quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Talvez a safa esteja nas Lajes


É, pelo menos, para o que aponta o segundo texto, de JOSÉ MANUEL NETO SIMÕES, nitidamente intranquilo em relação ao que diz o primeiro, de IVAN KRASTEV  e  MARK LEONARD que extrema as posições da U E, relativamente ao aliado de sempre, E U, preferindo abandonar ingratamente estes à sua sorte, na sua luta económica – e quem sabe se bélica – com a China, que caminha a passos largos para a supremacia económica – e quem sabe se política - do mundo. Porém, com a presidência portuguesa no Parlamento Europeu, pode ser que os States venham à fala com Costa e retomem a ocupação do aeroporto das Lajes para futuras arremetidas suas nos caminhos da sua liderança. Se fosse para salvar o mundo do domínio amarelo, acho que até nos ficava bem oferecer aos Estados Unidos o aeroporto das Lajes, como ponto de passagem, como outrora nos foi dado Macau, em jeito de gratidão, embora efémero…

 

OPINIÃO

Europa e EUA: uma parceria em ruptura e a precisar de reparação

O impacto de Trump nas relações transatlânticas significa que, em qualquer potencial conflito dos EUA com a China ou a Rússia, a neutralidade é agora a opção mais popular entre os europeus.

IVAN KRASTEV  e  MARK LEONARD

PÚBLICO, 19 de Janeiro de 2021

Donald Trump não é nenhuma Evita Perón. Poucas pessoas na Europa ficarão tristes com a sua partida. Ao mesmo tempo que festejam a transição para uma força moderada, em Joe Biden, a maioria dos europeus duvida que os Estados Unidos possam regressar à liderança global em questões internacionais, como as alterações climáticas ou a ameaça da China.

Este é o ponto-chave da nossa sondagem, publicada esta semana, feita a mais de 15 mil europeus em 11 Estados-membros da UE. Além de revelar um grande cepticismo relativamente à trajectória futura dos EUA, chega à conclusão que, embora muitas pessoas na Europa estejam solidárias com o novo líder da Casa Branca, uma maioria pensa agora que o sistema político dos EUA está em ruptura.

Os EUA, aos olhos de muitos europeus, serão distraídos por divisões internas e lutarão para reconquistar a liderança global. Seis em cada dez inquiridos na sondagem do ECFR pensam que a China irá ultrapassar os EUA e tornar-se a principal superpotência mundial nos próximos dez anos. E há uma maioria a pensar que, afinal de contas, os EUA não estarão sempre prontos a proteger a Europa. A aposta de Trump de que era do interesse de Washington agir como o grande perturbador, e de organizar o mundo em torno de relações bilaterais assimétricas com outras potências, parece ter falhado. No entanto, a esperança de que Biden se torne um pivot dos EUA, de volta à política de Obama de incorporar o poder norte-americano numa rede de alianças, também parece irrealista.

Quase um terço dos europeus acredita que, depois de terem votado no Trump em 2016, não se pode confiar nos norte-americanos. Surpreendentemente, mais de metade dos alemães (53%) têm esta opinião sobre o parceiro transatlântico da Europa. Embora possam ser atípicos neste ponto, é evidente que a reputação internacional prejudicada dos EUA pode levar mais tempo do que um único ciclo eleitoral a sarar.

O impacto de Trump nas relações transatlânticas significa que, em qualquer potencial conflito dos EUA com a China ou a Rússia, a neutralidade é agora a opção mais popular entre os europeus. A nova administração dos EUA pode ter presumido que a mudança dos europeus para a neutralidade se deu, unicamente, com a sua reacção visceral a Trump. Ao que parece agora, pode não ser o caso.

Como alternativa à dependência que têm dos EUA, os europeus estão a convergir em torno da ideia de uma Europa mais soberana e autónoma. Mais de dois terços dos europeus em geral acreditam que este continente deve cuidar da sua própria segurança, com especial entusiasmo entre os cidadãos franceses (70%), suecos (71%) e espanhóis (71%) – e até mesmo britânicos (74%).

