Herói, hoje, amante de si, segundo a
actual cartilha de cá. Desmascarado por AG, que, coitado, bem se esforça por nos
abrir as cabeças, a respeito destas conivências fabricadoras desses tais heróis
de hoje, por aqui. Que, os de ontem, já Reinaldo
Ferreira os descrevera, em ironia desgostosa, é certo, além dos que a gente
vai admirando, lá pela Ucrânia, bem reais, esses, de cartilha antiga, defensora
de valores pátrios, que julgávamos imutáveis, e ainda o são, lá.:
Tome-se um homem,
Feito de nada, como nós,
E em tamanho natural.
Embeba-se-lhe a carne,
Lentamente,
Duma certeza aguda, irracional,
Intensa como o ódio ou como a fome.
Depois, perto do fim,
Agite-se um pendão
E toque-se um clarim.
Serve-se morto.
Pedro Nuno, uma vida socialista
O Pedro Nuno nunca exibiu respeito
pelo dinheiro alheio, que no fundo julga seu. Nunca mostrou serventia,
vergonha, arrependimento. Pedro Nuno não é nada, o que em Portugal é condição
para se ser tudo.
ALBERTO GONÇALVES Colunista do
Observador OBSERVADOR,
08 jul. 2023, 00:209
Foi tão bonito, o regresso de Pedro Nuno Santos à Assembleia da
República. Bonito e comovente. Os
deputados socialistas, e talvez alguns outros, fizeram fila a cumprimentar o
Desejado, a tocar-lhe nas mãos e na barba, a revelar agradecimento e a pedir
bênção. Os sorrisos eram rasgados a ponto de os parlamentares arriscarem
deslocação do maxilar ou paralisia facial. Embora por pudor os jornais não o
referissem, acredito que houve quem levasse aleijadinhos para efeitos de cura.
E acredito que a cura terá sido instantânea.
O cerimonial reduziu ao ridículo a
má-fé dos descrentes. Os descrentes são aquelas criaturas ressentidas que não
enxergam a óbvia grandeza do Pedro Nuno, se Ele permite que o chame assim. Vi
por aí diversas alusões à falta de carisma, de currículo e de motivos para o
tratamento dispensado ao Homem, com monumental H. Aos ressentidos falta juízo, é o que é. Além de transbordar carisma, o
currículo do Pedro Nuno é uma sucessão de proezas sem mácula, as quais,
somadas, fornecem amplos motivos para que, um belíssimo dia, ele possa
liderar o Partido, o governo, o país e, Deus queira, as nossas vidas. Alguém
falou em predestinados?
Filho
de um vereador do calçado e industrial do PS, ou o contrário, o Pedro Nuno
nasceu a 13 de Abril de 1977 em São João da Madeira. Não
encontrei informações acerca do seu percurso no infantário e na escola
primária. Aposto, porém, que já então ele revelava propensão para a chefia e
ameaçava, à distância, pôr a tremer as
pernas do colega que lhe pedia a devolução dos lápis de cera. Garantido é que, mal entrou na Escola
Secundária Dr. Serafim Leite, labutou até subir à presidência da respectiva
associação de estudantes, onde sem dúvida deixou legado.
Aliás, pela vida académica afora, o
Pedro Nuno jamais permitiu que os estudos lhe atrapalhassem o apelo da
política. Descido a Lisboa, no ISEG,
ocupou os cargos de membro
da direcção da Associação de Estudantes, presidente da mesa da RGA e membro do
senado da Universidade Técnica. O facto de, soterrado em afazeres, lá ter arrancado uma licenciatura em Economia, cuja data de
conclusão procurei e não descobri, é uma façanha espantosa. E a façanha adquire
maior dimensão se considerarmos que em simultâneo, dos 20 aos 24 anos, o Pedro
Nuno acumulava as tarefas escolares (digamos) com a presidência da assembleia
de freguesia de S. João da Madeira. O
que, no meio de semelhante generosidade cívica, o Pedro Nuno não acumulou foram
grandes noções de economia, lacuna que não o impediu de ser hoje equiparado a
renomados vultos do ramo como Mariana Mortágua e o general Maduro. Além
disso, na hipótese (por demonstrar) de não possuir o dom da ubiquidade, as
repetidas idas e vindas entre São João da Madeira e a capital forneceram-lhe a
especialização em transportes que o distinguiria no futuro.
