Bielorrussa em fuga, por se atrever a
denunciar um homem sem ela – (digo, coragem) - um homem do seu país, que, de
resto, governa, a corresponder às ânsias do nosso Jerónimo, mau grado
as limitações deste, viradas sobre o “bem que gostaria” de estar por cá, na
pele desse tal Lukashenko de lá. De facto, por cá, nem mulher nem homem, somos um
povo assim-assim, “que cerra fileiras”
– (eu diria antes, “serra”, nessa questão das fileiras, em dispersão
indiferente e acomodada) – exceptuado Jerónimo e as suas aspirações malandras,
mais dedicadas aos arreganhos putinescos dominadores, como anti-herói ao nosso
nível, de aspirantes constantes a ambições mais reconfortantes.
Lukashenko e Putin mantêm uma
"falsa amizade", diz Svetlana Tikhanovskaia
A opositora do regime bielorrusso
afirma que os dois líderes políticos "sempre se aproveitaram um do outro
para garantirem benefícios". Svetlana Tikhanovskaia encontra-se em
Portugal.
AGÊNCIA LUSA:
TEXTO observador+lusa@observador.pt
OBSERVADOR, 17 jun 2022, 18:03
▲A
ex-candidata às eleições presidenciais está exilada na Lituânia
JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA
A relação entre os Presidente da
Bielorrússia e da Rússia é de “falsa amizade” e ambos se aproveitam mutuamente
para extrair benefícios, disse esta sexta-feira em entrevista à Lusa a líder da
oposição bielorrussa Svetlana Tikhanovskaia.
“[O
Presidente da Bielorrússia Alexander Lukashenko e o Presidente da Rússia,
Vladimir Putin] são duas pessoas que sempre tiveram falsas amizades,
circunstanciais, sempre se aproveitaram um do outro para garantirem benefícios.
E agora Lukashenko precisa de Putin como
um apoio político, e Putin encara Lukashenko como um seu representante, para
indicar não ser o único que está a combater na Ucrânia, mas antes através de
uma coligação de países”, assinalou.
“Podemos
vez como se alterou a retórica de Lukashenko desde o início da guerra. No
início eram declarações de bravura, dizendo que ele e Putin tomariam Kiev em
três dias, e tendo a ‘guerra relâmpago’ falhado tenta agora alterar a sua
posição, dizer que não participa nesta guerra, e pretende assumir o papel de
bombeiro”, prosseguiu
a activista, 39 anos, que na quinta-feira iniciou uma visita de dois dias a
Lisboa a convite
do ministro dos Negócios Estrangeiros português, João Gomes Cravinho.
A ex-candidata às eleições presidenciais
de agosto de 2020, desde então exilada na vizinha Lituânia, denota assim uma
nova abordagem da diplomacia de Minsk, mas que considera infrutífera.
[Lukashenko] joga com os países ocidentais, o seu ministro dos
Negócios Estrangeiros enviou cartas onde refere a necessidade de iniciar o
diálogo, mas devido a estes muitos meses de guerra [na Ucrânia], conseguimos
explicar aos países que o regime bielorrusso tem características criminosas e
existem diversas pessoas que representam uma nova Bielorrússia democrática em
diversas organizações e pretendem mudar o regime. Assim, ninguém está a contactar com o ditador”, frisou.
A
opositora, distinguida em 2020 com o Prémio Sakharov para a Liberdade de
Pensamento, atribuído pelo Parlamento Europeu, e que
esta sexta-feira tem encontros com o presidente da Assembleia da República,
Augusto Santos Silva, com o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes
Cravinho, e com o presidente da câmara de Lisboa, Carlos Moedas, também
denunciou um processo de “russificação” ou “sovietização” do seu país, uma
ex-república soviética, destinado a impor uma uniformização cultural.
“Lukashenko
é a pessoa mais pró-soviética da Bielorrússia. Durante 27 anos promoveu as
escolas em língua russa. Proibiu a língua bielorrussa. Agora, ler um livro em
bielorrusso pode implicar prisão”, denunciou.
