De facto, o rigor da análise científica,
baseado nos dados concretos da realidade mensurável, nada tem a ver com a análise
das realidades do domínio abstracto, quer a psicológica quer a sociológica,
quer a esotérica, confinadas que são a uma amplitude do domínio espiritual, sem
o rigor analítico do concretismo mensurável, e por isso mesmo do domínio
pessoal ou social, embora possa ser de efeitos alastradores, como qualquer
peste ou virose contagiantes. Assim, este excelente artigo de Paulo Tunhas, é explorado por comentários mais ou menos
de caris irónico, que não só vão ao encontro dos seus argumentos críticos a uma
sociedade capciosamente simplista ou redutora na apreciação dos maquiavelismos
duma guerra sem sentido, ou com o sentido que os manipuladores da opinião
pública lhe querem atribuir.
Maneiras de pensar
Enquanto que, em ciência, a eficácia
da simplificação pode ser testada, em política o arbitrário, aureolado pela
“ciência”, pode singrar de modo incorrigível e persuadir multidões alegremente
incautas
PAULO TUNHAS
OBSERVADOR, 02 jun 2022
Quando
tudo se parece jogar num acontecimento
particular – por estes
dias, a guerra na
Ucrânia – é
difícil escrever sobre outras matérias. Mas com a situação no terreno num
impasse que só poderá ser resolvido caso o Ocidente democrático aumente o
auxílio em armamento pesado aos ucranianos, convém buscar outras coisas que
ocupem o espírito. Um assunto
óbvio é a eleição de Luís
Montenegro para a chefia do PSD.
Com efeito, depois destes anos todos em que o PSD andou mergulhado numa versão
política da chamada disforia de género, com a descoberta por Rui Rio que se
tratava de um partido impecavelmente de esquerda, algo que o corpo da
agremiação, como o atestam os resultados eleitorais, acolheu mal, a mudança é
bem-vinda. O problema é
que ainda é demasiado cedo para conceber verdadeiramente o que se vai passar e
não há vantagem previsível, para quem não tem grande imaginação no capítulo, na
mera especulação.
A
guerra da Ucrânia permite, no entanto, algumas considerações gerais
sobre o modo como certas maneiras de pensar se revelam inadequadas quando são
transportadas de um objecto para outro objecto diferente, algo que Aristóteles
já há muito havia perfeitamente percebido. Tomemos o exemplo clássico do caso, sempre muito
elucidativo, do cientista que fala de política. Seria de esperar que a racionalidade que
supostamente usa na sua actividade profissional funcionasse às mil maravilhas
quando discorre sobre a sociedade e os conflitos internacionais. Ora, é muito
instrutivo verificar que isso só muito raramente acontece. O mais das
vezes, verifica-se exactamente o contrário: Se pensarmos bem, podemos descobrir
várias razões para que assim seja. Uma delas é quase óbvia. A ciência busca a
simplicidade nas hipóteses que formula. Se percorrermos a lista dos requisitos
das boas hipóteses científicas que a história das ciências nos legou, tanto sob
a pena dos filósofos da ciência como dos próprios cientistas, encontramos
invariavelmente entre os requisitos principais (a par, entre outros, da
fecundidade explicativa) o requisito da simplicidade, normalmente associado
aos da inteligibilidade, da elegância e da beleza. Se há progresso no
interior das teorias, ele deve-se muitas vezes a revisões que assentam num
aumento da exigência de simplicidade. Acontece, no entanto, que essa
excelente exigência não surte o efeito desejado quando aplicada aos fenómenos
sociais e políticos, por razões que convém chamar ontológicas. O modo de ser da
natureza é distinto do modo de ser da sociedade, os seus respectivos objectos não
podem ser determinados de idêntica maneira. E, por essa razão, o que é um
mérito num caso é um demérito no outro. A simplicidade tende quase
inevitavelmente a transformar-se em simplismo.
