segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

Em suma


No não saber é que está o poder? Será?

Não sei, não quero saber e tenho raiva a quem me lembra o que soube

José Sá Fernandes não sabe. D. Américo Aguiar não sabia. Pedro Nuno Santos não sabia que soube. Gomes Cravinho sabia mas era como se não soubesse... No não saber é que está o segredo.

HELENA MATOS Colunista do Observador

OBSERVADOR, 29 jan. 2023, 07:3695

Portugal está entregue aos clones de Schettino, aquele rapaz simpático que há onze anos comandava junto à costa italiana o navio de cruzeiros Costa Concordia e que após ter manobrado mal o navio se pôs de imediato a salvo do naufrágio. Schetinno diz que não abandonou o barco mas sim que foi ejectado para o bote. Quanto ao acidente também não resultou de uma manobra mal feita mas sim das alterações climáticas…

A conversa telefónica que nesse 13 de Janeiro de 2012 teve lugar entre Schettino a salvo no seu bote e Gregorio de Falco o responsável pela capitania tornou-se antológica.Falco percebe que Schettino abandonara o navio onde mais de quatro mil pessoas lutavam pela vida. Dá-lhe ordens para que regresse de imediato ao barco e organize as operações de socorro. Schettino vai argumentando que está escuro logo não vê o suficiente para regressar, que não vale a pena tentar voltar ao navio porque outros já estavam a tratar dessas operações e assim sucessivamente até que um furioso Gregorio de Falco  lhe grita ‘Vada a bordo, cazzo‘ que podemos traduzir por “Vá para bordo, porra!” (obviamente que é muito mais vernáculo). Schettino não regressou. Das 4.229 pessoas que estavam no cruzeiro, 32 morreram e 64 ficaram feridas. A frase “Vada a bordo, cazzo” acabou estampada em t shirts. Isto há onze anos. Em Itália. Mas aqui, neste canto, em 2023, Schetinno produziu discípulos e tornou-se um padrão. Olhando à nossa volta percebemos que esse sorridente-irresponsável se tornou entre nós no protótipo de quem exerce cargos de poder: querer agradar a todos, não assumir quaisquer  responsabilidades e procurar salvar a pele são as regras dominantes.

Não é de admirar portanto que Portugal pareça cada vez mais um imenso Costa Concordia cheio de Schetinnos. Aqui ficam alguns. Os dos últimos dias.

José Sá Fernandes, coordenador do grupo de projeto criado pelo Governo para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023, não se lembrou que devia conhecer o projecto do altar. Com a ligeireza própria de alguém que nunca se responsabilizou pelas consequências dos seus actos, José Sá Fernandes declara Não conheço o projecto”. Se o coordenador do grupo de projeto criado pelo Governo para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023 não conhece o projecto do altar principal quem o conhecerá?

D. Américo Aguiar, presidente da Fundação JMJ Lisboa 2023 nunca se lembrou de perguntar o valor do altar onde o Papa celebrará missa durante a Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023. Quando soube o custo declarou, como se fosse um recém-chegado a este assunto: “Confesso que o valor do palco me magoou”. Como é que um homem que é (ou era até esta polémica) apresentado como futuro cardeal patriarca de Lisboa não percebe a sensibilidade de um assunto desta natureza? Não vê que o ónus da questão acabaria inevitavelmente a cair sobre uma igreja que vive acossada pelos escândalos sexuais e que não encontra solidariedades na hora de denunciar o activismo laicista (coisa muito diferente da laicidade)? D. Américo Aguiar diz-se magoado com o valor do altar. Mas tem rapidamente de se deixar de mágoas e tratar de pedir responsabilidades. A quem? A si mesmo.

Gomes Cravinho. Aqui estamos perante uma espécie de quebra-cabeças: inicialmente o ministro não se lembrava que sabia da derrapagem das obras no Hospital Militar de Belém. Depois lembrou-se que sabia (ou alguém lhe lembrou que havia um ofício a lembrá-lo) mas explicou que saber da derrapagem nas depesas não é a mesma coisa que autorizar que essa despesa com derrapagem se realizasse. Na prática as obras com derrapagem continuaram. O ministro que sabia mas que defende que saber não é o mesmo que autorizar diz ter condições para continuar ministro. Os contribuintes pagam. Pagam as obras, pagam a derrapagem e pagam o ministro.

