Mas na forma brilhante de MJA.
A assinatura
Não é “mais do mesmo”: trata se do direito de saber,
trata-se das regras comummente aceites numa democracia; trata-se da moralidade
dos procedimentos.Tudo em falta, como água numa seca.
MARIA JOÃO AVILLEZ Jornalista, colunista do Observador
OBSERVADOR, 12 jul. 2023, 00:2036
1Que
terá de acontecer mais, para acontecer alguma coisa, enquanto vai acontecendo
tudo sem nunca acontecer nada? Um case study mais sociológico que
político e é pena não haver um livro com esta história que começa assim: era
uma vez um político socialista que sem que alguém lhe perguntasse, se apressou
a sossegar o país quanto à sua condução de uma maioria absoluta: então não tinha
ele a mão no leme? Mais: e não iria até Marcelo (Marcelo?) estar tão atento?
Nós que ficássemos tranquilos. (Coitados).
Nunca
percebi porém que se “entregasse” o exclusivo da indignação ás oposições. Ou apenas
ás oposições. Que tudo se lhes peça e delas se espere, dispensando
intermediários e desconfiando de mudanças. Mas
parece que assim estamos: olhando tudo, não estranhando nada. É
obviamente também (muito) por isso que a política está como está: ambas as
coisas – o abuso de poder e arrogância de comportamentos de um lado e um
alheado “deixa andar”, do outro — não são desligáveis.
São
siamesas.
2Na terra socialista o solo está tão
democraticamente infértil que já nem perguntas acolhe (já repararam que nenhuma pergunta que se
lhes faça obtém resposta desde há um ano?). A minha faz-se porém depressa: até
quando, os não socialistas irão coleccionando uma permanência de ocorrências
sem um levantar de pálpebra? Como e porquê
“se” vão ignorando, relativizando ou disfarçando tantos incomuns casos de
difícil sobrevivência num estado de direito? Que aconteceu á indignação que
tanto sorria ao dr. Soares que a via como um “direito”, sobretudo quando ela
era a seu favor e logo nacionalmente praticada? Misteriosamente tal “direito” não ocorre a quem
discorda do sulfúrico entendimento que o PS tem hoje da democracia:
ignorando-lhe os “estatutos”, dispensando as suas exigências, não honrando a
sua responsabilidade. Estatelando-se das suas regras básicas, até cair no chão
da indignidade, como agora, com a conclusão do Relatório da CPI da TAP. Santo
Deus que dias! Ficarão na memória colectiva, colados ao espantoso relatório
sobre a ex-gloriosa companhia “de bandeira”: uma assinatura socialista,
legível, impositiva, definitiva: PS+Governo são os donos dos tabuleiros de
xadrez, manuseiam sozinhos as suas peças, ditam o jogo que apenas eles jogam.
Não se fica indiferente: a desconcertante ousadia de dar direito de veracidade
e cidade a tão indecoroso relatório indicia o quanto “eles” consideram o país e
os portugueses: nada. Não consideram. Excepção para os do voto cativo no PS.
Sabemos quais são.
Que me lembre nunca houve retrato tão nítido deste invulgaríssimo grupo
político de gente que age e respira como se convivessem exclusivamente entre
eles. O socialismo vigente numa galáxia própria, nós, neste pequeno troço de
ocidente atlântico. Desmunidos e alheados.
3Ainda isto: a) certas pessoas e alguns factos passíveis da obrigação
de explicações públicas desaparecem misteriosamente dos radares do escrutínio
do país (e não só de relatórios encomendados). Por exemplo (e não, não é mais
do mesmo!): que será feito daquela séria preocupação face ao saber-se o SIS
envolvido num mero caso de polícia? Peço desculpa mas não desisto disto: o SIS
interveio? Porquê, como, quando, a mando de quem? A porta de saída foi omiti-lo
na conclusão do relatório? Pesado silêncio, comprometido silêncio. Ou o
silêncio como ultimo porto abrigo político?
b) No meio da mais glacial indiferença
do poder socialista face à obrigação -já nem digo a honra, prática em desuso –
da prestação de contas, há coisas que teimam em não nos ser explicadas. Ou
seja: democracia: zero. Accountability: menos que zero.
Por exemplo: porque não podemos saber
o que foi António Costa fazer a Budapeste e dizer o quê a Orban? Deu o abraço –
não era o que o levava lá? – a José Mourinho? Como não é de todo crível que
tenha simplesmente ido à bola, que foi lá fazer? Eu sei, uma chatice falar
nisto outra vez, “já não se pode”. Ah não? Então admitimos o segredo como
prática? E as más práticas, como norma?
Insisto: não. Trata-se do direito de
saber, trata-se de regras comummente aceites e tidas como os indispensáveis
pilares de um pais democrático; trata-se, hélas, da moralidade dos
procedimentos. Em falta, como a água numa seca prolongada.
O mutismo do Governo e do PS
confere-nos porém finalmente a inequívoca certeza de que se estão nas tintas.
