sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

Perplexidade


Enquanto o Dr. Salles se informa na Internet sobre as origens e evolução do Bloco de Esquerda no tablado político nacional, procurei eu informar-me sobre o percurso de Catarina Martins, no mesmo tablado, pois não o entendi bem nas suas loas, apesar de eu própria reconhecer nela uma boa capacidade de expressão, sempre pingando para a mesma banda, de resto, que irresistivelmente me punham em ascese, tal a bondade – parcial que fosse – que traduzia, e sempre exigindo mais e mais em prol dos deserdados, sem a tónica do trabalho como gerador de capital, bla, bla, bla, mais fundado em justiça na distribuição dos ganhos, bla bla…… De facto não entendi bem a mensagem do Dr. Salles, procurando desviar o percurso de Catarina Martins, num sentido mais para o centro (?), ou mesmo para uma direita (?) em que poria travão no discurso demagógico de alguns (?), num sentido mais construtivo, afinal, para uma nação em vias de perdição a curto prazo.

O Dr. Salles lembrou-me Hércules, a desviar o leito de um rio para satisfazer o rei Áugias, lavando-lhe os estábulos, sujos de muitos anos, em apenas um dia, e cumprindo assim, um dos seus doze heróicos trabalhos. Eu nunca teria pensado numa tal solução, de desviar o curso de Catarina Martins para limpar - e se limpar - do seu jeito de piedade unilateral, em prol de um esforço múltiplo, num país que não é só de uns, é também de outros, e sobretudo dos vindouros, que estamos a desgraçar… Não, não entendi bem o apelo. De bla bla bla estamos todos cheios. E de virtude palavrosa também.

CARTA PARA UMA SENHORA

HENRIQUE SALLES DA FONSECA    A BEM DA NAÇÃO, 04.02.21

Voz bem colocada, discurso determinado e calmo, dicção clara, gesto sereno, estética amiga, tem Vossa Excelência uma bela postura em cena.

Cena em que o papel desempenhado corresponde à de líder de um conglomerado de frágil coesão interna a que, por disfarce, chamaram Bloco mas em que o mais efectivo elemento agregador é o real carisma de Vossa Excelência que não a homogeneidade genética estratégico-doutrinária da intelectualidade «bloqueada». E, neste domínio essencial, vou à «biografia autorizada» do Bloco, a Wikipédia, donde extraio as passagens que me parecem mais esclarecedoras:

«Origens: O Partido nasceu em 1999 da aproximação de três forças políticas: a União Democrática Popular (marxista), o Partido Socialista Revolucionário (trotskista) e a Política XXI (desde marxistas a sociais-democratas de esquerda), às quais posteriormente se juntaram vários outros movimentos. Qualquer uma dessas forças definia-se como resultado de processos de crítica em relação ao chamado «comunismo» ou «socialismo real», mantendo a referência socialista através da reflexão e da discussão sobre a actualidade do marxismo. Membro do Secretariado Unificado da IV Internacional, o PSR herdava a tradição trotskista, oposta ao estalinismo; a UDP, marxista, apresentava-se como desligada de quaisquer referências no campo comunista internacional, posicionando-se em ruptura com todas as experiências de "socialismo real"; a Política XXI resultara da união de ex-militantes do PCP, pelos herdeiros do MDP-CDE e por independentes. Na formação do Bloco, juntaram-se ainda pessoas sem filiação anterior, mas que já haviam mostrado identificar-se com os movimentos indicados, destacando-se, no grupo inicial, Fernando Rosas (a sua antiga filiação no PCTP-MRPP havia acabado há muito).

Desde o início, o Bloco apresentou-se como uma nova força política que não negava a sua origem nos três Partidos citados e que tinha uma organização interna democrática, mais baseada na representação dos aderentes do que no equilíbrio partidário. A adesão de novos militantes, sem ligação anterior a qualquer um dos Partidos originários, contribuiu para esse efeito.

