segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Os truques da nossa sobrevivência

 

Helena Matos é o maestro excelente, da orquestra onde comentadores tocam, nos seus instrumentos de saber e sabor vário…

A fábrica de clientes /premium

Esta campanha autárquica mostra-nos o poder municipal transformado numa indústria socialista: não se trata a realidade, discutem-se cenários. Não se responde às questões dos cidadãos, criam-se clientes

HELENA MATOS, Colunista do Observador

OBSERVADOR, 12 set 2021

126.780 pessoas. Repito, em Portugal 126.780 pessoas estão empregadas em câmaras, juntas de freguesia e naquele universo opaco de empresas, associações, fundações municipais e comunidades intermunicipais. Como não estou candidata a nada posso dizer o que penso sobre estes números: uma parte significativa destas pessoas não faz nada e outra parte, não menos expressiva do ponto de vista numérico ocupa-se em actividades burocráticas sem outro interesse que não seja o da manutenção dessa mesma burocracia.

O poder municipal está transformado numa indústria socialista: não responde às questões dos cidadãos, cria clientes-dependentes. Não trata a realidade, discute cenários. Um misto de caciquismo e assistencialização fazem o resto: dos santos populares ao agora aclamado arrendamento acessível, o poder autárquico mete-se em tudo, sobretudo naquilo que não tem competência para fazer mas que lhe acrescenta a influência e sobretudo faz de cada munícipe-apoiado um fiel e constante eleitor.

Sinal do unanimismo reinante a presente campanha autárquica é daquelas em que menos se escrutinou o trabalho dos autarcas, tudo se resume a uma discussão em torno dos dois ou três tópicos que a cartilha socialista agendou: a solução mágica do arrendamento acessível, os malefícios do alojamento local e depois um ou dois assuntos que variam com o município mas que invariavelmente têm de passar pela reivindicação de algo gratuito e/ou “amigo do ambiente”. À partida está pressuposto que apenas se divirja na quantidade de verbas a afectar a estes inquestionáveis propósitos (quanto mais melhor!) O resto está excluído da discussão.

Basta invocar o arrendamento acessível para que os mais destravados programas passem a fazer títulos triunfais. Depois sob esses títulos cai o manto do silêncio e do desinteresse: desde 2019 que tento saber sem sucesso quantas adesões registou o «Chave na Mão – Programa de Mobilidade Habitacional para a Coesão Territorial». Pretendem as cabeças iluminadas que criaram este programa que os proprietários de imóveis que optam por ir viver para “territórios de baixa densidade” (maneira burocrática de dizer interior) vão entregar as suas casas citadinas ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana para que este as administre e coloque no mercado de arrendamento acessível. Quantos portugueses colocaram o seu património? Um? Dois?… Continuo à espera de resposta.

Em Lisboa, a falta de adesão por parte dos proprietários de imóveis aos programas anunciados, tem servido a Fernando Medina para dar conta da sua bipolaridade enquanto governante: qual soviete afável, Medina ora promete mundos e fundos ora ameaça os proprietários. Em Maio de 2020, Medina prometia três anos de rendas adiantadas e isenções fiscais aos proprietários que colocassem os seus apartamentos num dos programas municipais de arrendamento. Mas nem assim os proprietários confiaram na CML e dificilmente tal acontecerá, pois os proprietários de Lisboa não são grandes fundos imobiliários como se gosta de imaginar nos debates autárquicos mas sim minúsculos proprietários — um estudo datado de 2017 concluía que 60 por cento dos senhorios conta apenas com uma propriedade para arrendamentoque vêem no arrendamento dessa propriedade a forma de garantirem a si mesmos um rendimento extra na velhice. Logo dificilmente confiarão numa autarquia para gerir o seu património mais a mais se essa autarquia tal como acontece com a de Lisboa não souber quantas das suas casas estão ilegalmente ocupadas e não conseguir cobrar as rendas nos seus próprios bairros.

Face a esta espécie de protesto silencioso, Fernando Medina partiu para a ameaça aos proprietários e assim já em Agosto deste ano ficávamos a saber que Medina quer “impossibilitar” abertura de novos alojamentos locais em Lisboa. Para o autarca socialista e recandidato à presidência da Câmara, é necessário “recuperar imóveis afectos à função de alojamento local para o mercado de habitação” Não interessa que a maior parte dos imóveis onde estão os alojamentos locais estivessem anteriormente devolutos e degradados. Medina quer a todo o custo casas para os seus programas municipais e está disposto a pagar por elas o que for preciso. Se esta estratégia falhar parte para a mudança da lei!