Mal terminou o tirocínio na junta, e
ainda – presumo – com o curso por terminar, o Pedro Nuno continuou a
concentrar-se no que importa e saltou da freguesia para a assembleia
municipal. Não satisfeito, decidiu nas horas vagas (?) chefiar a federação
de Aveiro da Juventude Socialista e de seguida a equivalente aveirense do PS
dos adultos. A pulsão para desvalorizar a economia em prol do
socialismo é uma constante na carreira do Pedro Nuno. Felizmente.
Apenas uma devoção precoce e intensa ao
bem-comum permitiu que, em 2004, o Pedro Nuno irrompesse pela política nacional
e alcançasse o posto de secretário-geral
da Juventude Socialista. A devoção
era tamanha que, logo em 2005 e sob o elevado patrocínio do “eng.” Sócrates, o
nosso herói se viu eleito deputado. Extraordinário? Com certeza. E
mais extraordinário, quase sobrenatural, será notar que ao altruísmo partidário
o Pedro Nuno adicionava funções administrativas num grupo empresarial. Antes
que alguém se horrorize com a cedência ao capitalismo e à selvajaria dos
mercados, calma: o grupo em questão é do pai dele e faz principalmente negócios
com o PS, perdão, com o Estado, muitos por ajuste directo. Para cúmulo, e
assegurar que os negócios da família não se conspurcavam no mundo concorrencial,
a prestigiada firma Tecmacal manteve
as ligações ao sector público mesmo após o Pedro Nuno penetrar o governo e
apesar de a lei das incompatibilidades proibir o arranjinho com a perda de
mandato.
O governo. É fácil
dizer que o resto é história, cujo final não estraguei porque será
inevitavelmente épico e impossível de arruinar. O Pedro Nuno chegou ao governo
em Novembro de 2015, depois de ajudar ao acordo do PS com dois
partidos leninistas (do primeiro,
o Pedro Nuno frequenta as festas; do segundo, é uma espécie de sócio honorário).
À época, era sobretudo conhecido pela
lição de macroeconomia e ortopedia que dera aos banqueiros alemães, em 2011, e
por se locomover de Maserati, propriedade do pai e no fundo com financiamento
social. Entretanto, tornou-se
célebre e venerado conforme merece. De uma secretaria de Estado pulou para o
ministério das Infraestruturas, o palco ideal para consumar os sonhos de
qualquer criança saudável: brincar com aviõezinhos e comboios. Decorridos
quatro anos e milhares de milhões “investidos” em alucinações pioneiras e
indemnizações a compinchas, demitiu-se para fugir do WhatsApp e demais maçadas
incompatíveis com a sua estatura. O Pedro Nuno voltou agora,
transbordante e mítico, para júbilo dos que são iguais a ele, dos que ambicionam
ser iguais a ele e dos que lamentam não conseguir ser iguais a ele. Em suma, de
um pedaço razoável da população portuguesa. Os que sobram, e não compreendem o
culto da figura, não sabem o que dizem nem onde vivem.
O
Pedro Nuno nunca trabalhou, daquele tipo de trabalho em que se é remunerado por
retribuição de uma competência lícita e útil. Nunca exibiu o mínimo respeito
pelo dinheiro alheio, que no fundo julga seu. Nunca se lhe ouviu um esboço de
qualquer coisa parecida com um raciocínio pertinente. Nunca mostrou serventia,
vergonha, arrependimento. O que mostra é a arrogância com que os simplórios
simulam “nível”, e a peculiar acepção de “redistribuição” que caracteriza um
comunista autêntico. O Pedro Nuno não é nada, o que em Portugal é condição para
se ser tudo.
COMENTÁRIOS:
Alexandra Ferraz: Só não entendo
tanta bajulação da comunicação social a tamanho incompetente. Até dói... Só
mesmo neste país surreal. Tirem-me deste filme!!! Como sempre, assino por baixo. Cupid Stunt:
Clap...clap...clap... bravo! Sublime,
humorada e certeira descrição do personagem. Um autêntico e inútil tigre de
papel. O que, infelizmente, neste pais é muitas vezes garantia de sucesso.
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