Querem
um exemplo? Haverá
hipótese mais simples e aparentemente dotada do poder de tudo explicar do que
aquela que atribui a uma única entidade o monopólio da causalidade política no
mundo humano? Tudo
passa imediatamente a fazer sentido, que é o que qualquer pessoa quer, até
porque relativiza de um modo quase mágico o sem-sentido com que somos, no nosso
dia-a-dia, obrigados a conviver. Peguemos numa proposição muito
corrente: tudo o que corre mal neste nosso planeta deve-se à acção omnipotente
do “imperialismo americano”.
O corolário natural dessa afirmação é que todas as restantes entidades
políticas se limitam a uma passividade essencial, exceptuando parcialmente
aquelas que se colocam na posição de servir o dito “imperialismo”, assim
recebendo uma espécie de actividade vicária. Como é bom de ver, só a actividade é susceptível
de engendrar a culpa – a passividade designa, quase por definição, a inocência.
Eis uma bela teoria, de uma simplicidade ímpar, cujo
único defeito é o não capturar minimamente as condições reais das relações
políticas, nacionais ou internacionais.
E,
no entanto, ela goza de um grande prestígio, até porque, mesmo quando se
reivindica do simples “bom senso”, sem se atribuir pergaminhos científicos,
aparentemente é conforme ao projecto da ciência: descobrir a estrutura profunda
que subjaz à estrutura da superfície e que por inteiro a determina. Assim, o mundo superficialmente aparece como um
lugar de oposições várias em que cada entidade procura afirmar, a partir da sua
perspectiva própria, a sua existência, preferencialmente de forma não violenta.
Que sucesso explicativo não representa descobrir
que, no plano da estrutura profunda, uma única entidade é, de facto,
determinante! A lei da
causalidade única, no plano da estrutura profunda, oferece a chave que,
simultaneamente, explica e desmistifica o reino da aparência e, com tal
desmistificação, abole a importância do contexto e da contingência, puros
efeitos de superfície.
Pelo caminho, dissolve-se tudo aquilo
que faz parte do elemento imaginário que efectivamente caracteriza o que há de
específico a cada sociedade. O
cientista que lida com a sociedade segundo os bons procedimentos das ciências
da natureza descura quase por obrigação tudo aquilo que está na origem da
maneira de ser própria de cada sociedade: as regras, os costumes, o significado
das instituições, as próprias necessidades que para si inventam, as maneiras
que criam para fazerem sentido do mundo. Tudo isso lhe parece excedentário e
irrelevante, isto é, eliminável pela boa explicação. E fá-lo sem se dar conta que deita fora o bebé com a
água do banho. A diferença
entre os astecas e os vitorianos quase desaparece num ápice. E, com ela, quase
inevitavelmente, a própria história.
Dir-se-á
que todo este processo que nos conduz da simplificação
científica ao simplismo político é afim daquele que observamos nas
vulgares teorias conspiratórias. E
é, de facto, afim. O princípio
da causalidade única, bem como a explicação do visível pelo invisível, estabelecem um forte traço de união entre as duas
atitudes. É o mesmo tipo de satisfação do espírito que é buscada: a descoberta de um sentido pleno e sem falhas. Tal é o resultado mais aparente da busca científica da
simplicidade quando ela se metamorfoseia em simplismo político. Enquanto que, em ciência, a eficácia da simplificação
pode ser testada e corrigida, em política o arbitrário, aureolado pelo
prestígio da “ciência”, pode singrar de modo incorrigível e persuadir multidões
alegremente incautas.
Estou
muito longe de afirmar que o que escrevi atrás valha para todos aqueles que se
dedicam à ciência – o que seria absurdo.
Limito-me a constatar que se trata de um fenómeno mais vulgar do que seria
desejável. E que ele radica na convicção errónea de que um único estilo de
racionalidade, uma única maneira de pensar, vale identicamente para todos os
objectos. Não vale. Objectos diferentes obrigam-nos a pensar
diferentemente. Não se pode transportar, sem risco de violação da
verdadeira inteligibilidade, a maneira de pensar a natureza para a maneira de
pensar a sociedade.
COMENTÁRIOS:
josé maria: Maneiras de pensar: Não faz sentido estar a demonizar o eucalipto porque
nós sabemos que uma grande parte do território não tem eucalipto e que o
eucalipto é o que menos arde. Pedro Passos Coelho, o grande ídolo político de Paulo
Tunhas. PT Jornal, 29/6/2017 Utilizador Removido……….. Autor removido do sistema. Jose Miguel PereiraUtilizador Removido: E o que tem o traseiro a ver
com as bragas?... ……..
