terça-feira, 3 de janeiro de 2023

O que nos vale é o “CORREIO DA MANHÔ

 

Como ponto de partida para deslindar o que ficou no segredo dos deuses, as tais coisas que terei pudor de contar seja a quem for”: temos pano para mangas no capítulo das obscuridades, provando que muito do que se faz por cá, sobretudo nas questões dos dinheiros, escorre tranquilamente pelos tais crivos de que trata Helena Garrido. Só falta saber se as tais “negligências” não foram merecidamente recompensadas, nesse tal de amiguismo providencial, nosso espelho na arte da formação de muitas das fortunas, a cada passo vindo à tona, muitas vezes graças à perspicácia de um jornal, como neste caso, segundo conta Helena GarridoMas já está tudo resolvido com demissões e admissões que permitem mais suspeições e, quem sabe, mais suspensões a curto prazo…

Incompetência, negligência ou amiguismo no caso TAP

O Governo, no mínimo, foi vítima da captura que fez ao Estado. Há todo um conjunto de crivos que não funcionaram no caso da indemnização à ex-administradora da TAP.

HELENA GARRIDO

OBSERVADOR, 03 jan. 2023, 00:214

O caso da indemnização na TAP tem muitas vertentes graves, entre elas a política, a ética e a moral. Mas um dos aspetos mais graves do que se passou com a agora ex-secretária de Estado do Tesouro é verificar que falharam uma série de procedimentos de escrutínio, previstos em quadros legais, e que vão desde o momento do pagamento da indemnização de 500 mil euros para sair da TAP até à sua escolha para o Governo, passando pela sua nomeação para a NAV. Dizer que não se sabia é tão ou mais grave do que saber. Pelo menos, se soubessem, ministros, secretários de Estado deste e do anterior Governo, entidades públicas várias, podiam limitar o problema à falta de sensibilidade política ou a um sentimento de “quero, posso e mando”. Não saberem é negligência, incompetência ou tratar os assuntos de Estado como se fizessem todos parte de um clube de amigos.

Comecemos pela decisão de pagar a indemnização. Tudo parece começar, pelo que é hoje contado, com o pedido da presidente executiva da TAP Christine Ourmières-Widener ao ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos para negociar a saída da administração de Alexandra Reis, com quem se dava mal. E com isto podemos imaginar que pode ser relevante a probabilidade do cenário de o problema ter sido tratado como se estivéssemos num clube de amigos.

E é logo aqui que começa o primeiro acto que não cumpre os procedimentos. Estamos perante a decisão de destituir uma administradora, tema de accionista em qualquer empresa e especialmente sensível e importante numa empresa que está a ser ajudada pelos contribuintes e a pedir sacrifícios aos trabalhadores. A presidente executiva devia ter feito esta solicitação às duas tutelas que a TAP tem: o ministro das Infraestruturas e o ministro das Finanças, que então era João Leão. Quem passou por empresas públicas sabe que até temas que podem ser de pura gestão operacional exigem o “sim” das Finanças.

Tanto quanto sabemos Christine Ourmières-Widener não o fez. Mas havia uma segunda hipótese: o ministro das Infraestruturas informar o seu colega das Finanças. Também não aconteceu, afirma João Leão. Pelo que sabemos, Pedro Nuno Santos autorizou que se iniciasse o processo negocial para a saída de Alexandra Reis e delegou o assunto no secretário de Estado das Infraestruturas Hugo Mendes que também, ao que é dito, não informou o seu colega das Finanças, o secretário de Estado do Tesouro Miguel Cruz.

A TAP informou o secretário de Estado das Infraestruturas da conclusão do processo negocial e, de acordo com o comunicado de Pedro Nuno Santos, Hugo Mendes “não viu incompatibilidades entre o mandato inicial dado ao Conselho de Administração da TAP e a solução encontrada”. E, aparentemente, não informou ninguém. O problema estava resolvido, terá pensado.

Ainda nesta fase, em que o assunto esteve a ser negociado entre advogados, há um terceiro crivo que falhou, o do administrador financeiro da TAP Gonçalo Pires. O Ministério das Finanças é que escolhe os administradores financeiros das empresas públicas – como é o caso agora da TAP – e estes reportam às Finanças, em geral ao secretário de Estado do Tesouro. Também o administrador financeiro não pareceu sentir necessidade de informar Miguel Cruz, o então secretário de Estado do Tesouro, sobre o que se estava a passar e especialmente a despesa extraordinária que ia ter com o mínimo de 500 mil euros que iria entregar a Alexandra Reis (faltam os impostos).

A partir de 4 de Fevereiro de 2022 a informação é pública. A TAP comunica à Comissão de Mercados de Valores Mobiliários que Alexandra Reis renunciou ao mandato, informação que, na sequência de se conhecer a indemnização, a empresa corrigiu, afirmando agora que a renúncia foi da iniciativa da TAP. Com a informação pública, entramos na fase em que é o Ministério das Finanças a falhar. E estamos no quarto nível de escrutínio falhado. Começando pelos serviços, há pelos menos três organismos que podiam ter perguntado à TAP o que se passava: a Parpública, a Direcção Geral do Tesouro e Finanças e a UTAM – Unidade de Acompanhamento das Empresas Públicas. Ninguém, tanto quanto sabemos, parece ter tido a preocupação de se informar ou, no mínimo, de avisar o secretário de Estado Miguel Cruz para que tomasse a iniciativa de perceber o que se passava numa empresa tão sensível como a TAP. A renúncia de uma administradora, a meio de um mandato, suscitaria a curiosidade de qualquer accionista e, por tudo o que conhecemos, deveria ter acendido as luzes vermelhas no caso da TAP. Mas não aconteceu.

Chega o novo Governo e há mais uma quinta possibilidade de escrutínio, em várias oportunidades. Em Abril é publicado o parecer da CreSAP – entidade que avalia os candidatos a lugares do Estadorevelando que o secretário de Estado das Infraestruturas propôs, a 11 de Abril, que Alexandra Reis fosse presidente da NAV – menos de um mês e meio depois ter saído de uma empresa do sector que ia passar a regular. no parecer da CreSAP não existe uma única questão sobre as razões que levaram Alexandra Reis a sair da TAP, considerando-a com o perfil adequado. E aqui temos, nesta fase, a primeira oportunidade perdida de se fazer o escrutínio por uma entidade independente. Em Maio, o artigo do Expresso assinado por Anabela Campos revela que Alexandra Reis vai para a NAV e é aqui que se fala pela primeira vez de “uma indemnização milionária” referida por fontes da TAP. O Ministério das Infraestruturas foi questionado e não confirmou a informação. Segunda oportunidade perdida para perceber que o assunto podia ser um problema. No Ministério das Finanças, agora já com Fernando Medina como ministro e João Nuno Mendes como secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, estes também não viram nem tiveram ninguém que os avisasse do artigo do Expresso – dos seus assessores aos serviços do Ministério –, perdendo-se a terceira oportunidade.

E chegamos à sexta possibilidade de escrutínio. Em Novembro, quando Fernando Medina convida Alexandra Reis para integrar a sua equipa podia ter tido a curiosidade de perguntar porque saiu da TAP, uma empresa que está a ser ajudada pelos contribuintes e tem de ser bem gerida para cumprir o plano de Bruxelas. Não perguntou e assim se perdeu mais uma oportunidade. Até o Correio da Manhã, na véspera de Natal, colocar 500 mil euros na sua manchete e as campainhas finalmente começarem a tocar. Deixou de ser possível “não saber”.

Quatro entidades públicas, o administrador financeiro da TAP, três ministros e três secretários de Estado, juntando este e o anterior Governo, não foram capazes de fazer o devido escrutínio à empresa do Estado que enfrenta um desafio de sobrevivência depois de os contribuintes lá terem injectado mais de três mil milhões de euros. Os ministros e secretários de Estado argumentam que não sabiam. Do anterior Governo, João Leão e de Miguel Cruz vieram dizer que de nada sabiam. Se não sabiam, deviam saber, deviam ter perguntado. Também Fernando Medina diz que não sabia, mas devia saber.

E agora, não sabendo, a pergunta que se devem fazer é: porque é que essa informação não lhes chegou? Porque é que nenhuma entidade da administração pública – e são três, pelo menos, a Parpública, a DGTF e a UTAM –, com responsabilidade de acompanhar as empresas do Estado, os informou da saída da administradora e perguntou as razões? E porque é que a CreSAP não perguntou nada a Alexandra Reis? Não se quer acreditar que tudo isto aconteceu porque a posição ideal, a que defendia melhor os seus estatutos, era não saber nem querer saber, com medo dos ministros ou para agradar ao Governo.

Se o escrutínio das empresas públicas está a ser feito desta maneira displicente, por incompetência, negligência, amiguismo ou para não criar problemas ao Governo, temos todas as razões para nos preocuparmos. Até o Governo precisa de se preocupar. O PS, através do Governo, capturou todo o aparelho de Estado, feriu entidades que são supostas fazerem um trabalho independente, garantindo o cumprimento da lei – temos visto isso ao longo dos últimos sete anos. E hoje pode ter a trabalhar pessoas que apenas querem agradar ao “chefe”. E está a ser vítima da escolha que fez de partidarizar a administração pública ou de se sentir já dono disto tudo.

TAP   EMPRESAS   ECONOMIA   GOVERNO  POLÍTICA   PEDRO NUNO SANTOS   FERNANDO MEDINA

COMENTÁRIOS:

Rui Pedro Matos: É pena que a autora desta coluna só se apercebe desta partidarização de todo o aparelho em 3 de Janeiro de 2023! Quem deixou loas a este governo de esquerda radical e reaccionária, como a autora desta coluna desde 2015, deveria ser co-responsabilizado por tudo isto! Não foi apenas esta autora...muitos aqui no Observador! Enfim....                         José B. Dias: As hipóteses de algo diferente, para melhor, ter sido feito foram tantas ao longo do processo, que a única conclusão possível é a de que foi feito como foi por ser exactamente assim que se pretendeu que o fosse ... resta saber a mando e por mor de quem!                       observador censurado: "Em Novembro, quando Fernando Medina convida Alexandra Reis para integrar a sua equipa podia ter tido a curiosidade de perguntar porque saiu da TAP, ... Não perguntou ... De quem é a responsabilidade da contratação da sra. Alexandra Reis para Secretária de Estado? O sr. Fernando Medina contrata um Secretário de Estado sem saber o que Secretário de Estado fez no último ano? É este tipo de zelo que se espera de um Ministro das Finanças que não foi capaz de contratar o seu Secretário de Estado? Porquê o sr. Fernando Medina ainda não saiu do governo?             Madalena Sa: Muito bem observado! No entanto, o dono disto continua a cuspir para o ar pq o Presidente da república só se passeia, e assim, portugueses, se destrói um País!

 

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