Esta maravilhosa composição escrita, de TIAGO DORES, e digo-o num sentido puramente
etimológico de combinação de sons e não no sentido musical de composição
erudita que tantos nomes da ilustração clássica trouxe à ribalta da cultura musical
humana. Um texto que põe em relevo uma formação moral como uma formação
cultural, destacando sentimentos – de raiva, de impotência, de amargura, de dor
– como atitudes - de profunda ironia sabiamente tratada - na revolta em que
vivemos, contra a barbárie perpetrada – mais uma – lá fora - e o pasmado de uma
actuação - cá dentro – que para além das tolices e indiferença habituais, nos dá
previsões de mais uma geringonça possível a encaminhar inescrupulosamente os
destinos de um país sem alma, sem saber e sem coragem. Um texto de fibra, o
deste jovem Tiago Dores.
Hamas e há péssimas sondagens com o PS na frente
Perante o terror que se vive em Israel por estes dias,
quem me dera ter a capacidade de fazer como António Costa cada vez que há novo
escândalo no seu governo: simplesmente ignorar.
TIAGO DORES Colunista
do Observador
OBSERVADOR, 11 out. 2023, 00:16
Costuma
dizer-se que “A ignorância é uma bênção”. Ou melhor, os falantes de inglês usam
a expressão, que não estou certo tenha esta tradução directa para português. E
para já ficarei na ignorância porque, à hora avançada que escrevo, não ter de
fazer essa pesquisa é, lá está, uma bênção.
Ora, qual é o meu problema. O meu
problema é que, embora seja um indivíduo muito razoavelmente ignorante, tenho
bastante dificuldade em ignorar notícias como a de que, no âmbito da invasão do
Hamas a Israel,os terroristas palestinianos
chacinaram 40 bebés israelitas, incluindo por decapitação.
Educar não é complicar.
Não quero com isto insinuar
que o vómito provocado pela leitura desta notícia seja incompatível com o
vómito provocado pela estreia do espaço de comentário de Pedro Nuno Santos na
SIC. De todo, que este segundo regurgitar é mais do que justificado. Ainda que
fique também a anos-luz da volta ao estômago que me dá cada vez que alguém
menciona o “ciclo de violência” entre Israel e a Palestina, desta forma
equiparando a nível moral o estado judaico e os facínoras terroristas do Hamas
e companhia.
Curioso “ciclo de violência” este em
que, como tão acertadamente referiu Golda Meir, “se os
Palestinianos depuserem as suas armas, haverá paz. Se os Israelitas depuserem
as suas armas, haverá um massacre.”
Palavras que, por estes dias, e como nunca nos últimos 50 anos, constatam o
óbvio: se hoje à hora do lanche os israelitas abdicassem de defender o seu país
pela força das armas, ainda não se tinha dado a primeira dentada na torrada e
Israel já não existia.
Agora, que sossego deve ser
ignorar, ou pelo menos ser capaz de comentar de passagem, com displicência, as
manifestações pró-Hamas que tiveram lugar em tantas e tantas cidades por esse
mundo ocidental fora, incluindo Lisboa, Berlin, Londres, Toronto, Malmo,
Roterdão, Zurique, Copenhaga, Nova Iorque, ou Washington. Que gosto, constatar
que em tais bastiões do progresso e civilidade é perfeitamente aceitável – e
com tanto gosto reportado por variadíssimos meios de comunicação social! –
haver demonstrações de apoio à carnificina de centenas de
pessoas cujo crime foi assistir a um festival de música.
Ainda assim, há esperança. Pelo menos para Lisboa e para o nosso
querido Portugal. Sim, é verdade que já nem o maior hospital
da capital e do país tem urgências a funcionar. É verdade que os médicos estão
a dever mais horas à cama que Portugal a credores internacionais. É verdade que
faltam mais professores que nunca nas escolas, o que é pena, porque desde o
início do ano lectivo já perderam imensas oportunidades de fazer greve. E sim,
é também verdade que temos uma carga fiscal sueca e serviços públicos somalis.
Mas, meus amigos, calma. Calma, porque
saiu uma sondagem da TVI e CNN Portugal. E o que revela essa sondagem? Revela que podemos
acreditar no futuro. “Acreditar” no sentido em que é garantido que o futuro
chegará. Disso não há dúvida. Mas não mais do que isso. Porque
quando o futuro chegar vai tresandar a passado. Vem aí pivete a sério, uma vez que
esta sondagem coloca o PS como o partido mais votado, precisando do Bloco de
Esquerda, CDU, PAN e Livre para ter uma maioria absoluta. Tudo agremiações que
nutrem simpatia, nalguns casos da bem forte, por carniceiros que raptaram dezenas, ou centenas, de israelitas, e
passearam feridos e mortos pelas ruas de Gaza.
Perante tudo isto, qual a minha sugestão? A minha sugestão é adoptarem a estratégia de
António Costa a cada novo escândalo associado à sua pródiga governação: ignorar.
Está visto que é uma bênção.
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