Ninguém pergunta quanto custam estas casas aos contribuintes. Quantos funcionários, serviços, departamentos e gabinetes vão ser necessários para gerir tudo isto? Como se age em caso de incumprimento? Ou mais propriamente perante os incumprimentos vence a tese do BE de que não se pode despejar ninguém?

O município politico-mediaticamente ideal tornou-se em 2021 aquele em que se assume como objectivo a assistencialização da classe média; em que e pegando na expressão usada por José Manuel Fernandes no Contra-corrente a solução para ter casa se tornou de repente em ter um Estado-senhorio, onde não existem despejos (também não existe manutenção dos edifícios nem responsabilização de quem os degrada); as crianças frequentam escolas públicas que se pretendem substituir às famílias; os transportes públicos, municipalizados obviamente, são oficialmente gratuitos ou quase (na prática o seu custo cresce exponencial e descontroladamente mas o que conta é que são “gratuitos”); onde se inauguram todos os anos vários espaços municipais que nada acrescentam aos já existentes a não ser em criar-se mais uma cafetaria e vários empregos. Enfim, um município em que todos dependem do Estado ou mais propriamente da câmara. É a fábrica de clientes.

PS. Querem mesmo colocar já alguns milhares de casas no mercado de arrendamento em cidades como Lisboa, Amadora ou Porto? Simplifique-se a burocracia para a passagem das lojas a habitação. Por todo o lado, fora das grandes artérias (e também em muitos bairros municipais) existem lojas que dificilmente encontrarão interessados. Fazer as obras necessárias para passar o que foi uma loja a habitação não é difícil e faz-se sem dificuldades de maior em inúmeras cidades do mundo, difícil para não dizer quase impossível é conseguir em Portugal levar a cabo o processo burocrático para conseguir passar uma loja a habitação. (A burocracia é tão desrazoada nesta matéria que até a reposição da legalidade se torna quase impossível: todos nós nos confrontámos em algum momento com aqueles prédios de habitação em que existe um andar onde funciona um consultório, um serviço público, um escritórioPois caso o proprietário desse apartamento pretenda que ele volte a ser de habitação, tem de conseguir que todos os condóminos do edifício votem favoravelmente essa mudança de uso mesmo que seja para regressar ao uso que era o indicado! Percebe-se que se exija a aprovação dos condóminos de um prédio residencial para passar uma habitação a comércio ou escritório mas o contrário não faz sentido algum!)

A simplificação da mudança de uso de comércio para habitação não é uma solução mágica para a falta de casas para arrendamento, mas certamente que produziria melhores resultados que muitos dos programas anunciados pelo Governo e sem custos para os contribuintes.

