Sobre a tal famosa “Carta de Bruges” do
Infante D. Pedro: de MARIA JOSÉ PIMENTA FERRO, transcrita pelo Dr. Salles. Mas só no Blog “A Bem
da Nação” estará completo. Demasiada areia para a minha camioneta, pois que de
dinheiros, então como agora. Zero.
Acrescento
o comentário de BENILDE TOMÁS FONSECA esclarecedor dos conteúdos do
texto em causa.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 16.01.23
POLÍTICA MONETÁRIA DO REGENTE D. PEDRO (1439-1448)
MARIA
JOSÉ PIMENTA FERRO
A economia monetária portuguesa
caracterizou-se por vários factores que devemos ter sempre presentes: a dependência em metais preciosos do mundo exterior:
Europa (prata e cobre) e África
(ouro
e cobre); a constante «guerra monetária» entre Portugal e Castela; a sangria da prata e bolhão para o mundo mediterrânico; a deficitária balança comercial portuguesa onde primam
as importações sobre as exportações, e a que nem os «aldeamentos» evitarão o
empobrecimento do reino em metais preciosos amoedados.
Esta problemática ajudar-nos-á a
compreender a quebra de prestígio do infante D. Pedro junto da população
urbana [1] e o não cumprimento do seu ideário,
expresso na carta enviada de Bruges a D. Duarte [2].
A
relativa escassez de prata que, na Europa central, pode ser analisada a nível
de conjuntura [3], era uma constante num reino sem produção
argentífera. Este traço estrutural esteve bem demarcado ao longo da nossa história monetária pelas contínuas vicissitudes por que passaram as
espécies brancas aqui lavradas, e pelo facto de Portugal ter sido o primeiro
reino europeu a lançar moeda subsidiária de cobre (os reais pretos de D.
Duarte), quando no resto do continente, essa função cabia ainda ao bolhão[4].
Apesar
disto, podemos afirmar que a partir de 1415 houve uma tentativa de sanar o
nosso numerário com o lançamento dos reais de prata a qual seria confirmada
pelas emissões eduardinas de reais e escudos, estes em ouro [5] [6].
Concomitante a esta atitude dos monarcas, tínhamos a defesa da boa moeda pelos
«grandes», quer pertencessem à nobreza quer à burguesia.
De
facto, o infante D. Pedro ao escrever a D. Duarte, de Bruges, aconselhava-o a
não quebrar as espécies em circulação, o que
«he cousa que se custuma fazer em nosa terra e vem delo grande mal a todos
aqueles a que vos soes theudo de fazer bem, e se segue delo grande proveza a
terra» 6. Idêntica posição assumia o conde de Ourem, em 1433 [7].
Os
conselhos de Catalão e Abravanel são exemplo da aspiração do grupo mercantil à
estabilidade monetária, ao inserir esta na problemática peninsular. Assim, defendia
o lavramento de escudos e meios escudos, em ouro, e dos reais de prata, em
abundância e sem quaisquer mutações, enquanto que os reais brancos e pretos que
circulavam já em quantidades excessivas, deveriam ter as suas emissões
reduzidas [8].
No
entanto, a política régia era diferente e explicava-se pela pobreza do reino em
metal branco. Ela oscilava entre as medidas tendentes a atrair, para o reino, a
prata, sobrevalorizando-a em relação aos outros reinos e isentando os
mercadores que a trouxessem do pagamento da dizima e, por outro lado, limitando
o comércio interno deste metal, restringindo o trabalho dos ourives.
Assim, em 1441, o regente D. Pedro
que assumira, anos atrás, uma posição definida contra as mutações monetárias e
uma defesa implícita do lavramento da boa moeda, via-se constrangido a proibir
a compra e venda deste metal, excepto no câmbio do rei 9. Em 1442, nas cortes de Évora,
os povos opunham-se a esta determinação tomada em Torres Vedras pelo que lhes
era concedido o comércio livre dos dois metais preciosos, desde que não
ultrapassassem o preço estabelecido na ordenação. Ao elevar o valor da prata e
ao limitá-lo aos negociantes e ourives, vedando o lanço livre, o regente procurava
atraí-la ao reino e à Moeda, trazida pelos mercadores nacionais e estrangeiros
*0.
De novo, em 1446, se levantavam os
protestos contra a impossibilidade dos ourives negociarem livremente aquele
metal o que foi justificado pela defesa do não abaixamento da lei dos reais
brancos n. A revogação desta medida seria tomada por D. Afonso
V, nas primeiras cortes após Alfarrobeira [9] [10] [11] [12] [13].
O século xv caracterizou-se pela
abundância de metal amarelo. Também Portugal participou desta realidade
europeia pois a Lisboa afiuiu, sobretudo, a partir de 1443, o ouro da costa
africana *3.
À
morte de D. Duarte, o numerário português constava de espécies:
— em ouro, os escudos, lavrados em lei de 18 quilates,
em número de 50 peças no marco e com o valor nominal de 140 reais brancos [14];
em prata, os reais, em número de 80 peças no marco de
prata de lei de 11 dinheiros, circulando com o valor de 10 reais brancos [15];
em bolhão, os reais brancos de 35 libras que, segundo
os conselhos de Catalão, 836 faziam um marco de prata de 11 dinheiros [16],
ou seja, 76 peças no marco de bolhão;
em cobre, os reais pretos ou de 3 libras e meia, ou
seja 1/10 do real branco [17] [18].
Estas eram as peças monetárias em circulação e emitidas por D. Afonso V,
durante a regência de D. Pedro.
Em
1441, a casa da moeda de Lisboa retomava o trabalho para cunhar escudos, reais
e bolhões, em nome do novo soberano se não o fizera já, pelo menos, no ano
anterior. São várias as referências documentais àquele funcionamento. Assim,
pela carta de quitação de Pero Eanes Çarrabodes, feitor em Bruges, sabemos que
enviou a Rui Gonçalves de Castelo Branco, tesoureiro da oficina monetária de
Lisboa, 175 quintais, 2 arrobas e 9 libras e meia de cobre, metade em Junho e a
outra metade em Outubro *8.
Em
1442, e 1444, esta encontrava-se ainda a lavrar, como podemos verificar pelos
registos feitos pelo escrivão da dita casa e que chegaram até nós, através de
umas folhas soltas e fragmentadas, existentes no Arquivo Nacional da Torre do
Tombo [19].
Pela
carta de quitação de João Martins, do pedido e meio do almoxarifado de Tavira,
em 1442, sabemos que 114 marcos e 7/8 de prata entraram na casa da moeda para
lavramento 2 o.
Entre
14 40-41, com os tesoureiros Diogo Gonçalves [20] [21] e
Rui Gonçalves de Castelo Branco [22],
lavravam-se reais brancos de 35 libras e leais [23].
Neste último ano, o regente, talvez pela falta de prata para a moeda, mandou
Bartolomeu Gomes, Gonçalo Gonçalves e o ensaiador Álvaro Gil, ensaiarem
amostras de lei de 22, 20 e 12 grãos [24] que
julgamos ser de reais brancos, se atendermos a que o real de 3 libras e meia
era de cobre, desde D. Duarte [25].
Segundo
o recibo de 22 de Agosto, dado a Rui Gonçalves, fabricaram-se 95 marcos de
bolhões de lei de 33 grãos e 1/2, obtidos da fundição das seguintes peças:…………….
…………………..
Ora,
se nos basearmos nos documentos atrás mencionados, veremos que os reais
brancos, lavrados pelo regente, eram de lei baixa, 30 e 33 grãos, se excluirmos
a hipótese de que não chegou a haver emissão de 20 grãos. O real branco como
espécie circulante estava a caminho do fim. O seu longo reinado iria ser como
unidade de conta.
Além destas
espécies cunhou-se numerário de cobre, os chamados reais de 3 libras e meia ou
reais pretos de 120 peças no marco, na hipótese de se ter mantido o peso das
espécies eduardinas, o que duvidamos 3 9. De facto, se
atentarmos no peso médio destes e no dos de D. Afonso V [37] [38],
concluiremos que houve uma quebra .De 1,49 gramas nos de D. Duarte passámos a
0,94 grs. nos de seu filho, o que nos leva a calcular que o número médio de
peças no marco passou de 120 e 154, aproximadamente, a cerca de 244. Donde o
podermos afirmar tal como o fizeram as cortes de 1442 que havia lucro no
lavramento destas espécies. Se computarmos o preço do quintal de cobre em 800
reais brancos [39],
somos levados a concluir que o soberano obtinha de lucro com a sua feitura,
excluindo a braçagem e outros gastos, cerca de 4.667 reais brancos. No caso do
cobre, oriundo do norte de África, o ganho era menor [40],
embora fosse ainda considerável, ou seja, 4.057 reais brancos aproximadamente.
Nas
cortes de 1449, o concelho do Porto pedia a D. Afonso V para que se não
lavrasse mais moeda preta porque era causa de destruição do reino [43].
Também no mesmo ano, esta cidade escrevia ao monarca a insistir que a moeda
de cobre «he grande abatimento de suas rendas e estruiçam de seu povoo» [44].
…………………………
COMENTÁRIOS:
Henrique Salles da Fonseca 18.01.2023 06:54
A CARTA DE BRUGES!
A famosa
carta de Bruges, escrita pelo infante D. Pedro ao seu irmão D. Duarte, em 1426,
devia ser dada nas escolas. É um
documento notável sobre os problemas de Portugal e dos
portugueses. É quase um programa de governo,
extenso, minucioso e certeiro, de uma visão extraordinária, com muita
atualidade, em que o infante das Sete Partidas dá conselhos ao futuro rei sobre
tudo. Há 600 anos! Deixo-vos algumas
frases. É tão difícil de escolher, mas aqui têm um apanhado:
IGREJA
“Há excesso de
prelados com escassa preparação, e em quem a vocação é ausente. Clérigos sem
cultura, em quem floresce a preguiça e a gula(...). Quanto aos
bispos, entendo que é nefasto o hábito de serem nomeados sem que se acautele
que são homens livres de escândalos.”
ESTUDOS SUPERIORES
“Saliento a importância da educação de todos os que
dão mostras de aptidão e inteligência, e não apenas dos filhos dos
privilegiados (...) Ricos e pobres devem conviver durante a vida de
estudos, em igualdade de tratamento. Defendo a criação de dotações para os
estudantes sem recursos.”
IMPOSTOS E
POVOAMENTO
“A força reside, em parte, na população. É preciso
evitar o despovoamento dos campos e diminuir os tributos que
pesam sobre o povo.”
JUSTIÇA.
"A
justiça parece só existir em Portugal na cabeça do rei e do seu herdeiro; e
dá ideia de que lá não sai, porque, se assim não fosse, aqueles que têm por encargo administrá-la
comportar-se-iam mais honestamente. A
justiça deve dar a cada um aquilo que lhe é devido e deve dar-lho sem delongas(...). O grande mal está na
lentidão da justiça”
DEFEITOS DOS
PORTUGUESES
"Dos muitos vícios que encontro no nosso povo,
falar-vos-ei do gosto pela ostentação vazia, que leva a que todos
queiram viver na corte, enjeitando as
nobres profissões de seus pais, para se verem afidalgados, entregues ao ócio e ao dinheiro fácil. Enche-se de
ociosos a corte e os lugares que deveriam
administrar o reino. Vejo nesta situação
uma das causas do atraso de Portugal, onde cumpre a lei nem se resolvem os
entraves.
BENILDE TOMÁS FONSECA
Nenhum comentário:
Postar um comentário