Isto levanta a questão de saber se Berlim irá substituir Washington como a capital “prevalente”, para a liderança da política externa. Certamente, parece que muitos europeus têm esta opinião – com a maioria dos inquiridos em França, Espanha, Dinamarca, Países Baixos, Portugal e Hungria a escolherem a Alemanha, acima dos EUA, como o “país mais importante com o qual se deve construir uma boa relação”. O Reino Unido (55%) e a Polónia (45%), que tradicionalmente vêem os EUA como poderosos protectores da sua liberdade, foram os únicos países que classificaram os EUA à frente da Alemanha de um modo significativo.

Dito isto, parece fácil uma leitura excessiva destes dados. Embora alguns líderes europeus, como Emmanuel Macron, tendam a interpretar o apoio popular à soberania europeia como um desejo de desempenhar um papel mais importante na política global, representam, para uma maioria substancial dos cidadãos, um desejo de neutralidade na escalada da concorrência entre os EUA e a China. Para estes cidadãos, a soberania não é uma grande entrada, por parte da UE, na política internacional, mas, pelo contrário, uma porta de saída de emergência do mundo bipolar de amanhã. É uma candidatura à reforma antecipada da competição das Grandes Potências.

A principal conclusão destes dados, no momento em Biden toma posse como o 46.º Presidente dos Estados Unidos, é que os europeus não tomarão automaticamente o partido de Washington numa nova Guerra Fria. Não é que discordem necessariamente da agenda dos EUA – o problema é que têm dúvidas sobre a sua capacidade de vencer. E o seu apoio terá de ser conquistado com provas sobre benefícios mútuos, em vez de ser encarado como um dado adquirido.

Após quatro anos de Trump, a parceria existente entre a UE e os EUA está em ruptura e a precisar de reparação. Em anos complicados, como testemunha o desempenho da bolsa de valores norte-americana, são os sentimentos e não as realidades económicas e políticas que governam o mundo. Deste modo, a nova administração Biden tem todos os motivos para temer não só as divisões tóxicas internas, mas também o estado de espírito dos europeus, à medida que os Estados Unidos voltam a entrar no mundo.

Ivan Krastev é presidente do Centro de Estratégias Liberais em Sófia e investigador permanente do Instituto de Ciências Humanas IWM em Viena.

Mark Leonard é director do grupo de reflexão pan-europeu do Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR) Presidente do Centro de Estratégias Liberais em Sófia e investigador permanente do Instituto de Ciências Humanas IWM em Viena Co-fundador e director do Conselho Europeu das Relações Exteriores (ECFR)

TÓPICOS

EUROPA  UNIÃO EUROPEIA  ESTADOS UNIDOS  JOE BIDEN  DONALD TRUMP  CHINA  EUA

COMENTÁRIOS:
Joao
MODERADOR:
Afinal a minha opinião não é assim tão diversa da maioria dos “europeus”. Por cá, este continente deveria tratar da sua vida e evitar regressar, mesmo com outra roupagem, aos colonialismos exploradores, cleptomaníacos, genocidas, incendiários. Deveríamos por cá evitar voltar a ser os piratas e corsários que andam pelo mundo a roubar tudo, a submeter de novo os povos à escravatura ou à submissão, a confiscar e apresar tudo o que encontram. Deveríamos portanto afastar-nos da mafia e dos piratas que têm a sua sede na ilha de Tortuga, hoje Bruxelas, Nato e EU. Óbvio que é impossível tal estamos manietados e drogados com Bruxelas, parceria Nato e EU, sem soberania, sem política externa, sem poder legislativo ou judicial nacional, nem independência monetária.           Roberto34 MODERADOR: Felizmente a sua opinião em relação a UE não é maioritária. Portugal tem poder legislativo, jurídicas nacional, tem política externa e total soberania para tomar as suas decisões. E já agora, nada do que você escreveu nesse comentário é correcto e corresponde a realidade. E sim a opinião da maioria dos Europeus é muito diversa e diferente da sua: eles não querem, ao contrário de si, acabar com a UE.           Roberto34 MODERADOR: Como esta sondagem mostra existe claramente uma vontade maioritária dos Europeus em manter a UE unida, soberana e autónoma. Só isto deve frustrar e muito os arautos da desgraça e que querem ver a UE destruída. E existem alguns aqui neste fórum. Jonas Almeida INFLUENTE: "qualquer potencial conflito dos EUA com a China ou a Rússia, a neutralidade é agora a opção mais popular entre os europeus" - é importante isto ter sido assumido aqui sem equívocos de forma a que haja equilíbrio e a atitude seja a mesma dos EUA em relação a conflitos da UE com a Rússia ou a China. A NATO parece assim estar pronta para o diagnóstico de acefalia terminal que lhe vaticinou Macron. Há muita coisa sobre este tema que tem escapado à imprensa portuguesa, com a excepção de artigos raros como o de Ricardo Cabral ontem. O empurrão do UK para a situação de pré-rotura territorial no mar da Irlanda foi apoiada por Biden com a expectativa de coordenação nas negociações com a China. Nisso saiu completamente gorado com o passo irreversível que a Alemanha e a França impuseram à UE recentemente. Ver por exemplo no Politico "Germany’s drive for EU-China deal draws criticism from other EU countries". Como também conclui este artigo no Público, as sortes foram lançadas de formas diferentes para diferentes países no continente europeu. Conflito interno, com adversários a leste, a norte e a oeste, é uma situação com ecos históricos difíceis de ignorar. alea jacta est. Roberto34 MODERADOR: Você claramente não faz ideia do que está a falar. Primeiro a UE começa a tomar as suas próprias decisões sem pedir justificação a ninguém (e faz bem). Segundo, a Alemanha e a França não puxaram coisa nenhuma: o acordo começou a ser negociado em 2013 e era uma das prioridades da Presidência do Conselho da UE da Alemanha. O acordo não está nem assinado nem aprovado. Se os outros países estão insatisfeitos, podem vetar o acordo. Simples. E deve haver algo neste artigo que o incomoda muito não? "Como alternativa à dependência que têm dos EUA, os europeus estão a convergir em torno da ideia de uma Europa mais soberana e autónoma." Deve ser muito frustrante para si que os Europeus não queiram acabar com a UE. Não existe nenhum conflito interno na Europa, por muito que você gostasse que houvesse          Joao MODERADOR: Muito bem!