Civicamente, democraticamente, portuguêsmente. Acabam de o certificar com a
segurança de um “proprietário” e uma assinatura socialista devidamente
reconhecida
Em certo sentido, é uma novidade. Olhando para trás e revendo outras –
digamos – “situações” de altas arrogâncias pessoais e políticas não me lembro
de nada com este grau de indiferença, mascarada de “partido de governo” e do
próprio governo!
Novidade, sim.
4E já agora: falam-nos muito das
contas certas (e quem nega a sua bondade?) faz parte da propaganda e
não há muito mais. Oxalá porém
o resto da governação acompanhasse o júbilo das “contas certas” em sectores
vitais para o tecido do país. Como por exemplo as contas de quem não tem a
saúde que procura, a escola a que tem direito, a justiça de que necessita. Ou o
fim do mês livre do peso aflição.
Em que contas está o governo
trabalhar para que os portugueses mais aflitos acertem um dia as suas próprias
contas?
PS: Gostava
de ainda estar neste mundo quando chegar a conta da decisão de erguer um novo
hospital no Bombarral. Em vez de, como tudo recomendaria estrategicamente, nas
Caldas da Rainha. Se é verdade que uma grande unidade de saúde não deve ser “o”
motor de uma cidade, é bem verdade que precisa dela: o novo hospital não pode
“precisar” do Bombarral, não há lá nada que faça a diferença. Nem dimensão, nem
infraestruturas, nem estruturas, nem capacidade de atracção de pessoal clínico.
Nem, nem… Se não é favorecimento político é muito, muito parecido. Que erro! E
que nova assinatura!
COMENTÁRIOS (de 36)
Luis Miguel: Força Sra Avillez, não se cale, nunca. A esquerda semeia o medo,
promete o arco íris e aqui chegamos. A grande preocupação deste PS não é governar, é garantir
que outros não governam. João Floriano > António Lamas: Talvez eu seja um totó ingénuo
e crédulo, mas não alinho muito na ideia de esqueletos escondidos no armário. A explicação está na
personalidade de MRS, que sempre foi isto que estamos agora a observar. um
abrilhantador de salões sociais, um narciso sedento de admiração, de aceitação.
António Costa, o verdadeiro exemplo de chico esperto, percebe isso muito bem e
manipula-o a seu bel prazer. Nada acontece por acaso, acredito eu, mas que raio
de conjuntura esta, que juntou no mesmo espaço temporal e físico o pior governo
com o pior presidente pós 25 de Abril! Barroso
Gonçalves: O povo é mau, as
elites piores e o que as faz indignar deixa muito a desejar, mas se existe
responsabilidade individual nesta quase admiração pela corrupta mediocridade de
um governo e do partido que o suporta, é o Presidente da República. Foi ele
que, dia a dia, intervenção a intervenção, liderou a interiorização de que tudo
que o PS faça de mau, não vale a pena mudar porque alguém no passado ou no
futuro também é capaz de fazer o mesmo. Em 8 anos de governo e de casos graves
ou veio em aflito apoio ao PS ou, sendo o caso demasiado flagrante, fazer uma
critica, mas sempre seguida de "mas que é que se pode fazer? Não há
oposição.". Condição que, no minuto em que as sondagens começaram a dar
vantagem à oposição de direita passou para "não há oposição enquanto um
partido de direita não tiver mais não sei quanta percentagem de votos do que o
total aos outros dessa área de direita: Qual invenção constitucional que
Marcelo só aplica aos partidos da direita. É, no entanto, esta miséria de
Presidente que jornais e TVs colocaram e mantêm num pedestal santificado.
Carlos Chaves: Caríssima Maria João, partilho do seu absoluto
desconsolo e da leitura que faz do nosso decadente e inaceitável ambiente
político, mas além do lamento e da indignação a questão que se impõe é, o que é
que podemos fazer para alterar esta situação antes que seja tarde demais para a
consertar? Além dos gravíssimos problemas que o socialismo sempre nos traz, é a
própria democracia que está em causa. Maria
Fernanda Louro: Quisesse Deus que houvesse mais vozes como a sua! Este País, agora país, já não é
a Pátria de Camões, é um país que matou os heróis e substituí-os pelos cobardes!
Não sou a favor das guerras mas cada vez mais me convenço que a esta geração
faz muita falta, fazer a tropa. Hipo
Tanso: Um artigo
notável de MJA. Tudo o que ela escreve é verdade e não nos dá sequer o
direito de discordar. Impossível - tão verdadeiro o que ela escreve! E
continuamos à espera - sabe-se lá por quanto tempo ainda! - que alguém nos
valha, quando afinal não há ninguém que nos possa valer a não ser nós próprios.
O socialismo é SEMPRE a rampa descendente e muito inclinada para a ditadura dos
tais "habilidosos" - aqueles que preferem submeter-se a todas as
vergonhas para se manterem a boiar como rolhas de boa cortiça portuguesa. - E o
povo...? - O povo... o povo que se f...
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