Mudando, esperando, firmando, papagueando,
impondo, destruindo, favorecendo, amaldiçoando, mudando, mudando, destruindo …
Com Jaime Nogueira Pinto, fixando, firmando, revendo, aprendendo, incitando a
que a mocidade, ao menos, com ele aprenda. E o siga, os radicalismos sectários
adquirindo banhos de bom senso… ou mesmo apenas umas lambedelas...
Mas o cepticismo logo nos desvia a
esperança, como à pobre da Marquesa de Alorna, em soneto que Jaime
Nogueira Pinto bem merece, de homenagem a uma sabedoria e compostura
que vão rareando, perdida a esperança, mas desejando que JNP mantenha a
sua, do rigor e do bom-senso – e que os povos cujo histórico eleitoral analisa,
também vão reconquistando, apesar de tudo, parcialmente que seja …
Esperanças de um vão contentamento,
por meu mal tantos anos conservadas,
é tempo de perder-vos, já que ousadas
abusastes de um longo sofrimento.
Fugi; cá ficará meu pensamento
meditando nas horas malogradas,
e das tristes, presentes e passadas,
farei para as futuras argumento.
Já não me iludirá um doce engano,
que trocarei ligeiras fantasias
em pesadas razões do desengano.
E tu, sacra Virtude, que anuncias,
a quem te logra, o gosto soberano,
vem dominar o resto dos meus dias. - MARQUESA
DE ALORNA
França, Colômbia e Andaluzia – sinais dos tempos
Ficou claro, na Colômbia e em França, que
o centro e os partidos sistémicos continuam a perder terreno e que o chamado
“populismo” está em marcha. A Andaluzia é a ambígua excepção que confirma a
regra.
JAIME NOGUEIRA PINTO, Colunista do OBSERVADOR
OBSERVADOR, 25 jun
2022, 00:1811
No Domingo passado, 19 de Junho, houve
três eleições importantes no mundo euroamericano: a segunda volta das
parlamentares francesas, as eleições regionais na Andaluzia e a segunda volta
das presidenciais na Colômbia.
A França dividida
A segunda volta das legislativas era o
último episódio da segunda temporada eleitoral francesa, começada com as
presidenciais. Nestas, Marine Le Pen e Emmanuel Macron repetiram o duelo de
2017, com a candidata da direita nacional
a perder outra vez, mas passando de 34% para 41,46% dos sufrágios, isto é,
obtendo quase 13.300 000 votos. Há 20 anos, o seu pai, Jean-Marie Le Pen, tivera pouco mais de 5 milhões
contra Chirac; em 2017, Marine conseguira 7.700 000 na primeira volta e
10.600 000 na segunda.
O terceiro
classificado na primeira volta das presidenciais, Jean-Luc Mélanchon, que
ficara não muito atrás de Le Pen, conseguiu, para as legislativas, coligar a
sua La France Insoumise com os verdes e com os restos dos grandes partidos que
a História
ou o voto popular foram triturando: os socialistas e os comunistas. Graças à baixa votação dos candidatos presidenciais
socialistas, comunistas e verdes, Mélanchon
apresentou-lhes uma proposta que não puderam recusar. E fez-se uma nova Frente Popular, com
o pomposo nome de Nouvelle
Union Populaire Écologique et Sociale, um
logotipo arco-íris e um daqueles programas económico-sociais que contam ir
buscar recursos não se sabe bem onde.
O programa da Nova União Popular,
Ecológica e Social pretendia baixar os preços dos bens de primeira necessidade,
como o combustível, a alimentação e a energia (todos eles, em grande parte, importados), e “passar
imediatamente o salário mínimo para 1400 Euros” e a reforma para os 60
anos. A seguir, na boa linha
das novas esquerdas, vinham os direitos dos animais e toda uma vasta gama de
medidas para “salvar o planeta” e fazer deste o melhor dos mundos. Foi com este programa de unidade das esquerdas que Mélanchon conseguiu
eleger 131 deputados e deputadas.
Mas eis que, uma vez eleitos à boleia
de Mélanchon, socialistas, comunistas e verdes se recusaram a formar um grupo
único, reclamando a autonomia dos seus partidários que integravam as listas
comuns para formarem grupos parlamentares autónomos. Assim, o La France Insoumise fica com 72 deputados, o Partido Socialista com
24 e a Europe
Écologique les Verts com 23. Os
comunistas, que só
elegeram 12 representantes, vão integrar-se no Grupo Esquerda Democrática e Republicana.
Assim,
o Rassemblement National de Le Pen, com
89 deputados, ficará como o segundo grupo parlamentar, depois da
coligação Ensemble, de Macron, e
o primeiro da oposição. Parece que Le Pen terá tido alguma razão em não
querer negociar uma frente de direita com Zemmour, sacrificando alguns lugares.
