Do Luís, que enviou
o texto para o meu G mail.
Depois de ouvir recentemente, no Canal Memória, opiniões de escritoras nossas,
justamente bem-amadas, no nosso país bom-amante – de resto, na reciprocidade
dos afectos - sobre um Salazar que ambas desamavam - Sophia
de Mello Breyner e Natália
Correia - o que lhes mereceu prestígio geral pátrio, também
por isso - aprouve-me ler este texto de um Homem que me habituara a respeitar,
apesar da sua voz aflautada do entardecer da sua vida, da qual apenas colhia as
palavras da sua sinceridade amante da sua pátria, tentando olvidar o tom de voz, que,
no entanto, ainda hoje evoco com desprazer. Leio, assim, agradada por não ser
a única que mantém, hoje, idêntica opinião, pois que o Luís lhe descobre os textos que me envia,
postados, decerto, por algum admirador do tal “ditador” que já há tantos anos
desenhava o retrato de uma doutrina que se revelaria, posteriormente, por cá,
perfeitamente de acordo com o que dela ele escrevera:
“A visão de Salazar sobre como combater o comunismo,
uma lucidez e
objectividade impressionantes, um grande homem, um
grande político, a anos-luz da corja que lhe sucedeu...”:
«Quebrar a resistência moral das
nações, desorganizar a sua economia,
exercer sobre a máquina do Estado
acção paralisante é função atribuída ao
comunismo em toda a parte onde o
governo lhe está vedado. A
diminuição até
à impotência da força das
nações que se lhe entregam é o maior serviço
reclamado pelo país estrangeiro que o inspira, o apoia, o subsidia. De modo
que sofrer um país a acção do
comunismo quando no seu seio irrompeu,
devido a causas que não
puderam ser dominadas, é uma fatalidade contra que
tem de lutar-se, fazendo apelo
a todas as forças de ordem, para neutralizar-se
os efeitos, à espera de
melhores dias. Que se dêem
possibilidades de
desenvolver e organizar forças
tão virulentas e corrosivas do organismo social,
tão contrárias ao espírito da
civilização de que somos filhos, onde com atenta
vigilância podem ser mantidas
em respeito, senão inteiramente neutralizadas,
parece-nos cegueira que a
paixão política pode explicar, mas os interesses da
Nação claramente condenam (11
de Fevereiro de 1949).
[...] Ora, sendo tão graves os perigos, quer de influência
externa quer de
subversão social, trazidos pelo comunismo,
que processos de defesa se
utilizam para o contrariar?
Se não me engano, na Europa, salvo Portugal, a Espanha e a Suíça
(embora
esta última por motivos diferentes dos primeiros), e como na Europa, em
quase
todo o mundo, o comunismo goza
da liberdade de propaganda e organização,
bastando-lhe - o que não custa
nada - declarar-se integrado no plano das
forças políticas nacionais.
Por muita parte está representado em assembleias,
em numerosos países faz parte
dos governos.
Este modo de proceder não pode deixar de significar ou que se
considera o
comunismo tão legítimo como outro qualquer programa partidário e
apto à
realização do interesse nacional ou que se espera torná-lo
inofensivo num
regime de absoluta liberdade política. Todos aliás temos
ouvido dizer que os
grandes remédios contra a
doença comunista são: na Europa,
a democracia e
o
socialismo; na América, a liberdade e o bem-estar geral.
Não me proponho hoje discutir
estas teses, sobre as quais tenho naturalmente
as maiores dúvidas; levar-me-ia
longe o exame e ser-me-ia embaraçosa a
referência a casos particulares
que parecem contrariá-las. Direi apenas que, a
meu ver, há-de ser muito difícil
aos diversos Estados manter, partindo de tais
princípios, uma linha rigidamente
lógica; alguns que por ela se encaminharam
regressam ao ponto de partida; os
que receiam usar da autoridade vêem-se
depois compelidos a empregar a
violência e felizes se consideram quando,
como é geralmente o caso, não são
subvertidos por ela; sobretudo não há
confiança na terapêutica, pois
que os povos vivem receosos e intranquilos. O
Mundo tem medo do comunismo e os
sovietes servem-se dele para os seus
fins (25 de Novembro de 1947).
O mundo tem medo do comunismo.
Qual a razão disso?
A principal parece ter sido à
volta da ideia e do facto de se tratar de
organização que, integrada no
jogo das forças nacionais, recebe do estrangeiro
a súmula doutrinal do seu
programa e a orientação efectiva. Mas a mim não me
parece razão bastante.
Através da história e ainda nos tempos de hoje, numerosos movimentos se
têm
verificado de inspiração estrangeira e muitos apoiados por esta ou
aquela
potência, têm infelizmente vingado contra a vontade e os verdadeiros
interesses da nação que os suporta. A história está cheia destes
pecados. De
modo que, em face do comunismo, o que sobretudo importa não é saber que
é
protegido ou apoiado de fora - mas a essência da sua doutrina e as
verdadeiras intenções da potência inspiradora.
