E a conclusão: Lá como cá. Mas ainda bem
que José Milhazes nos mostra
os cordelinhos que, se em todos os tempos atam as ânsias do poder, nestes
nossos têm o seu carisma próprio, que nos poderia alertar. Alguns comentadores
esclarecem.
Rússia: a Leste nada de novo /premium
A União Europeia deve elaborar
urgentemente uma estratégia séria na sua política face a Moscovo. Isto é tanto
mais importante, quando os EUA ou a Grã-Bretanha se viram para outras paragens.
JOSÉ MILHAZES, Colunista
do Observador. Jornalista e investigador
OBSERVADOR, 22 set
2021
Pode-se afirmar com segurança que os
resultados das eleições parlamentares russas estão conforme a frase “a Leste nada de novo”, mas já
o mesmo não se pode dizer em relação ao futuro da Rússia. O mais provável é que
continuemos a observar um endurecimento do regime ditatorial de Vladimir Putin.
No
que respeita à transformação das eleições num autêntico circo, o Kremlin
começou por impedir a participação de “palhaços perigosos”, não só da oposição
extraparlamentar, mas também da oposição obediente. Desta vez, o filtro foi
mais apertado do que em quaisquer eleições anteriores.
Mas
para que nada falhasse, o escrutínio decorreu de-forma a que tudo ficasse na
mesma: a Rússia
Unida de Vladimir Putin vence com maioria constitucional. Para isso, recorreram-se aos tradicionais meios de
organização do escrutínio: organização de sorteios com valiosos prémios entre
os votantes, pressão sobre os funcionários públicos e militares para não se
absterem e votarem no partido certo. Essas pressões aconteceram também em
empresas privadas que não se querem zangar com o Kremlin.
O
exemplo mais flagrante ocorreu no seio das Forças Armadas da Rússia, onde a afluência às urnas foi de 99,8%. Mas há
mais: na Chechénia, região do Cáucaso governada pelo ex-terrorista Ramzan
Kadyrov, a Rússia Unida conseguiu 96,13% dos votos, tendo todos os restantes 14
partidos participantes nas eleições ficado abaixo de 1%.
O caso misterioso da votação
electrónica em Moscovo é também sintomático. As autoridades russas decidiram
organizar votação electrónica parcial nalgumas regiões da Rússia, nomeadamente
na capital. Se os resultados nas outras regiões foram publicados logo a seguir
ao fecho das urnas, os de Moscovo foram na tarde do dia seguinte e
surpreenderam. Segundo a votação tradicional, os candidatos da oposição venciam
em grande parte nos círculos uninominais, mas quando juntaram os votos
electrónicos, todos eles saíram derrotados.
Os
comunistas recusam-se a reconhecer esses resultados, mas esses protestos
morrerão nos tribunais, se lá chegarem.
(Isto
acontece, porque a política dos comunistas russos em relação ao Kremlin tem
semelhanças com a relação entre o PS e o Governo Português, por um lado, e o
Partido Comunista Português, por outro: o PCP critica, mas acaba por apoiar
muitas das iniciativas de António Costa. Falta apenas descobrir
omo se traduz geringonça para russo).
Fim do Direito Internacional
Estas
eleições mostram também que a Rússia continua a violar abertamente o Direito
Internacional. Ao organizar
eleições nas regiões separatistas de Donetsk e Lugansk online, em que
participaram 152.610 pessoas, Moscovo dá mais um passo para a integração
desses territórios. Além disso, foram enviados 825 autocarros e 12 comboios
para transportar eleitores das regiões separatistas para o distrito de Rostov,
que faz fronteira com a Ucrânia. Como os eleitores deveriam ter
passaporte russo para votar, estes foram concedidos em horas ou dias. Ora,
imagine-se Portugal a organizar semelhante manobra com os habitantes de
Olivença!
E
por falar em Direito Internacional, a escrita desta minha opinião coincidiu
com a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos de responsabilizar a
Rússia pelo envenenamento do ex-espião Alexandre Litvinenko e obrigar Moscovo a
pagar 100 mil euros de indemnização à viúva.
Moscovo
já reagiu, recusando novamente as acusações e certamente que não irá pagar,
porque a legislação nacional está acima da internacional e nenhum tribunal
russo terá a coragem de julgar os autores desse hediondo crime. Como diz o
ditado russo, ireis receber “o buraco da rosca”.
O
mais provável é que a política externa russa irá ser mais ofensiva e agressiva. O cada vez menos diplomata Serguei Lavrov, ministro
dos Negócios Estrangeiros eleito deputado da Duma Estatal, certamente não irá
aquecer a cadeira na Câmara Baixa do parlamento russo, mas continuará no seu
cargo. O mesmo sucedendo com Serguei Shoigu, ministro da Defesa.
