho certeiro



Mais um artigo revelador
de quanto João Miguel Tavares é sábio e conhecedor
das fraquezas dos homens,
- tomado o termo “homens” na sua dimensão de globalidade
como antigamente
e não de especificidade como hoje é frequente,
importunados que somos com a exigência
de transparência
nas designações,
falando-se de sexo só para as certas ocasiões
da meladice prazeirosa,
pois que o que está a dar agora
na nossa horta,
é o género, como se convencionou,
e dentro do respeito por tudo quanto mexe.
Distingamos, pois, a fêmea do macho
- e eu diria que mesmo do neutro,
que tem o mesmo direito, embora
nunca tal fosse posto em dúvida na nossa cidade.
Quando falo, pois, em Homens, é mesmo
segundo o modelo abrangente
de antigamente
envolvendo toda a gente,
- ou seja, a humanidade.
Assim, João Miguel Tavares, com muita clareza,
Desdenha da tibieza do Paulo Rangel
Que ainda se não desligou dos complexos
que logo surgiram aquando dos Cravos
em que mais ou menos todos
se solidarizaram
a desfazer no antigamente,
para poderem seguir em frente.
Mas João Miguel Tavares lá vai ziguezagueando
entre a esquerda e a direita,
democraticamente,
contornando os impasses,
a mim essencialmente parecendo
um homem com bastante pinta,
nas suas lições de coragem
e fervor,
com que assume princípios
de rectidão
na sua escrita dramática,
quer os seus comentadores o apreciam ou não.
Quanto a Paulo Rangel,
Parece-me que também ziguezagueia,
Mas tudo isso é natural
E não deixo de gostar dele.

