De Luís Soares de Oliveira, de 2020, no seu blog – sobre o afastamento, cada vez mais vincado, do
Homem, dos tais princípios de espiritualidade a que o positivismo, o realismo,
o naturalismo e correntes posteriores foram apondo o seu selo cada vez mais distante
dos idealismos platónicos ou cristãos e respectivos princípios que opõem
virtude e pecado - as consciências cada vez mais esmorecidas a respeito dos
valores que a tradição desde sempre ditara.
Mas o cepticismo
é antigo, e está patente, por exemplo, no soneto seguinte, de Gomes Leal (1848 – 1921),
no qual, através de um processo sinestésico, jogando com as interferências da
cor e do som (musical), assim demonstra, finalmente, a retoma de uma fé de que a
sua anterior temática irreverente, criada por um espírito talvez em busca de uma
exactidão científica, sentiu afinal ser bem irrisória, ante a magnitude da
Criação Divina.
Luís
Soares de Oliveira presta a sua homenagem a um jovem cientista genial Frank Ramsay que morreu muito
jovem, e cuja frase "A
ascensão da ciência em simultâneo com o ocaso da religião tornou as velhas
questões ou técnicas ou ridículas" justifica o cepticismo das
pessoas de mais idade, quando se confrontam com os maquiavelismos
desnorteadores da educação hoje.
Eis o poema de
Gomes Leal, de um possível recuo no seu conceito agnóstico, revelador de que
talvez se possa esperar sempre um volte-face… apesar da perda total de valores
humanos em certos casos. Hoje.
«Eu tenho
ouvido as sinfonias das plantas»
Por: Gomes Leal
A Eça
de Queirós
Eu sou um
visionário, um sábio apedrejado,
Passo a vida a fazer e a desfazer quimeras,
Enquanto o mar produz o monstro azulejado
E Deus, em cima, faz as verdes primaveras.
Sobre o mundo
onde estou encontro-me isolado,
E erro como estrangeiro ou homem doutras eras,
Talvez por um contrato irónico lavrado
Que fiz e já não sei noutras subtis esferas.
A espada da
Teoria, o austero Pensamento,
Não mataram em mim o antigo sentimento,
Embriagam-me o Sol e os cânticos do dia...
E obedecendo
ainda a meus velhos amores,
Procuro em toda a parte a música das cores,
— E nas tintas da flor achei a Melodia.
FACEBOOK, 14 de maio de
2020
A ERA QUE FOI E
A QUE É
Por vezes, os factos sucedem-se de um tal modo que nos
deixam a impressão de que neste mundo reina a harmonia e tudo converge entre si
e connosco. Foi o caso que adiante relato. Por estes dias, tenho vindo a
analisar, conjuntamente com a sábia Professora Maria João Correia, pelo
messenger, a fenomenologia do fim do Humanismo (eu com saudade, ela com firmeza) e eis que,de
súbito, chega até mim o exemplar do The New Yorker, de 4 de Maio, que traz um
soberbo artigo de Anthony
Gottlieb sobre o malogrado Frank Ramsey, falecido em 1930, com 26 anos de
idade, e ainda hoje considerado o mais brilhante e precoce cérebro que cursou
na Universidade de Cambridge, no século XX. Aos 17 anos, era o companheiro peripatético de John
Maynard Keynes, este já quarentão, catedrático de Economia naquela universidade
e muito discutido autor de um. "Tratado sobre a Probabilidade". O critico literário
inconformista Lytton
Strachey disse que Ramsey "herdou de Newton a majestade do pensamento e a
gentileza do temperamento". Foi a Ramsey que a Universidade encarregou de
traduzir do alemão o famoso Tratactus Logico-Philosophicus, de
Wittgenstein. Ramsey não só traduziu as
oitocentas e tal páginas como publicou um ensaio critico sobre o mesmo. Keynes respeitava em Ramsey o génio matemático
e a contribuição que deu para a introdução da matemática no estudo da economia. Isto tudo vem a propósito de
me ter sido dado saber pelo artigo em causa que, há
um século, Ramsey rematou a minha polémica com Maria João Correia com uma
simples frase: "A ascensão da ciência em simultâneo com o ocaso da
religião tornou as velhas questões ou técnicas ou ridículas". Aí
está, nada de paixões. É a vez do Homo
Algoritmus.
COMENTÁRIOS:
1José Correia Guedes: O "Homus Algoritmus". É mesmo isso.
Seguir-se-á o Homus Artificialis
quando a Inteligência Artificial dominar o mundo. Já não falta muito
Helena Astolfi: Prosaicamente
acrescento aquilo que a minha velha e muita sábia avozinha já dizia: Estamos no
fim do mundo... que conhecíamos, adiciono eu.
Maria João Correia: E esta, hein? Sábia professora da noite para o dia!
Agradeço a sua simpatia. Excelente tema para próxima tertúlia onde, felizmente,
as paixões ainda abundam. Contudo, devo dizer que sinais de humanismo na
ciência estão em crescendo.
Irei ler
atentamente. Obrigada... a paixôes são necessárias....
Luis Soares de Oliveira: Aditamento ao texto. No seu último ano de vida, Ramsey
ainda publicou dois ensaios. O primeiro intitulava-se "Verdade e
Probabilidade" e o segundo "O Optimo Fiscal" .
Henrique Borges: Interessante, Luis. Mas a meu ver os epidemiologistas
que temos ouvido sobre o COVID-19 têm dado uma fraca ideia da ciência... Como
dizia outro dia um economista famoso, afinal não somos só nós que nunca estamos
de acordo sobre nada...
Isabel Themudo Gallego: Extraordinário artigo Luís!!! Sempre a abrir portas a
novas reflexões . Na verdade um prazer lê-lo. Muito obrigada!
Francisco Soares de Oliveira: Sempre a aprender consigo
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