Pedro Nuno Santos. Não se lembrava de ter autorizado a indemnização da TAP a Alexandra Reis. Depois a CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, foi ao parlamento e declarou ter recebido autorização “por escrito” do secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, para pagar a indemnização a Alexandra Reis. O ex-ministro Pedro Nuno Santos corre para o Whatsapp e acaba a lembrar-se que sabia. O antigo secretário de Estado das Infraestruturas soube que tinha chegado a hora de alterar o depoimento que dera à TAP sobre o que sabia sobre este assunto. Em resumo, é a versão revista e actualizada doeu sei que tu sabes que eu sei.

Por fim mas não por último temos a questão: o que sabe Marcelo? Creio que o próprio Marcelo não sabe responder a esta pergunta tal é a sua pressa em saber apenas o que lhe convém. A forma como reagiu aos custos do altar-palco é sintomática dessa vertigem do Presidente: a 26 de Janeiro, o DN escrevia: “O Patriarcado de Lisboa garantiu esta quinta-feira à SIC Notícias que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, sabia dos custos avultados (4,2 milhões de euros) do palco para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) e explicou que todas as decisões sobre o evento são tomadas por várias entidades, entre elas as autarquias de Lisboa e Loures e a fundação que organiza o evento.” Nesse mesmo dia D. Américo Aguiar, presidente da Fundação JMJ Lisboa 2023 declara aos jornalistas a propósito dos custos com o altar-palco: “Eu não sabia, o senhor Presidente da República não sabia e não é verdade que o senhor Presidente da República soubesse. O que é que nós sabíamos? Sabíamos o global.” O problema é que o diabo está nos detalhes! Dizer que não se sabe tornou-se uma táctica de sobrevivência. Dizer que o outro sabia uma forma de ataque.

Perante tais personagens algo me diz que se gritássemos a cada um deles “Vada a bordo, cazzo” na esperança de os ver assumir as suas responsabilidades e fazer o que deviam ter feito, as respostas que escutaríamos não seriam diferentes daquele titubear que, da segurança do seu bote, Schettino ia proferindo enquanto no barco, que ele não soubera manobrar e entretanto se afundava, milhares de pessoas desorientadas procuravam escapar com vida.

JMJ 2023  RELIGIÃO  SOCIEDADE  PEDRO NUNO SANTOS  POLÍTICA  GOVERNO

COMENTÁRIOS (de 96)