Mais
um sinal de que a União Europeia deve elaborar urgentemente uma estratégia
séria e consistente na sua política face a Moscovo. Isto é tanto mais
importante, quando os Estados Unidos ou a Grã-Bretanha se viram para outras
paragens.
A
nível interno, a repressão irá certamente aumentar e fazer subir o número de
presos políticos, que já é maior do que na era do dirigente comunista Leonid
Brejnev (1964-1982). E a censura avança a passos largos.
Celebração da vitória
Não
é estranho que nenhum dirigente do partido Rússia Unida tenha participado nas
celebrações do êxito dessa força política? Vladimir Putin continua isolado no seu bunker a
pretexto do surto de Covid-19 no Kremlin. Medvedev, presidente do Rússia Unida,
esteve ausente devido a “tosse forte” e Lavrov e Shoigu andam muito ocupados
com outros afazeres. Teve de ser Serguei Sobianin, presidente da câmara de
Moscovo, a cumprir esse papel.
E
aqui acontece outra coisa comum na Rússia: quando a oposição informa o poder de
que pretende realizar uma manifestação, é-lhe recusado esse direito a pretexto
da pandemia, mas o mesmo não acontece com as manifestações de apoio a Putin e ao
seu regime. Embora estes últimos pareçam não estar imunes. O país registou na
terça-feira 19.179 novos casos e 812 mortos.
VLADIMIR
PUTIN RÚSSIA MUNDO ELEIÇÕES POLÍTICA
COMENTÁRIOS
PortugueseMan: ...Mais um sinal de que a União
Europeia deve elaborar urgentemente uma estratégia séria e consistente na sua
política face a Moscovo... Eu de facto acho que caminhamos para uma estratégia diferente face a
Moscovo meu caro, mas acho que não vai gostar dela... Vamos aguardar pelo sucessor de
Merkel e ver as tomadas de opções da Alemanha. Uma das decisões vem já aí a
toda a velocidade. A UE tem que decidir qual o seu plano energético
e até onde quer incluir a Rússia, antes que esta decida desviar mais gás
para a Ásia. Estou a achar tão curioso ninguém andar a dizer nada aqui no
Observador. É que até a Agência Internacional de Energia já anda a fazer declarações
que a Rússia podia fazer um pouco mais pela a Europa... até me custa a
acreditar no que leio. Mas se a UE quiser estabilidade e segurança energética vai ter que engolir
muitos sapos. Porque afinal o gás americano que foi muito falado por aqui, cada
vez anda mais afastado das paragens europeias. Assegurada esta estabilidade
energética, a UE tem que tomar outra decisão, e que felizmente os
americanos e ingleses estão a dar uma séria ajuda. A militarização da Europa.
Só tem que cair os tabus acerca da Alemanha e deixar esta crescer
militarmente. Uma militarização da Europa não representa uma ameaça para a Rússia. Os
mísseis americanos colocados na Polónia é que são. A crescente militarização da
Europa, irá passar também com o fecho de bases americanas na Alemanha. E com
isto diminuirá a tensão entre a Europa e a Rússia. A Europa tem que decidir o que
é melhor nos nossos interesses. Uma Rússia virada para a Europa ou uma
Rússia virada para a China. E eu acho que há muita gente (eu incluído) que não
quer uma Rússia virada para a China. Prepare-se meu caro, entramos na década das mudanças.
Carlos Soares: A Rússia acabará por ocupar os países bálticos e anexar a Ucrânia.
Ninguém lhe fará frente. A UE continuará a ladrar e o urso passará.
Cabral Paula: É melhor uma estratégia para apaziguar a Rússia, a Eu não vá o Sr. Putin
decidir fechar as torneiras, em prol da Greta, e em resposta às sanções
navalni... A UE começa a parecer pobre, irrelevante e mal-agradecida, a pagar o
gaz com os euros especulativos da Sra Lagarde, e sem grande coisa para oferecer
a não ser marxismo, é esse os russos já vomitaram.
mamadorchulo dostugas: Não tínhamos hipótese de organizar o mesmo em Olivença, quando os
passaportes fossem emitidos já as eleições se teriam realizado há muito tempo,
nem a população alinhava.
Carlos Quartel: Oportuno o
aviso de Milhazes. Putin vai ter rédea solta para o seu expansionismo e vai ser
aliviado da pressão quanto a direitos humanos na Rússia. Novo inimigo
se levanta, a Oriente, e os USA só estão para aí virados. Boris está mais
interessado numa associação com americanos do que em proteger as fronteiras da
Ucrânia, dos Bálticos ou da Polónia. O
fardo vai cair na Alemanha (dependente do gás russo) e na França, mais propensa
à conversa que aos actos. Bons
ventos para Putin ......
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