OPINIÃO
Olha, o Paulo Rangel também não é de direita
Eu gosto de Paulo Rangel e há boas probabilidades de vir a votar PSD nas próximas europeias. Mas continuar com vergonha da palavra “direita” 45 anos depois do 25 de Abril tira-me do sério.
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 19 de Fevereiro de 2019,
A sério, isto começa a ser ridículo: a quantidade de gente que pertence ao PSD que faz questão de dizer que não é de direita é totalmente absurda, e mostra bem o desequilíbrio do sistema político português e o complexo salazarista que ainda paira na cabeça da direita-que-não-o-é. Desta vez a negação coube a Paulo Rangel, cabeça de lista do PSD às eleições europeias. Vinha na primeira página do Expresso: “Nunca disse que era de direita.” Lá dentro, as explicações: “Posso garantir que nunca disse que era de direita, mas do centro ou centro-direita. E com posições sociais muito fortes, muitas vezes a chegar ao centro-esquerda em algumas matérias.”
Não há pachorra. Nem sequer faltou a Rangel explicar que isto da esquerda e da direita são só “rótulos” e que “os cidadãos querem é respostas para os seus problemas” – sempre a forma cobardolas de nunca assumir uma identidade ideológica, que isto das ideologias, como diria o doutor Salazar, só serve para criar confusão. Atenção: eu gosto de Paulo Rangel e há boas probabilidades de vir a votar PSD nas próximas europeias (o que dificilmente acontecerá nas legislativas). Mas continuar com vergonha da palavra “direita” 45 anos depois do 25 de Abril tira-me do sério.
A ver se nos entendemos. A não ser que sejamos de extrema-direita (tipo PNR) ou de extrema-esquerda (tipo PCP), é verdade que ser de direita ou de esquerda pode variar consoante a época e o lugar. Por exemplo, hoje em dia, nos Estados Unidos da América, eu seria sempre um democrata. Donde, se escrevesse no New York Times, assumir-me-ia como uma pessoa de esquerda. Da mesma forma, se vivesse no tempo do Estado Novo, o salazarismo paternalista e censório ser-me-ia certamente insuportável, e, portanto, de esquerda seria.
Esquerda e direita dependem do contexto, tanta na relação entre os valores da igualdade e da liberdade, como na relação entre os pesos do Estado e da sociedade civil. Para voltar ao exemplo americano: como certamente se recordará quem viu o filme de Michael Moore sobre o sistema de saúde dos EUA, não é aceitável viver num país supostamente civilizado onde um homem que perdeu dois dedos numa serra eléctrica é obrigado a escolher se fica com um ou com o outro, porque o seu seguro de saúde não lhe permite salvar os dois dedos em simultâneo. Em 2010, eu estaria entusiasmadamente ao lado do Obamacare, porque o sistema de saúde americano deixava dezenas de milhões de pessoas sem qualquer protecção. Mais Estado ou menos Estado varia, de facto, de país para país. Às vezes é preciso mais, outras vezes é preciso menos – depende do lugar onde vivemos.
Tanto eu, como Paulo Rangel, vivemos em Portugal, no ano de 2019. Enfim: Rangel também vive em Bruxelas, mas na Europa continental as coisas não são assim tão diferentes. Quando dizemos que somos de direita ou de esquerda estamos a falar de um espaço e tempo concretos, e nesse contexto essas categorias tradicionais têm, de facto, um valor operativo e ajudam à clarificação política. Dizer que se é de esquerda ou de direita serve para que as pessoas saibam onde estamos e ao que vimos. Quando me declaro de direita estou apenas a resumir numa palavra estas convicções: que a liberdade, no Portugal de hoje, deve ser favorecida face à igualdade, e que o peso da sociedade civil precisa crescer face ao peso do Estado. É só isto, é bastante simples, e penso que Paulo Rangel acredita no mesmo – só não percebo por que raio lhe custa tanto admiti-lo.
COMENTÁRIOS
Antonio Gaspar: Concordo em número, género e grau com o subscritor do artigo em exame. Parabéns!
Luis Morgado, Lisboa: Por acaso acredito que João Miguel Tavares seria dos poucos jornalistas que por aí andam com coragem para afrontar a ditadura. Recorde-se a coragem dele quando era quase o único a falar dos desmandos de Sócrates, numa altura em que todos os outros se calaram durante tanto tempo.
mário borges: Atente-se nas seguintes frases de JMT: "como diria o doutor Salazar" e "se vivesse no tempo do Estado Novo, o salazarismo paternalista e censório ser-me-ia certamente insuportável" Reparem na reverência: "Doutor Salazar"!!! Como toda a gente sabe só simpatizantes da ditadura usam tal designação. E depois a pérola escondida à vista: "ser-me-ia certamente insuportável..." Ser-lhe-ia... Hipoteticamente, talvez, não sabe bem, depende tal como ele diz do contexto dessa mesma ditadura. Para quem ainda tinha dúvidas... Era muito mais útil se em vez de andar a pedir que o Paulo Rangel saia do armário, saísse sim o JMT e se assumisse de vez de direita radical.
PdellaF, Terra .: Na direita, na tradição política pós 1789, situam-se os conservadores e, na sua extrema, os reaccionários. Quem é reaccionário? Os salazaristas, os nazis, etc.. Mas também os estalinistas do PCP, que são da reversão de tudo. Na direita moderada estarão os democrata-cristãos, amáveis conservadores. Ao centro, o PSD, que nem para um lado, nem pelo outro, antes pelo contrário. O PS é a mexicanização do país, é o Partido Institucional Revolucionário cá do rectângulo, à direita, quando governa, à esquerda, quando discursa. Temos o BE, que em termos económicos está entre o reaccionarismo populista da direita neomarxista; já em termos de costumes é muito à frente e, portanto, extrema-esquerda. À esquerda estão os verdadeiros liberais, cuja ideologia é a grande ruptura esquerdista/revolucionária.
Joao Mamede: Tem de ser de direita pq o PSD faz parte do PPE e não da ALDE como já o foi. O PSD já foi de centro e social democrata. Desde o Barroso que é um partido popular (tal como o assume fazendo parte do PPE). E é por isso que não tem levado o meu voto.
AndradeQB,  Porto: Noblesse oblige, meu caro. Não se pode ser candidato a representar a maioria dos portugueses, apresentando-se alheio ao sentir que lhes vai na alma. Um sentir que se baseia numa curiosa compaixão esquerdista. Uma compaixão, não para dar resposta com o que é seu, mas para satisfazer à custa de outros. Um sentir esquerdista como o que os leva a criticar Guantánamo, mas no primeiro momento em que Trump perguntou o que querem fazer aos seus 800 terroristas presos na Síria, nenhum os quer alojar no andar de baixo. A Paulo Rangel já lhe chega o que os outros pensam dele, não é de esperar que cave a sua própria cova afirmando-se de direita. Abre Núncio, Satanás … de direita nunca. Todos temos um coração de pomba que só é ultrapassado em bondade por Maduro.
Nuno Silva: Ser de esquerda ou direita não são simples rótulos, como querem hoje a extrema-direita (neoliberal pré-fascista, e a fascista) impingir às pessoas, como se não houvessem alternativas. E não varia consoante a época e o lugar. Pode sim variar ao longo da vida, e isso é normal. Nem acho que o PCP (ou o Bloco) são de extrema-esquerda, porque se repararem, são quem mais defende na prática ideais sociais-democrátas de centro-esquerda. E além disso são democráticos e defendem os Direitos Humanos. Mas ser de direita não é vergonha. É um ideal como outro qualquer (desde que democrata e humanista), porque no fundo ser de direita é ser realmente "livre", independente do meio, individualista e sem necessitar do estado para o seu próprio nascimento, na doença, no desemprego, na velhice, etc...
JDF, Portugal: Bem, nuno, se são essas as suas conclusões, então força, que estamos num país livre. Agora a história de extrema direita ser obrigatoriamente o mal encarnado, e extrema esquerda, tão pacifica que quase parece de centro, é que é boa.... E velha... Já avançávamos um pouco mais o raciocínio...


Nenhum comentário: