terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Um quadro triste


Quando chegará a mudança? Não é a vitamina a droga, já que é aplicada aos outros todos com êxito. Olhemos antes para nós, e o nosso jeito… E, sim, a destruição das empresas forjadoras de capital…

OPINIÃO:  Portugal tornou-se um país viciado em fundos europeus

O Plano de Recuperação e Resiliência é António Costa a patrocinar-se a si próprio, injectando nas veias da pátria a dose de fundos com que planeia anestesiar o país durante mais uns anos. Talvez resulte.

JOÃO MIGUEL TAVARES              PÚBLICO, 23 de Fevereiro de 2021

E se a vitamina for uma droga? E se a bazuca for um tiro no pé? E se os milhares de milhões de euros que vão voltar a cair sobre o país apenas servirem para perpetuar um modelo de desenvolvimento inviável, eternamente centralizado no Terreiro do Paço, perpetuamente dirigido pelo governo de plantão? E se o único plano estratégico para Portugal for semelhante ao de um toxicodependente – garantir a próxima dose, ano após ano, quadro plurianual após quadro plurianual?

Em 1986 estávamos de mão estendida, e percebia-se: éramos um país pobre, vindo de décadas de ditadura e de uma revolução que deu cabo de parte do nosso tecido produtivo. Precisávamos da ajuda dos países da Europa rica para nos tornarmos um deles. Queríamos chegar ao “pelotão da frente”, e durante algum tempo pareceu possível. A partir do início deste século, estagnámos. A estabilidade da moeda única deixou de nos permitir brincar à inflação. Ficámos sem objectivos enquanto país, para além da pedinchice anual em Bruxelas, cada vez mais sonora e decisiva – “não se arranja mais uma moedinha, senhora comissária?” –, porque a Europa não quer mais aterragens da troika na Portela, e controla com mão apertada as finanças públicas, para impedir desvarios.

Desde que entrou para a então Comunidade Económica Europeia em 1986, Portugal recebeu 140 mil milhões de euros de fundos europeus, qualquer coisa como 2,5% do seu PIB a cada ano. Nunca chegámos ao pelotão da frente. Pelo contrário, continuamos na cauda da Europa, ultrapassados por países que entraram na UE depois de nós e que eram mais pobres do que nós. Isto, que deveria merecer a mais profunda reflexão nacional, continua a ser recebido com um encolher de ombros. É a vida. E mantemos a receita, ano após ano, gordos de alegria de cada vez que um pacote financeiro aterra no Terreiro do Paço, desta vez com 13,9 mil milhões de euros a fundo perdido para distribuir em apenas cinco anos, o sonho de qualquer governo e das suas clientelas: ter muito dinheiro para gastar e muito depressa. A fava voltou a calhar ao PSD – e o brinde ao PS.

O Plano de Recuperação e Resiliência não disfarça ao que vem: “recuperação significa ter dinheiro para retomar boa parte do investimento público que o governo se viu privado de fazer desde 2015, por causa das cativações; “resiliência” significa ter dinheiro para que os amigos do partido e as empresas do regime continuem a gravitar em seu redor. Isto não é má vontade minha – é a consequência óbvia de mais um plano centralista onde o único papel reservado à iniciativa privada é a participação em concursos de obras públicas, de investimentos públicos e de ideias do governo, acerca das quais a sociedade civil tem sete longos dias para dizer que são magníficas.

É dinheiro para hospitais, para estradas, para infraestruturas, para habitação acessível, para fogos, para recursos hídricos, para o novo Banco de Fomento, para o hidrogénio, para o lítio, para a descarbonização, para a eficiência energética, para os transportes públicos, para a expansão do metro, para os computadores das escolas, ou seja, para financiar tudo aquilo que o governo há muito tinha prometido aos portugueses, e que não executou por falta de dinheiro. O governo, sempre o governo, eternamente o governo. Este grandioso plano é António Costa a patrocinar-se a si próprio, injectando nas veias da pátria a dose de fundos com que planeia anestesiar o país durante mais uns anos. Talvez resulte.

Jornalista

TÓPICOS: POLÍTICA  PLANO DE RECUPERAÇÃO E RESILIÊNCIA  UNIÃO EUROPEIA  OPINIÃO  GOVERNO  ANTÓNIO COSTA  EMPRESAS

COMENTÁRIOS:

DemocrataXXI EXPERIENTE: É como o JMT, viciado em piadolas ultra-liberais          Soeiro INICIANTE: Comentário soberbo. Experiente é outra loiça.          Mario Coimbra INFLUENTE: O problema não está no dinheiro recebido, está em quem o gasta e mal. Concordo consigo que falta um desígnio nacional e mais importante, falta consistência. Vai demorar gerações acabarmos com a dívida e mudarmos. Para isso precisamos de consistência e que os governos não borrem a pintura. E esta parte é difícil. Para o dia-a-dia estamos mal para o médio-longo prazo estamos a na idade das trevas. Ninguém tem uma ideia um plano. Enfim.           Fernando Ferreira EXPERIENTE: Tudo começou com Don Cavacon. O subsídios entraram à pazada. Muitos directamente para os bolsos de amigos e de parceiros de negócio. Da parte que foi utlizada, apenas foram utilizados 70% pois 30% foram para "propinas". Tem sido um fartar vilanagem. Até o Tecnoformatado do Traste de Massa Má bicou. E nunca ninguém foi preso. De tudo isto vem o vício. Vacina eficaz para combater esta epidemia é que ninguém está interessado em criar, é muita gente a mamar. E tudo compadres e comadres.           Sergio Domingues INICIANTE: "O governo, sempre o governo, eternamente o governo." Mas o JMT pensa que o mercado e a iniciativa privada vai investir nas infraestruturas referidas de forma altruísta? Qualquer governo, de qualquer espectro político, tem opções de investimento público. Seria mais útil que o autor se dedicasse à discussão pública das opções do plano e as suas alternativas do que este queixume ridículo sobre o papel do Estado.        OldVic1 MODERADOR: Em 1986 estávamos de mão estendida, e percebia-se: éramos um país pobre, vindo de décadas de ditadura e de uma revolução que deu cabo de parte do nosso tecido produtivo" : 2 erros trágicos, dos quais o primeiro é empolado pelos donos do regime, enquanto o segundo é esquecido pelos mesmos, na tentativa de ocultar o papel que tiveram nele.            Por bom caminho e segue EXPERIENTE: A história de Portugal é, desde os primórdios, uma história de apertos, de bancarrota, de empréstimos urgentes, de quebra da moeda, quando havia moeda. Um tipo lê e relê historiadores como Oliveira Marques, que vai a números, e fica espantado e triste. O país fez-se com a Reconquista, Ceuta, África subsaariana, a Índia e Ceilão, a China, a América, de novo a África, agora a Europa - e a sensação com que se fica é que, drenando constantemente recursos humanos, não criamos as condições para nos bastarmos, e o que não se basta não é verdadeiramente independente. Gostamos de viver bem, viver de imitação e endividamo-nos para parecermos melhores do que somos. Vendemos até a alma, o pouco que nos identifica. Bem-vindos os estrangeiros que apostam em nós, se tornam parte de nós, nos ajudam a compensar a tendência para a autodestruição.            Jonas Almeida INFLUENTE: Vá lá reconhece o facto que a entrada do euro estagnou a economia, envenenou o tecido socioeconómico e endividou o país. Pensamos?! Divertidíssimo como agora o parasitismo europeísta se ataca aqui a ele próprio, como se Gaspar não fosse irmão gémeo de Centeno, com o mesmo vício, e Sócrates de Passos - os gémeos cábulas. Uma cambada, ladrões e caloteiros comportam-se como aquilo que são. JMT fussa aqui na gamela de que se alimenta. Um gozo completo! Assine o #50 e isso passa-lhe.            OldVic1 MODERADOR: Sempre a criticar quem dá a esmola e não o mendigo que a desbarata, Jonas.                Roberto34 MODERADOR: Assinar o artigo 50 seria um suicídio económico. Não queremos obrigado. O Euro foi a bênção em muitos aspectos, como diz o autor do artigo: deixamos de poder brincar a inflação, os custos de financiamento baixaram e a desvalorização da moeda deixou de servir para mascarar os problemas da má governação. O euro não é o problema de certeza.        Roberto34 MODERADOR: O comentário do OldVic acerta na mouche. Sempre a criticar quem sempre nos ajudou e quem nos proporcionou as bases para uma economia próspera e desenvolvida: a UE. Mas claro que o projecto de futuro do Jonas para um país onde não vive há 20 anos era a criação de uma espécie de Coreia do Norte Ocidental, sem investimento nacional ou estrangeiro, isolado de quem nos compra 80% das exportações, etc.      Paulo Marques.504209 EXPERIENTE: E se, sei lá, os fundos europeus tivessem que ser exactamente para o modelo de desenvolvimento decidido em Bruxelas, como qualquer outro país europeu naturalmente deficitário dependente de moeda estrangeira? E se, epá, vamos ser loucos, as situações que nunca podiam acontecer com a disciplina orçamental a criar o desemprego estrutural necessário, segundo os criadores da mesma, insistam em acontecer? E se, loucura agora, os fundos, graças ao que sai por obrigações institucionais, só der mesmo para investir no milagre do momento, de acordo com os decisores acima mencionados, para poder ser devolvido no curto prazo? Ou se a austeridade permanente, a das 63 reformas na saúde e das cativações anuais para as contas certas que Gaspar não tinha, só sirva para formar quadros alemães? Naa! Ficção!          Tiago O INICIANTE: JMT acertou na mouche. A ironia da situação é que agora temos um governo apoiado por uma esquerda radical anti-UE mas que necessita, como de pão para a boca, dos subsídios dessa mesma UE para as suas "políticas sociais" e para engrossar o "Partido do Estado". Os mass media subvencionados vão camuflando a enorme estagnação que caracteriza estes anos de geringonça. A oposição de direita é fraca. Não afixa cartazes com, a interrogarem os cidadãos: "Sabia que em 2019 a dívida pública era superior a 2015?" ou "Sabia que Portugal é o país da OCDE com menos investimento público?" ou "Sabia que o governo de Costa gastou menos com o SNS do que o de Passos Coelho?", etc. Nada fazem. Ficam parados a assistir à perpetuação desta gigantesca fraude que é a narrativa do "virar de página da austeridade"!           JLourenço INICIANTE: Tem razão em alguns pontos, mas é falsa a afirmação de "que o governo de Costa gastou menos com o SNS do que o de Passos Coelho", como aliás foi ontem explicado no Polígrafo.           MODERADOR: Era interessante saber-se onde foi gasto esse dinheiro: se no serviço aos utentes ou na máquina do SNS em salários, por exemplo. A queda abrupta no atendimento não COVID é preocupante nesse sentido.               AAA_ INICIANTE: Talvez resulte? Sim, vai resultar em sermos ultrapassados por mais uns quantos países que ainda estão atrás de nós. Ou seja, depois destas injecções na veia, voltará a estagnação. É isto que os portugueses querem, é isto que terão. Pobres de nós!

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