José B. Dias: Marcelo só sabe o que lhe convém a cada momento ... mas no final sabe-a toda!               Carlos Vito: Todos, gente sem escrúpulos nem ponta de vergonha. Cobardes até ao tutano. Entre todas as afirmações despudoradas dos amnésicos acrescentam-se as afirmações do bispo em evidência no título do artigo: "não sabia nem tinha que saber"! Como assim? Então eu proponho determinada obra e não procuro saber nem me interessa o seu custo?! Isto só é comparável ao Cravinho, que tem o desplante de dizer que não sabe o significado do aforismo: "quem cala consente". E a posição de Marcelo é uma excelente prova de como o epíteto de catavento lhe assenta que nem uma luva. Já a ética de Sá Fernandes diz muito sobre o caráter pretensamente superior da esquerda.                     Luis Ferreira: Helena Matos, você acaba de chamar ratos a estas pessoas, sempre os primeiros a abandonar o barco. Sabe o que lhe digo ? Bravo!!!               Fernando Cascais: O escrutínio da opinião pública vai governando o país. Se não fosse a indignação pública com o preço do palco tudo teria passado sem problemas. Agora, felizmente já existem preocupações com os valores envolvidos para financiar o evento anunciado em festa por Marcelo e Costa. O dinheiro dos contribuintes começou a ser tido em conta. Com as indemnizações na TAP idem. Se não fosse a notícia do Correio da Manhã a denunciar a indemnização de 500 mil euros, esta teria passado despercebida e com a maior das naturalidades. Outras se seguiriam naturalmente mesmo com a TAP falida, seria normal. O próprio presidente da república nas suas incontáveis declarações diárias vai mudando a opinião consoante o ruído da opinião pública. Somos actualmente governados pelo filtro da opinião pública que vai dando a noção da gravidade dos acontecimentos para os governantes agirem. Quanto mais filtro e escrutínio a comunicação social fizer, melhor será a nossa governação, ou, menos erros serão cometidos. Pena, que este escrutínio não tivesse sido devidamente feito na altura em que o presidente da república gritava para os microfones que ganhámos o Euromilhões das JMJ. Nota 1: o retorno do investimento é uma falácia Nota 2: Manuela Ferreira Leite, ex-ministra das finanças defendeu com unhas e dentes que o retorno valia qualquer investimento. Para umas coisas é poupadinha, para outras é uma mãos-largas. Devem ser os efeitos da crença na racionalidade. Nota 3: quanto vai custar financiar o evento? Como se chegou aos 160 milhões? Ninguém sabe, óbvio, nunca houve durante este tempo um plano com pés e cabeça.                 Maria Tubucci: Na tomada de posse os elementos do governo fazem um juramento,”Eu, abaixo assinado, afirmo solenemente pela minha honra que cumprirei com lealdade as funções que me são confiadas.” Isto é só folclore, pois não têm honra e muito menos são leais aos portugueses, são leais aos seus próprios interesses. Assim no instante imediatamente a seguir ao juramento, já estão a mentir. Este género de pessoas, irresponsáveis, incompetentes, interesseiros, inimputáveis, que governam o país com os resultados que se vêem. Estranhar estes factos? Não, são tudo consequências da maioria absoluta, da falta de escrutínio, de se considerarem moralmente superiores, de considerarem os portugueses como acéfalos e burros de carga. Isto alguma vez mudará? Talvez, se o povo votante se sentir indignado e revoltado, facto que ainda não aconteceu. Talvez, se começarem a ser insultados em público pela sua cobardia, surta efeito e pensem 2 vezes antes de abrirem a boca. Talvez a política do ”dizer que não sei, não me lembro”, HM, termine da pior forma possível para os envolvidos. Não sei, era o que mereciam. Talvez, ainda demore muito tempo!                  Maria Cordes: Está bem explicado e compreendido. Ainda não percebi, porque é que o palco para esta ocasião, tem de servir para futuros acontecimentos, como prováveis eventos da Madona. Porque não se cingiram ao agora? Faz lembrar os estádios do inefável Guterres. Quanto aos timings, outra trapalhada, só agora é que acordaram. Sá Fernandes, depois da barracadas do túnel do Marquês, devia ter calçado as pantufas. Esta gente, pensa que nascemos ontem. A importância do jornalismo de investigação, livre, é incontestável. Parabéns Helena.                     Maria da Luz Bueno: Mas afinal quem é que quis fazer o evento em Lisboa? O presidente, as autarquias, a Igreja? Pelo que ouvi a Igreja até estava reticente. Sobram os outros dois. E todos sabiam que eram necessários investimentos. O grande problema da esquerda é que os primeiros a aproveitarem o dito palco é a Igreja. Se fosse um qualquer evento das esquerdas estava tudo bem, como é da Igreja é 'bota abaixo'.               elpjust just: Bom dia! Não devemos perder a esperança por um amanhã melhor! No entanto, por mais que se frequente a escola até mais tarde, se, tenha mais conhecimento, literacia etc..  etc.. temos cada mais uma juventude de quarenta anos de idade, inerte sem valores sem ambições, muita ainda a comer do tacho dos pais, sem vontade de lutar por causas e direitos, porque também não quer honrar deveres e obrigações. O ardil não dorme, sempre com astúcia necessária, para comer sem fazer nada, até porque também não sabe, a vida não lhe ensinou nada, nunca foi a tropa, nunca andou a pé nunca teve que pedir boleia para ir trabalhar, nada, nunca lhe faltou nada por isso nunca lutou. Agora, que a barriga começa apertar, com a subida dos preços (roubalheira), para pagar a mentir do COVID, que nasceu por dec. e findou por dec. ( A minha opinião), gastaram-se milhões têm medo de abrir as instituições ao público em geral, sim porque o nosso presidente e políticos nunca lhes faltou a liberdade para comícios e outras coisas. Contudo, é bem verdade quando a fome aperta o povo vai ao limite ou mais além. Temos os professores na rua, com toda a razão, porque não ganham para combustíveis, temos as casas como nunca visto, alimentos, etc. etc.. tudo isto, porque nunca tivemos políticos com visão de estado de (povo), sempre se governou por impulso, e para calar reclamações dos que têm a coragem de gritar e lutar por alguma coisa, exemplo a TAP, a Madame teve que se chegar à frente para não ter prejuízo. Se, fosse assim com tudo tínhamos uma sociedade equitativa, dentro do principio da igualdade. Dá-se subsídios a malandros para acabar com os carteiristas, promove-se o ócio, e o expediente, para comprar votos, e, garantir que a máquina partidária não encrave, para que as famílias, se governem, e tem-se esta vergonha do não sei, não tenho culpa, mas afinal sabia de tudo e omiti até ser apertado. Concluindo, de quem é a culpa que está sempre a morrer solteira, só encontro um culpado, ( O código Penal ), e os seus manuseadores, não vou falar de justiça, porque justiça é outra coisa bem diferente, que muitos confundem a seu belo prazer.(Correm noticias animadoras na cabeça dos inocentes), nunca haverá um amanhã melhor com uma sociedade inerte e cobarde, sem espinha dorsal. Todo o pai consciente diz ao filho, que se não lutar não tens, excepto se fores para político.          José Barros:  Muito bom. Como Helena Matos nos acostumou. Já o disse. Tanto "não sabia" é a mais flagrante e trágica confissão de incompetência. Quem não sabe e devia saber é, obviamente, um incompetente. Deve reprovar. Sendo servidor público deveria ser proibido de exercer cargos públicos por incompetência.           João Ramos: Excelente retrato do que são as “elites” neste país, só faltou referir o Medina e claro está, o responsável máximo Costa que nomeia e mantém, sabe Deus a que propósito, está gentalha que nos conduz ao abismo. O Sã Fernandes deveria de ser demitido imediatamente das funções que não exerce e quanto aos outros deveriam tomar o mesmo caminho, a bem da nação…               Amigo do Camolas: Entre escolher não querer saber e escolher não se importar, Marcelo e Costa escolheram as duas. E "nós" escolhemos os dois. E quando os que exercem cargos públicos são tão ignorantes e tão incompetentes em tudo, é porque lhes falta empatia. É porque lhes falta qualquer tipo de noção para o cargo que ocupam. E esta balbúrdia entre gestores de instituições públicas e empresas públicas são sintomas dessas falhas. As habilidades destes dois e dos socialistas de tomar o poder do estado manipulando, roubando e enganando estão em contradição com as habilidades humanas necessárias para aplicar esse poder de maneira significativa. Como todo mal, esta bolha "Schettina" está condenada a se autodestruir desde o início. É verdade que Costa nunca quis nem quer fazer nada sobre a roubalheira descarada nas instituições públicas e sobre as aldrabices dos mesmos. Ele não quer saber nada sobre uma empresa que ele nacionalizou - TAP. Ele não quer saber nada sobre o que os seus ministros fazem e não se importa com o quão bem ou mal os milhões injectados na JMJ estão a ser geridos. A manhosice de Marcelo e as aldrabices de Costa são expressões do seu desprezo pelas pessoas abaixo deles. Suas posições implodem porque eles nunca se preocuparam em entender como elas afectam pessoas reais. Eles escolhem não saber, porque escolheram não se importar                    Carlos Chaves: Caríssima Helena Matos, não viria mal ao mundo se tivéssemos por cá esses “Schettino’ s” a tratarem das suas vidas privadas. O problema é quando descobrimos que as suas cobardes decisões, típicas neste caso de homens muito pequeninos, afectam a vida de todos nós! E pior, estão a fazer escola!               Maria Melo > Fernando Cascais: Resta saber para os bolsos de quem vai parte desses milhões.                Américo Silva: Sou grande admirador das crónicas da Helena Ramos, por isso, com consideração, discordo muitas vezes. Esta está excelente, magistral.

Nenhum comentário: