domingo, 9 de julho de 2023

E o mundo gira


Com uns e com outros. Os que destroem, os indiferentes a isso, os que pretendem reconstruir das cinzas, procurando um qualquer ponto bruxuleante, por entre aquelas. O Dr. Salles da Fonseca é desses heróicos batalhadores saudosistas, há muito que defende a tese de uma continuidade linguística que vai sobressair, por enquanto, nesses que hoje dominam, aqui no país. De quem eu gostei mesmo foi de Narana Coissoró, pela sua integridade, naqueles tempos em que o CDS seguia esses rumos que o Dr. Salles não se cansa de pretender reaver, ainda que só na memória dos Homens. Mas o mundo vai em frente, outros valores se lhe impondo, até mesmo os daqueles que só pensam em destruir, despudoradamente… Talvez em lembrança dos czares, seus antepassados, conquistadores de outrora. Se vale a pena ou não, outros o dirão. Mas o esforço do Dr. Salles é, de facto admirável, na sinceridade do seu amor pátrio.

CULTURA INDO-PORTUGUESA

HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO08.07.23

O Estado Português da Índia existiu desde 1510 a finais de 1961. Foram 451 anos de convivência intercultural a que deveremos acrescer os anos que antecederam a criação oficial do referido Estado e os anos que já decorreram desde a sua extinção de facto até ao presente. São, praticamente, cinco séculos de intercâmbio cultural cuja realidade global deve ser reconhecida como verdadeiro Património da Humanidade tanto na vertente material como na imaterial.

Arquitectura, religião, língua, mobiliário, medicina, literatura, pintura, música, enfim, todas as vertentes da intelectualidade e da cultura popular.

A cultura indo-portuguesa consubstancia um estilo de vida que traduz uma Civilização híbrida de grande mérito dentro e fora do subcontinente hindustânico. São inúmeras as personalidades oriundas desse estrato civilizacional que ao longo da História se elevaram aos mais altos postos das hierarquias indiana e portuguesa. Por exemplo, Jorge Fernandes que foi Ministro da Defesa da Índia de 2001 a 2004 e António Costa que é o actual Primeiro Ministro de Portugal.

Mas esta cultura vem desaparecendo porque as vicissitudes da História puseram fim à presença da Administração Portuguesa, porque os indo-portugueses vêm emigrando e porque o espaço assim deixado vago vai sendo preenchido por quem não se sente ligado a essa tradição cultural. Mesmo a Igreja Católica se apressou a substituir a língua portuguesa pela inglesa nas homilias das suas celebrações e esse foi, só por si, um golpe da maior gravidade na coesão da cultura indo-portuguesa.

Valha o Visconde Seabra cujo Código Civil prevaleceu.

Entretanto, a Universidade de Goa acolheu o Instituto Camões e ali se ministra a didáctica da língua portuguesa aos futuros professores. Este é um trabalho ciclópico a que não poupo louvores.

Mas os professores não podem ensinar se não houver quem os queira escutar e eles próprios precisam de viver.

Assim nasceu a Sociedade de Amizade Indo-Portuguesa, Goa (Indo-Portuguese Friendship Society, Goa) que vem desempenhando um papel da maior relevância no estreitamento das relações de amizade entre os dois países, ou seja, entre as duas culturas. O mesmo é dizer que vêm preservando a cultura indo-portuguesa.

Falta que em Damão-Silvasssa e em Diu os lusófilos se associem de modo semelhante em Sociedades de Amizade Indo-Portuguesa, recrutem professores indianos de língua portuguesa e preservem desse modo a identidade civilizacional que os distingue a nível mundial.

Falta promover a Cultura Indo-Portuguesa a Património da Humanidade.

Lisboa, Abril de 2022

Henrique Salles da Fonseca

(publicado na «Revista da Casa de Goa», ed. Julho-Agosto de 2023)

 

 

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