 

OPINIÃO: EUA na relação com a União Europeia e Portugal

Espera-se que a União Europeia, agora em tempo de presidência portuguesa, saiba aproveitar a mudança em Washington para reafirmar também um novo atlantismo e que Portugal, com os outros países europeus, não se permita perder este activo fundamental.

JOSÉ MANUEL NETO SIMÕES

PÚBLICO, 10 de Fevereiro de 2021

Joe Biden é o novo Presidente dos EUA num momento complexo da história americana e mundial. Unir os americanos e revitalizar a democracia americana. São estas as ideias essenciais desde a sua tomada de posse. Ao fim de quatro anos, os EUA erguem-se de novo para o nível que sempre tiveram.

Isto não significa que o mundo vá ficar melhor. Mas é inegável que a partida de Trump tornou o ambiente político mais desanuviado. Joe Biden quer reparar os estragos, sem esquecer que o mundo mudou desde que foi vice-presidente.

O novo Presidente quer restaurar a credibilidade do país à frente de uma aliança de democracias ocidentais. A “liderança americana não é infalível”, como Biden referiu. Mas, se Washington não assumir esse papel, o vazio será preenchido por actores menos recomendáveis.

A capacidade de diálogo para encontrar soluções com inclusão numa plataforma moderada e a gestão da pandemia são os grandes desafios de Biden, que condiciona todos os outros, nomeadamente a recuperação económica.

A política americana continua a ter um grande peso nas relações estratégicas e económicas internacionais. Assim, com a entrada em funções da administração Biden, a cena internacional começou um novo capítulo. O diálogo deverá substituir a política da confrontação de Trump.

A visão de Joe Biden é muito mais tradicional do que a de Trump quanto ao papel e aos interesses dos EUA, assente em instituições internacionais estabelecidas após a Segunda Guerra Mundial e baseada em valores democráticos ocidentais compartilhados.

Espera-se que a União Europeia (UE), agora em tempo de presidência portuguesa, saiba aproveitar a mudança em Washington para reafirmar também um novo atlantismo e que Portugal, com os outros países europeus, não se permita perder este activo fundamental.

No entanto, é bom que comecemos a demarcar expectativas. O desanuviamento diplomático proposto é bem acolhido na Europa, mas ninguém está disponível para agir como se os últimos quatro anos não tivessem existido, desde logo começando pela Alemanha.

Na realidade, a desconfiança com os EUA aumentou, será inevitável a predominância da China, o sistema político americano partiu-se e cresceu a vontade por parte da UE em autonomizar estratégias.

É verdade que a administração Biden carrega um histórico transatlântico autêntico e parece estar interessada em trabalhar com os europeus, em frentes consideradas comuns, nomeadamente com a China. Porém, a dificuldade em unificar uma política euro-americana para a China foi um facto – gerador de algum desconforto da administração americana – que antecedeu a tomada de posse de Biden.

Berlim e outras capitais europeias, incluindo Lisboa, consideram que o relacionamento com a China deve ter um cunho europeu mais pronunciado e distinguir-se do modelo americano.

China e os EUA têm competido pelo lugar de maior economia do mundo, com o gigante asiático a caminho de ultrapassar os norte-americanos em 2028.

Importa, pois, acomodar a ascensão chinesa da forma menos confrontacional possível – parceiro de negociação em vez de parceiro estratégico ou competidor económico –, partindo do princípio de que a influência regulatória e normativa da UE é uma força geopolítica capaz de, no tempo, moldar o comportamento externo da China.

Ou seja, para que a influência sobre a China seja maximizada vai ser preciso fazer um caminho de aproximação entre os dois modelos: o europeu tornar-se menos cínico e mais pragmático, o americano pautar-se por menos agressividade e cerco estratégico.

Por outro lado, talvez seja preferível não cristalizar nas posições de partida e colocar o foco nos eixos onde o entendimento prático é exequível, sem projectar a realização de grandes cimeiras internacionais.

Em vez disso, interessa ter como objectivos a massificação da vacina com cooperação industrial, metas mais ambiciosas para a cimeira do clima em Novembro, passos concretos na reforma da Organização Mundial do Comércio e da Organização Mundial da Saúde, trabalhar um Acordo de Parceria Transatlântica mais minimalista e que coloque a regulação digital no centro da discussão.

Contudo, a nova agenda transatlântica é imprescindível à coesão europeia e à superação de vários desafios da globalização. É também um contributo para ajudar os EUA, que, como país ferido, precisa mais do que nunca que as alianças funcionem.

A administração Biden vai trazer maior clareza e menos tensão às relações transatlânticas e à NATO, que continua a ser essencial para a segurança e defesa de Portugal.

Nesse sentido, Portugal deve explorar os laços de proximidade com os EUA e o valor estratégico do seu território, no espaço do Atlântico Norte, onde a NATO desempenha um papel fulcral. O desinvestimento dos EUA na Base das Lajes decorreu de equívocos em governos anteriores dos dois países.

Além disso, nas relações entre Portugal e os EUA, não pode ser esquecido a existência de mais de um milhão de portugueses e luso-americanos que vivem nos EUA. Acresce que este país é o nosso maior mercado de exportação a seguir à Europa.

A administração norte-americana também se pode interessar mais por África, o que arrasta consigo os países africanos de língua portuguesa (PALOP), sendo estratégico para Portugal.

África pode, de facto, ser outra vantagem nesta equação: uma melhor relação com o líder americano poderá melhorar o diálogo sobre a utilização da Base das Lajes, pois há uma antiga ambição de Portugal ver a Terceira como parte do Comando dos EUA para África (AFRICOM). E, de acordo com últimos desenvolvimentos, a base passará a integrar a rota sul no Atlântico entre os EUA e África.

Com Biden, as relações dos EUA com Portugal devem ser menos tensas, depois de o embaixador norte-americano ter feito um ultimato ao Governo para escolher entre os aliados e a China. Mas, no que respeita à “nova Guerra Fria” com a China, não se espera que os EUA mudem muito o perfil da sua política externa.

O facto de não sermos neutros, não quer dizer que não sejamos autónomos. Aliás, temos um entendimento da nossa relação com a China que não pode ser reduzido a uma única dimensão, como foi característico da Administração Trump.

As escolhas que Portugal fizer nestas várias frentes ditarão não só o seu lugar na indispensável relação com Washington, reaberta pelo “Brexit”, pelo seu espaço político na UE, e a sua relevância geopolítica numa década marcada pelas tensões sino-americanas e pelo potencial africano.

É preciso construir um novo pacto fundador para uma Europa mais unida, para uns EUA mais fortes e para um mundo melhor. Precisamos de discutir tudo isto com a responsabilidade que o momento exige.

Capitão-de-Fragata (reforma)

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