AUTÁRQUICAS 2021  ELEIÇÕES  POLÍTICA

COMENTÁRIOS

Maria Augusta: Uma vez mais, Helena Matos de forma pertinente a colocar a nu o manicómio canhoto-fascista em que este país foi transformado pelos socialistas e pela comunada. Se juntarmos as 126.780 pessoas que infernizam a vida aos verdadeiros cidadãos produtivos e contribuintes aos mais de 700.000 funcionários públicos com emprego vitaliciamente garantido e que extenuadamente "trabalham" as 35 horas semanais (de facto dizer que um xuxareco ou comuna trabalham é um enorme eufemismo), temos um quadro perfeito da falta de futuro deste pobre país. Portugal está morto nas mãos desta cambada progressista, sepultem-no Panteão Nacional!           Liberal Assinante do Local: Infelizmente hoje Helena Matos "mete os pés pelas mãos" com o seu post scriptum, parecendo que é ela também candidata à CML ou a outra das tascas, e não uma mera colunista. Passar comércios a habitação?!!! Mas que raio de ideia! Não defendo que tal deva ser uma impossibilidade absoluta, mas daí a criar facilidades vai uma enorme distância. Não há falta de habitação em Portugal, como é óbvio, os mercados estão amplamente abastecidos, até mesmo o mercado de arrendamento, onde os preços têm descido acentuadamente. As lojas e serviços fazem falta, um bairro só de habitação é uma nulidade urbana, por vezes designado como um dormitório. O que falta afinal para que o famoso "direito à habitação" seja mais real do que fictício? Falta o óbvio, aquilo que falta aos pobres: dinheiro. A verdadeira questão é por que é Portugal cada vez mais pobre? E não, a solução não é transformar lojas em apartamentos. Liberal Assinante do Local > maldekstre estas kaptilo: O Estado e as suas tascas municipais andam há décadas a intervir nos mercados imobiliários e o seu ceteris paribus nunca resultou em descidas de preços, apenas em privilégios ilegítimos para alguns e contas chorudas para os contribuintes. Mas prontos, se quiser acabar com as lojas tente, desde que seja longe de mim que preciso delas.           maldekstre estas kaptiloLiberal Assinante do Local: Nada do que respondeu tem a ver com o que eu escrevi. Mas não se amofine e não perca mais tempo comigo.            Elvis Wayne > Liberal Assinante do Local: Apresente-me um bom argumento para que se mantenha a burocracia insuportável que impossibilita qualquer conversão de uma loja em habitação. maldekstre estas kaptilo > Liberal Assinante do Local: Conhecendo-o tenho a certeza que não. E não se preocupe com isso, é mais do mesmo dos nossos estimados censores do Observador. Ainda-por-cima nada disse de mal ou ofensivo,  nem sequer ao de leve, foi um comentário meramente económico.            Gustavo Ferreira: A H. M. pôs, uma vez mais, o dedo na ferida. Mas quando alguém está “anestesiado” as chagas não lhe doem… Claro que as pessoas têm direito a um tecto, a começar pelos sem-abrigo a quem foi prometido, já há bastante tempo, o aconchego de algumas telhas! (…) E as pessoas também têm direito à comida para a manutenção do metabolismo basal, pelo menos; e a cobrirem o corpo com roupinha que por vezes é mínima mas, por enquanto, necessária; e têm direito à saúde e ao conveniente controle das doenças que, bastas vezes, elas não evitam; e têm direito ao transporte para o trabalho ou para afazeres essenciais. E têm direito a que os seus filhos tenham acesso ao ensino, desde o básico até ao superior. E têm direito à justiça quando se sentem desconsideradas. E têm direito a férias para a imprescindível mudança de ares e ambiente. Estes são alguns direitos e talvez o mais elementar seja o direito à casa de habitação. Eis um problema de delicada resolução. Mas se o Estado se sente obrigado a suprir, entre muitas outras, algumas destas necessidades, onde vai arranjar os fundos necessários a tão exigentes tarefas? O socialismo quer acudir a tudo mas parece que, às vezes, tem razões que a economia não compreende... Disponibilizar, favorecer, auxiliar são verbos que significam uma nobre candura de intenções. Que significará o verbo “pagar” quando, um dia, a factura destas benesses for apresentada?          Karoshi > Gustavo Ferreira: Os nórdicos conseguem fazer tudo isso ;) E em relação a habitação, agora até já é possível usar a impressão 3D para criar casas a um preço muito mais barato. É usar. Maria Narciso: Foi o PS quem introduziu nas políticas locais a dimensão social, quem mais se empenhou no reforço de intervenção social das Autarquias e das IPSS, foi responsável pela criação na nossa Ordem Jurídica do essencial dos instrumentos de política social com repercussões no envolvimento das Autarquias locais na promoção da coesão social do País. Criando o Fundo Social Municipal , assim como o enquadramento para financiar várias políticas sociais : - Apoio á infância ,idosos , educação , saúde , deficiência e educação .     Liberal Assinante do Local > Maria Narciso: Portanto, tudo menos asfaltar as vias e calcetar os passeios. Está-se bem, mas é melhor manter os olhos no chão.          Maria Narciso: As Autarquias locais dispõem actualmente de significativas competências ao nível da política local de educação, o que fica a dever-se quase em exclusivo á acção Legislativa promovida pelo PS .           Aríete > Maria Narciso: E isso não é nada bom, bem pelo contrário.         Theodor Adorno: O socialismo é o futuro ,o resto pertence ao caixote do lixo da história. A direita em Portugal é constituída na sua maioria por racistas e homofóbicos.        Dr. Feelgood > Theodor Adorno: Racistas não. Realistas. E homofóbicos são os piolhos que não aceitam a diferença dos que não os partilham. Tudo o mais é refugo new wave, fock !            Maria da Graça de Dias: Uma constatação de factos relatados com conhecimento, com inteligência e com sabedoria, que permitem uma maior compreensão e discernimento sobre a realidade do tema aqui em causa "A fábrica de clientes". Mais um excelente e brilhante artigo de opinião de HM, com um sublinhado ao tão pertinente título.          Nova Aurora: A possibilidade de reconverter espaços comerciais em residenciais sem bloqueios de condomínios está em análise em vários países, não só por falta de habitações mas também pela decadência do comércio presencial ... mas reformas neste país