António Sennfelt: O melhor exemplo da disfuncionalidade da atribuição do
monopólio da causalidade político-social a uma única entidade foi o assim
chamado materialismo dialéctico marxista-leninista! Bastará referir o seu
postulado da luta de classes como alegado "motor da História"! advoga diabo: PT acertou, e mostrando-se como
exemplo! Quem mais que ele para, aureolado pela "filosofia",
complicar e ser arbitrário na análise politica? João Floriano: Esta semana parece-me que o
filósofo residente escreveu muito, esforçou-se muito mas não trouxe nada de
novo. Religião, Futebol e Política continuam a ser os assuntos que se forem
trazidos à baila mais hipóteses têm de arruinar um encontro de amigos. O que de
facto se exacerbou foi o furor, a animosidade, a intolerância, o ódio até com
que criticamos as ideias de outros. E pensando bem, muitas vezes sem qualquer
razão de ser. Dou-vos um exemplo do mais simples que pode haver e fácil
compreensão: Não há muito tempo ainda, um dos grandes motivos de
engalfinhamento nestes comentários era a jovem Greta: deus no céu, Greta na
Terra. Era só dizer algo de menos abonatório da Greta, e pum! saltava o palhaço
de dentro da caixa, com aquele ar de terror de criancinhas. Tunhas escreveu uma
crónica brilhante: a Praça Greta Thunberg ( se a memória não me falha). Hoje em
dia, onde está a jovem Greta? Deixou de servir os fins que a justificavam,
simples instrumento descartável. Contudo nunca a sua intervenção podia ser tão
importante na defesa das questões ambientais e das crianças e jovens como ela
que sofrem e morrem na Ucrânia. Mas não! a Greta está muda e calada. Mostra bem
a sua vacuidade e a falta de inteligência dos parvos, tontos e totós
repetitivos que um dia, não muito distante defendiam um falso ídolo. bento guerra: "É preciso acreditar!É
preciso acreditar!" Hipo
Tanso: Este artigo do P. Tunhas vai arranhar muita gente que usa os pergaminhos da
ciência para tentar justificar decisões injustificáveis que tomou ou pretende
tomar. Ahmed Gany:
O Bill Gaitas que
o diga: largou a "ciência exata" para se dedicar às vacinas. josé maria:
Maneiras de
pensar. 1- Peguemos numa proposição muito corrente: tudo o que
corre mal neste nosso planeta deve-se à acção omnipotente do “imperialismo americano”.
O corolário natural dessa afirmação é que todas as restantes entidades
políticas se limitam a uma passividade essencial, exceptuando parcialmente
aquelas que se colocam na posição de servir o dito “imperialismo”, assim
recebendo uma espécie de actividade vicária. 2 - Peguemos numa proposição
muito paulotunhista: tudo o que corre mal na Faixa de Gaza deve-se à acção
omnipotente dos “anti-semitas””. O corolário natural dessa afirmação é que
todas as restantes entidades políticas se limitam a uma passividade essencial,
exceptuando parcialmente aquelas que se colocam na posição de servir o dito
“anti-semitismo”, assim recebendo uma espécie de actividade vicária. Duarte Correia: "do cientista que fala de
política", ou de quando a filosofia se esquece de um dos seus objectos, a
Verdade, e se põe, partidariamente, a dissertar sobre a guerra. Américo Silva: Pois, a causa única da crise
ucraniana é a agressão russa, simples. Acaso Zelensky fique desempregado, pode governar
Portugal. Muitos portugueses não apoiam Costa, mas apoiam Zelensky, muitos
desconfiam do PSD, confiam em Zelensky, muitos odeiam Ventura, amam Zelensky,
muitos não dão importância à IL, escutam atentamente Zelensky. Zelensky tem
maior apoio em Portugal do que na Ucrânia, onde parte dos ucranianos não apoia,
arriscando a vida sendo contra, e esta hein?
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