Esta última referência repõe
no tabuleiro todo o problema anterior - ou seja a
Rússia na Europa e no Mundo, a
sua vida de relação com os mais Estados, o
valor prático para ela e a
aceitação voluntária por sua parte daquele conjunto
de princípios e de conceitos
(uns pura emanação da moral, outros adquiridos e
fixados pela experiência)
sobre que deve viver e prosperar a comunidade
internacional. Quer
dizer, independentemente da execução do programa
comunista, um problema continuaria de pé - o de
saber-se a constituição da
comunidade de nações por ela chefiada, que é o mesmo que dizer qual
o grau
de independência de cada país na gestão dos seus negócios internos e
externos. Uma coisa
me parece clara - a existência de pressões suficientes
para
se considerarem privilegiados ou preferentes os interesses da potência
que
a si própria teria reservado a posição de quase suserana. Já
Hitler ou
alguns dos seus sonharam essa construção: não julgo que a Europa no
seu
todo se pudesse submeter a semelhante fórmula.
Concebe-se que a Rússia, por amor de um interesse político seu, se
alheie,
fora de fronteiras, do comunismo, não como governo, mas como
ideologia. O
comunismo, porém, não se
desinteressará de si próprio. Salvo
o caso de
partido assim etiquetado para
usufruir algum prestígio exterior, mas de facto
apostado apenas em conquistar
posições de mando, o comunismo, como
doutrina integral que é, tenderá a
modelar os homens, as sociedades, as
instituições públicas e privadas
segundo as concepções que defende. De modo
que ou se contradiz e se anula no
puro jogo de forças políticas concorrentes ou
há-de por todos os meios fazer a sua
revolução.
Não cuide alguém que esta se limite a procurar corrigir desmandos,
abusos,
ilogismos, desacertos ou injustiças - tanto revela a actual organização social
contra que temos de lutar sem
descanso - nem a provocar a transferência do
poder de uma para outra classe ou legitimar a transferência de bens
de uns
para outros indivíduos; trata-se de criar um tipo diferente de humanidade,
outra
civilização (se é que esta forma de
me exprimir se pode considerar correcta).
Pouco
importa saber que o não logra, porque, frustrada a revolução, terá pelo
menos
conseguido a desordem (25 de Novembro de 1947).
[...] O comunismo é, pois, como
movimento revolucionário e expressão de uma
política internacional agressiva, o
grande inimigo do momento, e a primeira
contribuição que pode dar-se na ordem
externa é contê-lo decisivamente no
interior. É problema vital e urgente
definir os meios apropriados.
As potências que se apelidam
de democráticas parece descansarem em
demasia no jogo dos partidos
políticos e na movimentação eleitoral das
massas, quando arregimentadas
e rotuladas em maioria nos chamados
partidos burgueses, nos quais
se incluem mesmo os socialistas. Esta atitude,
filha do hábito da luta entre forças concorrentes e por vezes
complementares,
passa, porém à margem da verdadeira actuação comunista e não pode, por
isso, ter efeitos decisivos. O comunismo não é necessariamente um partido
nem precisa de dispor de maioria:
basta-lhe dispor de uma minoria, movida por
uma fé e servida por uma técnica de
proselitismo e de combate, técnica que é
a síntese de tudo quanto a
experiência e a psicologia descobriram para
dominar e conduzir massas humanas.
O que se diz do partido político que
não pressupõe formação, mas atitude de
simpatia ou passiva concordância com
um vago programa da ordem
estabelecida, há-de dizer-se das
ligas, das associações, dos congressos que
se organizam para combater o
comunismo: toda esta
acção se dirige aos que
dispõem
já de certa posição de espírito ou se aprontam a tomar certa atitude
de
oposição, mas não formam os espíritos nem evitam que o comunismo
deforme
as inteligências e as vontades da massa neutra que é a grande
maioria
de um País.
Uma tendência generalizada deposita esperanças,
também excessivas, na
repressão
directa das actividades comunistas, e eu estou longe de julgar essa
repressão
dispensável ou indiferente, antes me parece que se vão
aproximando
os tempos de mais ampla e severa actuação. Mas a força do
proselitismo comunista exige
imperiosamente uma acção intensiva de aliciação
das inteligências à volta de
um sistema de ideias que o repilam. Se a
inteligência do século é
trabalhada já no sentido da ansiedade e da insatisfação
para aceitar as soluções integrais
do comunismo, não se pode descansar na
repressão, como se esta
resolvesse todas as dificuldades (12 de Dezembro de
1950)».
Oliveira
Salazar (in J. P. D'Assac, «O Pensamento de Salazar extraído dos seus
discursos»).
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