Com a perda da maioria absoluta e a
recusa do Les Républicains em apoiar o governo Macron, o presidente reeleito
vai ter sérias dificuldades em política interna e internacional. Num tempo de crise económica e social, que as
oposições não deixarão de explorar, uma assembleia bipolarizada à direita e à
esquerda irá com certeza salientar as divisões entre “as elites” e “os cidadãos
comuns” e insistir na ideia de que Macron
representa a França do privilégio contra “o povo”.
O triunfo do Partido Popular andaluz
Nas
eleições regionais da Andaluzia, o Partido Popular teve uma grande
vitória, ao conseguir
uma maioria absoluta de 58 deputados em 109 num território que foi, por
muitas décadas, coutada dos socialistas do PSOE. E de a conseguir sem ficar
dependente da nova direita do VOX, que, entretanto, também melhorou a sua
representação no legislativo andaluz, passando de 12 para 14 deputados.
Mas
mais que o PSOE, que teve 30 deputados, e que a coligação de extrema-esquerda
liderada por Inmaculada Nieto, o grande
derrotado das
eleições de 19 de Junho foi o Ciudadanos, o partido rigorosamente ao centro
fundado por Alberto Rivera. É
curioso lembrar que o Ciudadanos surgiu na Catalunha
com uma posição firme e corajosa contra o separatismo catalão; e que há quatro
anos, em Sevilha, elegeu 18 representantes. Este
ano não conseguiu nenhum: o partido dirigido por Inés Arrimadas veio somando
derrotas nas votações regionais – tendo também perdido posições em Múrcia, em
Madrid e em Castilla y Leon.
A vitória de Moreno na Andaluzia foi
oficialmente assumida pela Secretária Geral do Partido Popular como a vitória
da moderação e da estabilidade. A chegada do
líder galego Alberto Nuñez Feijóo à
chefia do PP, substituindo Pablo Casado (e as suas oscilações entre a pressão à
direita do Vox e alguma tentação centrista), parece ter sido coroada de
sucesso.
Mas
mais do que à moderação e à promessa de estabilidade, terá talvez sido à ambiguidade e ao amplo e plural apelo ao voto de
Feijóo que que ficou a dever-se o sucesso eleitoral do PP: “Ensanchar (alargar) o PP, torná-lo o partido
da maioria dos espanhóis”, de gente “que es más de derechas, más liberal,
más conservadora, más de centro, más reformista y más de centro isquierda”
– o que, em termos de exegese ideológica, era suficientemente
dúbio e flexível para poder resultar. E
na Andaluzia resultou: o PP arrumou
os Ciudadanos, derrotou o PSOE e o Podemos e conteve o VOX.
Mas
será que a receita regional terá sucesso nacional, num momento em que os grandes problemas de Espanha
continuam a ser os separatismos? E quando a Esquerda prossegue ali a
sua ofensiva “fracturante”, permitindo o aborto às raparigas com mais de 16
anos sem autorização dos pais? A Eutanásia já tinha sido aprovada em Março de
2021, ficando a Espanha, depois da Holanda, da Bélgica e do Luxemburgo, como o
quarto país europeu a proporcionar o suicídio assistido aos seus cidadãos.
Portugal também parece estar “no bom caminho”, rumo a esta gloriosa “conquista
da civilização.
Petro e a viragem colombiana
Finalmente,
também no Domingo, na Colômbia, Gustavo
Petro derrotou Rodolfo Hernández,
um populista de direita, com 50, 44% dos votos contra 47%. A abstenção foi de 42,5%.
Os
dois candidatos vêm política e socialmente de fora do rotativismo
oligárquico liberal-conservador que há décadas monopoliza o poder no país. Petro foi, na juventude, guerrilheiro do M-19; esteve
preso, converteu-se à democracia representativa e chegou a deputado e a
presidente da Câmara de Bogotá. Esta foi a
sua terceira tentativa presidencial, com um programa em linha com as “novas
esquerdas” latino-americanas. Na Colômbia, o povo, aparentemente farto das elites,
entre um populista de direita – Hernandez – e um de esquerda – Petro – escolheu
o de esquerda.
A Colômbia segue assim a regra do
sub-continente americano onde, à excepção do Brasil, do Equador, da Guatemala,
do Uruguai e do Paraguai, governados à direita, ou da Costa Rica, do Panamá e
da República Dominicana, governados ao centro, todos os outros países – e os
mais importantes – escolheram a Esquerda ou, como não há “extrema-esquerda”, a
Nova Esquerda mais ou menos iliberal (equivalente, àquilo que, à direita,
poucos hesitariam em chamar “extrema-direita”, agregando-lhe o inevitável
“perigo”).
Lopez Obrador no México e Alberto
Fernandez na Argentina são exemplos desta nova vaga e as felicitações pela
vitória, chegadas a Bogotá vindas de Cuba e da Venezuela, testemunham o
regozijo dos compagnons de route.
Para já, entretanto, os discursos quer de Petro, quer de Hernandez, foram
cautelosos. O novo presidente foi mesmo correcto e tranquilizante.
A marcha deste mundo
“O
Senhor conduz a marcha deste mundo”, costumava cantar-se na missa. Haverá
nestas três eleições alguma coisa que nos ajude a entender “a marcha deste
mundo” e quem é que agora a conduz? É que o Senhor parece ter deixado de o
fazer, ou fá-lo-á por caminhos cada vez mais ínvios e linhas cada vez mais
tortas.
Foi
claro, na Colômbia e em França, com o fim do rotativismo conservadores-liberais
e, em França, com a perda da maioria da coligação macronista Ensemble, que o
centro e os partidos da esquerda e direita clássicas continuam a perder
terreno. Foi também claro que aquilo a que se convencionou chamar
“populismo”, por comodidade e interesse, continua em marcha: em França com Le
Pen e Mélanchon; na Colômbia com Petro e Hernandez. Já em Espanha, onde a
chefia de Estado é monárquica e a questão da unidade nacional central, com a
subida do populismo de direita (se assim considerarmos o Vox) e a queda do de
esquerda, com o Podemos, o sistema PP-PSOE aguentou.
A guerra da Ucrânia e a gestão
política norte-americana e europeia da crise parecem estar a abalar os
fundamentos económicos e sociais das democracias liberais, agravando as
condições de vida das classes baixas e médias, e alargando o fosso entre “as
elites” e “o povo”.
Em
termos geopolíticos, basta ver a política e a prática de sanções à Rússia
nos vários continentes – Ásia, América Latina e África – para perceber que a
contraposição ideológica entre “democracias” e “autocracias”, avançada pela
Administração Biden, não será propriamente uma fórmula de sucesso para
preconizar uma “vitória das democracias”. Sobretudo se, pensando para além das retóricas de
princípios, repararmos que o Euromundo do Hemisfério Norte está cada vez mais
longe de ser um modelo universalmente seguido, e que a História não acabou – e
as nações e os seus interesses muito menos.
ELEIÇÕES POLÍTICA FRANÇA EUROPA MUNDO COLÔMBIA ESPANHA
COMENTÁRIOS:
vitor Manuel: Resumindo e concluindo, um horizonte bastante
nebuloso. Rui
Lima: Estão todos zangados com o que têm e
90% da população dos países ricos já nasceu na era do consumo. Mas acima de
tudo o cidadão normal não compreende os políticos de hoje. Dou um exemplo: o
actual ministro da educação francês é um ultra-radical de esquerda Pap Ndiaye
defende o estado “dono de tudo”. Mas tem os filhos na escola da elite École
alsacienne. Estes políticos quando têm problemas de saúde vão ao privado e ao
melhor que existe - Hôpital Américain de Paris. A esquerda tem sorte ninguém
lhes exige coerência . vitor
Manuel > Rui Lima: Repare
que o camarada dos Santos optou, contrariamente ao que seria de esperar, por um
hospital de Barcelona rejeitando os excelentes hospitais de Havana e Moscovo.
Em Portugal é a mesma coisa, veja-se o caso da ex-Secretária de Estado da
Educação grande defensora da "Escola Pública" com as suas filhinhas
no colégio alemão em Lisboa e os nossos solidários funcionários públicos,
também eles grandes apoiantes da "causa pública", ferozes defensores
dos hospitais privados onde são tratados. Xico Nhoca: Quem concorre às eleições é para ganhar o poder.
Ganha o poder quem é mais votado. As estatísticas dizem que há aproximadamente
60% de analfabetos funcionais (eufemismo para idiota). Não fui eu que os
contei, são as estatísticas que o dizem. Portanto quem falar para estes e
ganhar os votos destes tem o poder assegurado. O populismo é uma
inevitabilidade da democracia. A abstenção vai aumentando porque há 40% de
pessoas que sentem que não é para elas que estão a falar os políticos. Vejam o
conceito de ineptocracia, é justamente o que escrevi acima mas dito de uma
forma que nem os idiotas percebem! advoga diabo: Sente-se a manifestamente exagerada rejubilante alma
de JNP. Amanhã será o inverso, chama-se alternância no poder e é essência da
Democracia que muito incomoda personagens como JNP! Sem dramas. João Ramos: “Sobretudo se, pensando para além das retóricas de
princípios, repararmos que o Euromundo do Hemisfério Norte está cada vez mais
longe de ser um modelo universalmente seguido, e que a História não acabou – e
as nações e os seus interesses muito menos.” citação que dá muito que pensar…
muito bem como sempre JNP! bento
guerra: Para estes conservadores, quando perde
o centro, não é pela incompetência e o desprezo pelo sentimento popular, mas
porque vêm aí "os populistas" João Ramos > bento guerra: Infelizmente
ainda há muito pateta neste mundo…
Xico Nhoca > João Ramos: Dizem
que há 60% de analfabetos funcionais (eufemismo para idiota ou pateta). Estão
aí para ser utilizados por mentes menos escrupulosas. Longa vida ao populismo! Maria Nunes: Excelente artigo. Madalena Sa: Muito bom este artigo!
Nenhum comentário:
Postar um comentário