“Para
nós, como nação, é muito importante recuperar a nossa identidade. Em própria
sempre falei a língua russa, e agora tento cada vez mais falar em bielorrusso
porque lembro-me quando era nova, e usávamos palavras em bielorrusso, as
pessoas consideraram que era uma proveniente do campo, uma língua campesina.
Mas não podemos esquecer as nossas raízes, e os jovens falam cada vez mais em
bielorrusso”.
E neste processo, mantém a esperança
de uma mudança de mentalidades, e de regime, não deixando de fazer uma analogia
com o “caso” português.
“Há
muitos anos atrás, caso se perguntasse ao povo português se acreditavam que se
veriam livres da ditadura, e respondessem ‘sim, acreditamos’, ninguém poderia
responder quando, ‘mais tarde ou mais cedo’, mas estavam a lutar”, argumentou.
“É por
isso que estamos agora a lutar.
A nossa tarefa é prosseguir, não desistir, contrariar a intenção do regime de
que estamos exaustos, e por isso é muito importante criar diversos pontos de
pressão sobre o regime e apoiar a sociedade civil”.
Um combate que requer “energia”, como
reforçou. “Precisamos de força para prosseguir este combate. E muitos países
que na história viveram em ditadura, agora compreendem-nos. Querem ajudar e têm
confiança na nossa opção democrática”.
No
entanto, Svetlana Tikhanovskaia, uma antiga professora liceal e inglês, que se
viu “forçada” a entrar na alta roda da política, também mantém alguma apreensão
sobre a forma que os “países amigos” têm abordado a situação, em particular nos
meses mais recentes.
“Sentimos
a solidariedade nestes dois últimos anos, mas são as nossas
pessoas queridas que estão a sofrer nas prisões, a serem humilhadas e
torturadas. Sabemos que poderia ser feito muito mais, pode haver um
desconhecimento do processo, mas saúdo cada passo efetuado por qualquer país
para nos ajudar. Emissão de vistos, imposição de sanções, ajuda aos ‘media”,
cooperação com diversas entidades, é muito importante para nós. Cada passo é
significativo”, concluiu.
Bielorrússia e Ucrânia em “luta comum em duas frentes”
A
Bielorrússia e a Ucrânia travam uma “luta em duas frentes”, porque sem
liberdade num país não haverá liberdade no outro, disse esta sexta-feira a
líder da oposição bielorrussa, Svetlana Tikhanovskaia.
“Antes
do início da guerra na Ucrânia lutávamos contra o regime na Bielorrússia, mas após
a guerra compreendemos
que também tínhamos de apoiar os ucranianos, porque os destinos dos dois países
estão profundamente relacionados, porque sem liberdade na Ucrânia não haverá
liberdade na Bielorrússia”, indicou
a activista, 39 anos, que na quinta-feira iniciou uma visita de dois dias a
Lisboa a convite do ministro dos Negócios Estrangeiros português, João Gomes
Cravinho.
“Por isso desencadeámos um movimento
antiguerra, diversos ativistas sabotaram linhas de caminho de ferro para
impedir o envio de material militar russo para a Ucrânia através da
Bielorrússia e foram organizados dois batalhões para defender a Ucrânia”,
assinalou a principal opositora ao regime do Presidente da Bielorrússia
Alexander Lukashenko, que na tarde de quinta-feira foi recebia pelo Presidente
da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
“Assim, neste momento estamos a lutar em duas frentes”
Numa
sala de um hotel de Lisboa, com ar discreto e pouco antes da deslocação ao
Ministério dos Negócios Estrangeiros, entende-se
que a líder da oposição da Bielorrússia, exilada em Vilnius há quase dois anos,
foi adquirindo experiência política como candidata da oposição às presidenciais
e após substituir o marido, Sergei Tikhanovsky, preso a 29 de maio de 2020.
Lukashenko, no
poder desde 1994, renovou o mandato presidencial nas eleições de 9 de agosto de
2020, cujos resultados não foram reconhecidos pela oposição interna, e pelos
países ocidentais, após diversas denúncias de fraude eleitoral.
Tikhanovskaya reclamou a vitória sobre Lukashenko nessas eleições
presidenciais e viu-se obrigada a fugir para a vizinha Lituânia, em pleno
período de repressão às massivas manifestações de protesto após a divulgação
dos resultados oficias.
“A repressão nunca parou na
Bielorrússia desde 2020. Todos os
dias há notícias de novas prisões, até à manifestação antiguerra de 27 de
fevereiro cerca de 1.100 pessoas tinham sido detidas”, indica a ex-professora de inglês num liceu de Minsk,
com dois filhos, e que nos dois últimos anos conheceu uma mudança radical na
sua vida, na sequência do despertar inédito da sociedade civil no seu país.
“Muitos
foram condenados a pesadas penas e recentemente foram aprovadas novas leis,
incluindo a pena de morte por tentativa de terrorismo. Qualquer pessoa pode ser acusada de tentativa de
terrorismo e estar sujeita à pena de morte. Destina-se
a apavorar as pessoas”, acrescenta Tikhanovskaia, que desde a
sua ascensão à ribalta da política tem efectuado inúmeras deslocações a
diversas capitais europeias com o objectivo de consolidar a sua rede
diplomática e procurar soluções para a crise política interna.
Actualmente,
e mesmo que admita existirem números contraditórios sobre
o número de presos políticos no país,
socorre-se do Centro de Defesa, uma organização de direitos humanos na
Bielorrússia, que refere existirem 1.237 pessoas detidas. “Mas amanhã o número
será mais elevado”, assegurou.
Apesar
da nova geração que emergiu no país com capacidade de contestação, a opositora
admite que a sociedade bielorrussa permanece fraturada.
“No
entanto, durante os protestos de 2020, os reformados também saíram à rua. Claro
que existem pessoas pró-União Soviética, que têm nostalgia dos antigos tempos,
mas cada vez mais pessoas têm acesso a informação alternativa, entendem como se
vive em outros países, e que também podemos viver de forma diferente”,
indicou.
“Assim, é por
isso que pedimos aos jovens que expliquem aos seus pais e avós a verdadeira
situação da guerra na Ucrânia, etc., para que se consiga abranger toda a
gente”.
Numa
referência à “percentagem da população bielorrussa que apoia o regime”,
Tikhanovskaia identifica-os como provenientes, na maioria, da ‘nomenclatura’
e das forças de segurança.
“Isto
porque durante 27 anos [Alexander] Lukashenko
conseguiu garantir um enorme poder político, as pessoas
estão confrontadas com o medo, com chantagem…, mas o regime não é tão
monolítico como pretender mostrar, existem
constantes conflitos em diversas esferas… Cada vez mais pessoas percebem
que Lukashenko não é o líder que pode liderar o nosso país e garantir a
nossa independência”, garantiu.
A
ex-candidata presidencial, apesar de afastada do país há dois anos, sente
que algo está a alterar-se, e sem retorno.
“A
situação está a mudar, e a guerra na Ucrânia também está a mudar e podem surgir
diversos cenários no desenvolvimento da situação”, assinalou.
Não
tenho a esperança que a situação vá mudar, antes tenho a certeza que a situação
vai mudar. Porque vejo que as pessoas continuam a lutar, a não desistir, e o
regime de Lukashenko sente o mesmo. Não posso prever a tendência, mas sinto que
em cada dia que passa, os nossos presos políticos acreditam na vida, na
liberdade. A nossa primeira tarefa consiste em libertá-los”.
Um desejo de
libertação obviamente extensível a Sergei Tikhanovsky.
“O
advogado encontra-se uma vez por semana com o meu marido e pode entregar-me
alguma informação e eu envio também alguma informação, mas não podemos
comunicar directamente com ele. As crianças podem escrever cartas ao pai, e ele
responde-lhes. Mas a maioria das cartas escritas para os presos políticos não
lhes são entregues, para demonstrar que estão abandonados, esquecidos,
convencê-los que já ninguém necessita deles”, concluiu.
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