S Belo > Nova Aurora: A dificuldade não reside apenas nos " bloqueios de condomínios": mesmo que um negócio tenha falido, como aconteceu e muito com pequenas unidades do ramo da restauração, mantém-se a obrigatoriedade de pagar água, electricidade, taxas de recolha de lixos etc pelo tarifário antes instituído para a actividade. Entidades públicas e público-privadas ficam assim a receber por serviços que não prestam. Há gente na penúria que não pode sequer habitar no local onde teve o seu negócio sem mergulhar no poço sem fundo da burocracia: projectos de arquitectura, licenças, taxas e taxinhas....           Laurentino Cerdeira: Mais um excelente artigo! Quanto à ideia explanada no post scriptum, creio que a Sra D. Helena Matos estará a deitar pérolas a porcos...          Mario Guimaraes: Bom artigo. O poder autárquico é sede de muita corrupção. Ninguém intervém. Todos têm um primo ou prima ou sobrinho numa junta. Mudar o poder só quando o autarca mor sair. É assim Portugal.          Joaquim Moreira: Mais do que uma fábrica de clientes, estamos a falar da maior Agência de Comunicação, que dificulta muito quem tenta fazer-lhe oposição. Mesmo quando, são eles a oposição a um governo em plena governação. A facilidade com que cria narrativas, são as provas destas minhas afirmativas. No tempo do Governo da PàF de Pedro Passos Coelho, conseguiu convencer, através da CS, que a austeridade foi da sua inteira responsabilidade! E assim, fazer esquecer o grande responsável por tudo o que estava a acontecer. E foi de tal maneira, que durante todo este tempo em que estão no poder, usaram um slogan publicitário que não devemos esquecer. A saber: “à justiça o que é da justiça, à política o que é da política”. Dito assim, ou ao contrário, não passa de um golpe publicitário. E que revela bem a qualidade desta agência, e da sua competência. Na realidade, sabem como ninguém usar a CS, razão por que não é nada fácil ser oposição em Portugal. Situação que foi agravada, com a fusão com duas outras agências que agora actuam de forma unida e não separada! Mas não posso terminar sem dizer, que há uma outra razão para se manterem no poder. Razão que ao mesmo tempo é uma certeza, continuam a distribuir para aumentar a pobreza, em vez de primeiro criar riqueza! E quem primeiro quer criar riqueza, é visto pela “direita” como se fosse da mesma seita!         Karoshi > Joaquim Moreira: Tem de especificar melhor o que é que entende por "riqueza" e como é que se cria... Joaquim Moreira > Karoshi: Riqueza é o que sobra depois de pagar a despesa! Depois desta simples resposta vou-lhe a dar a que não gosta. Para se criar riqueza, só pode ser através do crescimento de todas e da cada empresa! A distribuir o que não temos, é que não é com certeza!            Karoshi > Joaquim Moreira: Está a falar de dinheiro portanto. Mas então, fica a saber que as únicas empresas que criam essa "riqueza" são os bancos, porque são eles que criam todo o dinheiro. A distribuir o que não temos, é que não é com certeza! Mas como é que é possível distribuir algo que não se tem? Essa acusação não faz muito sentido.          Joaquim Moreira > Karoshi: Essa de que os bancos é que criam "riqueza" só pode ser uma pequena esperteza! E como sabe, melhor do que eu, é muito fácil de distribuir o que se não tem. Basta continuar a aumentar a dívida, que um dia há-de pagar alguém! Como já pagou três vezes a minha geração e vai voltar a pagar a geração que aí vem!

…………………….

Nenhum comentário: