Um texto – de HENRIQUE
NETO – perfeitamente justo e acessível a todos nós, que aparoladamente – ou
manhosamente - vamos aceitando as tretas em que assentamos, com a ajuda pecuniária
externa a reforçar-nos as convicções do sofisma imposto, na questão económica. E no restante...
Paul Krugman está mal informado
Não acredito que Paul Krugman esteja
bem informado sobre a realidade da economia portuguesa, ainda que possa ter
contribuído para a felicidade de muitos portugueses que acreditam em milagres.
HENRIQUE NETO Empresário
OBSERVADOR, 24 nov. 2023, 00:134
Dizer que um Prémio Nobel está mal informado é um exercício
arriscado, mas facilitado pelo próprio ter confessado não compreender aquilo a
que chamou “o milagre económico português”, provavelmente porque não existe
milagre algum. Aliás, não
é normal que em economia existam milagres, porque se trata de uma disciplina em
que se estudam principalmente as causas e os efeitos.
Aproveito assim a ocasião da visita do
famoso economista para recordar algumas das causas e dos efeitos que sei
existirem na economia portuguesa e que possam porventura ajudar a compreender
que os milagres são mais prováveis em Fátima do que em economia.
Dualidade económica
Em Portugal, com maior importância do
que noutros países, existem duas economias: (a) uma economia semelhante à dos outros países
europeus, constituída por empresas nacionais e estrangeiras de alguma dimensão,
nomeadamente industriais, de sectores como a metalomecânica, o automóvel, o
calçado, a confecção e alguns outros, que se dedicam essencialmente à
exportação; (b) existe
depois uma segunda economia, cerca de 95% das empresas portuguesas, que são
muito pequenas, a grande maioria comerciais, que pouco contribuem para as
exportações nacionais, se exeptuarmos o turismo, empresas em geral servidas por
recursos humanos com baixas qualificações e sem qualquer formação profissional.
Trata-se de mercados de rua, pequenas lojas de roupa e de todo o tipo de
produtos, cafés, pastelarias, restaurantes, cabeleireiros, reparações de
informática, de electrodomésticos e minimercados, além da agricultura de
pequena dimensão, pesca artesanal, limpezas, pequenos transportes e toda uma
enorme quantidade de trabalhadores individuais em regime de mera sobrevivência. Ou seja, trata-se de uma grande parte da
economia portuguesa de baixos salários e de baixa produtividade, de empresas
sem grande futuro e que morrem e renascem às dezenas de milhares todos os anos sem
fim à vista. Fenómeno que existe principalmente devido ao
fraco investimento na indústria, que é o sector da economia constituído por
operações repetitivas do trabalho, o que permite uma formação relativamente
rápida e barata, além de melhores salários. Ou
seja, temos um modelo económico que alimenta a elevada pobreza dos muitos
milhões de portugueses que ainda não deram pela existência de qualquer milagre.
Exportações
Os países europeus da dimensão de
Portugal, com pequenos mercados internos, exportam entre 60% do PIB e os
80-90% da maioria, com a Irlanda a atingir 105%, país que, com maior realidade, se poderia
afirmar existir um milagre económico. Infelizmente, Portugal exporta apenas 50% do PIB e,
porventura mais preocupante, essas exportações resultam de sectores criados há
já muitos anos, durante os períodos da EFTA e do PEDIP/AutoEuropa, resultantes
em ambas as fases do investimento estrangeiro, na indústria e com produções
dirigidas para a exportação. Acontece que durante os últimos 25 anos
não existiram grandes investimentos estrangeiros na indústria, sendo
substituídos pelo imobiliário, centros comerciais, escritórios de comunicação
de grandes empresas internacionais atraídas pelos baixos salários e que, tal
como aconteceu com o sector das cabelagens, podem sair do País a qualquer
momento com a subida dos salários. Em resumo, nenhuma economia europeia de
pequena dimensão pode sobreviver em boas condições com apenas 50% das
exportações.
Sistema político
Em Portugal existe um sistema
político de fachada democrática, em que os representantes do povo são
escolhidos pelas hierarquias partidárias, onde apenas metade dos eleitores
votam e menos ainda têm qualquer tipo de intervenção política. Acresce, que durante os últimos vinte anos,
por força dos baixos salários e dos elevados níveis de pobreza, o Estado criou inúmeros programas sociais
pagos através dos apoios da União Europeia, do crescimento dos impostos e do
crescimento da dívida, soluções dificilmente sustentáveis para todo o sempre.
Nos últimos tempos a dívida pública em percentagem do PIB diminui porque o
PIB nominal aumentou com a expressiva inflação que temos tido, mas em valor
absoluto ela continuou a crescer e tem de ser paga mais tarde ou mais cedo, um
problema sério se, como penso, tivermos também mais tarde ou mais cedo uma
séria crise económica, nacional ou europeia, ou ambas.
Por outro lado, o PIB teve um expressivo crescimento em 2022 devido
a três razões: o chamado efeito base pois
tinha-se contraído muito nos anos anteriores e por isso nessa comparação com os
anos anteriores regista-se um crescimento expressivo; o boom
turístico na sequência
da recuperação económica pós-covid e porque Portugal é, felizmente, um País
seguro; a extraordinária resiliência das exportações
portuguesas que cresceram em 2022, apesar da crise energética. Todavia, sendo o turismo o grande motor do
crescimento económico nesta fase recente da economia portuguesa, será que
Portugal se deve contentar com o turismo como a grande alavanca da economia, ou
deve, como acontece nas economias desenvolvidas, apreciar a performance
turística no quadro de uma economia forte e diversificada em que a agricultura
e a indústria também devem ser motores desse crescimento?
Acresce que a corrupção
não ajuda a economia, que o modelo económico descrito antes é insustentável,
que a educação dos portugueses é insuficiente e pouco exigente e a emigração
também não ajuda. Finalmente,
os governos continuam a apostar no mercado interno, nas pequenas e médias
empresas e, mais recentemente, nas novas tecnologias desenquadradas duma visão
de competitividade, enquanto só são apreciadas algumas, poucas, das grandes
empresas, quando todas são essenciais. Novas tecnologias que, infelizmente, são mal compreendidas, como é o
caso da energia, e que não são aplicadas na modernização de uma
administração pública enorme e altamente consumidora de recursos.
Em resumo, não acredito que Paul
Krugman esteja bem informado sobre a realidade da economia portuguesa, ainda
que possa ter contribuído para a felicidade de muitos portugueses que acreditam
em milagres.
ECONOMIA POLÍTICA
COMENTÁRIOS
Rui Pedro
Matos: Muito bem! José B. Dias: Compare-se o pensamento e o conhecimento da realidade
com aquilo que se foi vendo por parte de Marcelo ao longo dos já bastos anos de
exercício do cargo ... e limpem as mãos à parede todos os que elegeram o actual
putativo ocupante da Presidência da República.
Rui Lima: Milagre
económico conheço o da Coreia do Sul ou Twain , Portugal será mais um desastre
pois não pára de perder posições na Europa como perde os seus jovens mais bem
formados . JOHN MARTINS: Excelente artigo de H N, todavia se PK, considera
milagre foi muito poucochinho, se tivermos em conta, que desde que Costa tomou
o governo, via aritmética, recebeu a grande ajuda, milagreira, da Europa em
forma 20/20 mais 20/30, mais bazuca PRR. Mas mais ainda como muito bem HN
referiu, contraíram uma dívida de 41 mil milhões, contrariamente à ladainha do
ministro Medina que continua a enganar o povo ao dizer que a dívida
baixou. O que é falso.
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