Pinceladas de História,
pinceladas de arrogância, fica-se com a sensação de que o que mais brilha nele
é o canal da displicência, com que liberta o seu saber, atirando, lá da sua
altura intelectual, punhados de dados a “esta
gente que não percebe” e que, por vezes, gostaria de perceber melhor. Todavia, o prazer
é sempre enorme, quer quando abre os seus cordões ao conhecimento - comedidos
na informação e simultaneamente largos de abrangência justificativa - quer quando denuncia uma visão mordaz na avaliação das acções humanas.
Que o seu Diário se prolongue, para bem
da gente.
OPINIÃO
Diário
VASCO PULIDO VALENTE
PÚBLICO, 9 de Fevereiro de 2019
Venezuela. O PC e o
Bloco tomaram uma posição política e moralmente abjecta.
A extrema-esquerda continua a fazer a política externa da Rússia, por puro ódio
à América, agora reforçado pelo ódio a Trump. A extraordinária Raquel Varela
jurou, na televisão, argumentando a favor de Maduro, que estaria disposta a
defender Salazar contra uma intervenção estrangeira. Pena não a poder mandar
para 1941.
Ainda
por cima esta gente não percebe que a Rússia é hoje uma potência de segunda
ordem; o “Gabão com mísseis” de Helmut Schmidt. Há 5 Estados dos Estados Unidos
com um PIB maior que o da Federação Russa; e sobram 45.
Os americanos salvaram a Europa dos nazis e dos comunistas, mas não
tencionam salvá-la de Putin. Esse cavalheiro, de resto, não quer reconstituir o
império soviético, só quer voltar às fronteiras de 1991. E não vai
ser dissuadido pelo ridículo exército europeu de Macron e Merkel.
Até já se vê sobreposto à tricolor da Federação um emblema que se parece
suspeitamente com a águia dos Romanov.
É para isto que o PC e o Bloco
aplicadamente trabalham. Maduro abriu as portas da Venezuela aos
russos e aos chineses. Os russos
venderam-lhe armamento (15 mil milhões de euros) e os chineses
emprestaram-lhe dinheiro (3 mil e quinhentos milhões de euros). Consola
saber que os nossos revolucionários defendem estes negócios contra a ambição
imperialista da Europa e da América de ajudar as 370 mil pessoas que estão em
risco de morrer.
3 de Fevereiro
Venezuela. Toda a gente diz que o exército decidirá tudo.
Mas toda a gente sabe que esse exército é um exército patrioticamente
sul-americano, sem a mais vaga tradição de combate e com 2 mil e tantos
generais (os Estados Unidos, a primeira potência militar do mundo, têm 900)
que se dedicam a roubar o Estado e ao tráfego de droga e divisas. Quando
Guaidó apela à “honra” dessa camarilha burocrática e suja não fico muito
convencido.
4 de Fevereiro
O meu amigo Luís Marques Mendes é o
melhor valsista de Portugal. Anda sempre a três tempos. Tem sempre três
argumentos, três razões, três cenários, três obstáculos, três erros, três
factos, três culpados e três informações muito confidenciais. É a pessoa mais
ternária do mundo.
5 de Fevereiro
Durante
a última doença, estive internado na enfermaria geral, nos cuidados intermédios
e nos cuidados intensivos. A medicina é uma indústria, mas só quando se é
processado como um produto industrial se percebe o que isso quer dizer. Entre
outras coisas quer dizer que quem nos trata, quem está ao pé de
nós, quem nos conhece, não são os médicos, são os enfermeiros. Não acredito que um doente que tenha alguma vez
passado pelos hospitais públicos ou privados esteja contra a greve que o
primeiro-ministro acha “selvagem”. “Selvagem” é a maneira como ele fala dos
enfermeiros.
6 de Fevereiro
Quando
cheguei à Assembleia da República, eleito por Eduardo Azevedo Soares e pelo dr.
Fernando Nogueira, descobri que se marcavam faltas aos representantes da Nação.
As coisas passavam-se assim: a Nação chegava por volta das três da tarde,
assinava o ponto, tomava o seu cafezinho, e ia à sua vida. As bancadas ficavam
vazias excepto pela direcção do grupo parlamentar e meia dúzia de tristes que
liam o jornal.
Isto
punha-me perante um dilema. Por um lado, era uma partícula da Nação,
ofendido pelo regime escolar a que tinha sido submetido. Por outro, não
passava de um vassalo do meu chefe, Fernando Nogueira, ou seja, de uma cara
desavergonhada. A partícula da Nação queria protestar contra a marcação de
faltas, o vassalo estava consciente da sua indignidade. Demiti-me ao fim de
quatro meses.
Esta
semana os jornais anunciaram que, por iniciativa do benemérito Jorge Lacão,
o Parlamento talvez resolva multar os seus próprios
membros por pequenos delitos ou por desvios sensacionais à
ética prevalecente. Não se pode descer mais baixo.
7 de Fevereiro
A
fantasia do governo e dos partidos políticos, neste mês de propaganda
eleitoral, foi ilimitada. O primeiro-ministro declarou que “não poderia
dormir descansado” enquanto houvesse violência doméstica. E, logo a
seguir, como se isto não fosse bastante, tirou do bolso uma proposta de lei
para apoiar a actividade de 800 mil cuidadores informais.
8 de Fevereiro
Circulatura do Quadrado (um nome
imbecil). O Presidente da República, para
compensar o telefonema a Cristina Ferreira e
o discurso na inauguração da sede da SIC, ajuda a TVI a lançar o velho programa
de Pacheco Pereira, Lobo Xavier e Jorge Coelho. São equilíbrios necessários;
eles lá sabem as linhas com que se cosem. De qualquer maneira, é bom saber
que o chefe do Estado anda agora envolvido nas guerras de canais.
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