O Bloco foi incluindo ainda outros grupos e tendências: desde pequenos grupos políticos, como a Ruptura/FER, até grupos que, não sendo organizações políticas, são activistas constituídos já dentro do Bloco: feministas, activistas LGBT, sindicalistas, ambientalistas, etc. O Bloco reivindica a independência destes grupos em relação à política geral do Partido.

Entretanto, os Partidos constituintes entraram num processo de auto-extinção. A Política XXI tornou-se uma associação de reflexão política que se exprime numa das revistas da área do Bloco, a «Manifesto». O PSR também se extinguiu transformando-se numa associação que se exprime numa revista, a «Combate». A UDP passou de Partido a associação política e edita uma revista, «A Comuna». Esta auto-extinção demarcou uma nova maneira de pensar na esquerda europeia e mundial, visto que evidencia a vontade da construção de um Partido plural e de acabar com o sectarismo característico deste tipo de pequenos Partidos de esquerda. O Bloco de Esquerda foi o primeiro Partido com destaque de Nova Esquerda em Portugal.»         * * *

É, pois, Vossa Excelência a protagonista do papel de «costureira» duma manta de retalhos, de «editora» de revistas potencialmente antagónicas, de «maestrina» de aderentes ideologicamente vinculados e potenciais caudilhos das respectivas ideologias. Ingrato, o papel que atribuíram a Vossa Excelência nesse lado norte da cena em que prepondera a inveja, o nivelamento por baixo até ao fracasso absoluto das instituições e à frustração das pessoas como a História nos demonstrou sem necessidade de saltar para fora do século XX.

E assim é que, papel por papel, também a Vossa Excelência será fácil – mais fácil, até – manter, como actriz experiente, a sua tradicional compostura, o seu gesto sóbrio, a clareza da sua dicção, a calma firmeza do seu discurso se mudar de local na cena migrando para o lado sul da dita cena onde urge substituir barrigudos e façanhudos de carisma escasso ou nulo na defesa da harmonia das classes, na virtude do lucro como «pai» do investimento, da modernização e do progresso, na substituição da função «serviçal» do Estado pela de regulador-fiscalizador, tudo num processo em que à tributação é conferida a função principal de redistribuição da riqueza e não como punição do sucesso. Será muito mais fácil desempenhar este novo papel que ora lhe sugiro sem as guerras ideológicas que actualmente lhe adivinho e, pelo contrário, em ambiente de serenidade típica de quem não inveja o sucesso alheio.

É que, na banda sul, o carisma que se perfila não me agrada mesmo nada.

Fevereiro de 2021         Henrique Salles da Fonseca

COMENTÁRIOS:

Anónimo 04.02.2021: : Caro Dr. Salles da Fonseca, Perdoe-me a discordância, mas essa de considerar que a distribuição da riqueza é a principal razão de ser dos impostos custa-me a aceitar. De facto, numa leitura precipitada de J. M. Keynes, era isso que se ensinava no ISCEF, hoje ISEG, e, certamente, noutras escolas de economia. Pensar-se-ia, talvez, que estava encontrada a simbiose perfeita entre o "capitalismo" (visto como cada um por si) e a máxima cristã do "de cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo as suas necessidades". Rapidamente se viu o que sempre esteve à vista de todos: era, apenas, um bom pretexto para extorquir sem remorsos e gastar sem preocupação. Que os impostos implicam sempre a redistribuição de rendimento, é evidente - mas não necessariamente no sentido de atenuar desigualdades. Que, também, levem à redistribuição de riqueza, já é mais duvidoso. Um exemplo, não com impostos fiscais, mas com impostos sociais: as pensões. Hoje, em Portugal, vemos tantos e tantos a financiarem com as suas contribuições pensões de reforma que, eles-próprios, nunca terão. O nosso modelo redistributivo nas pensões é, na realidade, um processo de perpetuação de desigualdades na distribuição do rendimento. Os impostos existem, antes do mais, para financiar as funções de soberania. Com o tempo, a justificação foi estendida ao financiamento das infraestruturas básicas não tarifáveis e, mais recentemente, ao financiamento do combate à pobreza. Ora, só quanto a este último ponto se pode falar de "redistribuição do rendimento", mas com as necessárias cautelas. O combate à pobreza implica a transferência de rendimentos, como facilmente se percebe. Contudo, pode-se transferir rendimentos sem se estar a combater eficazmente a pobreza. É aquilo a que temos assistido nestes últimos quase 100 anos.

Francisco G. de Amorim 04.02.2021: Como o lixo tem uma característica especial: gosta de se agregar. Daí os lixeiros.

Adriano Lima 04.02.2021: Depois do seu relativo sucesso eleitoral, é possível que o Bloco venha a perder progressivamente a consistência do cimento que por algum tempo agregou as suas diferentes tendências de inspiração marxista. Será preciso um factor externo suficientemente motivador para que não se dê o arrefecimento da energia que alimenta as ilusões e os deslumbramentos ideológicos dos seus militantes. Creio que a maior ameaça para o Bloco é o sucesso de uma governação de centro-esquerda que dispense o seu apoio. Ameaça estará também na clarividência cívica do eleitor que deixe de confiar o seu voto a forças partidárias que fazem da política mais um festival de trivialidades circenses que uma via para servir o país.

NOTAS DA INTERNET: UMA BIOGRAFIA: CATARINA MARTINS

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Catarina Soares Martins (Porto, 7 de setembro de 1973) é uma linguista e política de esquerda portuguesa, com o cargo de deputada naAssembleia da República e Coordenadora Nacional do Bloco de Esquerda.

Vida pessoal: Catarina Martins nasceu no Porto, a 7 de setembro de 1973. Fez a primeira classe em São Tomé, onde os pais eram cooperantes, e a segunda e terceira classes em Cabo Verde. Regressa a Portugal aos nove anos e vive em cidades como Aveiro, Vila Nova de Gaia e Lisboa. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, tem um mestrado em Linguística e frequência de doutoramento em Didáctica das Línguas. É casada e tem duas filhas. Percurso político: Catarina Martins participa desde a juventude em diversos movimentos cívicos e políticos. No liceu junta-se à luta contra a Prova Geral de Acesso e, mais tarde, em Coimbra onde estuda Direito, participa nos movimentos contra as propinas na universidade. O seu percurso leva-a ao envolvimento em movimentos culturais: é cofundadora, em 1994, da Companhia de Teatro de Visões Úteis e foi dirigente do CITAC e da Plateia (Associação de Profissionais das Artes Cénicas). É eleita deputada à Assembleia da República pela primeira vez em 2009, ainda como independente nas listas do Bloco, tendo sido reeleita pelo círculo do Porto em 2011 e 2015. Nos primeiros anos de mandato, integra as comissões de Educação, Ciência e Cultura, Economia e Obras Públicas, assim como na Subcomissão de Ética Adere ao Bloco de Esquerda. e integra a sua direcção desde 2010. Em 2012, juntamente com João Semedo, sucede a Francisco Louçã na liderança do partido. Em 2014, na sequência da IX Convenção, João Semedo abandona a liderança, passando a vigorar uma nova Comissão Permanente da qual Catarina é porta-voz. Em 2016, após a X Convenção, a Comissão Permanente é dissolvida e Catarina Martins assume as funções de Coordenadora do Bloco de Esquerda. É no mandato de Catarina Martins que o Bloco de Esquerda alcança o seu melhor resultado eleitoral de sempre, elegendo 19 deputados, superando o meio milhão de votos e obtendo 10,19% nas eleições legislativas. A 3 de dezembro de 2015, na sequência do sucesso eleitoral e do afastamento da direita do poder, a conceituada revista norte-americana Politico classifica Catarina Martins como uma das 28 personalidades em destaque na Europa, considerando-a “a cara da esquerda” e referindo que “o sucesso de Martins provocou arrepios a todo o establishment da Europa”. Um estudo da consultora de comunicação Imago Llorent & Cuenca, em parceria com a Universidade Católica Portuguesa, coloca Catarina Martins entre os dez políticos mais influentes na rede social Twitter. Em Março de 2017, o Jornal Económico

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